Embargos infringentes interpostos de ação de busca e apreensão.
EXMO. SR. DR. DESEMBARGADOR RELATOR DO ..... GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS DO
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ....
Embargos Infringentes nº ..............
Embargante: .................
Embargado: .................
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
EMBARGOS INFRINGENTES
visto a existência de decisões divergentes no v. acórdão de nº ..........,
prolatado nos Embargos Infringentes julgados pelo .......º Grupo de Câmaras
Cíveis deste Egrégio Tribunal de Justiça, aonde foi embargado BANCO ...........,
instituição financeira em regime de liquidação, também ali identificada,
fazendo-o nos exatos termos permitidos pelo Direito esperando, ao final, ver
providas suas razões de ingresso.
1. DOS FATOS
Trata-se de procedimento de Busca e Apreensão, distribuído pelo embargado aos
.............. perante o Douto Juízo de Direito da Comarca de .................,
visando a apreensão de um automóvel e de ............... metros cúbicos de
madeira de pinus serrada seca, vinculados a contrato da modalidade instrumento
particular de confissão, composição de dívida, forma de pagamento e outras
avenças.
O contrato que originou a demanda, foi firmado aos .......... pelo valor inicial
de R$ .................., amortizável em parcelas mensais e vinculado a
conta-corrente, liquidando valores anteriormente ditados como devidos pelo
financiador.
Designada audiência de conciliação, o aqui novamente embargante, efetuou
proposta de composição ao embargado, sendo esta rejeitada, não se permitindo às
partes qualquer prova, especialmente o pericial, que determinaria as elevadas
quantias impostas pelo agente financeiro durante a contratação.
O r. decisum singular, julgou integralmente procedente o pedido de Busca e
Apreensão, entendendo cabível a aplicação de juros superiores a 12% (doze por
cento) ao ano e determinando a entrega dos bens arrendados, sob pena de prisão
civil do fiel depositário.
Ao apelo interposto pelo aqui embargante perante este Egrégio Tribunal de
Alçada, foi negado provimento por maioria de votos, o que motivou, a teor do
disposto pelo artigo 530 do Código de Processo Civil, a oposição de Embargos
Infringentes, estes calcados no voto vencido.
O Exmo Juiz ................., declarando seu voto vencido, entendeu pela
aplicabilidade do artigo 192, parágrafo 3º da Constituição Federal, entendendo
que, qualquer remuneração superior ao limite fixado, seja a que título for,
tipifica a usura real da lei.
Quanto ao instituto da prisão civil, entende que só é aplicável quando se trata
de contrato de depósito típico, definido pelo Código Civil, afastadas
equiparações definidas em lei, posto que não mais autorizadas pelo texto
constitucional.
Declarou ainda em seu voto, que não é cabível o alargamento de casos de prisão
por dívida, entendendo que o conceito de depósito que a admite corresponde ao
tipo histórico adotado pelo constituinte, não podendo o legislador ordinário
criar novos casos e sujeitá-los ao instituto prisional.
Os argumentos constantes do voto vencido, motivaram os Embargos Infringentes
opostos, visando que o Grupo de Câmaras Cíveis reunido, desse fim à divergência
apontada.
Aos ..........., os Embargos Infringentes opostos foram julgados, e novamente
restou configurada a divergência, dado que, no tocante à limitação dos juros em
12% (doze por cento) ao ano, a maioria entendeu pela sua pertinência, mas,
quanto à prisão civil, foi a minoria quem pugnou pelo sua inviabilidade.
Visto a existência de nova divergência, apenas e tão somente no caso da
possibilidade da prisão civil do embargante, necessária a interposição de novos
embargos, calcados nos votos vencidos, a fim de que ao final, restem
integralmente acolhidos.
Tais os antecedentes processuais.
2. DO DIREITO
O v. acórdão prolatado nos Embargos Infringentes, assim restou ementado:
EMBARGOS INFRINGENTES - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM
AÇÃO DE DEPÓSITO - ARGUIÇÃO DE ABUSO NA CLÁUSULA QUE FIXA JUROS REMUNERATÓRIOS
SUPERIORES A 1% AO MÊS - LIMITE CONSTITUCIONAL DOS JUROS E AUTO-APLICABILIDADE
DO § 3º, DO ART. 192, DA CF - ADMISSIBILIDADE - PRISÃO CIVIL NOS CONTRATOS DE
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA - EQUIPARAÇÃO DO DEVEDOR FIDUCIÁRIO AO
DEPOSITÁRIO - LEGALIDADE - EMBARGOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS.
Tal o v. acórdão prolatado.
1. DAS RAZÕES DOS EMBARGOS INFRINGENTES - IMPOSSIBILIDADE DA PRISÃO CIVIL.
Conforme já alocado, em relação à prisão civil, foram os Embargos Infringentes
rejeitados, sendo 4 (quatro) votos à favor e 3 (três) votos contra sua
decretação, motivando novamente, em face da divergência, a interposição dos
infringentes.
O Exmo Juiz .................., declarando seu voto vencido, alocou entendimento
do Superior Tribunal de Justiça, da lavra do Ministro .............., que
brilhantemente inscreveu: "são conhecidas minhas restrições ao instituto da
alienação fiduciária, ressuscitada dos sovações da história a fiducia non
creditores para assegurar às instituições financeiras superlativas garantias,
além das muitas já utilizáveis, no direito brasileiro, de ordem pessoal e de
ordem real."
De maneira brilhante, prosseguiu o Ilustre Juiz .................., ressalvando
que o Decreto Lei 911/69, é fruto de uma época onde a ditadura dominava e os
interesses dos banqueiros na época, preponderavam sobre todos os demais.
Do voto, é de destacar-se:
"Monitorado pelos banqueiros que se refestelavam no poder, época em que as
liberdades individuais inexistiam e o Congresso estava fechado pelos tanques do
General "Nini", o referido decreto ainda se encontra em vigor por esquecimento
ou inapetência de nossos legisladores.
É alguma coisa assim como se as leis editadas por Hitler ainda estivessem a
vigorar na Alemanha de hoje."
Prossegue, alegando que conviver com essa legislação fascista, que não seria
admitida por qualquer estado democrático de Direito, afronta a própria ampla
defesa, quando o artigo 3º, em seu parágrafo segundo, determina que na
contestação, só se poderá alegar o pagamento do débito vencido ou o cumprimento
das obrigações contratuais.
Tal disposição, sem dúvida, fere o contraditório e jamais deveria fazer parte do
ordenamento jurídico brasileiro, pois a Carta Magna, além de garantir a ampla
defesa, conceitua nosso País, como sendo um Estado Democrático de Direito.
No aspecto legal, enfatizou o nobre Relator, que apenas nos casos de depósito
típico poderia ser aplicada a prisão civil, deixando ao largo os demais casos
instituídos por equiparação, afrontando o texto constitucional.
Em seu fecho, o Ilustre Juiz vencido, assim inscreveu:
"Tenho a ousadia de não seguir esta orientação, mesmo porque ela não é unânime e
os votos divergentes são respeitáveis, razão pela qual, não existindo efeito
vinculante, por enquanto, assim como Prometeu: "resisto".
São as razões pelas quais tenho que o recurso do devedor merecia receber
provimento também no sentido de ser afastada a prisão civil".
Sem dúvida, decisões de inspiração tão profunda, de fundamentação e de fundo
democrático, motivam, mesmo nos momentos em que a credibilidade não mais existe,
a lutar por aquilo que vai além dos textos legais e atinge o ser humano em seu
principal bem: a liberdade.
Não é à toa, que o lema da Revolução Francesa, pregava a igualdade, liberdade e
fraternidade, apenas três palavras que exprimem, com exatidão, os ideais de
qualquer ser humano e que revelam o tripé sob o qual qualquer legislação deve
basear-se.
Sem dúvida, coagir um devedor ao pagamento de determinada dívida sob a ameaça de
prisão, tolhendo a liberdade do indivíduo, sufocando-o, colocando sua vida em
voga, em face de tal fútil argumento, não é ato digno de uma democracia.
Sim, ainda vivemos sob a égide de um Estado Democrático, superamos a ditadura
que mesmo em face de nossa tolerância, caiu sem piedade sobre nossas vidas e
que, após muita luta, foi expurgada de nosso País e de nossa realidade.
Ao nos depararmos com tão absurda imposição, refletimos e constatamos que a
ditadura, como se houvesse planejado tardia vingança, nos deixa de herança o
Decreto Lei 911/69 e com ele, novamente nos faz relembrar os horrores daquela
época em que a liberdade não existia.
Revolta o fato dessa aberração jurídica, comparecer em citações e por ironia,
ser o embasamento legal da defesa ou da acusação de instituições bancárias que,
calcadas no que ali foi escrito, pretendem justificar suas pretensões.
A alienação fiduciária foi instituída em nosso País visando a facilitação do
crédito ao consumidor de uma forma ampla, conforme conceituou o Ministro José
Carlos Moreira Alves:
"Com efeito, sem crédito não há incremento de produção, nem tampouco a expansão
do escoamento que se produz".
Em relação à prisão civil, a Carta Magna determina:
Artigo 5º
Todos são iguais perante a lei ... omissis ...
LXVII - Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo
inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e do
depositário infiel.
No caso, a dúvida é estabelecer se o depósito realmente existe nos contratos de
alienação fiduciária, sendo necessário para tanto, analisar o disposto pelo novo
Código Civil, quando dispõe:
Artigo 627
Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar,
até que o depositante o reclame.
O doutrinador Orlando Gomes , acerca do disposto legalmente nos ensina:
"O contrato de depósito se caracteriza pela custódia ou obrigação de custódia,
exercida sempre no interesse do depositante."
Assim, o devedor fiduciante recebe o bem na qualidade de possuidor direto e como
titular de um direito, não tendo a obrigação de entregá-lo ao arbítrio do
devedor fiduciante, existindo apenas o exercício de um direito, revelando-se a
diferença existente entre o depósito puro e o decorrente de alienação
fiduciária.
A essência do contrato típico de depósito, é a entrega da coisa depositada, e
não apenas a existência do bem como garantia, que pode ser substituída pelo
valor do mesmo, como ocorre nos contratos de alienação fiduciária.
O Superior Tribunal de Justiça, já se manifestou pela impossibilidade de prisão
civil do depositário na alienação, decidindo:
RECURSO DE HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR FIDUCIANTE DECORRENTE DE AÇÃO
DE DEPÓSITO ORIUNDA DE DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. NÃO
RECEPÇÃO PELA ATUAL CARTA POLÍTICA, DAS DISPOSIÇÕES DA LEI Nº 4.728/65 E
DECRETO-LEI Nº 911/69, QUE AUTORIZAVAM A CONSTRIÇÃO PESSOAL. ENTENDIMENTO
CONSOLIDADO PELA 3ª SEÇÃO, EM PROCEDIMENTO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA.
RECURSO PROVIDO.
1. Consoante decidiu a 3ª Seção desta Corte (HC nº 4.728/65 e Decreto Lei nº
911/69), que autorizavam a prisão do devedor-fiduciante, decorrente de ações de
depósito, por força de inadimplemento de contratos de alienação fiduciária.
O mesmo STJ, em decisão recente, entendeu:
CONSTITUCIONAL. CIVIL. PROCESSUAL PENAL. CONTRATO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA.
DEVEDOR FIDUCIANTE. INADIMPLEMENTO DE OBRIGAÇÃO. PRISÃO CIVIL COMO DEPOSITÁRIO
INFIEL. IMPOSSIBILIDADE. CF. ART. 5º, LXVII, CC, ARTS. 1.265/87, DL Nº 911/69.
Segundo a ordem jurídica estabelecida pela Carta Magna de 1988, somente é
admissível prisão civil por dívida nas hipóteses de inadimplemento voluntário e
inescusável de obrigação alimentícia e de depósito infiel (CF, art. 5º, LXVII).
Este Egrégio Tribunal de Alçada, seguindo os entendimentos emanados da Colenda
Corte, decidiram:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 112.258-9, DE CASTRO, VARA CÍVEL. EGRÉGIO TRIBUNAL DE ALÇADA
DO ESTADO DO PARANÁ.
EMENTA:
APELAÇÃO CÍVEL - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO
- INCONSTITUCIONALIDADE DA PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO POR EQUIPARAÇÃO - JUROS -
LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL - 12% AO ANO - AUTO-APLICABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
"É entendimento do STJ que a CF/88 recepcionou o Dec. Lei 911/69. Entretanto,
com o advento da nova ordem constitucional e diante da redação do inciso LXVII,
do art. 5º, que, ao contrário do texto anterior - art. 153, § 17, da CF/69 -
suprimiu a expressão "na forma da lei" deixou de existir a prisão do
depositário, a não ser nos casos do contrato típico de depósito por equiparação,
como é o caso da alienação fiduciária.
Todo o embasamento legal e jurisprudencial acima alocado, denotam a necessidade
em acolher os Embargos Infringentes, decretando pela impossibilidade da prisão
civil dirigida a contratos de alienação fiduciária, em consonância com o
consagrado constitucionalmente.
2. DO PRÉ-QUESTIONAMENTO DA LEGISLAÇÃO FEDERAL E CONSTITUCIONAL INAPLICADAS.
O embargante, a teor do disposto pelas Súmulas 282 e 356 do STF, permite-se
realizar de forma explícita, o pré-questionamento da legislação federal e
constitucional inaplicadas:
· Código de Processo Civil : arts. 16,17, 125, 126, 130, 145 e ss, 331, 332, 458
e 535, inciso II;
· Novo Código Civil : arts. 104, 122, 406, 591, 627, 940;
· Constituição Federal : artigos 5º, incisos LIV, LV, LXVII, 170, 192, § 3º.
Além da legislação federal acima, entende o embargante que restaram frontalmente
inobservados todos os arestos jurisprudenciais citados em todo o procedimento e
novamente aqui alocados.
Efetuado o pré-questionamento e alocado o jurisprudencial entendido conflitante,
viável a eventual interposição de Recursos aos Tribunais superiores.
DOS PEDIDOS
Diante de todo o acima exposto, permite-se o embargante, na exata forma do
Direito, requerer sejam, na exata forma processual, acolhidos integralmente os
Embargos Infringentes interpostos, no tocante à impossibilidade de prisão civil
do devedor em contratos de alienação fiduciária, tendo em vista o previsto pelo
artigo 5º, inciso LXVII da Constituição Federal, aliado à falta de tipicidade do
depósito, designando-se data para julgamento dos Infringentes e intimando-se de
tal decisionamento o aqui embargante.
Protesta pela defesa oral em plenário.
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]