Em embargos monitórios, alega-se que a instituição financeira é a devedora, em razão da prática de anatocismo.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
AUTOS Nº .....
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., por intermédio de seu advogado (a) e bastante
procurador (a) (procuração em anexo - doc. 01), com escritório profissional sito
à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe
notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa
Excelência apresentar
EMBARGOS MONITÓRIOS
pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
1. DA EXISTÊNCIA DE PREVENÇÃO DO JUÍZO DA ....ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....,
EM RAZÃO DE CONEXÃO E CONTINÊNCIA - APLICAÇÃO INEQUÍVOCA DA REGRA PREVISTA ART.
106 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Antes de contestar o mérito da presente ação, cumpre esclarecer que o título
(contrato de abertura de crédito em conta corrente n.º ....) ora cobrado pelo
banco Autor já encontram-se sub judici posto que é objeto de ação ordinária de
revisão contratual, com apuração de valores cobrados e repetição de indébito dos
valores pagos em excesso, cumulada com declaratória de quitação e perdas e
danos, ajuizada na data de ..../..../.... e recebida pelo D. Juízo da ....ª Vara
Cível da Comarca de ...., Estado do ...., na data de ..../..../....
O caso em tela é típico caso de competência de juízo, logo o dispositivo legal
aplicável à espécie é, sem dúvida o artigo 106 do Código de Processo Civil.
Senão vejamos:
"Art. 106. Correndo em separado ações conexas perante juizes que têm a mesma a
competência territorial, considera-se prevento aquele que despachou em primeiro
lugar."
Registra-se que o juiz da ....ª Vara Cível despachou a ação ordinária proposta
pelos ora executados em ..../..../...., ao passo que esse D. Juízo, recebeu a
presente ordenando a citação dos requeridos somente em ..../..../....
Neste caso é inequívoca a aplicação, conforme citado, do art. 106 do CPC, visto
que, para o fim de evitar decisões conflitantes faz-se indispensável a reunião
da ação monitória e revisional, atendendo à regra de prevenção em favor do M. D.
Juízo da ....ª Vara Cível da Comarca de ...., além da evidente conexão e
continência, conforme restará demonstrado a seguir.
Assim, o artigo 103 também do CPC demonstra a Conexão das ações propostas (ação
monitória e ação ordinária de revisão contratual) que impõe a reunião dos
processos para serem julgados simultaneamente pelo mesmo Juízo, in verbis:
"Art. 103. Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto
ou a causa de pedir."
Ademais, a ação ordinária proposta pelos ora Requeridos, inclusive pretende a
Declaração de quitação de eventuais débitos existentes para com a instituição
financeira Requerente.
Por esta razão, é lógico que o contrato ora cobrado, também é objeto da ação
revisional, incidindo a norma do artigo 104, do Código de Processo Civil, que
dispõe:
"Art. 104. Dá-se a continência entre duas ou mais ações sempre que há identidade
quanto às partes e à causa de pedir, mas o objeto de uma, por ser mais amplo,
abrange o das outras."
Ora Excelência, além da evidente identidade de partes, observa-se que o
"instrumento de crédito" que instrui a ação monitória, também é objeto da ação
ordinária de revisão contratual. Sem dúvida o objeto da ação revisional é mais
amplo que o da presente ação monitória.
Tanto é verdade que a ação revisional busca inclusive a declaração de quitação
de todos os débitos apontados pelo banco Requerente.
Destarte, o Juízo competente para processar e julgar o pedido do banco Autor é o
Juízo da ....ª Vara Cível da Comarca de ...., face a existência de prevenção,
conexão e continência, para o qual a ação monitória (referente a saldo do
contrato) deverá ser remetida, bem como, não seria admissível a possibilidade de
serem proferidas decisões conflitantes nas medidas judiciais propostas, já que
versam, inclusive, sobre o mesmo negócio jurídico havido entre as partes.
Assim ante a prevenção verificada requer-se sejam os presentes autos enviados
para o Juízo da ....ª Vara Cível da Comarca de ...., a fim de que sejam
processados simultaneamente a ação revisional proposta pelos ora Requeridos.
2. AINDA PRELIMINARMENTE, CARÊNCIA DA AÇÃO MONITÓRIA, IMPROPRIEDADE DA VIA
PROCESSUAL ELEITA, AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS, AUTORIZADORES DA AÇÃO MONITÓRIA -
IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO
Ainda antes de adentrar-se nas razões de mérito que, da mesma forma, conduzirão
à improcedência da presente ação monitória, observa-se que a mesma não poderá
prosperar, diante da sua inadequação processual.
Observa-se que o banco Autor, ora Embargado, objetiva o recebimento de
importância que entende ser credor dos Embargantes, razão pela qual, instrui a
ação monitória com Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente de
Depósito.
Também o Requerido apresenta com a exordial, extratos emitidos pelo mesmo -
portanto unilaterais - que conduziriam (segundo suas alegações) ao montante de
saldo devedor em cobrança.
Ocorre Excelência, que a ação monitória somente se presta para a cobrança de
valores com liquidez inquestionável.
No presente caso, além do banco Autor não possuir título com força executiva, os
extratos somados ao referido contrato de abertura de crédito, não se caracteriza
como ensejador de pagamento de soma em dinheiro (requisito legal do art. 1.102a
do CPC), restando imprópria a via processual adotada pelo banco Requerente.
Evidentemente que a ação monitória, como no presente caso, jamais poderá
substituir a ação ordinária.
O reconhecimento da ausência de liquidez, a impossibilidade da presente ação
monitória, em se tratando de contrato de abertura de crédito, já foi reconhecida
pelo Superior Tribunal de Justiça:
"... LIMITANDO-SE A ENSEJAR A POSSIBILIDADE DE UTILIZAR-SE DE CRÉDITO, OBRIGA
APENAS QUEM SE DISPÕE A PROPICIAR O MÚTUO. NÃO REFLETE QUALQUER OBRIGAÇÃO DA
OUTRA PARTE, PELO MENOS AINDA LÍQUIDA, CERTA E EXIGÍVEL.
IMPOSSIBILIDADE DE O TÍTULO COMPLETAR-SE COM EXTRATOS FORNECIDOS PELO PRÓPRIO
CREDOR QUE SÃO DOCUMENTOS UNILATERAIS. NÃO É DADO ÀS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO
CRIAR SEUS PRÓPRIOS TÍTULOS EXECUTIVOS, PRERROGATIVA PRÓPRIA DA FAZENDA
PÚBLICA."(Acórdão unânime da 3ª Turma do STJ, Rel. Min. Eduardo Leite, Resp. n.º
164.030 RS [98.0009766-0])
Ademais, conforme demonstrado em capítulo próprio, os Embargantes não são
devedores, ao contrário, são credores do banco Autor, uma vez que, ao longo da
execução do contrato de financiamento este cobrou valores incorretamente dos
Embargantes.
Por todas estas razões, requer-se sejam acolhidas quaisquer das preliminares
aduzidas, com a conseqüente extinção da presente ação e a condenação do banco
Embargado ao pagamento do ônus inerente ao princípio da sucumbência.
DO MÉRITO
DOS FATOS
Trata-se o Requerido pessoa física de coobrigado em operações financeiras
contratadas junto ao banco Requerente, pela Requerida pessoa jurídica.
Entretanto, conforme restará demonstrado, após a realização de análise
contábil-financeira, a empresa avalizada detectou inúmeras ilegalidades e
irregularidades que vêm sendo impostas pela instituição Autora, quando da
contratação e cumprimento das obrigações ajustadas entre as partes.
Mediante a imposição de cláusulas e condições desproporcionais e descabidas, os
Requeridos vêm sendo obrigados ao pagamento de valores a maior e indevidos em
favor do banco Requerente, sob pena de serem inscritos em cadastro de devedores
(inadimplentes), sofrerem restrição de crédito ou transtornos quando da
efetivação de outras operações financeiras, trazendo inúmeros danos e prejuízos
à empresa avalizada e ao ora Requerido.
Assim sendo, os Requeridos, mais uma vez, pressionados e sem qualquer opção
frente à instituição financeira, viram-se obrigados a procederem a reanálise
jurídica, além da auditoria e perícia financeira das operações referidas
(documento que instrui a ação revisional proposta cuja cópia segue em anexo),
realizadas entre as partes.
O resultado da perícia foi surpreendente. Restou comprovado, explicitamente,
conforme planilhas anexadas a esta peça, bem como no estudo jurídico
desenvolvido, que tanto os valores imputados como os instrumentos formalizados,
opõem-se frontalmente à legislação pátria em vigor.
Destarte, conforme depreende-se dos documentos anexados pelo banco Autor à peça
exordial da presente ação, a liberação do crédito cedido por força do contrato
descrito na petição inicial mediante o aval dos Requeridos ocorrem em ..../....
Também nota-se que os extratos juntados pelo banco Autor referem-se a operações
iniciadas em ..../.... (conforme extrato de fls. ....), anteriores ao contrato
que o banco Autor descreve como origem do "débito" verificado e que busca
"ressarcimento" por meio da presente ação.
Desta forma, pelos documentos juntados pelo próprio banco Autor, fica
evidenciada a necessidade de revisão de todas as operações de crédito envolvendo
as partes, conforme pleiteiam os Requeridos (com antecedência à presente ação)
em ação autônoma, posto que os contratos firmados entre as partes são sucessivos
e identificam dependência sistemática, devendo ser analisados em conjunto, e não
isoladamente como pretende a instituição financeira Requerente.
Foram objeto do estudo pericial todos os instrumentos contratuais firmados entre
as partes, destacando-se a análise do contrato de abertura de crédito em conta
corrente n.º ...., operação que como já foi exposto, identifica dependência
sistemática, aos demais negócios havidos entre as partes, devendo ser analisados
em conjunto, e não isoladamente como pretende a instituição financeira
Requerente.
Independentemente da perícia técnica realizada, pelos documentos juntados pelo
próprio banco Autor a sua peça inicial, já se pode verificar a ocorrência de
práticas que afrontam o sistema legal vigente.
Nota-se que apesar do contrato que aparelha a presente ação ter sido firmado em
..../..../...., os extratos juntados, que supostamente representariam a
"liquidez" do alegado crédito do Requerente, tem como data de início ..../....
Desta forma, pelos documentos juntados pelo próprio banco Autor, fica
evidenciada a necessidade de revisão de todas as operações de crédito envolvendo
as partes, conforme pleiteiam os Requeridos (com antecedência à presente ação)
em ação autônoma, posto que os contratos firmados entre as partes são sucessivos
e identificam dependência sistemática, devendo ser analisados em conjunto, e não
isoladamente como pretende a instituição financeira Requerente.
Conforme depreende-se do parecer elaborado por profissional de nomeada
(documento anexado à petição inicial e ação revisional movida pelos ora
Requeridos) o banco Autor, além de proceder o lançamento de débitos incorretos e
não autorizados, apurou valores indevidos, muito superiores aos apurados
corretamente pelo parecer.
Em suma, os resultados da Perícia constante do parecer técnico (documentos
anexos) apontam diversas ilegalidades e irregularidades praticadas pela
instituição financeira Ré como se vê a seguir.
O banco cobrou valores indevidos.
Segundo o que restou demonstrado acima, o banco Requerente ajustou diversas
condições para o cálculo do débito de responsabilidade dos Requeridos, inserindo
nos contratos de adesão diversos encargos.
Ocorre, Excelência, que a perícia contábil procedida nos referidos instrumentos,
tomando-se por base os encargos imputados pelo próprio Réu, razão pela qual
neste momento não discute a legalidade ou não da cumulação dos encargos
imputados, mas tão somente se procura demonstrar que refeitos os cálculos
exatamente como imputados pelo Requerente já são encontradas diferenças a favor
dos Réus.
Os resultados da citada perícia não deixam dúvidas quanto a irregularidade das
cobranças realizadas pelo Requerente, restando apurado e provado que o banco
Autor aplicava fórmula para o cálculo de juros diversa da orientação legal e
jurisprudencial.
Assim, conforme os Requeridos passam a demonstrar, os valores ora cobrados pela
instituição financeira Autora, por meio da presente ação monitória, não refletem
o montante dos débitos e créditos existentes entre as partes, que vale
ressaltar, já estão sendo apurados pela ação revisional proposta pelos Réus com
antecedência da presente ação.
DO DIREITO
Uma vez apontadas todas as irregularidades praticadas pela instituição
financeira Requerente, especialmente no que diz respeito à incorreta apuração de
valores, neste momento, passa-se a realizar a análise jurídica das condições
impugnadas, que certamente conduzirão à improcedência da presente ação.
Os presentes embargos fundamentam-se - dentre outros dispositivos legais
aplicáveis à espécie - nas normas do Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º
8.078/90), todavia, nunca é demais esclarecer quais os princípios norteadores
desse sistema legal.
Para se saber se as normas contidas no Código de Defesa do Consumidor são
aplicáveis ou não ao presente caso, impõe-se, antes de mais nada, a
identificação dos elementos componentes da relação de consumo segundo os modelos
legais previstos pelo CDC.
Quanto ao enquadramento na conceituação de consumidor prevista pelo CDC, das
pessoas (físicas e jurídicas) que fazem uso dos serviços bancários, não poderá
existir qualquer dúvida. Vale dizer, ocorrendo uma prestação de serviços
bancários, onde figurem, de um lado, na qualidade de fornecedor, um determinado
banco comercial e, de outro, na qualidade de consumidor, uma pessoa qualquer,
que contrate com esse agente financeiro, é evidente que essa relação jurídica se
caracterizará como relação de consumo.
Já quanto à inclusão ou não das pessoas jurídicas como consumidores, segundo
alguns autores, dependeria sua caracterização, da finalidade consignada à
relação de consumo, isto é, da destinação dessa contratação bancária e, a partir
daí, da análise a ser realizada pelo Poder Judiciário de sua vulnerabilidade,
que deveria ser perquirida caso a caso.
Primeiramente, ressalva-se que a conceituação de consumidor, no sistema
brasileiro, não está vinculada à constatação ou não de vulnerabilidade das
partes envolvidas na relação de consumo. Aliás, para os efeitos de aplicação do
CPC, o consumidor é presumivelmente considerado vulnerável frente ao fornecedor.
(O que não se pode confundir é vulnerabilidade com hipossuficiência. A
vulnerabilidade é geral e decorre de simples situação de consumidor, já a
hipossuficiência decorre de condições pessoais e relativas a cada consumidor em
confronto com as condições pessoais do respectivo fornecedor. Assim, a
hipossuficiência deve ser analisada caso a caso, ao passo que a vulnerabilidade
do consumidor é inerente a sua própria condição).
Mais ainda, devemos lembrar que o CDC não contempla em seu texto somente a
conceituação do consumidor destinatário final (artigo 2º, caput), mas também as
pessoas (físicas ou jurídicas) expostas às práticas previstas em todo o Capítulo
V e VI, do CDC (artigo 29).
Na maior parte das vezes, tanto as empresas como as pessoas físicas clientes das
instituições financeiras estarão enquadradas na extensão conceitual de
consumidor prevista pelo artigo 29 do Código de Defesa do Consumidor, diante da
proteção contratual conferida ao consumidor que firma contrato de adesão com a
instituição bancária contendo cláusulas nulas em sua grande maioria. Ainda,
segundo o preceituado pelo artigo 17 do Código do Consumidor, equiparam-se aos
consumidores todas as vítimas de evento decorrente de fato do produto ou
serviço.
Desta forma, a conceituação do consumidor de serviços ou produtos oferecidos
pelos bancos está ligada a sua exposição às práticas abusivas lançadas pelas
instituições financeiras e à proteção contratual conferida, especialmente se
houver ajuste por meio de contrato de adesão (como no presente caso), quando não
decorrente de evento danoso proporcionado pelo serviço de natureza bancária,
financeira, de crédito ou securitária (segundo § 2º do art. 3º, do CDC).
Assim, resta demonstrada a existência de relação de consumo entre cliente
(pessoa física ou jurídica) e instituição financeira (Autora), devendo ser
conferida aos consumidores a proteção outorgada pelo CDC.
Há que se esclarecer que a terminologia empregada pelo CDC, no sentido de
"equiparar-se" a consumidor todas as pessoas expostas às práticas previstas, não
quer dizer que exista qualquer diferença de ordem prática aos consumidores
'equiparados' por força do artigo 29, com os outros consumidores conceituados
por outros dispositivos do CDC. Por outro lado, a lei de proteção ao consumidor
em momento algum faz distinção de tratamento ao consumidor pessoa física ou
jurídica, ao contrário, inovando em relação às leis estrangeiras, o caput do
art. 2º conceitua consumidor como
"toda pessoa física ou jurídica".
De nada valeria fazer a previsão de inúmeras práticas reprováveis lançadas pelos
fornecedores sem equiparar as vítimas destas práticas (comerciais e
contratuais), para efeito da proteção outorgada pelo CDC, a consumidores.
Desta forma, em se tratando de relação bancária de consumo ou relação jurídica
equiparada a consumo, qualquer pessoa (física ou jurídica) exposta às práticas
elencadas pelo CDC (artigos 30 a 54) e demais normas que disciplinam relações de
consumo (como por exemplo a Lei n.º 8.884, de 11 de junho de 1994, que dispõe
sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica), será
considerada consumidora, possuindo todas as vantagens trazidas pelo CDC na
defesa e promoção dos seus direitos.
Apesar de claramente dispor o parágrafo segundo, do artigo 3º, do CDC, que na
conceituação de serviço, para a tutela da Lei n.º 8.078/90, entende-se por
serviço:
"inclusive a atividade de natureza bancária, financeira, de crédito e
securitária"
As instituições financeiras ainda insistem em colocar dúvida no seu
enquadramento como fornecedoras para efeito de incidência das normas do CDC.
Em relação à extensão do CDC às atividades bancárias, como passíveis de ensejar
relações de consumo, leciona Nelson Nery Júnior (Código de Defesa do Consumidor
- Comentado pelos autores do anteprojeto, Ed. Forense Universidade, 1991, p.
305-307) que para que se possa classificar um contrato de natureza bancária como
relação de consumo é preciso que se analise a finalidade do mesmo,
exemplificando que havendo outorga do dinheiro ou do crédito para que o devedor
o utilize como destinatário final restaria configurada a relação de consumo.
Na mesma esteira manifesta-se José Cretella Júnior (Comentários do Código do
Consumidor, Ed. Forense, 1992, p. 16), para quem fornecedor é o estabelecimento
bancário; consumidor é o que se beneficia com esse fornecimento, como
destinatário final.
Todavia, os argumentos lançados por aqueles que entendem inaplicáveis aos
contratos e serviços bancários as normas do sistema de proteção ao consumidor,
não encontram sequer respaldo na própria lei, que em seus preceitos deixa claro
o enquadramento das instituições de crédito como fornecedoras.
Por outro lado, conforme já argumentado anteriormente, do ponto de vista da
conceituação de consumidores, especialmente os expostos às práticas elencadas
como abusivas pelo CDC, não resta qualquer dúvida que a Lei n.º 8.078/90 é
perfeitamente aplicável às instituições financeiras.
Assim, conclui-se que entre as partes (autores clientes e instituição financeira
ré), existe relação de consumo, razão pela qual devem incidir sobre a questão,
as normas de proteção e defesa do Consumidor.
Especialmente no que diz respeito à proteção contratual o Código de Defesa do
Consumidor conferiu proteção especial à parte mais frágil (o consumidor).
Claudia Lima Marques (Contratos no Código de Defesa do Consumidor, RT, 2ª ed.,
p. 141), renomada doutrinadora do direito do consumo, leciona que:
"podemos denominar, genericamente, contratos bancários aqueles concluídos com um
bancou ou uma instituição financeira (...). É o contrato de adesão por
excelência, é uma das relações consumidor-fornecedor que mais se utiliza do
método de contratação por adesão, com 'condições gerais' impostas e
desconhecidas."
A aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor é medida que se impõe.
Conforme manifesta-se Nelson Nery Júnior (Direito do Consumidor 3, Ed. RT, 1992,
p. 64), sequer poderiam as partes afastar a aplicação destas normas, vez que:
"no microssistema do CDC, as cláusulas abusivas se encontram sob o regime da
nulidade de pleno direito, porque ofendem a ordem econômica de proteção do
consumidor, base normativa de todo o Código"
Como se vê do art. 1º do CDC, verbis:
"Art. 1º. O presente código estabelece normas de proteção e defesa do
consumidor, de ordem pública e interesse social."
As normas dos artigos 1º e 51 do CDC devem ser interpretadas de forma conjugada,
extraindo-se dessa interpretação a conclusão de que o magistrado deve
pronunciar-se ex officio sobre a matéria de cláusula abusiva, independentemente
de provocação de qualquer interessado. Deve agir assim o juiz, porque se trata
de matéria de ordem pública (art. 1º) e, ademais, porque a cláusula abusiva é
nula e não anulável (art. 51, caput). Como a norma é de ordem pública, não está
sujeita à preclusão, podendo ser argüida e/ou decidida em qualquer instância ou
grau de jurisdição.
A solução adotada pelo CDC, visa a correção da vulnerabilidade do consumidor na
sociedade de consumo e via de conseqüência, sua proteção no mercado de consumo
(art. 4º, inciso I). Para evitar que o consumidor - in casu a Autora - fique
inferiorizado ao contratar, notadamente quando sua manifestação de vontade vier
materializada em contratos de adesão, que não proporcionam ampla negociação
entre as partes, pois suas cláusulas são redigidas de maneira unilateral, é que
o legislador previu expressamente o cumprimento do princípio da igualdade nas
contratações, inadmitindo assim, de forma cogente, qualquer desnível nesta
esfera. Com isso, qualquer cláusula que ofenda esse princípio poderá ser
invalidada em juízo, pois sua permanência significaria violação desse comando
estabelecido pelo legislador (conforme Voltaire de Lima Moraes, Comentários ao
Código do Consumidor, Ed. Forense, 1992, p. 39).
Assim, as distorções vividas na sociedade de consumo, através dos longos anos de
inescrupulosa utilização dos contratos de adesão, principalmente pelas
instituições financeiras, proporcionando enriquecimento da parte estipulante
destes contratos em detrimento dos respectivos aderentes, não mais poderão
subsistir à luz dos preceitos do CDC.
É imperioso ter em vista que o negócio jurídico efetivado entre as partes,
materializou-se em contratos por adesão.
A imposição da verificação de todos os aspectos que envolvem o contrato
celebrado entre as partes é reconhecida pelo ilustre Orlando Gomes (Contratos,
12ª ed., p. 138/139) que assevera o seguinte quanto a contratos de adesão, lição
esta aplicável in casu:
"Cabe ao Juiz impedir que seus efeitos se produzam, não permitindo que
desvirtuem o espírito das cláusulas essenciais ou que tenham eficácia se não
forem conhecidas suficientemente pela outra parte aderente. Aplica-se a regra de
hermenêutica, segundo a qual devem ser interpretadas a favor do contratante que
se obrigou por adesão."
No mesmo sentido, manifesta-se Silvio Rodrigues (Direito Civil, Vol. III, p.
49), apontando a responsabilidade do Judiciário, em, através da prestação da
tutela jurisdicional, restabelecer o equilíbrio entre as partes:
"Também através da atividade judiciária tentou-se minorizar os efeitos funestos
do contrato de adesão. Por meio de interpretação de cláusulas do negócio
procurou a jurisprudência evitar a exploração de uma das partes pela outra.
Regras de hermenêutica, aplicadas sensatamente, alcançaram, por vezes, tal
feito."
A peculiaridade dos contratos firmados impõem que a interpretação de suas
cláusulas sejam igualmente peculiar.
No presente caso, foi apresentado aos Autores, pela Ré, contrato pronto,
contrato-padrão, com elevado número de cláusulas, elaborado unilateralmente pela
instituição financeira.
Diante disso, afasta-se o dogma da liberdade contratual por ser impossível
admitir como livremente celebrado um contrato quando uma das partes tinha todos
os elementos ao seu lado, restando à outra parte concordar com as condições que
lhe eram impostas, até por questão de absoluta necessidade para a viabilidade
dos seus negócios.
Não é possível, por isso, enfocar os contratos de adesão segundo os mesmos
parâmetros que alicerçam a consagração do contrato como emanação da liberdade
individual.
Ora Excelência, cabe ao Judiciário a imediata aplicação dos preceitos
pretendidos pelo legislador por ocasião da elaboração do CDC. É imperioso que se
ponha termo nos tempos de desmandos e desrespeitos aos consumidores brasileiros.
São tais abusos, lançados mão pelos fornecedores de serviços e produtos, que o
CDC veio a coibir, outorgando ao consumidor a possibilidade de ver restabelecida
a comutatividade contratual. Assim, impõe-se ampla revisão tanto nas cláusulas
contratuais inseridas nos contratos de adesão pactuados com a Requerente,
conforme os Requeridos buscam por meio da ação revisional proposta com
antecedência a presente ação, bem como, ampla aferição dos valores alegados como
devidos.
Como bem nos ensina James Marins (in, Revista Direito do Consumidor, vol. 18,
RT, p. 100):
"NÃO HÁ LUGAR PARA SUSTENTAR-SE QUE COMO CONDIÇÃO PARA QUE POSSA A EMPRESA
RECEBER A PROTEÇÃO REFERENTE À ABUSIVIDADE CONTRATUAL TENHA QUE ESTAR EM
SITUAÇÃO ASSIMILÁVEL À DO CONSUMIDOR OU AINDA SUBSUMÍVEL AO CONCEITO DO ART. 2º
(DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR), POIS TAIS ILAÇÕES NÃO DECORREM LÓGICA OU
GRAMATICALMENTE DO TEXTO LEGAL EXPRESSO NEM TAMPOUCO DO SISTEMA. IGUALMENTE NÃO
SE PODE, NO CASO DAS RELAÇÕES BANCÁRIAS, COGITAR-SE DA FINALIDADE DA OPERAÇÃO
COMO REQUISITO PARA APLICAÇÃO DA LEI, POIS NO QUE RESPEITA O ART. 29 E A
PROTEÇÃO CONTRATUAL, O COMANDO LEGAL É CLARO E O QUE EQUIPARA EMPRESAS A
CONSUMIDORES É A PRESENÇA INACEITÁVEL DA ABUSIVIDADE NAS DIVERSAS FORMAS QUE
PODEM REVESTÍ-LA, SEJA A ABUSIVIDADE CONSIDERADA OBJETIVAMENTE OU
SUBJETIVAMENTE."
Inúmeros precedentes jurisprudenciais já reconhecem expressamente a incidência
das normas do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários,
destacando-se os seguintes julgados:
"CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PROTEÇÃO CONTRATUAL. DESTINATÁRIO. CLÁUSULAS
ABUSIVAS. ALTERAÇÃO UNILATERAL DA REMUNERAÇÃO DE CAPITAL POSTO À DISPOSIÇÃO DE
CREDITADO. IMPOSIÇÃO DE REPRESENTANTE. CONHECIMENTO DE OFÍCIO.
O conceito de consumidor, por vezes, amplia-se, no CDC, para proteger quem é
"equiparado". É o caso do art. 29. Para efeito das práticas comerciais e da
proteção contratual, "equiparam-se aos consumidores todas as pessoas,
determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas". O CDC rege as
operações bancárias, inclusive as de mútuo ou de abertura de crédito, pois
relações de consumo. O produto da empresa de Banco é o dinheiro ou o crédito,
bem juridicamente consumível, sendo, portanto, fornecedora; e consumidor o
mutuário ou creditado. Sendo os juros o "preço" pago pelo consumidor, nula
cláusula que preveja alteração unilateral do percentual prévia e expressamente
ajustado pelos figurantes do negócio. Sendo a nulidade prevista no art. 51 do
CDC da espécie pleno iure, viável o conhecimento e a decretação de ofício, a
realizar-se tanto que evidenciado o vício (art. 146, parágrafo, do CC). É nula a
cláusula que impões representante 'para emitir ou avalizar notas promissórias'
(art. 51, VIII, do CDC). Objetivando a desconstituição de cláusulas, em
homenagem ao princípio da congruência, deve a sentença ater-se ao pedido.
Sentença parcialmente reformada." (Apelação Cível n.º 193051216 - 7ª CC - TA/RS
- Publicado in Julgados do TA/RS, n.º 93 - pág. 197-202)
DOS PEDIDOS
Ex positis, pugna-se pelo recebimento e pela procedência dos presentes embargos,
de forma a rechaçar a ação monitória proposta, dando-lhe total IMPROCEDÊNCIA.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]