RECURSO E RAZÕES - RECEPTAÇÃO - NULIDADE - AUSÊNCIA DE INCIDENTE DE
RESPONSABILIDADE PENAL - SEMI-IMPUTÁVEL - REINCIDENTE
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ VARA CRIMINAL DA COMARCA
DE __________________(___).
processo-crime n.º _____________________________
objeto: apelação de sentença condenatória e oferecimento de razões.
__________________________, brasileiro, convivente, servente de pedreiro,
residente e domiciliado nesta cidade de ________________, pelo Defensor Público
subfirmado, vem, respeitosamente, a presença de Vossa Excelência, nos autos do
processo crime em epígrafe, ciente da sentença condenatória de folha ______,
interpor, no prazo legal, o presente recurso de apelação, por força do artigo
593, inciso I.º, do Código de Processo Penal, combinado com o artigo 128, inciso
I, da Lei Complementar n.º 80 de 12.01.94, eis encontrar-se desavindo,
irresignado e inconformado com apontado decisum, que lhe foi prejudicial e
sumamente adverso.
ISTO POSTO, REQUER:
I.- Recebimento da presente peça, com as razões que lhe emprestam lastro,
franqueando-se a contradita ao ilustre integrante do parquet, remetendo-o, após,
ao Tribunal Superior, para a devida e necessária reapreciação da matéria alvo de
férreo litígio.
Nesses Termos
Pede Deferimento.
__________________, ___ de ____________ de 2.0__.
_______________________________
DEFENSOR PÚBLICO TITULAR
OAB/UF _____________
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO _____________________
COLENDA CÂMARA JULGADORA
ÍNCLITO RELATOR
"No processo criminal, máxime para condenar, tudo deve ser claro como a luz,
certo com a evidência, positivo como qualquer expressão algébrica. Condenação
exige certeza... não bastando a alta probabilidade..., sob pena de se
transformar o princípio do livre convencimento em arbítrio" (RT 619/267)
RAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO FORMULADAS POR:
_________________________________
Volve-se o presente recurso contra sentença condenatória editada pelo notável
e operoso julgador monocrático titular da _____ Vara Criminal da Comarca de
_________________, DOUTOR _______________, o qual em oferecendo respaldo de
agnição à denúncia, condenou o apelante a expiar, pela pena de (01) um ano de
reclusão, acrescida da reprimenda pecuniária, cifrada em (10) dez dias-multa,
dando-o como incurso nas sanções do artigo 180, caput, do Código Penal, sob a
clausura do regime semi-aberto.
A irresignação do apelante, ponto central da presente peça, centra-se e
condensa-se em três tópicos. A guisa de preliminar, pleiteará a nulidade do
feito por ter-se preterido a realização de prova indispensável, qual seja a
instauração de incidente de responsabilidade penal do réu, para aferição de sua
capacidade de volição e cognição à época do fato; e no mérito, num primeiro
momento discorrerá sobre a ausência de concreção do tipo penal a remanesceu
condenado, o que é aferido e constado, com uma clareza o doer os olhos, pela
prova reunida à demanda, o que conduzirá, em grau recursal, a absolvição do
recorrente, por atipicidade na conduta; para num segundo e derradeiro momento
postular pela expunção da circunstância agravante da reincidência, ante sua
notória e incontrastável inconstitucionalidade.
Passa-se, pois a ferir os pontos alvos de debate.
PRELIMINARMENTE
Consoante reluz das considerações finais de folha _______, foi solicitada
pela defesa pública a instauração de incidente de responsabilidade penal do réu,
visto que o mesmo é dependente de substâncias psicotóxicas, o que veio a lume
com o depoimento do genitor deste à folha ____, onde consta:"... disse que seu
filho consome substância entorpecente desde de bem jovem..."
Referida assertiva foi comprovada pela via documental (vide Ofício de folha
___), constando da missiva que o réu foi internado em Clínica Psiquiátrica para
viabilizar tratamento contra a drogadição, recebendo alta por fuga!
Entrementes, o nobre Julgador Singelo, entendeu por bem em rechaçar a
instauração do incidente, o fazendo sob os argumentos dedilhados à folha
_______.
Contudo, o indeferimento da perícia buscada legou dantesco cerceamento de
defesa ao réu, na medida em que não pode provar, pela via científica, a
limitação - ainda que parcial - que detinha de sopesar e avaliar a realidade que
o cercava, face ser refém de substâncias entorpecentes à época dos fatos
prefigurados pela denúncia.
Sabido e consabido, que a amputação parcial da capacidade de cognição e
volição - uma vez atestada por perícia - implica na redução da pena ante a
semi-imputabilidade do réu.
Porquanto, o indeferimento do pedido de submissão do apelante ao incidente,
acarretou dantesco cerceamento de defesa, na medida em que coibiu-se ao réu, de
realizar prova legítima, a qual se positivada implicaria em redução substancial
da sanção corporal imposta, com o que remanesceu violado e transgredido o
primado constitucional da ampla defesa.
Tal anomalia processual, acarreta a nulidade do feito, o que se postula seja
reconhecido e proclamado sem mais vagar, em grau de revista.
DO MÉRITO
1.) ATIPICIDADE NA CONDUTA
Em que pese o apelante ter afirmado ao juízo que tinha escasso conhecimento
da origem falsa do bem adquirido, temos, como dado insopitável, que desconhecia
a identidade do vendedor.
Assim, não tendo-se apurado no caminhar da instrução, quem transmitiu,
efetivamente, dito bem da vida cobiçado pelo réu, resta descaracterizado o tipo
reitor da receptação.
Neste norte é a mais abalizada jurisprudência que jorra dos tribunais
pátrios, digna de decalque face sua extrema pertinência ao caso em discussão:
"O crime de receptação dolosa (art. 180 caput do Código Penal) pressupõe
crime antecedente e o receptador não pode ser responsabilizado sem que
definitivamente se declare a existência deste pressuposto. Pressupõe, ainda, o
conhecimento pelo acusado da origem criminosa da coisa e identificação da pessoa
que transmitiu o bem. Sem tais elementos é impossível a caracterização do
delito" RT: 663/293
Donde, sendo dado incontroverso, que permaneceu incógnito o nome e a
identidade de quem vendeu o bem da vida, impõe-se a ab-rogação da sentença
objeto de incisiva exprobação, eis carente de sustentação lógica, axiológica e
jurídica.
Conseqüentemente, a sentença estigmatizada, por se encontrar lastreada em
premissas inverossímeis, estéreis e claudicantes, clama e implora por sua
reforma, missão, esta, reservada aos Preclaros Desembargadores, que compõem essa
Augusta Câmara Criminal.
2.) DA REINCIDÊNCIA
Sobremais, inadmissível, tenha o recorrente agravada sua pena pela
reincidência, haja vista, que pelo delito anterior o réu já foi penalizado, não
podendo o mesmo expiar duas vezes pelo mesmo fato - ainda que a exasperação da
pena venha dissimulada pela agravante estratificada no artigo 61, inciso I, do
Código Penal - sob o risco de incidir-se num bis in idem, flagrantemente
inconstitucional.
Neste sentido, já decidiu o Terceiro Grupo Criminal, nos embargos
infringentes n.º 70.000.916.106, em 16 de junho de 2000 cuja ementa assoma de
obrigatória transcrição:
"EMBARGOS INFRINGENTES - AGRAVAÇÃO DA PENA PELA REINCIDÊNCIA. A agravação da
pena pela reincidência, caracteriza bis in idem. Um mesmo fato não pode ser
tomado em consideração duplamente porque possibilita uma inadmissível reiteração
no exercício do jus puniendi do Estado.
Embargos acolhidos para que prevaleça o voto minoritário que afasta o
acréscimo da pena pela reincidência. Predominância dos votos mais favoráveis do
empate."
No mesmo sentido, é a posição adotada pela 6ª Câmara Criminal do Tribunal de
Justiça do Estado, na apelação criminal n.º 70.000.847.699, cujo decalque
veicula-se inarredável, por ferir com maestria e propriedade a matéria submetida
a desate.
"FURTO. CONSUMAÇÃO. MOMENTO. O CRIME DE FURTO SE CONSUMA, SE APERFEIÇOA,
QUANDO OCORRE A INVERSÃO DA POSSE DA RES, OU SEJA, O AGENTE PASSA A TER A
TRANQÜILA DETENÇÃO DA COISA, AINDA QUE POR CURTO ESPAÇO DE TEMPO, E LONGE DA
VIGILÂNCIA DA VÍTIMA. PENA. DOSIMETRIA. REINCIDÊNCIA. DESVALOR DE AGRAVAMENTO.
CONSIDERANDO A GARANTIA CONSTITUCIONAL DA LIBERDADE, DEVE-SE, FAZENDO UMA
RELEITURA DA LEI PENAL, APENAS DAR VALOR POSITIVO AS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DA
CONDUTA SOCIAL E PERSONALIDADE. SÓ PODEM SER CONSIDERADAS PARA BENEFICIAR O
ACUSADO, E NÃO MAIS PARA LHE AGRAVAR A PENA. E DENTRO DESTE RACIOCÍNIO, TAMBÉM
TEM-SE QUE AFASTAR O AGRAVAMENTO DA PUNIÇÃO PELA REINCIDÊNCIA. INCLUÍ-LA COMO
CAUSA DE AGRAVAÇÃO DE PENA, NÃO LEVA EM CONTA QUE O DELINQÜENTE REINCIDENTE NEM
SEMPRE E O MAIS PERVERSO, O MAIS CULPÁVEL, O MAIS PERIGOSO EM CONFRONTO COM O
PRIMÁRIO. ALÉM DISSO, MÃO PODE O PRÓPRIO ESTADO, UM DOS ESTIMULADORES DA
REINCIDÊNCIA, NA MEDIDA EM QUE SUBMETE O CONDENADO A UM PROCESSO DESSOCIALIZADOR,
DESESTRUTURADO SUA PERSONALIDADE POR MEIO DE UM SISTEMA PENITENCIÁRIO DESUMANO E
MARGINALIZADOR, DEPOIS EXIGIR QUE SE EXACERBE A PUNIÇÃO A PRETEXTO DE QUE O
AGENTE DESRESPEITOU A SENTENÇA ANTERIOR, DESPREZOU A FORMAL ADVERTÊNCIA EXPRESSA
NESSA CONDENAÇÃO E, ASSIM, REVELOU UMA CULPABILIDADE MAIS INTENSA. (09 FLS)"
(Apelação Crime nº 70000847699, 6ª Câmara Criminal do TJRS, Garibaldi, REL.
DESEMBARGADOR DOUTOR SYLVIO BAPTISTA NETO. j. 27.04.2000).
Portanto, cumpre exorcizar-se a agravante da reincidência, reduzindo-se a
pena-base tendo por estamento a confissão espontânea, a qual somente não operou
em virtude de concorrer com a reincidência (vide folha ________),
redimencionando-se, assim, a pena definitiva, bem como alterando-se o regime de
cumprimento da pena, o qual do semi-aberto, passará para o aberto.
ANTE AO EXPOSTO, REQUER:
I.- Seja acolhida a preliminar antes perfilhada, par ao efeito de decretar-se
a nulidade da sentença, uma vez que se amputou ao réu, a realização de prova
indispensável, qual seja a instauração de incidente de responsabilidade penal,
onde seria aferida sua capacidade de volição e cognição à época do fato, com
implicação direta na redução da pena, se positivada a semi-responsabilidade do
apelante pelo exame pericial, decorrência direta do uso abusivo e nocivo de
substâncias entorpecentes pelo último.
II.- No mérito, seja desconstituída a sentença buscada rescindir,
expungindo-se do decisum o veredicto condenatório uma vez que se encontra
descaracterizado o delito de receptação dolosa tributado contra o apelante, o
que se vindica com supedâneo no artigo 386, inciso III, do Código de Processo
Penal.
III.- Na remota hipótese de sobejar condenado, a despeito do requerido no
itens supra, seja reputada tida e havida como inconstitucional a circunstância
agravante da reincidência, determinando-se a minoração da pena-base em (06) seis
meses, por força da circunstância atenuante confissão espontânea, a qual somente
não operou em virtude de concorrer no mesmo grau de equivalência com a recidiva;
alterando-se, de resto, o regime de cumprimento da pena, para o aberto.
Certos estejam Vossas Excelências, mormente o Insigne e Culto Doutor
Desembargador Relator do feito, que em assim decidindo, estarão julgando de
acordo com o direito, e, sobretudo, perfazendo, restabelecendo e restaurando, na
gênese do verbo, o primado da JUSTIÇA!
____________________, em ___ de _____________ de 2.0___.
_______________________________
DEFENSOR PÚBLICO TITULAR
OAB/UF _______________