ROUBO QUALIFICADO - RECURSO E RAZÕES - NEGATIVA EM JUÍZO - CONFISSÃO
EXTRAJUDICIAL
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ª VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE _________
Processo-crime nº _________
Objeto: apelação de sentença condenatória e oferecimento de razões
Réu preso
_________, brasileiro, solteiro, auxiliar de mecânico, residente e
domiciliado nesta cidade, atualmente constrito junto ao Presídio Industrial de
______, pelo Defensor subfirmado, vem, respeitosamente, a presença de Vossa
Excelência, nos autos do processo crime em epígrafe, ciente da sentença
condenatória de folha 311 usque 331, interpor, no prazo legal, o presente
recurso de apelação, por força do artigo 593, inciso I, do Código de Processo
Penal, eis encontrar-se desavindo, irresignado e inconformado com apontado
decisum, que lhe foi prejudicial e sumamente adverso.
ISTO POSTO, REQUER:
I.- Recebimento da presente peça, com as razões que lhe emprestam lastro,
franqueando-se a contradita a ilustre representante do parquet, remetendo-o,
após ao Tribunal Superior, para a devida e necessária reapreciação da matéria
alvo de férreo litígio.
Nesses Termos
Pede Deferimento
_________, ____ de _________ de _____.
DEFENSOR
OAB/
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO _________
COLENDA CÂMARA JULGADORA
ÍNCLITO RELATOR
"A verossimilhança, por maior que seja, não é jamais a verdade ou a certeza,
e somente esta autoriza uma sentença condenatória. Condenar um possível
delinqüente é condenar um possível inocente" [*] NELSON HUNGRIA
RAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO FORMULADAS POR: _________
Volve-se o presente recurso contra sentença condenatória editada pelo notável
e operoso julgador monocrático titular da ____ª Vara Criminal da Comarca de
____________, DOUTOR ____________, o qual em oferecendo respaldo parcial de
agnição à denúncia, condenou o apelante a expiar, pela pena de (06) seis anos de
reclusão, acrescida da reprimenda pecuniária cifrada em (30) trinta dias-multa,
dando-o como incurso nas sanções do artigo 157, parágrafo 2º, incisos I e II, do
Código Penal sob a clausura do regime fechado.
A irresignação do apelante, subdivide-se em dois tópicos. Num primeiro
momento repisará a tese da negativa da autoria proclamada pelo réu em seu termo
desde na natividade da lide, a qual, contristadoramente, não encontrou eco na
sentença repreendida; para, num segundo e derradeiro momento, discorrer sobre a
ausência de provas robustas, sadias e convincentes, para outorgar-se um
veredicto adverso, em que pese tenha sido este parido, de forma equivocada pela
sentença, ora respeitosamente reprovada.
Passa-se, pois, a análise em conjunto da matéria alvo de debate.
Consoante sinalado pelo réu, quanto inquirido pelo Julgador togado à folha
______, o mesmo foi categórico e peremptório em negar ter perpetrado o segundo
delito, descrito pela denúncia, encampado, data maxima venia, de forma
imprudente, pela sentença aqui acerbamente hostilizada.
Além do que, precisou o réu, no termo de interrogatório de folha _______, que
assinou, no orbe inquisitorial, por determinação da ciosa autoridade policial,
um 'papel', adredemente preenchido por esta, onde constava sua confissão!
Donde, tendo o réu negado o fato delituoso frente ao Julgador singelo, dando
as razões que inquinam de nulidade sua confissão policial, tem-se, que passa a
merecer crédito suas assertivas declinadas no orbe judicial, passando o ônus da
prova (descrédito de retratação), ao órgão reitor da denúncia.
Nesta alheta, é a jurisprudência colhida junto ao Pretório Excelso, da lavra
do Eminente Ministro XAVIER DE ALBUQUERQUE, digna de transcrição, em razão de
sua extrema pertinência ao caso em discussão:
"A confissão extrajudicial, feita no curso de inquérito policial, pode e deve
ser considerada pelo julgador na formação de seu convencimento. Retratada que
ela seja, contudo, em juízo, tal consideração só é cabível se outras provas a
confortam ou corroboram. Mas, a produção de provas outras, que confirmem ou
prestem apoio à confissão retratada, é ônus da acusação ou dever do juiz na
livre condução do processo. Não toca ao réu, como às vezes que lê em julgados
que subvertem princípios consagrados, o ônus de provar que não espelha a verdade
a confissão extrajudicial por ele retratada" in, (RTJ, 81:337)
Por outro norte, obtempere-se, que a prova judicializada, é completamente
estéril e infecunda, no sentido de roborar a denúncia, haja vista, que o Senhor
da ação penal, não conseguiu arregimentar um única voz, isenta e confiável, que
depusesse contra o réu, no intuito de incriminá-lo, do delito a que
indevidamente subjugado.
Efetivamente, perscrutando-se com sobriedade e comedimento a prova de índole
inculpatória produzida com no dedilhar da instrução, tem-se que a mesma
centra-se e resume-se, única e exclusivamente na palavra das sedizentes vítimas
do tipo penal, o que delata sua precariedade e rotunda ausência de
credibilidade, de sorte que detém interesse direto no desfecho positivo da ação
penal, a qual foi instaurada para atender os reclamos destas.
Em assim sendo, tem-se, que a palavra das vítimas dos fatos deve ser recebida
com extrema reserva, haja vista, que possuem em mira, incriminar o réu, agindo
por vindita(1) e não por caridade(2) - a qual segundo apregoado pelo Apóstolo e
Doutor do gentios, São Paulo(3), é a maior das virtudes - mesmo que para tanto
devam criar uma realidade fictícia, logo inexistente.
Nesta senda é a mais lúcida jurisprudência, coligida junto aos tribunais
pátrios:
"As declarações da vítima devem ser recebidas com cuidado, considerando-se
que sua atenção expectante pode ser transformadora da realidade, viciando-se
pelo desejo de reconhecer e ocasionando erros judiciários" (JUTACRIM, 71:306)
No mesmo quadrante é o magistério de HÉLIO TORNAGHI, citado pelo
Desembargador ÁLVARO MAYRINK DA COSTA, no acórdão derivado da apelação criminal
nº 1.151/94, da 2ª Câmara Criminal do TJRJ, julgada em 24.4.1995, cuja
transcrição parcial afigura-se obrigatória, no sentido de colorir e emprestar
consistência as presentes razões: "Tornaghi bem ressalta que o ofendido mede o
fato por um padrão puramente subjetivo, distorcido pela emoção e paixão. Nessa
direção, poder-se-ia afirmar que ainda que pretendesse ser isento e honesto,
estaria psicologicamente diante do drama que processualmente o envolve, propenso
a falsear a verdade, embora de boa-fé..." (*) in, JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL:
PRÁTICA FORENSE: ACÓRDÃOS E VOTOS, Rio de Janeiro, 1999, Lumen Juris, página 19.
Assim, se for expurgada a palavra das vítimas, notoriamente parciais e
tendenciosas, em suas quiméricas e débeis assertivas, nada mais resta a delatar
a autoria dos fatos, imputados, aleatoriamente, ao apelante.
Sinale-se, outrossim, que para referendar-se uma condenação no orbe penal,
mister que a autoria e a culpabilidade resultem incontroversas. Contrário senso,
a absolvição se impõe por critério de justiça, visto que, o ônus da acusação
recai sobre o artífice da peça portal. Não se desincumbindo, a contento, de tal
tarefa, marcha, de forma inexorável, a peça esculpida pelo integrante do parquet
à morte.
Nesta rota, veicula-se imperiosa a compilação de arestos oriundos da cortes
de justiça:
"Por pior que seja a vida pregressa de um cidadão, tal circunstância, que
geralmente se reflete na fixação da pena, não serve como prova substitutiva e
suficiente de uma autoria não induvidosamente apurada no conjunto probatório"
(Ap. 135.461, TACrimSP, Rel. COSTA MENDES.
"A prova para a condenação deve ser robusta e estreme de dúvidas, visto o
Direito Penal não operar com conjecturas" (TACrimSP, ap. 205.507, Rel. GOULART
SOBRINHO)
"O Direito Penal não opera com conjecturas ou probabilidades. Sem certeza
total e plena da autoria e da culpabilidade, não pode o Juiz criminal proferir
condenação" (Ap. 162.055. TACrimSP, Rel. GOULART SOBRINHO)
"Sentença absolutória. Para a condenação do réu a prova há de ser plena e
convincente, ao passo que para a absolvição basta a dúvida, consagrando-se o
princípio do 'in dubio pro reo', contido no art. 386, VI, do C.P.P" (JUTACRIM,
72:26, Rel. ÁLVARO CURY)
Mesmo, admitindo-se, a título de mera e surrealista argumentação, que sobeje
no bojo dos autos duas versões dos fatos, a primeira proclamada pelo apelante,
desde a aurora da lide, a qual o exculpa, e a segunda encimada pelo dono da
lide, o qual pretextando defender os interesses das sedizentes vítimas, inculpa
graciosamente o recorrente, pelo fictício roubo (2º fato), deve, e sempre,
prevalecer, a versão declinada pelo réu, calcado no vetusto, mas sempre atual
princípio in dubio pro reu.
Neste diapasão é a mais abalizada jurisprudência, que dimana dos pretórios,
digna de decalque face sua extrema pertinência a questão submetida a desate:
"Inexistindo outro elemento de convicção, o antagonismo entre as versões da
vítima e do réu impõe a decretação do non liquet" (Ap. 182.367, TACrimSP, Rel.
VALENTIM SILVA)
"Sendo conflitante a prova e não se podendo dar prevalência a esta ou àquela
versão, é prudente a decisão que absolve o réu" (Ap. 29.899, TACrimSP, Rel.
CUNHA CAMARGO).
"Sem que exista no processo uma prova esclarecedora da responsabilidade do
réu, sua absolvição se impõe, eis que a dúvida autoriza a declaração do non
liquet, nos termos do art. 386, VI, do CPP" (Ap. 160.097, TACrimSP, Rel.
GONÇALVES SOBRINHO).
Porquanto, inexistindo prova segura, correta e idônea a referendar e
sedimentar a sentença, impossível veicula-se sua manutenção, assomando imperiosa
sua ab-rogação, sob pena de perpetrar-se gritante injustiça.
Registre-se, que somente a prova judicializada, ou seja àquela depurada na
pira do contraditório é factível de crédito para confortar um juízo de
reprovação. Na medida em que a mesma revela-se frágil e impotente para secundar
a denúncia, assoma impreterível a absolvição do réu, visto que a incriminação de
clave ministerial, remanesceu defendida em prova falsa, sendo inoperante para
sedimentar uma condenação, não obstante tenha esta vingado, contrariando todas
as expectativas!
Destarte, todos os caminhos conduzem, a absolvição do réu, frente ao conjunto
probatório domiciliado à demanda, em si sofrível e altamente defectível, para
operar e autorizar um juízo epitímio contra o apelante.
Conseqüentemente, a sentença estigmatizada, por se encontrar lastreada em
premissas inverossímeis, estéreis e claudicantes, clama e implora por sua
reforma, missão, esta, reservada aos Preclaros Desembargadores, que compõem essa
Augusta Câmara Secular de Justiça.
ANTE AO EXPOSTO, REQUER:
I.- Seja cassada a sentença judiciosamente buscada desconstituir,
expungindo-se da sentença, o juízo de exprobação, alusivo ao segundo fato, uma
vez o réu negou de forma imperativa sua participação, desde o rebento da lide,
cumprindo ser absolvido, forte no artigo 386, IV, do Código de Processo Penal; e
ou na remota hipótese de soçobrar a tese mor (negativa da autora), seja, de
igual sorte, absolvido, forte no artigo 386, VI, do Código de Processo Penal,
frente a manifesta e notória deficiência probatória que jaz reunida à demanda,
impotente em si e por si, para gerar qualquer juízo adverso.
Certos estejam Vossas Excelências, mormente o Insigne e Culto Doutor
Desembargador Relator do feito, que em assim decidindo, estarão julgando de
acordo com o direito, e, sobretudo, restabelecendo, perfazendo e restaurando, na
gênese do verbo, o primado da JUSTIÇA!
_________, ____ de _________ de _____.
DEFENSOR
OAB/
NOTAS
(1) "O inverso da caridade é a vingança" Camilo Castelo Branco.
(2) "A caridade cristã não se limita a socorrer o necessitado de bens
econômicos; leva-nos, antes de mais nada, a respeitar e a defender cada
indivíduo enquanto tal, na sua intrínseca dignidade de homem e de filho do
Criador" J. ESCRIVÁ DE BALAGUER (Cristo que passa, nº 72)
(3) 1º Coríntios 13,1-13