CONTRA-RAZÕES - ESTUPRO - DESCLASSIFICAÇÃO - SUBSTITUIÇÃO DA PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE - NÃO HEDIONDO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA _______ VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE ________________ (___).
processo crime n.º ____________
objeto: oferecimento de contra-razões.
__________________________, brasileiro, casado, agricultor, hodiernamente em
lugar incerto e não sabido, pelo Defensor Público subfirmado, vem,
respeitosamente, a presença de Vossa Excelência, no prazo legal, por força do
artigo 600 do Código de Processo Penal, combinado com o artigo 128, inciso I
(segunda parte) da Lei Complementar n.º 80 de 12.01.94, ofertar, em anexo, as
presentes contra-razões ao recurso de apelação de que fautor o MINISTÉRIO
PÚBLICO, propugnando pela manutenção integral da sentença, injustamente
repreendida pelo integrante do parquet.
ANTE AO EXPOSTO, REQUER:
I.- Recebimento das inclusas contra-razões, remetendo-se, após, os autos à
Superior instância, para a devida e necessária reapreciação da temática alvo de
férreo litígio.
Nesses Termos
Pede Deferimento.
____________________, ____ de __________ de 2.0__.
______________________________
DEFENSOR PÚBLICO TITULAR
OAB/UF _______________
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ____________________.
COLENDA CÂMARA JULGADORA
ÍNCLITO RELATOR
"A verossimilhança, por maior que seja, não é jamais a verdade ou a certeza,
e somente esta autoriza uma sentença condenatória. Condenar um possível
delinqüente é condenar um possível inocente" [*] NELSON HUNGRIA
CONTRA-RAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO FORMULADAS POR:
__________________________________
Em que pese o brilho das razões dedilhadas pelo denodado Doutor Promotor de
Justiça que subscreve a peça de irresignação estampada à folhas _______ dos
autos, tem-se, que a mesma não deverá vingar em seu desiderato mor, qual seja, o
de obter a reforma da sentença que injustamente hostiliza, da lavra do dilúcido
Julgador monocrático, DOUTOR ________________, porquanto o decisum de primeiro
grau de jurisdição, é impassível de censura, haja vista que analisou com rara
profundidade, proficiência e imparcialidade o conjunto probatório hospedado pela
demanda, outorgando o único veredicto possível e factível, uma vez sopesada e
aquilatada a prova parida no crisol do contraditório.
Irresigna-se o honorável integrante do MINISTÉRIO PÚBLICO, no concernente a
desclassificação do delito de tentativa de estupro para lesões corporais,
discorrendo, ainda, a título de questão periférica, sobre a impossibilidade de
substituir-se a pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, no caso
em tela, afora postular, por derradeiro, pela aplicação do regime integralmente
fechado, na remota hipótese de vingar a condenação ao delito de tentativa de
estupro.
Passa-se, pois, a análise seqüencial da matéria alvo de debate.
1.) DA DESCLASSIFICAÇÃO
Consoante sinalado pelo réu, desde a primeira hora que lhe coube falar nos
autos - vide de declarações junto ao orbe inquisitorial de folha ___ - o mesmo
foi categórico e peremptório em negar o cometimento do delito que lhe é
aleatoriamente imputado pela peça portal coativa.
Outrossim, a prova judicializada, vem ao encontro da tese da negativa da
autoria, suscitada pelo réu desde a natividade da lide, e agasalhada pela
sentença aqui louvada.
Em verdade, em verdade, em perscrutando-se com desvelo, comedimento e
sobriedade a prova que jaz reunida à demanda, tem-se, que a única voz que
investe diretamente contra o réu é própria vítima do fato, a qual pelo artifício
da simulação, procura incriminar o recorrido, pelo fictício e quimérico delito
de tentativa de estupro.
De resto, é dado inconteste, que a palavra da sedizente vítima, deve ser
recebida com extrema reserva, de sorte que possui em mira, incriminar a réu,
agindo por vindita e não por caridade - a qual segundo apregoado pelo Apóstolo e
Doutor do gentios, São Paulo, é a maior das virtudes - mesmo que para tanto deva
criar uma realidade fictícia, logo inexistente.
Nesta vereda, é a mais lúcida jurisprudência, coligida junto as cortes de
justiça:
"As declarações da vítima devem ser recebidas com cuidado, considerando-se
que sua atenção expectante pode ser transformadora da realidade, viciando-se
pelo desejo de reconhecer e ocasionando erros judiciários" (JUTACRIM, 71:306)
No mesmo quadrante é o magistério de HÉLIO TORNAGHI, citado pelo
Desembargador ÁLVARO MAYRINK DA COSTA, no acórdão derivado da apelação criminal
n.º 1.151/94, 2ª Câmara Criminal do TJRJ, julgada em 24.4.1995, cuja transcrição
parcial afigura-se obrigatória, no sentido de colorir e emprestar consistência
as presentes razões:
"Tornaghi bem ressalta que o ofendido mede o fato por um padrão puramente
subjetivo, distorcido pela emoção e paixão. Nessa direção, poder-se-ia afirmar
que ainda que pretendesse ser isento e honesto, estaria psicologicamente diante
do drama que processualmente o envolve, propenso a falsear a verdade, embora de
boa-fé..." (*) in, JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL: PRÁTICA FORENSE: ACÓRDÃOS E VOTOS,
Rio de Janeiro, 1999, Lumen Juris, página 19.
Ademais, sinale-se, por relevantíssimo, que para referendar-se uma condenação
no orbe penal, quanto aos delitos sexuais, mister que a autoria e a
culpabilidade resultem incontroversas, contrário senso, a absolvição - no caso
da desclassificação - se impõe por critério de justiça, visto que, o ônus da
acusação recai sobre o artífice da peça acusatória. Não se desincumbindo, a
contento, de tal tarefa, marcha, de forma inexorável, a peça parida pelo Senhor
da ação penal pública incondicionada à morte.
Neste passo fecunda é a jurisprudência compilada juntos as cortes de justiça:
ESTUPRO - PROVA - PALAVRA DA VÍTIMA - IMPOSSIBILIDADE DE SER RECEBIDA SEM
RESERVAS QUANDO OUTROS ELEMENTOS PROBATÓRIOS SE APRESENTAM EM CONFLITO COM SUAS
DECLARAÇÕES - DÚVIDA AINDA QUE ÍNFIMA, NO ESPÍRITO DO JULGADOR, DEVE SER
RESOLVIDA EM FAVOR DO RÉU - ABSOLVIÇÃO DECRETADA.
"Embora verdadeiro o argumento de que a palavra da vítima, em crimes sexuais,
tem relevância especial, não deve, contudo, ser recebida sem reservas, quando
outros elementos probatórios se apresentam em conflito com suas declarações.
"Assim, existindo dúvida, ainda que ínfima, no espírito do julgador, deve,
naturalmente, ser resolvida em favor do réu, pelo que merece provimento seu
apelo, para absolvê-lo por falta de provas.(Ap. 112.564-3/6 - 5ª Câmara Criminal
do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, j. 19.2.92, Rel. Desembargador
CELSO LIMONGI, in RT 681/330-332.
ESTUPRO - PROVA
"Embora seja a pedra angular da prova, a palavra da vítima não tem valor
absoluto. Até por ser ela, normalmente, o único condutor do veredicto, qualquer
dúvida, por mínima que seja, deve determinar o non liquet." (Ap. 696128875 - 3ª
Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, j.
10.10.96, Rel. Desembargador FERNANDO MOTTOLA, in RJTJRS n.º 130, página 128.
"Insuficiente para embasar decreto condenatório simples probabilidade de
autoria de delito, eis que se trata de mera etapa da verdade, não constitutiva,
por si só, de certeza" (Ap. 42.309, TACrimSP, Rel. GOULART SOBRINHO)
"O Direito Penal não opera com conjecturas ou probabilidades. Sem certeza
total e plena da autoria e da culpabilidade, não pode o Juiz criminal proferir
condenação" (Ap. 162.055. TACrimSP, Rel. GOULART SOBRINHO)
Registre-se, por derradeiro, que somente a prova judicializada, ou seja
àquela depurada no rebento do contraditório é factível de crédito para confortar
um juízo de reprovação. Na medida em que a mesma revela-se frágil e impotente
para secundar a denúncia - quanto ao delito de tentativa de estupro - assoma
impreterível a desclassificação obrada, visto que a incriminação de clave
ministerial, remanesceu defendida em prova falsa, sendo inoperante para
sedimentar uma condenação, em que pese seja a mesma perseguida (no segundo grau
de jurisdição) de forma temerária e imprudente, pelo apelante, para a
perplexidade e estupor da defesa.
2.-) DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA
Quanto ao segundo e derradeiro ponto esgrimido pela recorrente, tem-se, que
não merecer melhor sorte, haja vista, que a substituição da pena privativa de
liberdade pela restritiva de direitos, não só e recomendável no caso presente
como é factível, frente a pena cominada, a qual de resto, encontra-se prescrita.
3.- DO REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA.
Sabido e consabido que o proposição ministerial de compelir o réu ao
comprimento da pena imposta em regime totalmente fechado, face a suposta
hediondez, encontra-se em rota de colisão com a garantia Constitucional da
individualização da pena, contemplada pelo artigo 5º, XLVI, da Carta Magna.
Demais, assegura a Lei Fundamental, no artigo 5º, III, que "ninguém será
submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante".
A imposição de pena em regime integralmente fechado vexa o réu,
diminuindo-lhe, consideravelmente sua expectativa de vida, além de reduzi-lo a
um ente paragonável a um semovente (viverá em deletério e atroz confinamento
durante todo o período de cumprimento da pena), afora eliminar a decanta
possibilidade de ressocialização do condenado, tida e havida como o fim
teleológico da pena.
Sobre o tema discorre com muita propriedade o emérito penalista pátrio,
ALBERTO SILVA FRANCO, in, CRIMES HEDIONDOS, São Paulo, 1.994, RT, 3ª edição,
onde à folhas 144/145, traça as seguintes e elucidativas considerações, dignas
de transcrição obrigatória, face a maestria com que enfoca o tema submetido a
desate:
"Pena executada, com um único e uniforme regime prisional significa pena
desumana porque inviabiliza um tratamento penitenciário racional e progressivo;
deixa o recluso sem esperança alguma de obter a liberdade antes do termo final
do tempo de sua condenação e, portanto, não exerce nenhuma influência
psicológica positiva no sentido e seu reinserimento social; e, por fim,
desampara a própria sociedade na medida em que devolve o preso à vida societária
após submetê-lo a um processo de reinserção às avessas, ou seja, a uma
dessocialização.
A execução integral da pena, em regime fechado, de acordo com o § 1º, do art.
2º da Lei 8.072/90, contraria, de imediato, ao modelo tendente à ressocialização
e empresta à pena um caráter exclusivamente expiatório ou retributivo, a que não
se afeiçoam nem o princípio constitucional da humanidade da pena, nem as
finalidades a ele atribuídas pelo Código Penal (art. 59) e pela Lei de Execução
Penal (art. 1º). A oposição a um regime prisional de liberação progressiva do
condenado e de sua preparação para uma vida futura em liberdade significa a
renúncia ao único instrumento capaz de tornar racional e, desse modo, tolerável
- pelo menos enquanto não for formulada uma outra resposta idônea a substituí-la
- a pena privativa de liberdade e de justificar, até certo ponto, o próprio
sistema penitenciário.
No mesmo norte, é o magistério da festejada e respeitada Professora ADA
PELLEGRINI GRINOVER e outros, in, AS NULIDADES DO PROCESSO PENAL, São Paulo,
1.994, Malheiros Editores, 3ª edição, onde à folha 250, sufraga a tese da
inconstitucionalidade do regime integral fechado:
"Tem sido apontada a inconstitucionalidade do artigo , do art. 2º, § 1º, da
Lei 8.072/90, - a denominada ‘lei dos crimes hediondos’ - por violação do art.
5º, XLVI, CF, que garante a individualização da pena: significando esta
especializar e particularizar a reação social ao comportamento vedado, a fixação
de regime fechado integral representa generalização constitucionalmente
proibida"
Em consolidando as teses doutrinárias concernentes a inconstitucionalidade do
regime integral fechado, colige-se jurisprudência oriunda do Egrégio Tribunal de
Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, inserta no volume n.º 177, página 59, da
REVISTA DE JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL,
nos embargos infringentes número 695035113, adicto ao 1º Grupo Criminal, julgado
em 27 de outubro de 1.995, sendo Relator o Desembargador GUILHERME O. DE SOUZA
CASTRO, cuja ementa assoma de decalque obrigatório:
"REGIME INTEGRALMENTE FECHADO NO CUMPRIR DA PENA EM CONDENAÇÃO POR DELITO
DITO HEDIONDO. A CF/88 VEDA A IMPOSIÇÃO DE PENA CRUEL, E O COMANDO QUE UMA PENA
SEJA CUMPRIDA INTEIRAMENTE EM REGIME FECHADO CARACTERIZA CRUELDADE, ALÉM DE
ESBARRAR NA GARANTIA CONSTITUCIONAL DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA, BEM ASSIM
AFRONTAR AS DIRETRIZES MAIORES DA EXECUÇÃO DA PENA. EMBARGOS ACOLHIDOS".
Destarte, a sentença injustamente repreendida pelo apelante, deverá ser
preservada, lançando-se ao anátema os pleitos de índole ministerial, missão,
esta, confiada e reservada aos Cultos e Doutos Desembargadores que compõem essa
Augusta Câmara Criminal.
ISTO POSTO, pugna e vindica o recorrido, seja negado trânsito o recurso
interposto pela Senhora da ação penal pública incondicionada, mantendo-se
intangível a sentença de primeiro grau de jurisdição, com o que estar-se-á,
realizando, assegurando e perfazendo-se, na gênese do verbo, o primado da mais
lídima e genuína JUSTIÇA!
_________________, em ___ de ____________ de 2.0___.
____________________________
DEFENSOR PÚBLICO TITULAR
OAB/UF __________