Impugnação à contestação, em ação civil coletiva interposta pelo PROCON, para devolução de valores pagos em consórcio, ante desistência, com a devida correção monetária.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA .... VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE
.....
AUTOS Nº ....
A COORDENADORIA ESTADUAL DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR - PROCON/...., órgão
da administração pública direta do Estado, pertencente à SECRETARIA DE ESTADO DA
JUSTIÇA E DA CIDADANIA - SEJU, instituída pela Lei nº 9609/91 e regulamentada
pelo Decreto nº 609/91, neste ato representada por .... (qualificação), por seus
advogados ao final assinados (também integrantes do PROCON/PR), vem mui
respeitosamente, nos autos de AÇÃO CIVIL COLETIVA promovida em face de ...., com
base no artigo 327 do CPC, ante Vossa Excelência, apresentar
IMPUGNAÇÃO À CONTESTAÇÃO
pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
1. DA REGULARIDADE DA EXORDIAL
A requerida afirma que "não houve pedido condenatório, mas apenas declaratório.
O autor não pediu que a ré fosse condenada ao pagamento das parcelas pagas, mas
apenas e tão somente, pediu que houvesse o reconhecimento do direito, que é de
natureza declaratória e não condenatória." (sic)
Todavia, não há que se falar em inépcia da inicial, eis que a exordial atende
todos os requisitos elencados no artigo 282, do CPC. Na verdade, ao requerer o
reconhecimento do direito, a autora pretende obter sentença de cunho
declaratório e condenatório, com base no artigo 95, do Código de Proteção e
Defesa do Consumidor, senão vejamos:
"Em caso de procedência do pedido, a condenação será genérica, fixando a
responsabilidade do réu pelos danos causados."
Sobre este artigo, vejamos o que preleciona a professora Ada Pellegrini
Grinovewr (CÓDIGO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, comentado pelos autores do
ante projeto, editora Forense Universitária, 3ª edição, 1.993):
"Nos termos do artigo 95, porém, a condenação será genérica: isso porque
declarada a responsabilidade civil do réu, em face dos danos apurados por
mostragem ou perícia e o dever de indenizar, sua condenação versará sobre o
ressarcimento dos danos causados ..."
Desta forma, vislumbra-se com clarividência que a presente ação tem por escopo
não apenas reconhecer o direito dos consorciados em receber as parcelas pagas
com a devida atualização monetária, mas também condenar a requerida a tal
pagamento. Ao se requerer o "reconhecimento", na verdade, quer-se, primeiro, a
obrigação da responsabilidade do fornecedor e, em seguida, a sua condenação ao
ressarcimento dos prejuízos causados com a não devolução das parcelas pagas
corrigidas monetariamente.
Portanto, esta preliminar não merece acolhimento.
2. DA LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA
O argumento de ilegitimidade ativa da autora para buscar em juízo a tutela dos
direitos dos consumidores lesados antes da vigência do CDC deve ser totalmente
repelida. É que a condição de legitimidade para a causa é exigível no momento da
propositura da ação e não é questionada ou mesmo considerada no momento da lesão
ao direito substancial do consumidor.
A legitimatio ad causam é matéria estritamente processual e que vem à luz
somente a propositura da ação, ou seja, da formação de uma relação jurídica a
nível processual. É absolutamente ilógico pretender-se a ilegitimidade da autora
para a presente ação por estar ela regulamentada, ao tempo da lesão ao direito
material que permanece subjacente a relação processual, o qual só passou a
existir a partir do ingresso em Juízo. Relata-se os artigos 81 e 82 do CDC, que
concederam a esta Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor/PROCON-PR.
total legitimidade processual para pleitear em juízo a defesa dos direitos
substanciais dos consumidores.
Faz-se mister elucidar não só as novas tendências relativas a política
legislativa e processual que propugnam pelo que se convencionou chamar de
direito a um devido processo legal, como também as novas legislações que vêm
sucedendo na busca de uma efetiva tutela jurisdicional, rompendo com o dogma
absoluto proposto pelo artigo 6º do CPC ao alargar de forma sobremaneira os
mecanismos de tutela jurídica dos interesses coletivos advindos de uma nova
realidade numa sociedade notadamente massificada. A Constituição Federal de
1.988 representou relevante avanço no que toca a facilitação do acesso ao Poder
Judiciário especialmente para a defesa dos interesses difusos e coletivos,
complementando o caminho evolutivo traçado ela lei da Ação Civil Pública, nº
7.437/85.
Na esteira desta evolução processual que visa à facilitação do acesso à justiça,
surgiu o Código de Defesa do Consumidor que processualmente inovou o tema ao
permitir a tutela dos interesses ditos individuais homogêneos, os quais têm a
mesma origem, decorrente da não devolução dos valores pagos aos consorciados
corrigidas monetariamente.
Por oportuno, urge esclarecer que, a assertiva de que "não existe relação
jurídica de consumo, mas sim relação jurídica obrigacional" não merece
prosperar, eis que os consorciados são reconhecidamente "destinatários finais" e
a requerida presta serviços aos consorciados ao administrar os grupos.
Igualmente alegou a requerida ILEGITIMIDADE PASSIVA para figurar na presente
ação. Tal argumento é claramente inválido e não encontra respaldo legal.
A administradora de consórcios é responsável pela representação do grupo em
Juízo ou fora dele. Ademais, a Administradora recebe taxa de administração como
pagamento pela organização e administração do grupo. Veja-se o que dispõe o
Manual do Sistema de Consórcios, editado pela (ABAC-SINAC, página 32), quando a
administração do grupo, verbis:
"A representação do grupo pela administradora de consórcio permite que os
interesses e direitos coletivamente considerados possam ser submetidos à
apreciação judicial em qualquer dos pólos da relação processual, ativo e
passivo, ou seja, na qualidade de autor ou réu.
A relação de representação que se estabelece entre o grupo e a administradora é
semelhante àquela que surge entre o condomínio, de um lado, e o síndico, de
outro. Com efeito, aquelas figuras, inobstante a ausência de personalidade
jurídica, estão legitimadas a ingressar ou responder em juízo na defesa de
interesses próprios da entidade, através de seus representantes."
Igualmente, portanto, esta preliminar não deve ser acolhida.
DO MÉRITO
Prefacialmente, mister se faz esclarecer que, o erro formal na elaboração da
proemial, ao se referir em veículos, não descaracteriza o caráter condenatório
da ação.
Após impugnadas todas as preliminares apresentadas pela recorrente, no mérito, a
questão centra-se no reconhecimento do direito dos consumidores-consorciados em
perceber as parcelas pagas à Administradora com a devida correção monetária,
pois, caso contrário, estar-se-ia gerando enorme desequilíbrio entre os
consorciados e as Administradoras de Consórcios em todo o país.
Deve-se atentar, primeiramente, que o caso em tela tem como pano de fundo um
CONTRATO DE ADESÃO, o qual guarda como característica principal a inexistência
de livre discussão, que normalmente precede a formação dos contratos, ou seja, é
celebrado mediante estipulação unilateral da Administradora.
Não bastasse, devido às incertezas ocasionadas pela economia brasileira, vários
consorciados que firmam contrato com as Administradoras de Consórcios
objetivando adquirir determinado tipo de bem por meio de auto-financiamento, com
o esforço comum dos demais integrantes, se vêem impossibilitados de suportar o
valor das parcelas aprazadas.
A devolução das parcelas pagas sem a devida atualização monetária, por seu
turno, possibilita à Administradora de consórcios o LOCUPLETAMENTO INDEVIDO e o
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA, o que é proibido pelo nosso ordenamento jurídico.
A cláusula do contrato de adesão que admite que os consorciados desistentes ou
inadimplentes devem receber a devolução das parcelas pagas sem correção
monetária é LEONINA, ABUSIVA e ATENTATÓRIA à boa-fé que norteia os negócios
jurídicos em geral.
No mesmo sentido, a jurisprudência é pacífica. Veja-se a já citada Súmula 35, do
Superior Tribunal de Justiça:
"INCIDE CORREÇÃO MONETÁRIA SOBRE AS PRESTAÇÕES PAGAS, QUANDO SUA RESTITUIÇÃO EM
VIRTUDE DA RETIRADA OU EXCLUSÃO DO PARTICIPANTE DE PLANO DE CONSÓRCIO."
A necessidade de que os negócios jurídicos encetados com prazo de vencimento
devam ser corrigidos, ocorre em virtude do índice corretor ter por objeto a
reposição da substância corroída pela inflação, fato que estabelece igualdade
entre os contratantes. É por isto que se falou na exordial que "... A CORREÇÃO
MONETÁRIA NÃO É UM "PLUS", QUE SE ACRESCENTA AO CRÉDITO, MAS UM "MINUS" QUE SE
EVITA, NÃO OCASIONANDO SIGNIFICATIVO DANO AO DESISTENTE" (fls. ....). Justo
porque, não se admite um desequilíbrio entre as partes contratantes.
É assente o entendimento dos tribunais em reconhecer a incidência da correção
monetária quando da devolução das parcelas pagas, como v.g., o Egrégio tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul:
"JÁ DECIDIU ESTE TRIBUNAL, ATRAVÉS DE SUAS CÂMARAS SEPARADAS, SEGUINDO NA
ESTEIRA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE AO PARTICIPANTE DO CONSÓRCIO QUE
DELE SE AFASTA É DEVIDA, QUANDO DO ENCERRAMENTO DO PLANO, A DEVOLUÇÃO DAS
PRESTAÇÕES PAGAS, COM CORREÇÃO MONETÁRIA." (Ac. un. da C. de Férias Civ. do TARS
- AC 191178275, j. 14.01.92, Repertório de Jurisprudência).
Além disso, o consorciado desistente e excluído não precisa "esperar o
encerramento do grupo" para perceber as parcelas pagas com a devida correção
monetária. Este é o entendimento pacífico nos pretórios em todo país, senão
vejamos:
"CONSÓRCIO - DESISTÊNCIA - DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS - GRUPO NÃO ENCERRADO -
INEXISTÊNCIA DE CARÊNCIA DE AÇÃO - CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO 30 DIAS APÓS O
ENCERRAMENTO DO GRUPO. (Relator Campos Marques TA/PR, j. 13.10.94, DJ/PR.
04.11.94, p. 77)."
"CONSÓRCIO - DESISTÊNCIA - DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS - CLÁUSULA CONTRATUAL -
EXCLUSÃO DA INCIDÊNCIA DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DE JUROS REAIS - AÇÃO PROPOSTA
ANTERIORMENTE AO ENCERRAMENTO DO GRUPO - CARÊNCIA DE AÇÃO AFASTADA - Relator
Nilton Macedo Machado TJ/SC, DJ/SC 06.12.94, p. 06."
DOS PEDIDOS
Isto posto, requer:
a) o não acolhimento de todas as preliminares argüidas na contestação;
b) seja julgada procedente a presente AÇÃO COLETIVA DE INDENIZAÇÃO, condenando a
requerida a promover a devolução de todos os valores pagos com a devida correção
monetária.
c) a condenação da requerida ao pagamento das custas processuais e honorários
advocatícios na base usual de 20% (vinte por cento).
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]