Ação civil pública contra cobrança de taxa de iluminação pública casada com cobrança de taxa de energia elétrica.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
O MINISTÉRIO PÚBLICO DA ................, por intermédio da ....ª e ....ª
Promotorias de Justiça de ................, com base na Constituição da
República, na Constituição do Estado, nas Leis Federais n. 7.347/85, 8.078/90 e
8.625/93 e na Lei Complementar Estadual n. 11/96, e fundamento nas peças de
informação em anexo, vem propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
em face de
................ - Companhia de Eletricidade da ................, pessoa
jurídica de direito privado, com sede na Av. ........, n. ......,
................-....., inscrita no CNPJ sob n. ........, representada por seu
Diretor Presidente, Sr. ................, pelos motivos de fato e de direito a
seguir aduzidos.
DOS FATOS
Desde ......... de ......, a ................ vem fazendo a cobrança nas suas
notas fiscais (contas de energia elétrica) da taxa de iluminação pública
instituída pelo Município de .................A TIP foi criada em
................ pela Lei Municipal n. 1932/97, e a cobrança desse tributo
somente se viabilizou porque a ................, ora suplicada, violando o
princípio da lealdade que rege e deve reger as relações de consumo, forneceu ao
Município o cadastro de seus consumidores e passou a incluir nas contas de
energia elétrica o valor referente à TIP.
A ................ e o Município de ................ firmaram entre si um
convênio pelo qual a ................ se obrigou a realizar a referida cobrança,
auferindo com isso um lucro de 5% (cinco porcento) sobre o valor da arrecadação
da taxa, que tem sido superior a cento e cinqüenta mil reais mensais.Por
considerar que a TIP é inconstitucional, o Ministério Público propôs perante a
Vara da Fazenda Pública ação civil contra o MUNICÍPIO DE ................ e a
................ para que fosse proibida a cobrança da TIP pelo poder público e
para que fosse decretada a nulidade do convênio firmado entre ambos, bem como
para que fosse declarada incidentalmente a inconstitucionalidade da taxa de
iluminação pública. A ação proposta pelo Ministério Público foi ali tombada sob
o número geral ...........(número no cartório .......).
A MM. Juíza da Vara da Fazenda Pública concedeu a antecipação da tutela em
............ asseverando que "existe prova inequívoca de que a norma que criou a
taxa de iluminação pública (TIP), cobrada, viola os dispositivos do art. 91,
inciso II e parágrafos 2º e 3º, alínea a da Lei Orgânica do Município de
................ (LOMFS) e a Constituição Federal", dizendo mais que "o sistema
tributário municipal tem que sujeitar-se às normas do Código Tributário Nacional
(CTN)".Fica claro que a decisão judicial de antecipação de tutela teve
fundamento apenas na legislação tributária (municipal e federal) e na norma
constitucional, não tratando de relação de consumo.
Tanto isso é verdade que, em decisão proferida no agravo de instrumento
50.133-9, da 2ª Câmara Cível, o Des. AMADIZ BARRETO suspendeu a execução da
antecipação da tutela argumentando que faltava legitimidade ativa ao Parquet
para a propositura daquela ação, porque o magistrado entendeu que ali se
discutiam interesses dos contribuintes municipais, e não de consumidores.
A ação civil pública continua em curso nesta comarca, aproximando-se da fase de
saneamento, e o agravo está no Tribunal de Justiça, já com contra-razões
ministeriais.
Todavia, em decorrência de direito superveniente tem-se agora clara expressão
normativa para a defesa dos consumidores no que se refere à TIP.
Deixe-se logo assentado que não há aqui litispendência.
A presente ação busca proibir a ................ de instrumentalizar o Município
de ................ na cobrança da taxa em detrimento de seus consumidores,
impedindo-lhe:
a) o fornecimento do seu cadastro de consumidores ao Município de
................;
b) a inclusão da cobrança da taxa nas contas de consumo; e
c) a imposição de pagamento casado, ou seja, de pagamento da conta de energia
juntamente com a TIP, sem alternativa para o consumidor.Diversamente, na ação
que tem curso perante a Vara da Fazenda Pública, objetivou-se proibir a cobrança
mesma da TIP, ou seja, visou-se a eliminar do mundo jurídico a própria taxa.
Aqui, como se vê, não se discute a constitucionalidade ou legalidade da TIP, mas
sim a prática abusiva da ................, que viola os deveres de lealdade e de
boa-fé que deve cumprir em relação aos seus consumidores.Importa observar que a
própria ................ alegou ser parte ilegítima naquela ação, por entender
que a causa versava sobre matéria tributária e que a empresa era mera agente
arrecadadora do tributo. Logicamente, não poderá agora negar a relação
consumerista Concomitantemente à ação civil pública, a Promotoria de Justiça de
Defesa do Consumidor desta comarca encaminhou o expediente de n. 43, de 26 de
janeiro de 1999, ao Ouvidor da Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, em
Brasília, solicitando providências no âmbito daquela agência contra a
................, no que pertine à malfadada taxa de iluminação pública.No dia
anterior, tomou-se o depoimento da consumidora ..........., que, inconformada
com a cobrança da TIP, pediu providências ao Parquet para a suspensão da
cobrança, fornecendo cópias de suas contas de consumo.
DO DIREITO
Diz o art. 301, §§1º e 2º, do CPC, que ocorre litispendência "quando se reproduz
ação anteriormente ajuizada", esclarecendo-se que "uma ação é idêntica à outra
quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido".
Em face da definição legal, a presente ação não induz litispendência, porque as
ações não são idênticas: apenas uma das partes passivas é a mesma, a causa de
pedir é diversa, como diverso é também o próprio pedido.
Detalhadamente, observa-se que:Lá se tem uma ação civil pública; aqui, uma ação
coletiva.Lá as partes são o MP versus o MUNICÍPIO DE ................ e a
................ (como litisconsorte passiva). Aqui, as partes são apenas o MP e
a .................Lá a causa de pedir é a relação jurídico-tributária ilegal e
inconstitucional. Aqui, o abuso na relação de consumo.
Lá se pediu a nulidade do convênio, a declaração incidenter tantum de
inconstitucionalidade da TIP e a repetição do indébito. Aqui se pede a nulidade
da prática da ................ de incluir a cobrança nas contas de consumo de
seus clientes, não se pretendendo discutir se a TIP é inconstitucional e/ou se o
convênio entre a ................ e o MUNICÍPIO DE ................ é nulo.
Portanto, à vista desses elementos, não há litispendência, até porque para tal
se exige que os pedidos sejam idênticos e que os fundamentos jurídicos das ações
sejam os mesmos, o que não ocorre na hipótese.A inexistência de litispendência é
evidente, porque naquela causa, se procedente, o MUNICÍPIO DE ................
será proibido de cobrar a TIP, como quer que seja. Nesta, se procedente, o
MUNICÍPIO DE ....... poderá continuar a cobrar a TIP, desde que o faça por outro
meio, sem usar as contas de consumo da ................. OCORRÊNCIA DE PRÁTICA
ABUSIVA ................, hoje empresa privada do grupo espanhol ..........,
mantém página ativa na internet, no endereço virtual ...........Naquela home
page, na seção sobre "direitos do cliente", a empresa suplicada anuncia
(documento anexo, acessado e impresso em ............) que os seus consumidores
têm direito a:
"4 - Sigilo quanto às informações específicas das unidades consumidoras".É
forçoso concluir que a ................ vem descumprindo a sua filosofia,
anunciada para o mundo pela rede mundial World Wide Web.É que os consumidores da
................ não têm tido nenhum direito ao sigilo, porque a empresa - não
só em ................, como também em ................, em ...... e em outras
cidades do Estado da ................ onde se cobra ou se cobrou a TIP - tem a
prática inaceitável de fornecer, sem autorização dos clientes, todas as
informações cadastrais das unidades consumidoras, de forma a viabilizar a
cobrança da taxa.Tal prática mostra-se ainda mais odiosa, quando se percebe que
a ................ age dessa maneira em seu próprio e primordial benefício,
porque ao embutir a TIP nas contas de energia, está:I - garantindo o recebimento
das faturas de iluminação pública devidas pelos municípios. É consabido que as
prefeituras (e ................ não é exceção) costumam atrasar os pagamentos da
iluminação pública, gerando dívidas impagáveis. Com a instituição da TIP, que é
cobrada e arrecadada pela ................, o pagamento dessas faturas é feito
nos prazos devidos, porque o dinheiro ingressa diretamente na contabilidade da
empresa, permanece em seus cofres, e o saldo é utilizado, conforme o convênio,
para a expansão da rede de iluminação pública da cidade.
Vale dizer: a ................ acaba ficando com todo ou quase todo o dinheiro
arrecadado em razão da TIP;II - auferindo lucro sem risco. Além de cobrar para
si mesma, numa reprovável auto-remuneração, a empresa ainda tem direito de
recolher 5% da arrecadação total do tributo;III - enriquecendo sem causa. As
multas pelo atraso nas contas de energia são calculadas também sobre o valor da
TIP, o que leva ao enriquecimento ilícito da ................, já que não há
prova de que esses valores sejam repassados ao Município;
eIV - criando situação suspeita. Não se sabe se a ................ também paga a
TIP. Já que a ................ é a fornecedora da energia, a comunidade (e quiçá
o próprio poder público) não tem qualquer informação sobre eventuais pagamentos
da TIP pela ................. Afinal, a empresa também se vale da iluminação
pública e deve pagar a taxa ao Município até que esse tributo seja excluído do
mundo jurídico. No mínimo, falta transparência nesta situação.Na mesma home page,
a ................ promete aos consumidores "proteção contra publicidade
enganosa e abusiva", o que não vem ocorrendo, a começar por sua publicidade ali
mesmo na internet, que passa a idéia enganosa de que empresa respeita os seus
consumidores e, entre outras coisas, garante-lhes o sigilo de suas
informações.Tenha-se por certo que o convênio firmado pela ................ com
o MUNICÍPIO DE ................ não obriga os consumidores, que, em relação a
ele, são terceiros (res inter alia), não podendo ser compelidos ao pagamento da
taxa de forma casada, sem que tenham autorizado o repasse de suas informações de
consumo a terceiros, como:
a) o nome do cliente;
b) o endereço da unidade consumidora;
c) o endereço para entrega da conta;
d) o consumo mensal em KWh;
e) a média de consumo;
f) o valor pago ou a pagar;
g) a situação de inadimplência ou não;
h) o número do CPF ou CNPJ do consumidor.
Todas essas informações, algumas das quais podem expor o consumidor a
constrangimento indevido ou a dano moral (como a situação de inadimplência ou o
atraso nos pagamentos de contas), são privadas, de interesse exclusivo dos
consumidores e são franqueadas à ................ numa relação de confiança, em
razão do contrato de fornecimento de energia elétrica.
Portanto, não pode a companhia abusar dessa confiança, fazendo mal uso dos dados
sigilosos de seus clientes, entregando-os a terceiro, no caso o MUNICÍPIO DE
.................
Tal situação se revela ainda mais imoral, porque a ................ ainda lucra
com a quebra desse dever de lealdade contratual em relação aos seus clientes, e
o faz para submetê-los a uma cobrança espúria por terceiros, cobrança que já foi
inúmeras vezes declarada inconstitucional pelas cortes brasileiras.Assim, não se
pode escapar de uma conclusão inevitável: a de que a inclusão da TIP nas contas
de energia põe os clientes da ................ em situação de desvantagem na
relação de consumo.
Ora, o consumidor tem de pagar a sua conta de energia, sob de pena de suspensão
do fornecimento. Como a TIP está incluída na conta, o consumidor vê-se obrigado,
compelido, constrangido a pagar o tributo juntamente com o consumo normal, já
que a ................ alega falaciosamente que o sistema de código de barras
impede a separação dos valores da TIP e do consumo de energia.
Daí decorre que o consumidor não tem outra alternativa, senão pagar a TIP,
sujeitando-se à prática abusiva da suplicada, em prejuízo de seus direitos de
consumo.Parece certo, contudo, que são as coisas (principalmente as inovações
tecnológicas) que têm de se adaptar ao homem, e não os homens a elas.
Se o sistema de código de barras impõe a cobrança casada, que se reprograme o
sistema para admitir que o consumidor pague seu consumo separadamente da TIP, ou
que a ................ crie alternativa para solucionar o conflito de
interesses. Em verdade, somente se proibindo a ................ de fornecer, sem
autorização prévia, os dados cadastrais de seus consumidores para a cobrança da
TIP ou para outros fins, é que se poderá dar adequada solução ao problema, que
ofende a Lei Federal n. 8078/90, nos seguintes dispositivos:
a) direito à liberdade de escolha (art. 6º, inciso II, do CDC);
b) direito à informação (art. 6º, inciso III);
c) direito à proteção contra métodos coercitivos ou desleais e contra práticas
abusivas ou impostas no fornecimento de produtos ou serviços (art. 6º, inciso
IV);
d) direito à prevenção por dano patrimonial e moral (art. 6º, inciso VI);
e) direito à adequação e continuidade de serviço público, como o de fornecimento
de energia elétrica (art. 22);
f) direito à proteção contra exigência de vantagem manifestamente excessiva
(art. 39, inciso V);
g) direito à não exposição (art. 42);
h) direito ao cadastro e sigilo de informação (art. 43, §2º);
i) direito à proteção contra cláusulas abusivas ou iníquas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a
eqüidade (art. 51, IV).A conduta da ................ ofende a todos esses
direitos, em maior ou menor grau, sendo necessária a intervenção do Judiciário
para reprimir a prática, que prejudica um sem número de consumidores de energia
elétrica.
Os direitos dos consumidores não se encerram na exemplificação do CDC. O art. 7º
do Código determina expressamente que tais direitos "não excluem outros
decorrentes de (...) regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas
competentes (...)
".Em atenção a essa norma, a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da
Justiça expediu em 19 de março de 1999 a Portaria n. 3/99, que foi publicada no
Diário Oficial do dia 22 de março.A referida portaria está em consonância com a
citada autorização legal e amplia o rol exemplificativo do art. 51 do CDC,
passando a considerar como abusiva a cláusula aquela que permita "ao fornecedor
de serviço essencial (água, energia elétrica, telefonia) incluir na conta, sem
autorização expressa do consumidor, a cobrança de outros serviços".
Tal cláusula é nula de pleno direito, conforme o art. 51, caput, do CDC, e o
caput da Portaria SDE n. 3/99.Na nota explicativa ao art. 3º da Portaria, o Sr.
Secretário de Direito Econômico, esclareceu que:"Cobrança casada.
É comum aos órgãos públicos, por si ou suas empresas concessionárias,
permissionárias, sem a prévia autorização do consumidor, incluir em
avisos/contas de consumo de serviços por elas prestados, serviços outros que
refogem a sua finalidade.
Tal é o caso da telefonia, taxa de iluminação nas contas de energia elétrica,
coleta de lixo em faturas de consumo de água, etc." (nota veiculada no Despacho
n. 170, do Secretário de Direito Econômico, em 19 de março de 1999).
O despacho anota ainda que "comumente o serviço é interrompido, porque não é
facultado ao consumidor destacar o valor correspondente à fruição do serviço
essencial".
Esse é justamente o caso da taxa de iluminação pública incluída nas contas de
energia da ................ e por ela cobrada em prejuízo de seus consumidores,
o que evidencia a abusividade da prática da suplicada.
Aliás, a Portaria n. 466, de 12 de novembro de 1997, do Departamento Nacional de
Águas e Energia Elétrica - DNAEE (hoje ANEEL), determina, em seu artigo 19,
parágrafo único, quanto ao cadastro dos consumidores de energia elétrica, que:
"Parágrafo único. O cadastro deverá permitir levantamentos estatísticos
organizáveis a partir das informações indicadas neste artigo, observando, quanto
ao seu uso, as disposições da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990."
"Evidentemente, a ................ não vem obedecendo as normas de defesa do
consumidor no que pertine ao uso do cadastro de seus clientes, porque os cede
graciosamente às Prefeituras, para fins tributários.Já o art. 67, parágrafo
único, da mesma Portaria DNAEE n. 466/97 diz que:
"Parágrafo único. Fica também facultado ao concessionário, mediante acordo com
consumidor, incluir na conta, de forma discriminada, a cobrança de outros
serviços, observado o disposto no parágrafo primeiro do artigo 76."Como inexiste
qualquer acordo com os seus consumidores, a ................ não pode incluir na
conta de consumo a cobrança de serviço e muito menos de um tributo
inconstitucional.
Ademais, quanto à suspensão do fornecimento de energia elétrica, o ato normativo
determina que:
"Art. 76. O concessionário, mediante prévia comunicação ao consumidor, poderá
suspender o fornecimento:
I - por atraso no pagamento da conta, após o decurso de 10 (dez) dias de seu
vencimento;
II - por atraso no pagamento de encargos e serviços relativos ao fornecimento de
energia elétrica prestados mediante autorização do consumidor; (...)§ 1º O
disposto no inciso I deste artigo só se aplica no caso do não pagamento dos
serviços de energia elétrica prestados.
"Em nenhum dos incisos desse artigo há previsão legal de corte ou suspensão do
fornecimento de energia em razão do inadimplemento de tributos."
Aliás, após a leitura do inciso II e do §1º do art. 76, fica claro que somente o
atraso de "encargos e serviços relativos ao fornecimento de energia elétrica
prestados mediante autorização do consumidor" podem dar causa à suspensão do
serviço.
O não pagamento de tributos como a TIP não pode dar causa a essa suspensão.
No entanto, não é o que vem ocorrendo, porque os consumidores da
................ sequer têm o direito de não pagar a TIP incluída nas contas,
embora tal tributo seja inconstitucional.
A propósito, em 10 de março de 1999, o STF decidiu de forma unânime, ao julgar
os recursos extraordinários n. 231.764-RJ e 233.332-RJ, que a taxa de iluminação
pública é inconstitucional, porque o "serviço de iluminação pública não pode ser
remunerado mediante taxa, uma vez que não configura serviço público específico e
divisível". Foi relator o Min. ILMAR GALVÃO, referindo-se à TIP instituída pelo
Município de Niterói-RJ (noticiado no Informativo STF n. 141/99).
SOBRE A VIABILIDADE DA AÇÃO - A presente ação coletiva é viável para a obtenção
do provimento judicial que se almeja.O art. 129, inciso III, da Constituição
Federal relaciona entre as funções institucionais do Ministério Público a de
"promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos", além de "exercer outras funções que lhe forem conferidas" (inciso
IX).Já o art. 25, inciso IV, alínea a, da Lei Federal n. 8.625/93, diz
expressamente que compete "ao Ministério Público promover o inquérito civil e a
ação civil pública na forma da lei para proteção, prevenção e reparação dos
danos causados (...) ao consumidor (...)".O art. 51, §4º, do CDC, determina que
"É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao
Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de
cláusula contratual que contrarie o disposto neste Código ou que de qualquer
forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes".
O art. 81, parágrafo único, incisos II e III, do Código de Defesa do Consumidor,
estatui que a defesa coletiva dos interesses dos consumidores será exercida
quando se tratar de "interesses ou direitos coletivos" e "interesses ou direitos
individuais homogêneos", ficando estabelecida nos arts. 82, inciso I; 83; 91 e
92 do CDC a legitimidade do Ministério Público para a defesa de tais interesses.
Não há assim como opor qualquer preliminar de ilegitimidade ativa à atuação do
Ministério Público na defesa dos consumidores da .................
Permite o §3º do art. 84 do CDC que "Sendo relevante o fundamento da demanda e
havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz
conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu".
Este é o caso dos autos.Nagib Slaib Filho, em artigo publicado nas Seleções
Jurídicas de ADV-COAD, de dezembro de 1995, ensina que através da tutela
antecipatória "busca-se, antes do final do processo, antecipar a decisão final,
de forma a vencer os efeitos deletérios que pudessem advir da longa espera até o
dia do trânsito em julgado ou do esgotamento das providências de
execução".Tratando dos pressupostos do instituto, o professor da UFF, citando
José Eduardo Carreira Alvim, esclarece que "Prova inequívoca é a que não pode
admitir, razoavelmente, mais de um significado; é a que apresenta um grau de
convencimento tal que, a seu respeito, não possa ser oposta qualquer dúvida
razoável, ou, em outros termos, cuja autenticidade ou veracidade seja provável".
A documentação que instrui a ação é essa prova inequívoca de que a inclusão da
TIP nas contas de consumo é abusiva.Nagib Slaib Filho ensina que o requisito da
verossimilhança impõe que a alegação tenha a aparência de verdadeira, indicando
a probabilidade de o requerente ser o vencedor da lide. Em suma, é o fumus boni
juris ou a aparência do alegado direito.
Esse segundo elemento, a plausibilidade do direito substancial invocado, exsurge
da própria postulação, em vista da extensa coletânea de legislação trazida à
colação.
O fundamento da demanda é relevante. Isto é inegável. Já os prejuízos aos
consumidores são de difícil reparação, porque poderão ficar sujeitos à prática
abusiva da ................ até decisão final, em última instância, sendo
submetidos a ônus indevido e sendo desrespeitados em sua relação de consumo com
a ré, que monopoliza o fornecimento de energia elétrica no município, embora o
faça mediante concessão.À vista disso, pede o Ministério Público a antecipação
parcial da tutela, inaudita altera pars, para que a ré seja proibida de ceder,
fornecer ou vender o cadastro de seus consumidores a terceiros, sem autorização,
e de incluir a taxa de iluminação pública nas contas de energia elétrica de seus
consumidores, declarando-se abusivas e nulas de pleno direito tais práticas.
DOS PEDIDOS
Ex positis, o Ministério Público requer a citação da suplicada, na pessoa de seu
representante legal, para, querendo, contestar a presente ação, sob pena de
revelia, com final procedência da postulação, para que se torne definitiva a
antecipação da tutela, determinando-se à ................ que não inclua a taxa
de iluminação pública nas contas de consumo de energia, nem ceda ou venda a
terceiros, sem autorização prévia, o cadastro de seus consumidores.
O Parquet requer também a declaração de abusividade e de nulidade de pleno
direito das práticas ora atacadas, bem como a condenação da ré a pagar
indenização por perdas e danos (art. 84, §2º), em valor equivalente à
arrecadação total da TIP, desde o início da cobrança da taxa até a decisão
final, e ainda:
1. Para a hipótese de descumprimento das obrigações de não fazer acima
indicadas, o Ministério Público requer, com base no art. 11, da Lei de Ação
Civil Pública e no art. 84, §4º, do CDC, a cominação à ré e aos seus
representantes legais de multa diária no valor de R$........., sem prejuízo da
responsabilidade criminal dos gestores;
2. Com base no art. 95 da Lei n. 8078/90, a condenação da ré pelos danos
patrimoniais e/ou morais causados aos consumidores de energia elétrica: pela
cessão indevida do cadastro dos clientes, pela ilegal inclusão da TIP nas contas
de energia, e pela cobrança casada, apurando-se em execução as quantias que a
empresa deverá pagar a cada um dos lesados, acrescidas dos consectários legais;
3. Desde já, a expedição de edital, a ser publicado no Diário do Poder
Judiciário e divulgado pela mídia, para que os interessados possam, se
desejarem, intervir no feito como litisconsortes (art. 94 da Lei n. 8.078/90),
com vistas ao ressarcimento dos danos individualmente suportados; e
4. A inversão do ônus da prova, com fundamento no art. 6º, inciso VIII, do CDC,
porque são verossímeis as alegações apresentadas, e o Parquet, embora seja uma
instituição, atua como substituto processual dos consumidores lesados.
5. A condenação da ré ao pagamento das custas processuais;
6. Que os valores decorrentes da condenação e da aplicação de multa sejam
revertidos para o Fundo Municipal de Defesa do Consumidor de ................;
7. A produção de todas as provas em direito admitidas, em especial o depoimento
do representante legal ou do gerente regional da ré, oitiva de testemunhas,
realização de perícias e juntada de documentos.Dá-se à causa, por estimativa, o
valor de R$1.000.000,00 (hum milhão de reais).
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]