Ação civil pública interposta contra planos de saúde
que restringem acesso cirúrgico.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIO DO
.....
(Processo nº .....)
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República que esta subscreve,
vem, com fundamento no disposto no artigo 129, III da Constituição Federal e nos
dispositivos da Lei nº 7.347/85, ajuizar a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA
Em face de
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., ....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º
....., com sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado
....., CEP ....., ....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ
sob o n.º ....., com sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade .....,
Estado ....., CEP ..... e ....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no
CNPJ sob o n.º ....., com sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade
....., Estado ....., CEP ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir
aduzidos.
DOS FATOS
1. SINOPSE
Instaurou-se em .... do corrente ano no âmbito do ofício do consumidor da .....,
em virtude de representação da consumidora...., o procedimento tombado sob nº
...., para investigação de possível violação a direitos dos consumidores de
serviços oferecidos pelas empresas operadoras de planos/seguro de saúde.
A representante alegou, em síntese, que possuía plano de saúde da co-ré .....,
assegurando-lhe a realização de procedimento cirúrgico refrativo de ....,
independentemente do grau, e que, após realizar todos os exames pré-operatórios,
teve seu pedido de autorização para cirurgia de correção de ..... negado, ao
argumento de existir uma "lei" da AUTARQUIA FEDERAL, dispondo que os planos só
estavam obrigados a custear cirurgias refrativas para ..... (Doc.....). A esta
representação somaram-se a da Sra. ...., ainda contra a .... (Doc....), do Sr.
....., de ... ( Doc....) contra a co-ré .....e da Sra. ....., de ....
(Doc.....), contra a co-Ré ....., todas narrando o mesmo fato.
Visando instrumentalizar o referido procedimento foi expedido ofício para a
Autarquia federal, inquirindo-se sobre eventual edição de atos normativos de sua
parte ou outro órgão público que considerassem meramente estéticas cirurgias
refrativas para a correção de .... e quais critérios médicos técnicos foram
utilizados para a edição de tal norma.
Em sua resposta, sem enfrentar a questão dos critérios técnicos utilizados para
subsidiar sua atuação prestou os seguintes esclarecimentos, através de seu
Memorando nº .....
Até essa revisão, os beneficiários dos planos de assistência à saúde, só
contavam com a obrigatoriedade do procedimento ....., procedimento considerado
obsoleto, não mais sendo realizado nos melhores centros .... do mundo.
Com isso, os beneficiários que possuíam ....., continuavam descobertos com
relação aos procedimentos cirúrgicos para sua correção.
"Visando dar cobertura a estes beneficiários, foi incluído a cirurgia refrativa
para ...., considerando como estético o procedimento quando indicado para grau
inferior a ..... Esta (sic) decisão foi obtida por consenso das entidades ali
representadas". (grifou-se)
Também se oficiou para as operadoras de planos de saúde representadas
solicitando esclarecimentos sobre o fato objeto de investigação. Em suas
respostas, todas aduziram estar cumprindo resolução da AUTARQUIA FEDERAL.
Com o objetivo de complementar a instrução do procedimento e ampliar o alcance
da investigação, foram expedidos ofícios aos demais operadores dos planos de
saúde, solicitando fosse informado se estavam limitando a autorização de
cirurgias refrativas a consumidores com .....
Respondendo ao requisitado, quase todas as operadoras afirmaram estar limitando
tais autorizações em cumprimento à regulamentação expedida pela AUTARQUIA
FEDERAL, à exceção da ...., cujo procedimento é de autorizar a realização do
procedimento cirúrgico para qualquer ...., desde que, uma análise técnica
descarte a cirurgia estética e ...., cujo procedimento é o de autorizar a
cirurgia para qualquer ...., cuja indicação fica a critério exclusivo do
profissional médico.
DO DIREITO
1. DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MPF
Assim dispõe o artigo 129, III da Constituição Federal de 1988:
"São funções institucionais do Ministério Público:
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos;"
Nesse sentido também determina a Lei Complementar nº 75/93 em seus artigos 5º,
inciso V "a" e 6º, inciso VIII, in verbis:
"art. 5º - São funções institucionais do Ministério Público da União:
V - Zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos serviços de
relevância pública quanto:
a. aos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às ações e aos
serviços de saúde e à educação;" (grifou-se).
A iniciativa deste órgão ministerial para a proteção dos direitos do consumidor
recebe também a chancela da Lei nº 8.078/90 que em seus artigos 82, inciso I e
90 prevê a possibilidade de ajuizamento de ação civil pública pelo Ministério
Público que, nesse caso, atuará na qualidade de substituto processual,
defendendo em nome próprio interesse alheio.
Ademais, a ação arrosta ato normativo de efeito concreto da autarquia federal
Autarquia federal, de reflexos nacionais em desfavor do consumidor, o que
legitima a atuação deste órgão ministerial, nos termos do artigo 109, inciso I
da Carta Magna.
2. DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
A competência da Justiça Federal é indiscutível nos termos do artigo 109, I da
Constituição Federal, uma vez que figura no pólo ativo o Ministério Público
Federal , órgão da União e que, dessarte, possui foro na Justiça Federal.
Nesse sentido a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça no CC nº 4.927-0/DF,
Relator Min. Humberto Gomes de Barros, in DJ de 04.10.1993, pág. 20482, em
acórdão que assim restou ementado:
PROCESSUAL - MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - PARTE - COMPETÊNCIA - JUSTIÇA FEDERAL.
Se o Ministério Público Federal é parte, a justiça federal é competente para
conhecer do processo.
No mesmo diapasão o Pleno do Supremo Tribunal Federal que, no julgamento do RE
228955-9/RS, DJ de 14.04.2000, pág. 56, à unanimidade reconheceu a justiça
federal como competente para julgar as causas aforadas pelo Ministério Público
Federal.
Por outro lado, no pólo passivo da presente ação civil pública, se encontra uma
autarquia federal com competência de atuação em todo o território nacional.
Dessarte, indiscutível a competência desse juízo federal para julgamento da
presente ação civil pública, quer em razão da pessoa quer em razão da matéria.
3. DO DIREITO DA OFENSA AO PRINCÍPIO DA IGUALDADE
O artigo 5º caput da Constituição Federal dispõe sobre o direito geral à
igualdade ao enunciar que todos são iguais perante à lei sem distinção de
qualquer natureza. Não é mais objeto de controvérsia doutrinária ou
jurisprudencial que este mandamento se dirige não apenas ao aplicador da lei mas
também ao seu formulador. O mandamento da igualdade na formulação do direito
exige, portanto, que todos sejam tratados isonomicamente pelo Legislador.
Mas o que significa esse mandamento isonômico dirigido ao legislador? Com
certeza não pode significar que o legislador deva colocar todas as pessoas na
mesma posição jurídica ou que deva tratar iguais apenas aqueles que possuam as
mesmas circunstâncias naturais ou se encontrem na mesma situação fática. Tal
conceito de igualdade conduziria a situações absurdas, disparatadas e injustas.
Assim, o legislador pode discriminar os que cometem crimes dos que não cometem,
para o fito de apenar apenas os primeiros, mas não os últimos; ou taxar de forma
distinta os contribuintes levando em consideração sua capacidade contributiva,
sem que tais discriminações causem qualquer arranhão ao princípio isonômico.
Derradeiramente, o descrimine adotado poderia se justificar à base da distinção
entre procedimento de baixa e alta complexidade. Essa argumentação também restou
derruída pelas informações prestadas pela que esclareceu que a técnica
cirúrgica, o preparo e os cuidados são rigorosamente os mesmos para os pacientes
com grau reduzido ou mais agudo de ....
Evidencia-se, portanto, que a discriminação ao restringir como procedimento
básico a cirurgia ....., é arbitrária.
4. INCONSTITUCIONALIDADE E INEFICÁCIA DA LIMITAÇÃO DOS EFEITOS DA COISA JULGADA
AOS LIMITES DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL DO ÓRGÃO PROLATOR (ART. 16 DA LEI Nº
7.347/85, ALTERAÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI Nº 9.494/97) NA TUTELA JURISDICIONAL
DOS INTERESSES E DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
A novel redação do art. 16 da LACP (Lei da Ação Civil Pública), que procurou
restringir os efeitos da sentença aos "limites da competência territorial do
órgão prolator" é ineficaz e inconstitucional pelos seguintes fundamentos.
Restringir a amplitude dos efeitos da coisa julgada nas ações coletivas a uma
pequena parcela (ocorridas dentro de determinado território) das relações entre
autor (sociedade) e réu contraria frontalmente a política constitucional de
defesa dos interesses e direitos difusos, além de ofender o princípio
constitucional da universalidade da jurisdição e do acesso à justiça.
5. DO PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA
A Lei n.º 8.952, de 13 de dezembro de 1994, conferiu nova redação ao artigo 273
do Código de Processo Civil, no sentido de possibilitar a antecipação dos
efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, verbis:
"Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou
parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que,
existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito
protelatório do réu." (grifos nossos).
Os dois critérios gerais eleitos pelo legislador para a antecipação de tutela
são, portanto, como dispõe a lei processual: prova inequívoca e verossimilhança
do alegado. Comentando esses requisitos, o Juiz Federal Teori Albino Zavascki
pondera que:
"Atento, certamente, à gravidade do ato que opera restrição a direitos
fundamentais, estabeleceu o legislador, como pressupostos genéricos,
indispensáveis a qualquer das espécies de antecipação da tutela, que haja (a)
prova inequívoca e (b) verossimilhança da alegação. O fumus boni iuris deverá
estar, portanto, especialmente qualificado: exige-se que os fatos, examinados
com base na prova já carreada, possam ser tidos como fatos certos. Em outras
palavras: diferentemente do que ocorre no processo cautelar (onde há juízo de
plausibilidade quanto ao direito e de probabilidade quanto aos fatos alegados),
a antecipação da tutela de mérito supõe verossimilhança quanto ao fundamento de
direito, que decorre de (relativa) certeza quanto à verdade dos fatos. Sob esse
aspecto, não há como deixar de identificar os pressupostos da antecipação da
tutela de mérito, do art. 273, com os da liminar em mandado de segurança: nos
dois casos, além da relevância dos fundamentos (de direito), supõe-se provada
nos autos a matéria fática. (...) Assim, o que a lei exige não é, certamente,
prova de verdade absoluta, que sempre será relativa, mesmo quando concluída a
instrução, mas uma prova robusta, que, embora no âmbito de cognição sumária,
aproxime, em segura medida, o juízo de probabilidade do juízo de verdade"
(Antecipação da Tutela, editora Saraiva, São Paulo, 1997, fls. 75-76,
destacamos).
No caso ora posto sub judice, todos os requisitos exigidos pela lei processual
para o deferimento da tutela antecipada encontram-se reunidos.
A verossimilhança da alegação decorre da própria certeza relativa aos fatos. O
fumus boni iuris encontra-se igualmente presente, assentado sobre os argumentos
jurídicos que apontam para cristalina violação do princípio da igualdade.
O perigo do dano irreparável também existe. Diz o artigo 84 da lei 8.078/90,
aliás, nos mesmos termos do artigo 461 do Código de Processo Civil, que havendo
justificado receio de ineficácia do provimento final pode o juiz conceder a
tutela antecipada. Ora, o periculum in mora é notório, na medida em que os
consumidores dos serviços da saúde prestados pelas operadoras Rés não estão
conseguindo obter autorização para a realização do procedimento cirurgia .....,
alguns dos quais inclusive com previsão contratual para esse tipo de
procedimento, lesionando inquestionavelmente seus direitos.
Impor a esses consumidores, cuja deficiência funcional lhes acarreta extremo
gravame e sofrimento, o término da ação judicial para o gozo de seu direito
seria manter, por prazo indefinido, a situação de injustiça e de violação aos
seus direitos fundamentais.
DOS PEDIDOS
Destarte, em face de todo o exposto nesta exordial, e com supedâneo no art. 273
e §§ 1º e 2º e art. 461 e §§ 3º e 4º do CPC, c/c os arts. 12 e 19 da Lei n.º
7.347/85 e 84 do Código de Defesa do Consumidor, REQUER o Ministério Público
Federal se digne Vossa Excelência a conceder, decisão liminar inaudita altera
pars, de abrangência nacional, nos seguintes termos:
I) Seja declarada, incidenter tantun, a ilegalidade e inconstitucionalidade, por
ofensa ao princípio da isonomia, da restrição contida no anexo à...., na parte
em que restringe como procedimento cirúrgico referencial básico, a cirurgia
.....;
II) determine as empresas operadoras de planos de saúde Rés (obrigação de fazer)
que forneçam, com ou sem previsão contratual, cobertura integral para o
procedimento cirúrgico de ...., independentemente do grau de ....., desde que
haja indicação médica para o ato cirúrgico, sob pena de pagamento de multa
diária de R$....por cobertura negada;
III) determine à autarquia federal (obrigação de fazer) para que no prazo de 15
(quinze) dias, altere a RDC nº ...., excluindo a exigência mínima de ..., para
fruição do procedimento básico referencial de cirurgia ...., dando ciência a
todas as operadoras de planos de saúde e juntando aos autos cópia da nova
resolução, sob pena de multa de R$...., por dia de atraso no cumprimento;
IV) considerando que a autarquia não está autuando as operadoras que negam
cobertura para cirurgias ...., seja determinado à Autarquia que, no exercício de
suas funções administrativas previstas na lei que a instituiu, concedida a
medida liminar prevista no item II, passe a fiscalizar e autuar
administrativamente as operadoras de planos de saúde que negarem cobertura aos
procedimentos de cirurgias refrativas ao argumento de ser a ..... e dar imediata
ciência dessas autuações ao autor desta ação, para as devidas providências
judiciais contra os recalcitrantes, sob pena de multa diária de R$ ......
Diante o exposto, requer ainda o Ministério Público Federal:
1. a citação da autarquia federal, na pessoa de seu Procurador Autárquico
representante, e as demais Rés, nas pessoas de seus representantes legais, nos
endereços que constam de suas qualificações, para, querendo, contestar a
presente ação e acompanhá-la em todos os seus termos, até final procedência, sob
pena de revelia e confissão;
2. seja julgada procedente a pretensão ora deduzida, para o fito de declarar a
nulidade da restrição de exigência de .... para configuração de cirurgia ....
como procedimento básico referencial, condenar as Rés a efetuar, para todos os
consumidores portadores de ... de que grau for, a cobertura desse procedimento,
independentemente de previsão contratual, confirmando e tornando definitivos
todos os pedidos efetuados em sede de tutela antecipada, com a condenação das
Rés nas obrigações ali descritas;
3. A condenação das Rés ao pagamento das verbas de sucumbência;
Protestando por todo gênero de prova em direito admitido, com expresso
requerimento de concessão do direito de inversão ao ônus da prova a favor do
consumidor, nos termos do artigo 6º, inciso VIII do CDC.
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]