Impetração de mandado de segurança, sob alegação de falta de nomeação em concurso público de pessoa portadora de deficiência física.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA .... VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE
.... - ESTADO DO .....
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência impetrar
MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR
em face de
ato do Sr. ....Presidente da .... Telecomunicações do ...., sociedade de
economia mista, estabelecida à Av. ...., nº .... na Comarca de ...., o que
efetivamente faz com fundamento no disposto pelo inc. LXIX, do art. 5º da
Constituição Federal e no art. 2º da Lei nº 1.533/51, pelos motivos de fato e de
direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
A impetrante prestou concurso público para exercer a função de ...., para a
Comarca de ...., perante a autarquia .... Aquela possui deficiência ...., fato
este, comunicado no momento da inscrição, inscrevendo-se na categoria que a Lei
ampara. Soube de sua aprovação em .... de .... de ...., data esta que saiu a
publicação em jornal circulante, conforme docs. anexo.
Observou-se que tanto na edição do jornal, como também no comunicado enviado
pela ...., a classificação apresentada é a geral, ou melhor, a impetrante foi
classificada juntamente com os demais candidatos "normais", o que não é lícito,
sendo que no próprio edital de 30/12/94, item 9.3, estava exposto que:
"Os candidatos portadores de deficiência serão também classificados por ordem
decrescente de total de pontos obtidos, em lista de classificação por
cargo/região, Distinta dos Demais Candidatos."
Determinação esta que não foi publicada pelos organizadores do concurso.
Houve divergência e erro na classificação dos cadastrados, a qual o edital
dispusera, sendo confeccionada lista única inobservando a organização do próprio
concurso, além dos dispositivos legais que asseguram o direito do deficiente
físico em ser tratado da mesma forma aprovado na proporção de 5% dos candidatos,
devendo ser prioritária a chamada para diferenciada, conforme está o exposto
fundamentado na lei.
Sabe-se que a impetrante foi a .... colocada entre os deficientes, informação
esta não formalizada, mas possível em virtude de fotocópia de uma lista que
somente a instituição possui, que no presente momento junta-se documentos para
provar o alegado.
DO DIREITO
No preâmbulo da Carta Magna está disposto:
"Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional
Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o
bem-estar, o desenvolvimento, a Igualdade e a Justiça como Valores Supremos de
uma Sociedade Fraterna, Pluralista e sem Preconceitos, fundada na armonia
social..."
Claro percebe-se que para a impetrante estes princípios motivadores da
promulgação da Constituição Federal, não foram observados como também o disposto
de seu art. 1º:
"A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito
e tem como fundamentos:
(...)
III - A dignidade da pessoa humana;
IV - Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa."
E ainda em seu art. 3º dispõe que:
"Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - Constituir uma sociedade livre, justa e solidária...
(...)
IV - Promover o bem-estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e qualquer outras formas de discriminação."
Preceitos basilares da Carta Magna não estão sendo respeitados pela impetrada,
não permitindo a aprovação da impetrante, como também não divulgando sua
colocação comparada em relação àqueles que também são portadores de deficiência.
Infringe a impetrada o disposto no edital, conforme acima já aludido, como
também vários fundamentos, além dos já expostos, também o art. 5º, pois todos
são iguais perante a lei, dentro dos limites desta igualdade, pois o tratamento
deve ser igual para os iguais, e desigual para os desiguais.
A maior agressão ao ser humano é sem dúvida alguma, a discriminação, e a
impetrante como os demais deficientes físicos vêm sofrendo sem nenhum amparo de
fato, pois a legislação existente, não está no caso dos autos, sendo respeitada,
o que autoriza a impetrante buscar a tutela jurídica do estado para fazer valer
seu direito.
Aflição de espírito é a expressão que limitadamente melhor descreve a angústia
que a impetrante possui até o resultado de sua classificação, pois vêm
constantemente recebendo um Não, sempre sem explicações positivas, quando
procura um trabalho, e mais uma vez esta discriminação faz valer a hipocrisia
que maculam a sociedade.
Sofre a impetrante as dores desmedidas da discriminação, não em um aspecto
econômico, mais moral, psicológico. Sofrimento estes, que se constituem o maior
patrimônio do ser humano, onde as lesões se acentuam com maior intensidade,
variável de pessoa a pessoa. Certamente o deficiente físico sofre perseguições e
discriminações em razão da deficiência que por si só já lhe causa dor.
A Constituição Federal em seu art. 37, VIII, dispõe que:
"A lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas
portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão..."
Notadamente não foi totalmente observado pela impetrada esta norma, pois além de
não divulgar a lista específica aos deficientes, deixou muito vago quais dos
cargos poderiam ser exercidos por deficientes e qual o tipo de deficiência
aceita para determinados cargos.
Não poderá a impetrante ficar a mercê dos descuidos de organização e até do
desrespeito legal, pois é direito seu constitucionalmente garantido, merecendo
ser respeitado pela impetrada.
A proporção a ser ocupada por deficientes é definida em 5% (cinco por cento),
como observa-se pelo edital em seu item 9.4:
"A cada vinte vagas a serem preenchidas por cargo/região, a vigésima será
destinada a um deficiente, desde que já não o tenha sido pela classificação..."
Também a Lei nº 7.875 de 02/07/84, em seu inciso II, art. 16, dispõe que:
"Os órgãos compreendidos na Administração Indireta são obrigados a, com
prioridade, empregar pessoas com deficiência, ocupando-se no percentual mínimo
de cinco por cento de seu quadro permanente de empregados ou servidores técnicos
e administrativos, dando-lhes atividades adequadas à sua condição."
É clara a determinação legal, pois o emprego de pessoas deficientes é
prioritário àquelas pessoas chamadas normais, devendo, portanto, ser chamado em
primeiro lugar o deficiente em proporção de 5% e posteriormente os demais
classificados.
A mesma Lei nº 7.875/84 em seu art. 19, parágrafo único, acrescenta que:
"Na falta de candidato, a entidade empregadora poderá preencher a vaga com
emprego não reservado, fazendo-se compensação oportunamente."
Reflete o exposto que não é um dever legal da impetrada, claramente exigido
pelas normas, sendo estas então cogentes e, portanto, deverão ser obedecidas sob
pena de violação de direitos.
Mesmo sendo aprovada não foi chamado para assumir a vaga de ...., que estava
explícito no edital. Tanto quanto este a impetrante teve seu direito frustado
pela desídia da impetrada.
E, caso inexistente a vaga para o cargo da impetrante, conforme exposto na norma
supra referida, deverá preencher a vaga em outro cargo, fazendo-se, portanto, a
compensação exigida por lei.
No ato da inscrição declinou a impetrante portadora de deficiência ...., e por
esta razão prestou o concurso para o cargo de ...., pois para exercício da ....,
seja ...., organizar ...., efetuar ...., e vários outros está apta a realiza-lo
igual, e especialmente na área de ...., quem sabe ainda, melhor que pessoas que
possuem .... normal, sabendo-se que a capacidade produtiva é maior que os
chamados normais exatamente para suprir tal deficiência, fato este, comprovado
cientificamente. Mesmo assim nada impede que seja transferida para outro cargo,
se necessário for, para que assim possa exercer uma atividade compatível com sua
deficiência.
A impetrada exerce atividade delegada pelo estado, como é sabido, conforme
Constituição Federal art. 21, XI, então por ser uma delegação mantém a sua
titularidade, sendo somente a substituída pela impetrada, devendo-se
conseqüentemente reger-se o concurso desta sociedade de economia mista pelas
normas pertinentes ao direito público.
Carlos Ari Sundfeld, em sua obra "Fundamentos de Direito Público", Editora
Malheiros, pág. 75, dispõe que:
"A afirmação de que o Estado, em dadas hipóteses, submete-se ao direito privado,
há de ser tomada com cautelas. Mesmo ao desenvolver atividades econômicas, o
ente governamental deve observar algumas normas típicas do direito público, como
as de licitação, concurso público para seleção de empregados, controle do
tribunal de Contas e outras mais. O Estado, como um Midas, publiciza tudo o que
toca."
Presente no feito está o requisito do periculum in mora consubstanciado no fato
de que a decisão da impetrada acarretou e acarreta à impetrante, prejuízos de
elevada monta, já que privou-a da nomeação para a função de ...., por
discriminação física, fincando impedida de obter rendimentos para a subsistência
em razão de ter despesas inerentes a todos, como àquelas referentes ao pagamento
de taxas para inscrição e cursos para a realização do referido concurso.
Face ao exposto requer-se a concessão da liminar, pois demonstrado o periculum
in mora e o fumus boni iuris, a fim de determinar a chamada e posterior nomeação
da impetrante na função para qual prestou e foi aprovada no concurso público, ou
até outro cargo, posto que patente a discriminação relatada.
O inciso II, do art. 7º, da Lei nº 1.533, de 31.12.1951, estabelece os
pressupostos para a concessão de liminar, quais sejam:
"A relevância do direito invocado e a ineficácia da medida se deferida somente
ao final."
O primeiro requisito, à evidência, está totalmente caracterizado, face as razões
até então expedidas, que demonstram a existência do direito líquido e certo da
impetrante.
O segundo requisito, por seu turno, também está configurado, pois, a impetrada,
caso ultrapasse os seis meses de validade do concurso, poderá realizar outro,
sendo as vagas preenchidas por outras pessoas, mesmo que deficientes,
tornando-se ineficaz a medida, além do que, por não ter sido chamada, não está
recebendo os devidos proventos do exercício profissional que legalmente já
deveria estar realizando, deixando de auferir o devido salário.
Sujeitando-se a impetrante ao ato impetrado, teria que, posteriormente, recorrer
ao judiciário, através de ação ordinária de indenização por perdas e danos e
lucros cessantes, com a qual jamais conseguiria o ressarcimento da totalidade
dos prejuízos sofridos.
Em havendo a coexistência dos pressupostos ensejadores da liminar, a sua
concessão é obrigatória, consistindo em ato vinculado do Juiz, e não mera
liberalidade da Justiça. A respeito do tema em foco, é oportuno a lição do
festejado administrativista Hely Lopes Meirelles:
"Para a concessão da liminar devem concorrer os dois requisitos legais, ou seja,
a relevância dos motivos em que se assenta o pedido na inicial e a possibilidade
da ocorrência de lesão irreparável ao direito do impetrante, se vier a ser
reconhecido na decisão de mérito. A medida liminar não é concedida como
antecipação dos efeitos da sentença final; é procedimento acautelador do
possível direito do impetrante, justificado pela iminência de dano irreversível
de ordem patrimonial, funcional ou moral, se mantido o ato coator até a
apreciação definitiva da causa. Por isso mesmo, não importa em prejulgamento;
não afirma direitos; nem nega poderes à Administração. Preserva, apenas, o
impetrante de lesão irreparável, sustando provisoriamente os efeitos do ato
impugnado.
A liminar não é uma liberalidade da Justiça; é medida acauteladora do direito do
impetrante, que não pode ser negada quando ocorrem os seus pressupostos, como
também não deve ser concedida quando ausentes os requisitos de sua
admissibilidade." (in "Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública,
Mandado de Injunção e 'Habeas-Data'", 12ª Edição RT, pág. 50).
Quando não publicou a devida lista de classificação individual para os
deficientes, deixou uma lacuna, prejudicando a ora impetrante.
Por tratar-se de pessoa pobre na pura acepção jurídica da palavra, não possuindo
condições para suportar as custas processuais, requer o benefício da Lei nº
1.060/50.
DOS PEDIDOS
Nestas condições, diante do que se expôs, além do que certamente será suprido
com o notório saber jurídico de Vossa Excelência, requer seja recebido o
presente mandamus, requerendo ainda digne-se em conceder Medida Liminar inaudita
altera pars, determinando à Autoridade Coatora, a nomeação da impetrante para
assumir a função de ...., pois está apta, ou alternativamente, exercer outro
cargo que esteja qualificada, conforme exposto, a fim de que não se afete
moralmente a impetrante ao ver seu direito mais uma vez desprezado pela sua
deficiência física.
Requer, outrossim, após a manifestação do Ministério Público, seja, por
sentença, confirmada a liminar concedida, tornando ineficaz os efeitos da
classificação indevida, sendo a impetrante declarada nomeada, exercendo seu
direito líquido e certo ao exercício do cargo.
Requer, ainda, seja notificada a Autoridade Coatora, a fim de que preste
informações do número de aprovados e vagas destinadas aos deficientes, e para
que se abstenha de praticar quaisquer outras aprovações, até que a impetrante
tenha seu direito garantido.
Ainda, requer-se o benefício da justiça gratuita, por ser a impetrante pessoa
desempregada e não possuir recursos, de acordo com a lei nº 1.050/60.
Dá-se à causa o valor de R$ ......
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]