Contestação à reclamatória trabalhista sob alegação de
que a reclamante jamais trabalhou para o reclamado.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA .... VARA DO TRABALHO DE ..... ESTADO DO
.....
AUTOS Nº .....
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., por intermédio de seu advogado (a) e bastante
procurador (a) (procuração em anexo - doc. 01), com escritório profissional sito
à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe
notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa
Excelência apresentar
CONTESTAÇÃO
à reclamatória trabalhista proposta por ....., pelos motivos de fato e de
direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
Da ilegitimidade passiva "ad causam"
A Reclamante intentou a presente reclamação em face dos Requeridos alegando ter
sido admitida pelos mesmos em .../.../... na função empregada doméstica,
percebendo salário fixo e mensal de R$ ........... à época da rescisão
contratual. Afirma, ainda, que fora demitida sem justa causa em .../.../..., sem
que durante todo o vínculo laboral tivesse a sua CTPS anotada, bem como as suas
verbas resilitórias quitadas.
Ao final, além do pedido de anotação da CTPS no período acima mencionado,
reclama a condenação solidária e/ou subsidiária dos Reclamados no pagamento de
consectários legais que julga devidos.
Não obstante as alegações postas na peça inicial, cumpre destacar de plano a
ilegitimidade passiva ad causam dos Requeridos, vez que jamais contrataram a
Autora com vistas à prestação de serviços de empregada doméstica e tampouco lhe
efetuaram qualquer pagamento sob tal rubrica.
A verdade é que a mesma laborou, exercendo as atividades de acompanhante, na
residência da avó dos Requeridos, o que em hipótese alguma tem o condão lhes
imputar o pagamento de verbas trabalhistas.
A propósito, para a caracterização da relação de emprego é sabido que devem
encontrar-se presentes os três requisitos elencados no artigo 3º da Consolidação
das Leis do Trabalho, como sejam, serviço assalariado, mediante subordinação e
de natureza habitual. Na falta de qualquer um deles fulminada estará a pretensão
de reconhecimento do vínculo empregatício.
No caso, tendo em vista que a Autora jamais trabalhou para os Reclamados,
igualmente não recebeu em tempo algum qualquer remuneração por parte dos mesmos,
afastando a incidência do requisito salário.
Quanto à subordinação, a Autora prestava os serviços de acompanhante para a avó
dos Requeridos, a qual lhe orientava sobre as suas obrigações, sendo que os
demandados nunca emitiram qualquer determinação relativa ao seu trabalho.
Assim, nenhuma decisão foi imposta à Autora por parte dos Reclamados, os quais
somente a conheciam em decorrência das visitas que faziam à sua avó,
descaracterizando a eventual subordinação sugerida pela inicial.
De acordo com a lição de DÉLIO MARANHÃO, "caracteriza-se a subordinação na
relação de emprego, o fato de serem conferidos ao empregador os seguintes
direitos: de direção e de comando, de controle e de aplicar penas
disciplinares". (Süssekind, Arnaldo ... [et al.]. Instituições de Direito do
Trabalho. São Paulo: LTr, Vol. I, 17ª ed., 1997. p. 249).
No mesmo sentido, para VALENTIN CARRION "a subordinação do empregado às ordens
do empregador (colocando à disposição deste sua força de trabalho) de forma não
eventual é a mais evidente manifestação da existência de um contrato de emprego;
o poder disciplinar é-lhe inerente." (in, Comentários à consolidação das leis do
trabalho. São Paulo: Ed. Saraiva, 22ª ed., 1997, p. 36).
Ora, na situação debatida nos autos, salta aos olhos que os Requeridos nunca
exerceram referidos direitos.
E, por derradeiro, o último requisito necessário à caracterização do vínculo de
emprego, a habitualidade também não restou configurada, pois as atividades
ligadas ao trabalho da Autora eram desenvolvidas na residência e em proveito da
avó dos Requeridos.
Portanto, as condições reais da prestação do serviço mostram-se direcionadas na
direção da inexistência de qualquer relação jurídica entre as partes. Quanto
mais de ordem trabalhista.
Ante o exposto, requer-se, com fulcro no artigo 267, VI do Código de Processo
Civil, aplicável subsidiariamente ao texto consolidado (C.L.T. - art. 769), seja
acolhida esta preliminar, para o fim de declarar a inexistência de vínculo
laboral entre as partes, julgando extinto o presente processo sem exame do
mérito.
DO MÉRITO
Não sendo este, entretanto, o entendimento de Vossa Excelência, o que se admite
somente para argumentar, os Reclamados, fundados no princípio da eventualidade,
passam a deduzir defesa de mérito.
1. Do salário in natura
Postula a Reclamante a integração na sua remuneração de 03 (três) refeições
diárias, no percentual de 20% (vinte por cento), diante do fato das mesmas terem
sido ofertadas durante a vigência do pacto laboral. Ademais, requer a integração
da verba nos repousos semanais remunerados, nas férias+1/3, no 13º salário e no
aviso prévio.
Ocorre que o salário in natura, também chamado de salário utilidade, destina-se
apenas a melhorar as condições de trabalho, como no caso, em que a permanência
da Autora na residência da avó dos Requeridos pelo tempo máximo possível era
fundamental, por se tratar a empregadora de pessoa idosa e que necessitava de
muitos cuidados.
Para FRANCISCO ANTÔNIO DE OLIVEIRA, comentando o Enunciado n.º 258 do TST, caso
a ajuda de alimentação seja "fornecida para o trabalho [...] não se traduzirá em
aumento de salário" (in, Comentários aos enunciados do TST. São Paulo: Ed.
Revista dos Tribunais, 3ª ed., 1996, p. 633).
Esta orientação também se pode observar nos Tribunais Superiores, verbis:
"Ajuda de custo de alimentação. A verba denominada ajuda de custo alimentação
fornecida pelo empregador não tem natureza jurídica salarial, daí não integrar a
remuneração do trabalhador." (TST - 4ª Turma - RR n.º 182.402/95.2 - Relator
Min. Valdir Righetto - Ac. n.º 3.828/96 - grifos nossos).
E, com efeito, nada mais insólito do que trabalhador que exerce suas funções no
âmbito da residência da família, venha depois requerer a integração em sua
remuneração, a título de salário utilidade, das refeições que lhe eram
oferecidas. Basta ter em mira que a natureza do labor difere substancialmente
daquele desempenhado para pessoas jurídicas, atuantes no ramo industrial ou
mesmo comercial, as quais pautam suas relações pelo profissionalismo e não por
laços fraternais que, em casos como o presente, são inevitavelmente ensejados
pelo próprio ambiente de trabalho, desenvolvido no seio familiar.
Desta sorte, é de ser indeferido este pleito.
2. Da jornada de trabalho relatada na inicial
Relatou a Autora jornada de trabalho que teria cumprido durante o pacto laboral.
Entretanto, inobstante a Autora não tenha laborado em horas extras (jornada das
08:00 às 17:00hs, com uma hora de intervalo), cumpre frisar que os empregados
domésticos não fazem jus à remuneração sob tal rubrica, exatamente porque o
parágrafo único do artigo 7º da Constituição Federal não prevê tal direito.
3. Dos repousos semanais remunerados
A despeito da Constituição Federal prever no parágrafo único do seu artigo 7º o
direito ao "repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos", a avó
dos Requeridos sempre atendeu a este comando legal, como a própria Autora
confessa na inicial, ao afirmar que "Gozava de uma folga semanal durante todo o
contrato de trabalho." (grifos nossos).
Ora, se assim é, não se afigura jurídico que venha a juízo pretendendo receber
novamente a mesma verba, razão pela qual merece ser indeferido tal pleito.
4. Das verbas rescisórias
Alega a Autora que, dispensada imotivadamente, nada recebeu até o momento a
título de verbas rescisórias, postulando sejam os Reclamados compelidos ao
pagamento: a) do aviso prévio e da sua integração ao tempo de serviço; b) das
férias proporcionais relativas a .... - 1/12 avos - acrescida do terço
constitucional; c) do 13º salário proporcional - 9/12 avos - relativo a ....; e,
d) de mais uma parcela de 1/12 avos de férias, acrescida do terço constitucional
e 1/12 avos de 13º salário por conta da integração do aviso prévio.
Ora, não tendo a Reclamante laborado para os Requeridos, evidente que os mesmos
não podem ser compelidos ao pagamento de verbas rescisórias. Impor-lhes a prova
negativa de tal fato, data vênia, não encontra respaldo no ordenamento jurídico.
Não fosse isso, a Reclamante pretende receber duas vezes a parcela referente a
1/12 avos de férias, acrescida do terço constitucional, e 1/12 avos de 13º
salário, mascarando tal pretensão sob o título de integração do aviso prévio.
Ora, a verdade é que mediante tal pleito, pretende a Autora receber em
duplicidade uma mesma verba.
Sequer a multa prevista no artigo 467 da CLT se afigura devida no caso, pois
além de não ser direito afeto à classe dos empregados domésticos (CF - art. 7º,
par. único), inexistem parcelas salariais incontroversas, tal como exige
referido dispositivo celetário.
Portanto, requer seja indeferido o pagamento das verbas rescisórias postuladas
na inicial. Na remota hipótese de assim não entender Vossa Excelência, que seja
repelido o pagamento em duplicidade da parcela referente a 1/12 avos de férias,
acrescida do terço constitucional, e 1/12 avos de 13º salário, bem como da multa
do artigo 467 da CLT.
5. Das Férias e gratificações natalinas
Sustenta a Reclamante jamais ter recebido tais verbas durante o vínculo laboral
e, em conseqüência, postula a condenação dos Reclamados no pagamento das férias
relativas do período aquisitivo de .../..., com os acréscimos legais, e do 13º
salário, integral e proporcional.
De início denota-se que a Autora formula novamente o pedido de pagamento do
décimo terceiro proporcional, não obstante já o tenha elencado quando do
requerimento de pagamento de verbas rescisórias, razão pela qual desde já se
requer a exclusão desta prestação de eventual condenação.
No mais, convém repisar que não tendo a Reclamante laborado para os Requeridos,
evidente que os mesmos não podem ser compelidos ao pagamento destas verbas.
Impor-lhes a prova negativa de tal fato, data vênia, não encontra respaldo no
ordenamento jurídico.
Desta sorte, é de ser inferido o pleito ou, alternativamente, excluído da
condenação o pagamento do décimo terceiro salário proporcional.
6. Da multa prevista nos §§ 6º e 8º do artigo 477 da CLT
Como sabido, salvo aqueles direitos elencados no parágrafo único do artigo 7º da
Constituição Federal, aos empregados domésticos não se deferem outros, como é o
caso do recebimento da multa prevista no artigo 477 da CLT.
Os Tribunais Superiores têm manifestado firme entendimento neste sentido:
"A multa cominada pelo art. 477 da CLT não é aplicável na rescisão de contrato
de emprego doméstico, porquanto não está a sanção elencada no art. 7º, parágrafo
único da CF/88, não havendo, pois, previsão legal para a sua cominação." (TST -
1ª Turma - RR n.º 191.292/95.1 - Rel. Ministra Regina Rezende Ezequiel - Ac. n.º
4.375/96).
"Não se aplica ao empregado doméstico a multa prevista no art. 477, § 8º, da
CLT; eis que esse direito não se encontra expresso no parágrafo único do art. 7º
da Magna Carta." (TST - 3ª Turma - RR n.º 132.532/94.9 - Rel. Ministro José Luiz
Vasconcellos - Ac. n.º 2.902/95).
Isto posto, na eventualidade de uma condenação, requer seja indeferido o
pagamento da multa prevista no artigo 477 da CLT.
7. Da contribuição previdenciária
Não tendo a Autora vínculo empregatício com os Reclamados, como acima
demonstrado, evidente que não há falar-se em contribuição previdenciária em
atraso.
Todavia, sobrevindo condenação, o que se admite somente para argumentar,
requerem os Reclamados seja determinado o desconto mês a mês, o que nenhum
prejuízo importará à Autora.
8. Dos honorários advocatícios
Desmerece acolhida, de igual forma, o pleito de pagamento de honorários
advocatícios, vez que continua em vigor o Enunciado 219 do Egrégio Tribunal
Superior do Trabalho.
Nesse sentido posicionam-se os tribunais, conforme se vê do acórdão unânime
relatado pelo Juiz Euclides Alcides Rocha, da 2ª Turma do Egrégio Tribunal
Regional do Trabalho do Estado do Paraná (9ª Região), no Recurso Ordinário n.º
2.862/89, publicado no DJPR em 26.06.90, p. 121:
"REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL - 'JUS POSTULANDI' DAS PARTES - CF/88 - HONORÁRIOS DE
ADVOGADO. Honorários de advogado - CF/88. O fato do art. 133, da Constituição
Federal ter determinado a indispensabilidade do advogado na administração da
Justiça, não quer dizer tenha restringido o 'jus postulandi' na Justiça do
Trabalho, exclusivamente aos advogados. Subsiste por inteiro a Lei n.º 5.584/70.
Honorários indevidos."
Vê-se, assim, que as declarações constantes da presente reclamação, além de
maliciosas, são também totalmente improcedentes e infundadas, não passando
apenas de uma tentativa ardilosa da Reclamante de obter vantagem econômica sobre
os Reclamados, que nada devem.
DOS PEDIDOS
Ante o exposto requer-se:
a) seja acolhida a preliminar suscitada para, com base no artigo 267, VI do
Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente ao texto consolidado (C.L.T.
- art. 769), para declarar a inexistência de vínculo laboral entra as partes,
julgando extinto o presente processo, sem o exame do mérito;
b) a produção de todas as provas em direito admitidas, mormente a testemunhal
cujo rol será oportunamente apresentado;
c) no mérito, seja julgada improcedente a presente Reclamação Trabalhista.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]