HABEAS CORPUS - RECURSO ORDINÁRIO - INCOMPETÊNCIA - SERVIDOR PÚBLICO
FEDERAL - CRIME de CONCUSSÃO - TRÁFICO DE INFLUÊNCIA - ART 109 CF - NULIDADE
Excelentíssimo Senhor Ministro ...........
Ilustre Membro da .....ª Turma do Superior Tribunal de Justiça
HABEAS CORPUS No. ...../....
ÓRGÃO COATOR Tribunal Regional Federal da ...ª Região
PACIENTE ...........
RELATOR Exmo. Sr. Ministro .............. - ....ª Turma
MEMORIAL
Eminente Julgador :
Sob a honrada Relatoria do Insigne Ministro ..........., tramita nessa
Colenda .....ª Turma, Habeas Corpus Substitutivo de Recurso Ordinário, impetrado
em favor de .........., pugnando pela nulidade da ação penal No ....., contra si
intentada perante o Juízo da ...ª Vara da Justiça Federal de ....., mercê de
manifesta incompetência ratione materiae.
Nessa linha, roga à liberalidade de Vossa Excelência, para, ilustrativamente,
enumerar-lhe as razões que alicerçam sua súplica:
BREVE SUMÁRIO
1. Perante o Egrégio Tribunal Regional Federal da .....ª Região, impetrou-se
Habeas Corpus em benefício do paciente; deferido, contudo, tão só para revogar o
decreto prisional, já que repelida a preliminar de incompetência do juízo.
2. No ponto, o r. Acórdão Federal assentou-se em fundamento assim ementado:
Tratando-se de crime de concussão atribuído a servidor público federal, a
competência para o processo e julgamento é do juízo federal.
3. Consigne-se que referido mandamus foi impetrado ainda na fase policial. Na
denúncia, o dominus litis entendeu que a conduta, ao contrário, se amoldava à
figura típica nominada de tráfico de influência (artigo 332 do Código Penal),
não de concussão, remanescendo, todavia, o juízo federal para processamento.
1. O paciente, entretanto, está, datíssima vênia, convencido de que o
mandamento constitucional norteador da competência da Justiça Federal (artigo
109, inciso IV), decididamente, não se ajusta à realidade fática dos autos
principais, já que não houve ofensa, direta e objetiva, ao interesse patrimonial
da União.
2. É que, se consumado o inocorrido recebimento do valor ilícito pelo
paciente, o prejuízo seria, exclusivamente, da empresa .......... A União não
sofreria nenhum gravame financeiro, pelo que não poderia ser responsabilizada a
ressarcir referida importância.
3. Justo por isso, inconformado com a parte do julgamento do writ que manteve
a competência do juízo federal para processá-lo, bate, agora, o paciente à porta
desta Colenda Corte, buscando a proclamação da nulidade da persecução penal
contra si instaurada - a partir da denúncia, inclusive - com a remessa dos autos
originais ao foro competente para prosseguimento da ação.
4. É a síntese.
DA INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
5. A denúncia (doc. ...) destaca que o paciente - a pretexto de influir junto
ao Ministério do Meio Ambiente, em favor das reivindicações da Empresa ....... -
dela teria solicitado significativa importância em dinheiro.
6. Imputa-lhe, por isso, o cometimento do crime de tráfico de influência,
abrigado no artigo 332 do Código Penal.
7. Ilícito de competência da Justiça Federal - na visão do parquet e do juízo
processante, chancelada pela 3ª Turma do Colendo Tribunal Regional Federal, 1ª
Região, que, no particular - remarque-se - denegou o writ impetrado.
8. Ocorre que - como se depreende de sua leitura - a preambular ministerial
não indica, concretamente, em que, a conduta dardejada ao paciente, teria
lesionado bens, serviços, ou interesses da União ou de suas entidades
autárquicas, na esteira do dogma constitucional regente (artigo 109, inciso IV).
9. Ora, segundo a precisa observação de Wladimir Souza Carvalho - in
Competência da Justiça Federal, Ed. Juruá, 1990, pg. 210 - " O interesse da
União deve ser parti-cular, específico e direto (Ministro Nilson Naves, HC STJ
6.819-MG, DJU 10.4.87, pg. 7.718); específico e bem delineado (Ministro Aldir
Passarinho, RFC 467-RS, DJU 18.12.78, pg. 10.274, RTFR 63/234-235.)" Sublinhei
10. Por sua absoluta pertinência, o sempre atual magistério do saudoso
Ministro Bilac Pinto (RTJ 64/611):
Quer me parecer que a fórmula constitucional referente aos "interesses da
União" deve ser interpretada como atinente apenas àqueles interesses diretos e
inequívocos da Federação como um todo homogêneo. A interpretação ampla e
extensiva do dispositivo levaria, sem dúvida, a extremos indesejáveis, já que,
por via obliqua, nenhum ilícito penal poderia ser estranho aos interesses da
União. (Sublinhei)
O PACIENTE NÃO DISCUTE QUE O SUJEITO PASSIVO DO TIPO É SEMPRE O ESTADO OU
A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
11. Ao contrário do Parecer do Custos Legis (doc. ....), a consumação do
crime - seja de concussão (enquadramento do inquérito), como de exploração de
prestígio (imputação ministerial) - porque ocorrente no momento da exigência da
vantagem indevida, sem necessidade de outro resultado - não atrai, só por isso,
a competência da justiça federal.
12. O quid, então, in casu, para efeito de delimitação do juízo, é
perquirir-se quem teria sido lesado, direta e especificamente, pela conduta
imputada ao paciente.
13. É que - como acentua o eminente Professor Paulo Klautau, em judicioso
Parecer acostado ao writ (doc. ...) - não se discute que o sujeito passivo, do
tipo apontado, seja sempre o Estado ou a Administração Pública, em seu conceito
global, dilargado. Sucede que, para que se possa ter por competente a Justiça
Federal, imprescindível, como pressuposto indispensável, que se demonstre a
lesão direta ou possibilidade de lesão a bens, serviços ou interesses da União,
suas autarquias ou empresas públicas.
14. Tanto a autoridade policial quanto o Ministério Público - prossegue o
Parecerista - dão proeminência incontroversa ao fato de que o dinheiro
apreendido, e devolvido, pertencia, EXCLUSIVAMENTE, à ..... do Brasil. Dano
patrimonial, enfim, que seria experimentado tão somente pela referida empresa;
sem nenhum prejuízo direto ao IBAMA ou ao Ministério do Meio Ambiente.
15. Invocando lição do imorredouro Heleno Fragoso, Sua Excelência arremata:
A pessoa que dá ou promete a vantagem é lesado e será sujeito passivo
secundário, embora não aja de boa fé (não faltando quem pretendesse puni-la
também). O lesado estaria praticando um crime putativo que seria o de
participação ativa. É ele que sofre o prejuízo concreto ou material, com a
vantagem obtida pelo "vendedor de fumaça".
Isto posto, dessume-se que, para definir-se a competência não basta
atentar-se somente para o tipo, mas inarredável se patenteia penetrar na
concreta apuração de quem pode sofrer o prejuízo. Grifei.
PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS
16. A Decisão prolatada, outrossim, não se perfila à pacífica orientação
dessa Egrégia Corte - refletida em iterativos precedentes - para quem
indispensável a configuração direta e objetiva da lesão ou prejuízo aos entes
públicos referidos no item IV do artigo 109 da Carta Magna.
17. Além dos precedentes invocados no Parecer emitido pelo Professor Paulo
Klautau (doc. .....) - essa Colenda Turma, no particular, firmou o entendimento
de que:
Nos termos do artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal, somente se
firma competência da Justiça Federal, quando o crime afeta diretamente bens,
serviços ou interesses da União, suas autarquias ou empresas públicas. STJ CC
21.822 - Rel. Min. Félix Fischer.
A jurisprudência desta Corte, firmou o entendimento de que em se tratando de
crime de concussão praticado contra particulares conveniados com o SUS/INAMPS, a
competência para o julgamento é da Justiça Comum Estadual. STJ HC 14.652- Rel.
Min. Jorge Scartezzini.
A possível prática de concussão por médico de hospital conveniado com o SUS
contra pacientes internados na referida instituição, consistente na cobrança de
taxas extras pela prestação de serviços médico-hospitalares, não se enquadra nas
hipóteses previstas no artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal, pois
ausente qualquer outro prejuízo a bens, serviços ou interesses da União, suas
autarquias e empresas públicas, o que torna in-competente, portanto, a Justiça
Federal para julgar e processar o feito. CC STJ 21.831 - Rel. Min. José Arnaldo.
Não ocasionando ofensa direta a bens, serviços ou interesse da União, suas
autarquias ou empresas públicas, ficando a prática delituosa circunscrita à
particulares, compete à Justiça comum Estadual, apreciar e julgar os feitos
relativos a falsificação de guias do INPS. CC STJ 1.623 - Rel. Min. Flaquer
Scartezzini.
Compete à Justiça Comum Estadual o processo e julgamento do delito de
estelionato mediante o uso de Certidões Negativas de Débito falsas, tendo em
vista a ocorrência de prejuízo apenas ao particular, inexistindo ofensa a bens,
serviços ou interesse da União ou suas Autarquias. CC STJ 20.386 - Rel. Min.
Gilson Dipp.
18. Julgados, enfim, mutatis mutandis, de absoluta similitude à hipótese
concreta, onde a lesada seria tão somente uma empresa particular, com a
relevância de que o dinheiro dito solicitado sequer saiu da esfera de sua posse,
já que apreendido e restituído.
NO TEMA, UM VOTO PRIMOROSO, EM CONTEÚDO TÉCNICO
19. A ilustre Juíza Tânia Escobar, da 2ª Turma, do Colendo Tribunal Regional
Federal da 4ª Região, proferiu lapidar voto em o ReCrim 96.04.60365-5-RS, DJU
12.03.1997, que, por sua precisão técnica, se adequa, com exatidão científica, à
tese ora esposada, na proporção em que demonstra a total impossibilidade de se
buscar a competência para a Justiça Federal, em ofensa reflexa a bens ou
serviços da União, enfatizando, ao contrário, que ela há de ser direta e extreme
de dúvidas.
20. Eis seu excerto nuclear :
O entendimento expresso no Acórdão recorrido, consubstanciado na tese de que
os crimes foram cometidos em detrimento de serviços ou interesses da União, não
tem como ser prestigiado. É certo que, de modo geral, qualquer lesão à ordem
jurídica afeta os interesses finais do Estado. Todavia, a Carta Magna foi
precisa ao definir a competência da Justiça Federal em matéria penal: inseriu em
dois incisos distintos, "os crimes em detrimento de bens, serviços ou interesses
da União (artigo 109, IV), e os crimes contra o sistema financeiro e a ordem
econômico-financeira (artigo 109, VI). São situações distintas que não podem ser
confundidas com o propósito de conferir-se maior elastério à competência da
Justiça Federal.
Sobre a matéria de competência da Justiça Estadual para processar e julgar os
crimes acima referidos, tanto o Supremo Tribunal Federal como o Superior
Tribunal de Justiça vêm interpretando que só prevalece a competência
extraordinária da Justiça Federal sobre a Justiça Estadual se houver lesão
direta e interesse da União, e não apenas lesão reflexa.
A ciência do Direito constitui-se num todo harmônico de regras
constitucionais e legais, atribuindo a cada órgão o exercício da jurisdição que
lhe compete, excluindo as demais.
As regras definidoras da competência, inscritas já em sede constitucional, no
diploma processual penal e na legislação especial, não obstante a aparente
complexidade que encerram, apresentam-se de solução singela. Dispõe o inciso
LIII do artigo 5º da Constituição Federal: "Ninguém será processado nem
sentenciado, senão pela autoridade competente."
DO PEDIDO
21. Dessarte, considerando-se que:
O fato de o dinheiro dito solicitado não ter saído da esfera da posse da
empresa ..... - já que apreendido e posteriormente restituído - dentro de todo o
contexto factual sob análise, não pode ser considerado mero exaurimento do
crime.
Demonstra, ademais, que inexistiram lesão ou prejuízo patrimonial, diretos e
objetivos, aos entes públicos referidos no item IV do artigo 109 da Carta Magna.
.
22. Forte, pois, na consideração da incompetência da Justiça Federal para
processar o paciente, o impetrante submete à vossa apreciação o presente
arrazoado, síntese do habeas corpus postulatório proclamação da nulidade
absoluta da persecução penal instaurada.
........., .... de ..... de ......
.................
Advogado