DISSIMULAÇÃO - MEIO CRUEL - CONTRA-RAZÕES - JÚRI
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE _________
Processo nº _________
Réu preso
Objeto: oferecimento de contra-razões
_________, brasileiro, casado, borracheiro, atualmente constrito junto ao
Presídio Estadual de _________, pelo Defensor subfirmado, vem, respeitosamente,
a presença de Vossa Excelência, no prazo legal, por força do artigo 600 do
Código de Processo Penal, articular, as presentes contra-razões ao recurso de
apelação, interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, as quais propugnam pela manutenção
integral da decisão injustamente reprovada pela ilustre integrante do parquet.
ANTE AO EXPOSTO, REQUER:
I.- Recebimento das inclusas contra-razões, remetendo-se, após, os autos do
recurso, à superior instância, para reapreciação da temática alvo de férreo
litígio.
Nesses Termos
Pede Deferimento
_________, ____ de _________ de _____.
DEFENSOR
OAB/
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO _________
COLENDA CÂMARA JULGADORA
ÍNCLITO RELATOR
CONTRA-RAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO FORMULADAS EM FAVOR DO RÉU: _________
Em que pese a nitescência das razões esposadas pela denodado Doutor Promotor
de Justiça, no recurso pelo mesma interposto, tem-se, que o mesmo não deverá
vingar, em seu desiderato mor, qual seja o de submeter o réu a novo julgamento,
no que respeita as qualificadoras, do meio cruel e da dissimulação, as quais
foram magistralmente repelidas pelo Conselho de Sentença, inexistindo o menor
indício de que tal decisão, seja manifestamente contrária a prova dos autos,
como sustentado, de forma nitidamente equivocada, pelo agente Ministerial.
Passa-se, pois, a efetuar pequena digressão sobre os pontos alvos de
irresignação, incursionando-se, primeiramente, sobre o meio cruel, para após,
discorrer-se sobre a dissimulação.
1.- DO MEIO CRUEL
Quanto a qualificadora do "MEIO CRUEL", a qual foi legítima e sabiamente
excluída e extirpada pelos jurados laicos, tem-se, que a mesma, não se
perfectibilizou na conduta testilhada pelo réu.
Assente-se, que o réu foi vítima segundo consta da perícia e da denúncia de
ESGORJAMENTO, o qual segundo o médico, DELTRON CROCE e outro, in VOCABULÁRIO
MÉDICO-FORENSE, São Paulo, Saraiva, 1.994, página 95, significa: "Lesão
produzida por instrumento cortante na face anterior lateral ou laterolateral do
pescoço, com comprometimento amiúde do feixe vasculonervoso. A morte ocorreu por
anemia aguda conseqüente a hemorragia fulminante, secção dos nervos frênico e
pneumogástrico, formação de embolia produzida pela penetração de ar nos grandes
vasos lesionados, e asfixia, em virtudes da penetração de sangue nas vias
respiratórias.
Inexistiu pois, a propalada agonia da vítima, como advogado de forma
irrefletida pelo recorrente, a qual morreu instantaneamente, constituindo-se
gritante equívoco a hora da morte precisada pelo perito à folha ____ onde
consigna: "A hora provável do óbito se localiza entre as 14 horas do dia ____, e
6 (seis) horas do dia ____"
Considerando que o fato narrado na denúncia consigna às 22:00 horas do dia ,
resta difícil, senão impossível dar-se crédito ao malsinado laudo nesse ponto.
Assente-se, e tal dado é impassível de contestação, que o réu, atingiu a
vítima, desferindo um só golpe de facão. Ou seja, não houve reiteração de
golpes, e ou qualquer ato que determinasse a morte, em etapas, da vítima. O agir
do réu limitou-se e cingiu-se a brandir o facão (de propriedade do co-réu)
contra o pescoço da vítima, tendo com um só golpe letal, provocado a morte
imediata e súbita desta. Ou seja, a vítima, não sofreu qualquer padecimento
atroz.
Segundo professa o maior penalista brasileiro, NELSON HUNGRIA, in,
COMENTÁRIOS AO CÓDIGO PENAL, Rio de Janeiro, 1.979, Forense, 5ª edição, Volume
V, página 167: "Meio cruel é todo aquele que produz um padecimento físico inútil
ou mais grave do que o necessário e suficiente para a consumação do homicídio. É
o meio bárbaro, martirizante, denotando, da parte do agente, a ausência de
elementar sentimento de piedade..."
Em secundando e roborando o aqui sustentado, veicula-se imperiosa a
transcrição de pequeno excerto, bastante elucidativo, compilado de acórdão,
editado pela 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande
do Sul, no recurso crime nº 691.056.972, de 22 de agosto de 1.991, onde foi
Relator o Preclaro Desembargador EGON WILDE.
"Homicídio - Qualificadora - Meio insidioso e cruel - Agressores munidos de
armas brancas utilizadas na execução do ilícito - Inexistência de ânimo tendente
a infligir maior sofrimento ao ofendido - Vítima abatida com um único golpe -
Não incidência da qualificadora - Inteligência do art. 121, III do CP.
"Munidos os ofensores de armas brancas, próprios ou impróprios esses
instrumentos, sofrendo a vítima um único golpe que o abate, não se configura a
qualificadora pela crueldade, pois esse só se entende quando partida de um ânimo
calmo, que permita a escolha dos meios capazes de infligir o maior padecimento
desejado à vítima". in, JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA CRIMINAL, Curitiba, 1.993,
Juruá, (Revista Trimestral nº 32 -HABEAS CORPUS-) página 264.
"A qualificadora do meio cruel só pode ser admitida se a repetição de golpes
ou tiros se dá por sadismo, e não quando por inexperiência ou estado psíquico do
agente" (RT 606/394)
"O simples fato de terem sido vários os disparos feitos contra a vítima de
homicídio não concretiza a qualificadora do meio cruel, cuja configuração exige
o marcado e marcante propósito de provocar sofrimento na pessoa visada,
prolongando-a ao máximo possível (RT 629/310).
Destarte, tem-se que resta exorcizado o motivo cruel, o qual não logrou foros
de agnição, uma vez que a prova aponta de forma clara e serena, que o réu,
valeu-se de um só golpe fatal, para por termo a vida da vítima, com o que fica
abolida e proscrita a possibilidade de qualificar-se de cruel, o decesso da
última, como aliás assim decidiu de forma serena e irrepreensível o Conselho de
Sentença.
2.- DA DISSIMULAÇÃO.
No que pertine a segunda qualificadora esgrimida contra o apelado pelo
recurso ora hostilizado, alusiva a "DISSIMULAÇÃO", tem-se, que a mesma, por
igual, não deverá vingar, visto que o agir do réu, ocorreu, após a vítima ter
estabelecido uma querela com o co-réu, (_________) o qual, num primeiro momento,
lhe infligiu sevicias, o que se encontra atestado pelo auto de necropsia de
folha ____: "A vítima sofreu ação, quando ainda em vida, de instrumentos
contundentes em crânio (cabeça) região orbitária esquerda e braço esquerdos
quais não foram letais".
Aliás, o próprio co-réu à folha ____ é categórico em afirmar: "Que o
depoente, no local do crime, puxou a vítima fora do Ford Corcel e desferiu um
soco que atingiu a vítima no pescoço para cima, tendo a mesma caído no chão..."
Ora, quanto o réu serviu-se do facão para secionar a vida da vítima, esta, já
se encontrava atenta aos atos hostis do co-réu, logo possuía plena ciência do
iminente perigo que corria, no palco dos acontecimentos.
Na lição do festejado mestre DAMÁSIO EVANGELISTA DE JESUS, in, DIREITO PENAL,
São Paulo, 1.980, Saraiva, 2º volume, obra citada, página 74, entende que
somente "existe dissimulação quando o criminoso age com falsas mostras de
amizade. A qualificadora pode ser material ou moral. Material: caso de o sujeito
se disfarçar para matar a vítima. Moral: quando ele dá mostras falsas de amizade
para melhor executar o fato"
Em socorro a tese aqui esposada, toma-se a liberdade de transcrever-se,
jurisprudência, que comunga e se irmana com o aqui delineado:
"A dissimulação, ainda de acordo com a definição de Nélson Hungira, 'é a
ocultação da intenção hostil, para acometer a vítima de surpresa. O criminoso
age com falsas mostras de amizade, ou de tal modo que a vítima, iludida, não tem
motivo para desconfiar do ataque e é apanhada desatenta e indefesa' E, no
conceito de Magalhães Noronha, 'a ocultação do próprio desígnio, é o disfarce
que esconde o propósito delituoso: a fraude precede, então, a violência'
(Direito Penal, vol. II, 1969, nº 259, p. 26). É evidente que, se o assassinato
ocorreu no curso de uma briga, inicialmente corporal, não se pode falar em
dissimulação, ainda que o autor do crime se houvesse armado com o fim de
enfrentar seu desafeto" in, RT 29/364 - No mesmo sentido: RJTJSP, 25/530.
Demais, como explicitado pela própria pronúncia, a vítima não foi convidada
pelo co-réu para adentar-se no automóvel deste, antes foi compelia (obrigada) a
ingressar no automóvel pelo co-réu _________, consoante informado pelo réu
_________ à folha ____: "...".
Tamanha era a sanha do co-réu _________ que o mesmo não contente em maltratar
a vítima ainda a espancou: "..." (Vide folha ____).
Todos os caminhos, uma vez perscrutados e sondados com acuidade, conduzem a
única e irrefutável conclusão: o réu _________, não se serviu da "dissimulação",
para a prática delitiva.
Nesse aspecto assoma irreporchável a decisão dos jurados de fato, os quais
afastaram dita qualificadora, eis ausentes seus pressupostos, como aqui
sustentado.
Por derradeiro, de se consignar que o julgamento proferido pelo Tribunal do
Júri, goza de soberania em seus veredictos, por primado Constitucional, (por
força do artigo 5º, XXXVIII, alínea "c" da Carta Magna), e somente é passível de
revisão em seus pronunciamentos, quando a matéria decidia representa e
consubstancia decisão arbitrária, totalmente dissociada do conjunto probatório,
hipóteses inocorrentes no caso submetido a desate.
Nesse momento é a mais lúcida e alvinitente jurisprudência digna de
compilação:
"Julgamento proferido pelo Júri Popular, por ser constituído de pessoas
leigas, tem critério próprios e, que nem sempre correspondem com os seguidos
pelos juízes togados. Assim, o veredicto não poderá ser analisado sob o mesmo
prisma do julgamento comum. Apelação visando anular decisão contrária à prova
dos autos, é necessário que essa contrariedade seja 'manifesta', em face do
princípio constitucional da soberania do Conselho de Sentença." ( in, RJ nº
224/114)
"A decisão do Júri somente comporta juízo de reforma, que desatende ao
respeito devido à soberania de seus pronunciamentos, quando manifestamente
contrária à verdade apurada no processo, representando distorção de sua função
de julgar" (in, RT nº 642/287).
Frente a tal quadro, impossível é emprestar-se respaldo de prossecução ao
apelo ministerial, o qual clama e implora por seu improvimento, missão, esta,
confiada e reservada aos Insignes e Doutos Sobre juízes que compõem essa Augusta
Câmara Criminal.
ISTO POSTO, REQUER:
I.- Seja repelido o recurso interposto pelo, dono da lide, em sua dúplice
postulação, não tanto pelas razões aqui alinhavadas, mas mais e muito mais,
pelas que hão Vossas Excelências de aduzirem, com a peculiar cultura e
proficiência, para que assim seja realizada, assegurada e preservada a mais
lídima e genuína JUSTIÇA!
_________, ____ de _________ de _____.
DEFENSOR
OAB/