Alegações finais por parte do réu, em face de crime fiscal.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE .....
Autos de Ação Penal nº.............
Autor: Ministério Público do Estado do ...............
Réu: ...............
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
ALEGAÇÕES FINAIS
em cumprimento ao determinado pelo artigo 500 do Código de Processo Penal,
procedimento penal, aonde é autor o Ministério Público do Estado do .........,
fazendo-o nos exatos termos permitidos pelo Direito vigente, esperando, ao
final, ver providas suas razões de ingresso.
PRELIMINARMENTE
1. DA PRESCRIÇÃO.
Os autos processuais, ao instante da abertura do prazo do artigo 499, já se
encontram prescritos pois a denúncia foi recebida aos ...../...../..... e aos
...../..../.... já contavam ... anos, .... mês e .... dias.
Assim, aplicável o disposto pelo artigo 107, IV do Código Penal, quando legisla:
"Artigo 107
Extingue-se a punibilidade;
IV- Pela prescrição, decadência ou perempção."
Damásio de Jesus, in Código Penal Comentado, acerca do momento da ocorrência da
prescrição, assim nos ensina:
"Em regra, as causas extintivas da punibilidade podem ocorrer antes da sentença
final ou depois da sentença condenatória recorrível"
E ainda, acerca da prescrição da pretensão punitiva e executória:
"O decurso do tempo incide sobre as duas formas de pretensão. Daí falar-se em a)
prescrição da pretensão punitiva b) prescrição da pretensão executória.
Prescrição da pretensão punitiva: é regulada pela pena cominada na lei penal
incriminadora, seja simples ou qualificado o delito. O prazo prescricional varia
com o MÁXIMO DA SANÇÃO ABSTRATA privativa da liberdade, com desprezo da pena de
multa, quando cominada cumulativamente ou alternativamente. Para saber qual o
prazo de prescrição da pretensão punitiva devemos verificar o limite máximo da
pena imposta in abstrato no preceito sancionador e enquadrá-lo em um dos incisos
do artigo 109 do Código Penal."
Desta forma, o exame de mérito fica impedido, segundo inúmeras decisões
jurisprudenciais (TACRIMSP EI 416.173, JTACRIMSP 90:40, STF 65.211, RT 630.366,
RT 118.934, RT 638.337).
Já a prescrição da pretensão executória é a perda do direito de executar a
sanção penal imposta na sentença condenatória pelo decurso do tempo, sendo que
conforme nossa jurisprudência (TACRIMSP, ACRIM 419.199, RTJE 40.363), o caput do
artigo 110 do Código Penal não se aplica quando a sentença condenatória ainda
não transitou em julgado.
Ainda de acordo com a Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal, a prescrição
regula-se pela imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da
continuação.
Logo, o prazo prescricional deve ser contado de acordo com o máximo da pena
cominada "in abstrato" ao delito, ou seja, a prescrição ocorre quando completa o
lapso temporal do limite da pena a ser aplicada.
Assim, no caso em epígrafe, como o máximo da pena cominada ao delito é de 5
anos, o processo investigatório não pode ultrapassar este limite temporal, sob
pena de prescrever a pretensão punitiva, haja vista a incidência da prescrição
retroativa entre o conhecimento da materialidade e autoria do delito e a
persecução penal propriamente dita.
Diante de tais, deve ser argüida a prescrição da pretensão punitiva, devido a
ultrapassagem do limite permitindo, restando inaplicada a pena proposta pelo
ilustre membro do Ministério Público Estadual.
2. DA IRRETROATIVIDADE DA LEI.
Conforme se verifica da inicial a maior parte dos fatos imputados foram
cometidos anteriormente a edição da Lei 8137/90, estando, portanto, sob a égide
da Lei 4.729/65.
Dessa forma, tendo em vista a continuidade delitiva que se iniciou em ..........
e cessou em ......, a lei aplicável ao caso é a Lei 4.729/65, uma vez que a lei
só poderá retroagir para beneficiar o réu.
Assim preceitua o artigo 5º, inciso XL da Constituição Federal:
XL- a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.
No caso em epígrafe, verifica-se que houve uma modificação na quantificação da
pena, uma vez que a pena máxima cominada ao crime foi alterada de 2 (dois) anos
para 5 (cinco) anos, ocorrendo, portanto, uma modificação maléfica ao réu.
Nessa esteira, houve uma alteração da prescrição do delito, e o crime que já
estava prescrito ao tempo do prazo do Art. 499 do CPP, passa a não mais estar
segundo o dispositivo da Lei 8137/90, fato que gera uma situação mais gravosa ao
réu, excluindo a incidência da Lei 8137/90, para a aplicação da Lei 4729/65.
Tal entendimento é o do ilustre doutrinador Alberto Silva Franco, in Leis
Especiais e sua interpretação jurisprudencial, que assim dispõe:
"(...) a sonegação anterior à vigência desta lei não será punida, sabido
inexistir irretroatividade in pejus, de modo que a disposição era dispensável,
ou a do art. 3º, dispondo que somente os atos definidos nesta lei poderão
constituir sonegação fiscal, afirmação tão óbvia quanto desnecessária, ou do
art. 4º, esclarecendo, também desnecessariamente, a destinação das multas
arrecadadas, para dispor que serão recolhidas como receita pública
extraordinária."
Vale ressaltar, que o Código de Processo Penal incide a lei em vigor durante a
ocorrência do delito, já que aplica-se o primado tempus regit actum, devendo ,
assim, aplicar-se a Lei 4729/65, uma vez que ao tempo da ação ou omissão os
fatos tipificados estavam sob a égide da Lei 4729/65.
Assim, não cabe ao caso a aplicação dos dispositivos constantes na Lei 8137/90,
uma vez que segundo o primado constitucional da irretroatividade da lei
maléfica, deve-se aplicar a Lei 4729/65, uma vez que em consonância com a Lei
4729/65 o fato delituoso já estaria prescrito.
DO MÉRITO
O aqui acusado veio a ser denunciado, como incurso no disposto pelo artigo 1º,
inciso II, combinado com o artigo 11 da Lei nº 8137/90 e artigo 71 do Código
Penal, sendo o ora acusado sócio da empresa ..........., por haver pretensamente
exonerando-se, em prejuízo do fisco estadual, do pagamento do imposto - ICMS,
reduzindo ou suprimindo a carga tributária e aumentando, de conseqüência e
indevidamente seus lucros.
Os dispositivos legais tidos como infringidos pelo acusado assim dispõem:
"Artigo 1º
Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou
contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou
omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei
fiscal.
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
"Artigo 71
Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais
crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução
e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do
primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou mais grave,
se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.
Formulada as Alegações Finais pelo Ministério Público Estadual, o mesmo entendeu
pela inexistência da prescrição da pretensão punitiva, tendo se posicionado pela
condenação do réu a 3 anos e quatro meses de reclusão, e multa a ser fixada pelo
Juízo, por estar incurso nas penas do artigo 1º da Lei 8.137/90, cominado com o
aumento de pena do artigo 71 do Código Penal.
Contudo, apesar do parecer desfavorável do Ministério Público, entende o ora
acusado que as alegações finais não devem prosperar, pelos fatos e fundamentos
adiante expostos.
Tais os fatos necessários.
O dolo constitui a vontade livre e consciente de realizar o crime, ou seja ,
configura a determinação prévia do cometimento do delito, sem a interferência de
fatores alheios à vontade do agente para a superveniência do resultado.
Assim, o sujeito ao momento da ação ou omissão já está pré-deterninado a
realização do delito da maneira em que ocorreu, tendo assumido, dessa forma, a
responsabilidade pelo resultado e pelo dano causado.
No caso em comento, não há a prévia determinação em sonegar o fisco, uma vez que
o fato sobreveio do erro cometido quanto a alíquota a ser creditada na
compensação do ICMS.
Dessa forma, a alíquota aplicada de 12% foi confundida com a compensação de 17%,
devido a existência de posição doutrinária e jurisprudencial que permitira tal
creditamento diferenciado, devido a não cumulatividade do ICMS, fato que
caracteriza a inexistência de prévia determinação ao cometimento do delito.
Logo, há a exclusão do dolo do agente, já que o sujeito ativo não planejou sua
conduta, não tendo conhecimento do resultado que poderia advir, já que sua
conduta era lícita ao tempo da ação ou omissão, devido na possibilidade de
creditamento de alíquota diferenciada de ICMS.
A esse respeito, nossos tribunais têm se manifestado:
JULGADOS DO TRIBUNAL DE ALÇADA DO RIO GRANDE DO SUL. SETEMBRO DE 1993. ANO XXII,
Nº 87, PÁG. 146. APELAÇÃO CRIME Nº 2983110524-3 - 3ª CÂMARA CRIMINAL - LAJEADO -
CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL.
O crime de sonegação fiscal, definido na Lei 4.729/65, demanda a prática de atos
ou a omissão de fatos, isoladamente considerados crimes de apropriação indébita,
falsidade ideológica ou material, omissão própria ou corrupção, tendentes a
impedir ou a retardar o conhecimento, pela autoridade fiscal, da ocorrência do
fato gerador do tributo. A lei não pune a simples recusa no pagamento do
tributo, nem criminaliza a conduta do contribuinte que, amparado em entendimento
doutrinário e jurisprudencial contrário ao adotado pelo fisco em matéria
relacionada com o aproveitamento de crédito gerado pela diferença de alíquota
entre operações interestaduais e internas, recolhe tributo menor, sem se
utilizar para tanto, de fraude penal. Decisão judicial que rejeita denúncia
confirmada em sede de recurso de apelação.
Vale ressaltar, ainda , que o agente ao tempo do conhecimento da denúncia
parcelou o débito, tendo regularizado sua situação perante o fisco, motivo que
enseja a ausência de dolo e a exclusão da punibilidade para o crime erroneamente
imputado..
Tal entendimento é o da jurisprudência:
"O pagamento do tributo, ainda que parcelado, extingue a punibilidade do crime
de sonegação fiscal cometido antes da vigência da Lei nº 8.383/91, desde que
iniciado antes da propositura da ação penal - A certidão da inexistência de
débito tributário do paciente para com a Fazenda Nacional por ser genérica,
presta-se como prova do pagamento do tributo de cuja sonegação se cogita no
caso, anterior àquela certidão - HC deferido". (TRF 5ª R. - 1ª T. - HC 304-CE -
Rel. Hugo Machado - j. 25/08/93 - Repert. IOB Jurisp. 12/94, p. 212)
No mesmo sentido esclarece o ilustre professor da Universidade Federal da Bahia,
Sérgio Habib:
"ao compor com o Fisco, o contribuinte demonstra sua intenção em satisfazer o
que lhe é cobrado, embora o faça em parcelas, muitas vezes, por força do valor
do débito ou de suas condições financeiras para efetuar o pagamento de uma só
vez. Mas a sua intenção de pagar é inegável, o que, por si só, afasta o dolo na
conduta"
Consumado o delito anteriormente a superveniência do sobredito pela Lei
8.383/91, persiste por força da interação entre o princípio da ultratividade da
lei anterior mais benéfica e o secular postulado tempus regit actum, a extinção
da punibilidade.
Diante da ausência do dolo pela inexistência de vontade dirigida, e tendo em
vista o parcelamento do débito, deve restar configurada a exclusão da
punibilidade, conforme artigo 2º da Lei 4.729/65 com nova redação dada pelo
artigo 14 da Lei 8.137/90.
DOS PEDIDOS
Em face do acima exposto, permite-se o acusado, na exata forma do Direito,
requerer sejam devidamente recebidas e processadas a presente alegações finais,
restando o acusado absolvido da imputação que lhe move o Douto Ministério
Público, uma vez que ocorreu a prescrição da pretensão punitiva do Estado em
punir o delito, além da inexistência do dolo necessário para a criminalização de
conduta lesiva, devido a exclusão da punibilidade.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]