Agravo em execução em face de decisão que declarou incompetente a Vara Criminal para execução da pena.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CRIMINAL DA COMARCA DE .....,
ESTADO DO .....
O Promotor de Justiça que ao final assina, no feito apontado na epígrafe, não se
conformando, "data venia", com a r. Decisão de fls. .... . do apenso autuado em
.... , que declarou o Juízo incompetente para o processamento da execução da
pena pecuniária imposta, afirmando ser competente o Setor de Execuções Fiscais
da Fazenda Pública, tempestivamente, interpõe
AGRAVO EM EXECUÇÃO
à Superior Instância, para vê-la reformada e, juntando as razões do
inconformismo nesta oportunidade, requer seja o mesmo recebido e regularmente
processado.
Requer, outrossim, para formação do instrumento, sejam trasladadas cópias das
peças constantes do apenso autuado em .
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE .....
O Promotor de Justiça que ao final assina, no feito apontado na epígrafe, não se
conformando, "data venia", com a r. Decisão de fls. . do apenso autuado em , que
declarou o Juízo incompetente para o processamento da execução da pena
pecuniária imposta, afirmando ser competente o Setor de Execuções Fiscais da
Fazenda Pública, tempestivamente, interpõe
AGRAVO EM EXECUÇÃO
pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
RAZÕES RECURSAIS
COLENDA CÂMARA
DOUTA PROCURADORIA DE JUSTIÇA
DOS FATOS
Pela r. decisão de fls. . do apenso autuado em data - proc. nº , o preclaro
Julgador de primeira instância indeferiu pedido do Ministério Público para
processamento da execução da pena pecuniária imposta, declarando incompetente a
MM. . Vara Criminal da Capital, aduzindo que a ação deveria ser proposta junto
ao Setor de Execuções Fiscais da Fazenda Pública, nos termos da Lei 9.268/96.
Deve entender a I. Magistrada que, com o advento da Lei 9.268, de 01.04.96, a
multa penal se transformou em "dívida de valor", devendo ser executada pela
Procuradoria da Fazenda Nacional, sendo o Juízo Criminal incompetente "ratione
materiae" para executar as multas oriundas de processos criminais.
A respeitável decisão, porém, não merece prosperar, conforme se deduzirá abaixo.
Numa leitura menos atenta do texto legal, pode-se entender que ocorreu uma
mudança substancial quanto à natureza da pena pecuniária. Esta teria perdido seu
caráter penal, passando a ter natureza diversa, de mera "dívida de valor", mero
"crédito fazendário".
DO DIREITO
Uma análise mais acurada dos diversos diplomas legais, numa interpretação
literal, sistemática e histórica, derruba-se por terra esse entendimento
primeiro, tomando-se posição diversa, no sentido de que a pena pecuniária
permanece sendo sanção de cunho penal e, como tal, deve ser tratada.
Observe-se que o texto literal do artigo 1º. da nova lei (que alterou o artigo
51 do Código Penal), ao invés de afirmar que a multa, após o trânsito em julgado
da sentença condenatória será ou passará a ser ou constituirá dívida de valor,
utilizou-se a expressão "será considerada" dívida de valor, no sentido de que
RECEBERÁ O MESMO TRATAMENTO, SEM OBRIGATORIAMENTE TER-SE TRANSFORMADO, MEDIANTE
MUTAÇÃO DE SUA NATUREZA JURÍDICA, NESTA ÚLTIMA.
Se realmente a natureza jurídica de sanção penal da pena de multa tivesse se
extinguido com a edição da nova Lei 9.268/96, não teriam permanecidos intactos,
por exemplo, os artigos 32, inciso III do Código Penal, assim como os artigos
118, § 1º. da Lei de Execução Penal, ou mesmo o artigo 85, da Lei 9.099/95, além
de tantos outros que discorrem acerca da pena pecuniária.
Em todos os dispositivos mencionados, a multa é tratada como reprimenda, como
espécie de pena criminal, cujo não pagamento é capaz de ensejar sérias
conseqüências no âmbito penal, com exceção, é evidente, de sua conversão em pena
privativa de liberdade, agora não mais permitida, em virtude da expressa
revogação dos parágrafos 1º. e 2º. do artigo 51, do Código Penal, alterado pela
Lei 7.210/84 e do artigo 182 e seus parágrafos da Lei de Execução Penal.
Permanecem íntegros os artigos 32, inciso III, e o artigo 81, inciso II, ambos
do Código Penal. O primeiro enumera, dentre outras espécies de pena, a pena de
MULTA e o segundo estabelece ser causa obrigatória da revogação do "sursis" o
não pagamento da pena pecuniária.
Da mesma forma, a Lei inovadora não revogou o artigo 118, § 1º. da Lei de
Execução Penal, que preceitua a regressão do sentenciado em regime aberto a
regime mais rigoroso de cumprimento da pena, em face do não pagamento da multa,
como também deixou incólume o artigo 85 da Lei 9.099/95, no que pertine à
possibilidade de conversão da multa em pena restritiva de direitos.
Se a Lei 9.268/96 almejasse despir a pena pecuniária de seu caráter sancionador,
trataria, em princípio, de revogar os aludidos dispositivos legais. Não o
fazendo, tornou incontestável seu firme propósito de preservar a subsistência da
pena pecuniária.
Ora, se o não pagamento da multa pode gerar tão graves conseqüências de natureza
penal ao sentenciado, a ponto de revogar a suspensão condicional da pena
privativa de liberdade, regredi-lo a regime mais rigoroso de cumprimento da pena
ou constrangê-lo, por exemplo, a prestar serviços à comunidade, tais
conseqüências, a nosso ver, derivam do caráter penal-aflitivo que continua a
caracterizar a pena pecuniária. Não seriam admissíveis tais conseqüências, como
decorrentes de um mero crédito fazendário, em que se pretende tenha a multa
penal se transmudado.
Atente-se, ainda, que a própria Lei 9.268/96, em seu artigo 114, ao tratar da
prescrição da multa, confere-lhe o TRATAMENTO DE PENA, obedecendo ao que dispõe
a Constituição Federal, que no rol de penas a serem aplicadas no processo
criminal inclui a pena de multa. Sua alusão à multa, enquanto pena, fortalece a
intenção de preservá-la como sanção, pois é certo que a lei não contém palavras
ou expressões inúteis.
Dentro de outro enfoque, assente-se que não se pode aceitar, diante de uma
marcante tendência de Política Criminal, no sentido de enaltecer as penas
alternativas em detrimento das detentivas, reservando estas somente aos
sentenciados de alta periculosidade, que o legislador viesse a, injustificamente,
alijar a pena de multa das espécies de sanção penal.
Ainda, veja-se a Exposição de Motivos da Lei inovadora. Extrai-se dela que o
legislador objetivou, na verdade, apenas impedir a conversão da pena de multa em
pena privativa de liberdade, por considerar tal prática inconstitucional, uma
vez que a Constituição Federal, ao enumerar as hipóteses de prisão por dívida,
restringiu-se ao depositário infiel e ao inadimplente de pensão alimentícia.
Por outro lado, ao mesmo tempo em que o legislador inviabilizou a conversão da
multa em prisão, para não retirar da multa o seu caráter aflitivo, conferiu-lhe
maior força executória, aplicando à ação de execução da pena pecuniária o mesmo
regime processual da execução fiscal, ou seja, o da Lei 6.830/80, conferindo
maior celeridade e eficiência à sua execução.
Ressalte-se, também, que a Lei 9.268/96 não determinou qualquer alteração no
artigo 164, da Lei de Execução Penal, no que se refere à possibilidade jurídica
de execução pelos órgãos ali mencionados e nem mesmo inclui a Fazenda Pública
como órgão executivo da pena. Portanto, adotar entendimento diverso e estender à
Fazenda Pública essa atribuição causaria inegáveis transtornos nos vários
incidentes próprios da execução penal, como por exemplo, a revogação do "sursis"
(artigo 81, inciso II, do Código Penal) ou a regressão a regime mais rigoroso
(artigo 118, § 1º.), em caso de não pagamento da multa.
Assim, diante de eventual desvio de bens por parte do sentenciado, ou mesmo
constatada sua intenção de evitar a citação, parece indiscutível que o Juízo da
Fazenda Pública, por incompetência absoluta, não poderia pronunciar-se acerca da
revogação do "sursis", como não teria competência para decretar a regressão do
apenado para o regime prisional mais rigoroso.
Da mesma forma, o Juízo da Fazenda Pública ou mesmo de Execuções Fiscais, seria
incompetente para apreciar eventual preliminar, em embargos à execução, de
ocorrência da prescrição da pretensão punitiva ou executória, para julgar
extinta a punibilidade e, igualmente, para decretar a extinção da pena
pecuniária, na hipótese de eventual pagamento, ou, ainda, para promover a
conversão da pena de multa em pena restritiva de direitos, conforme previsto no
artigo 85 da Lei 9.099/95.
Caso pretendesse o legislador despojar a pena de multa de sua natureza
sancionadora, para transformá-la em mero crédito da Fazenda Pública, certamente
teria estabelecido regras para dotar o órgão fazendário de competência para
decisões nos vários incidentes acima mencionados, ou mesmo, revogando,
expressamente os diversos dispositivos sancionadores, decorrentes do não
pagamento da pena de multa.
Outro sério obstáculo ainda se faz presente à interpretação acolhida na r.
sentença guerreada. A transformação da pena de multa em simples dívida de valor
implicará a possibilidade de sua cobrança judicial alcançando terceiros que não
o sentenciado, revogando-se, assim, o sagrado princípio norteador de nosso
ordenamento jurídico, de que a pena não ultrapassa a pessoa do criminoso.
DOS PEDIDOS
Do exposto, conclui-se que a multa foi e continua sendo espécie de pena e, como
tal, deve ser executada, quer no Juízo da condenação, quando isoladamente
aplicada (Provimento 491/92 da E. Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São
Paulo), quer no Juízo da Vara das Execuções Criminais, quando cominada
cumulativamente, sendo o Ministério Público Estadual o detentor da legitimidade
ativa para a propositura da ação de cobrança.
Com estes argumentos, aguarda-se o provimento do presente agravo, com a
conseqüente reforma da r. decisão recorrida, a fim de que se determine o
processamento da execução da multa no Ilustre Juízo da Vara Criminal de .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]