CONDOMÍNIO - UNIDADE RESIDENCIAL - FORNECIMENTO DE ÁGUA - TARIFA MÍNIMA - ART
22 CDC - LIMINAR - ART 4 CDC - COBRANÇA
INDEVIDA - ILEGALIDADE - DIREITO INDIVIDUAL HOMOGÊNEO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ... VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA
COMARCA DE ... .
CONDOMÍNIO EDIFÍCIO ..., pessoa jurídica de direito privado, sediado na Rua ...,
..., ..., neste ato representado por sua Síndica, Sra. ..., ata de eleição
inclusa (doc. n.º ...), por
intermédio de seu advogado que ao final subscreve, com escritório indicado no
rodapé desta página, instrumento de mandado incluso (doc. n.º ...), vem,
respeitosamente, à presença de
Vossa Excelência para impetrar
MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO,
Com pedido liminar
contra coação que se renova mês a mês, do DIRETOR - PRESIDENTE da COMPANHIA DE
... - ..., o qual tem sede na Rua ..., n.º ... - ... - ..., visando impedir a
interrupção do
fornecimento do produto, conforme passa a expor e, ao final, requerer.
1. DOS FATOS
O Impetrante, na qualidade de condômino devidamente constituído (Convenção e
Regimento interno incluso como docs. n.ºs ...e ...), é consumidor dos serviços
prestados pela ..., que na
condição de permissionária, realiza o regular abastecimento de água em todo o
Estado do ...
No caso em tela, o Impetrante insurge-se contra a cobrança da taxa mínima de
consumo imposta pela Impetrada, onde a permissionária estabelece uma estimativa
fictícia de consumo, mês a
mês, por unidade (imóvel), que corresponde a 10m3 (10.000 litros), mesmo quando
o consumo é inferior a este 'quantum'.
A cobrança de tarifa mínima de água na proporção de 10m3 ou 10.000 litros
mensalmente (cerca de 333 litros/dia) ou de gasto fictício é perversa por várias
razões, em especial porque na
sua maioria os consumidores que não chegam a consumir o mínimo faturado pela
autoridade coatora, encontram-se entre as classes sociais menos privilegiadas,
como é o caso dos autos
que, em geral, têm apartamentos com poucos pontos de distribuição de água.
A perversidade da cobrança de tarifa mínima de água é maior ainda quando a
autoridade coatora vem a público instar os consumidores a economizar água.
Este serviço cobrado e muitas vezes não prestado, é subsidiado pelos
consumidores cujo consumo é superior a 15 m3, ou seja, a ... aplica subsídio ao
consumidor que se situa na faixa
inferior a 10 m3 com a arrecadação do preço pago por quem consumir acima dos 15
m3. Pergunta-se: se o serviço oferecido até 10 m3 é subsidiado por quem consome
mais de 15 m3,
por que a ... não cobra pelo serviço realmente utilizado por aqueles que
consomem um percentual inferior a 10 m3?
A resposta negativa se impõe pelas vantagens do faturamento duplo (ou
enriquecimento sem causa duplo), ou seja, incidente sobre um serviço não
prestado para alguns que pagam mais,
sob a "justificativa" de subsidiar outros que, por sua vez, pagam pelo que não
consomem.
Não obstante as classes menos favorecidas sejam as mais penalizadas, não se pode
deixar de consignar a injustiça praticada também contra o consumidor de maior
renda. Embora
normalmente consuma água acima da cota mínima, existem situações em que ele nada
consome e paga. É o caso, por exemplo, dos consumidores proprietários de casas
de veraneio, que
durante pelo menos 10 (dez) meses do ano praticamente nada consomem e pagam
tarifa mínima.
No caso 'sub judice', a cobrança indevida do gasto fictício, com na grande
maioria dos condomínios que possuem somente um hidrômetro para todo o prédio,
onde também a ... estima um
consumo mínimo individual ou por moradia (a qual denomina de "economia"), se dá
independentemente do fato do hidrômetro marcar consumo inferior à soma daqueles
consumos mínimos.
Vale frisar, que o Impetrante possui unidades onde os moradores passam o dia
inteiro fora, deixando de consumir o limite mínimo imposto pela Impetrada. No
entanto, assim mesmo está
obrigada a pagar a referida tarifa mínima, haja água ou não, quer seja medida
por hidrômetro, quer seja estimada. A cobrança fictícia ocorre pelos 10m3.
De outra parte, é importante salientar que a Impetrada vincula a cobrança de 80%
do valor despendido com o gasto de água, a título de tarifa de esgoto, fato
induz ao pagamento de uma
"tarifa mínima de esgoto", que por sua vez também está maculada da mesma
ilegalidade.
Assim sendo, os fatos estão a merecer a tutela jurisdicional, posto que a
autoridade coatora, apesar dos insistentes apelos dos órgãos consumeristas,
resiste em se adequar a realidade fática,
econômica e jurídica.
Estes são os fatos.
2. DO DIREITO
2.1. Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor
Da observação dos fatos, confirmados pela documentação anexa, caracterizada e
incontestável está a relação de consumo existente entre o condômino usuário do
serviço de água e
saneamento e a autoridade coatora, que é Diretor Presidente da ..., nos termos
dos artigos 2º e 3º, do Código de Defesa do Consumidor, respectivamente, que
visa preservar os interesses
econômicos e de saúde do consumidor (art. 4º do C.D.C), objetivos nos quais se
calca toda a política das relações de consumo.
A defesa do consumidor, portanto, faz-se necessária em face da possibilidade de
lesão aos direitos individuais, caracterizando-se como direito individual
homogêneo, nos termos do art. 81,
§ único, III, "os decorrentes de origem comum".
A possibilidade de lesão concretizada e apontada refere-se ao condomínio,
sujeito à prática abusiva da autoridade coatora.
2.2 Das disposições específicas aplicáveis ao caso
Inicialmente convém destacar que a Impetrada deve atender ao disposto no art.
22, da Lei 8.078/90, in verbis:
"Artigo 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias,
permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a
fornecer serviços adequados,
eficientes, seguros, e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único - Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações
referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e
reparar os danos causados, na
forma prevista neste Código."
Dessa forma, não deve ser cogitada qualquer argumentação da Autoridade coatora,
no sentido de que a cobrança da tarifa mínima tem por escopo viabilizar o
sistema e mantê-lo à
disposição do usuário 24 horas por dia. Pois tal fato é decorrência lógica da
própria atividade desenvolvida pela companhia, além de ser corolário da
concessão do serviço público.
No tocante à tarifa, cumpre destacar o seu conceito, que se identifica como a
"quantia que o usuário de determinado serviço paga ao Estado pela utilização
concreta do serviço público
prestado." (J. M. Othon Sidou, in "Dicionário Jurídico")Segundo a definição de Plácido e Silva in "Vocabulário Jurídico": "tarifa não
integra o gênero tributo, pois tem a significação de pauta ou tabela do que deve
ser pago por alguma coisa,
quando ocorrer o fato em que é devido." (grifos nossos)
Seguindo esta linha de raciocínio a Autoridade coatora vem atuando de forma
contrária à lei, pois está cobrando por algo que não foi consumido pelo
condomínio usuário do serviço.
A Lei n.º 6.528/78, que trata das "tarifas dos serviços públicos de saneamento
básico", foi regulamentada pelo Decreto Federal 82.857/78 que, por sua vez,
dispôs em seu artigo 11 o
seguinte: "As tarifas deverão ser diferenciadas segundo as categorias de
usuários e faixas de consumo, assegurando-se o subsídio dos usuários de maior
para os de menor poder aquisitivo,
assim como o dos grandes para os pequenos consumidores." (grifo nosso)
Porém, a contrario sensu, o § 2º, do artigo supra citado, determina que: "A
conta mínima de água resultará do produto da tarifa mínima pelo consumo mínimo
que será pelo menos 10 m3
mensais, por economia da categoria residencial"
As disposições da Lei 6.528/78 e do Decreto 82.857/78 atualmente fornecem as
diretrizes tarifárias genéricas a serem adotadas pelas companhias de saneamento
estaduais, ficando à
discricionariedade destas a fixação dos valores, de acordo com as
características e as necessidades de cada Estado. Os instrumentos normativos
acima apontados, porém, não se coadunam
mais com a realidade econômica e social do país. A cobrança da tarifa mínima,
portanto, tem por fundamento uma legislação anacrônica e inadequada. Dessa forma
caberia ao legislador
estadual estabelecer parâmetros mais adequados à realidade dos usuários dos
serviços, de forma a atender os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor e
às novas diretrizes
econômicas do país.
A exigência da tarifa mínima, caracteriza-se, ainda, como prática comercial
abusiva, nos termos do art. 39, I e V do CDC:
"Artigo 39 - É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços:
I - condicionar o fornecimento de produto ou serviço ao fornecimento de outro
produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;" (grifo nosso)
Na definição do próprio Código de Defesa do Consumidor, artigo 51, § 1º, incisos
I, II e III, presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: ofende os
princípios fundamentais
do sistema jurídico a que pertence; restringe direitos e obrigações fundamentais
inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o
equilíbrio contratual; se mostra
excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo
do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.
A Autoridade coatora está indiscutivelmente condicionando o fornecimento de água
ao pagamento do limite mínimo de 10m3 ao mês, auferindo, dessa maneira, vantagem
manifestamente
excessiva dos usuários de menor poder aquisitivo, pois o usuário que se utiliza
de volumes menores e não paga pelos 10 m3 pode ter o serviço de água e
saneamento suspenso. Isso porque
onde tiver o consumidor o seu imóvel ligado à rede de esgoto pagará mais 80% do
valor, mesmo sobre o mínimo não consumido, ainda em flagrante ofensa aos
"princípios fundamentais do
sistema jurídico", não só à que pertence (defesa do direito do consumidor) mas a
toda ordem jurídica, enquanto tutelada pelo princípio do não enriquecimento
ilícito, na medida em que
existe a aferição de vantagem sem causa.
A Constituição Federal, em seu art. 5º, agasalha o princípio da igualdade.
Porém, a exigência da Autoridade coatora faz distinção entre os grandes
consumidores e os pequenos usuários,
exigindo destes, vantagem excessiva em relação à sua posição econômica. A tarifa
subsidiada na verdade encobre injustiça flagrante, pois se dá por um lado com
uma das mãos, retira-se por outro com as duas.
O fato de a autoridade coatora destinar o produto da cobrança da tarifa mínima
para manter o seu equilíbrio econômico financeiro e viabilizar o sistema, não
encontra justificativa e não lhe
dá o direito de exigir, da parcela da população de menor poder aquisitivo, a
tarifa mínima, referente a um fato gerador (para socorrer-se do instituto do
direito tributário) que se não
consumou. Para isso, a companhia dispõe de outros meios, como, por exemplo, os
reajustes periódicos (anual, no mínimo) no valor das tarifas.
A exigência da "tarifa" tem por fundamento a existência de uma atividade
específica e mensurável, o que não ocorre no caso. A companhia busca a cobrança
de algo que sequer foi
consumido e também ignora a necessidade de mensurar o que realmente foi
utilizado.
Assim, é manifesta a ilegalidade da cobrança da tarifa mínima de água pela
autoridade coatora, que contraria a lei e todos os princípios de eqüidade e
justiça social, ao exigir da população,
notadamente daquela de baixa renda, vantagem manifestamente indevida.
3. DO PEDIDO LIMINAR
A via eleita, portanto, para obtenção da prestação jurisdicional almejada é o
mandado de segurança, com pedido de liminar, ante a mensal ofensa ao direito
líquido e certo dos Impetrantes.
O "fumus boni iuris" afigura-se-nos suficientemente demonstrado nos permissivos
legais elencados e, na inegável relação de consumo existente entre a Impetrada e
as Impetrantes.
Quanto ao eventual dano e o gravame daí decorrente, é de se levar em
consideração que a questão atinge um indeterminado número de condôminos, ou
seja, potencialmente toda a
população usuária do fornecimento de água que compõem o condomínio Impetrante
(... apartamentos), cuja renda mensal é muito baixa e, vem sendo comprometida
mês a mês com a
prática da Impetrada, onde já se verifica um lato índice de inadimplentes.
A demora na prestação jurisdicional ou "periculum in mora" é fator indiscutível,
já que o condomínio pode vir a se tornar devedor de valores ilegítimos,
injustos, exigidos a título de tarifa
mínima e coleta de esgoto que, se não forem pagos, seus 32 condôminos ficarão
sujeitos à interrupção do fornecimento do produto, essencial para a vida humana.
A concessão da providência só ao final da demanda poderá ser inócua, e as
conseqüências desastrosas para a saúde dos moradores do impetrante.
Presentes, pois, os pressupostos do art. 7º, inc. II, da Lei n.º 1.533, de
31.12.51, por via de ordem liminar e, manifesto o perigo de dano em virtude da
possibilidade de inadimplência de
valores indevidos e, possível interrupção do fornecimento de água, faz-se
indiscutível a concessão da ordem liminar.
4. DO PEDIDO
Diante do exposto, considerando que se encontram presentes os requisitos
necessários a justificar o deferimento do pedido, 'INAUDITA ALTERA PARS', a
impetrante requer que Vossa
Excelência se digne a determinar a QUE A IMPETRADA PASSE A COBRAR DO IMPETRANTE
O VALOR CORRESPONDENTE AO SEU CONSUMO REAL DE ÁGUA E
SUA RESPECTIVA INCIDÊNCIA SOBRE A COLETA DE ESGOTO.
Uma vez concedida a liminar, requer a Impetrante, seja procedida a notificação
da digna autoridade impetrada para que apresente, querendo, as informações que
entender de direito no
presente 'mandamus' e, após, colhida a manifestação do Ministério Público, seja
julgado procedente o presente 'mandamus' para impedir, definitivamente, que o
ato apontado como coator
se perpetue.
Dá se à presente causa, para os devidos efeitos legais, o valor de R$ .........
(........ reais).
N. Termos,
P. Deferimento.
..., ... de ... de ...
..........................
Advogado
OAB/... N.º ...