ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - BUSCA E APREENSÃO - BEM DEIXADO NA QUALIDADE DE
DEPOSITÁRIO - NULIDADE - CLÁUSULA - SUBSTITUIÇÃO DE GARANTIA - VENCIMENTO
ANTECIPADO - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - PENA CONVENCIONAL - MANDATO - COMISSÃO DE
ENCARGOS - LIQUIDAÇÃO DO CRÉDITO - CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO - CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ....ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE .... - ESTADO
DO ....
...., já devidamente qualificado nos Autos de Busca e apreensão sob o nº
...., que lhe move ....., por seus advogados adiante assinados, instrumento de
mandato já juntado, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com
fulcro no art. 300 e ss., do Código de Processo Civil, apresentar CONTESTAÇÃO
pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.
PRELIMINARMENTE
1. O contrato objeto da presente ação já está sendo discutido perante o MM.
Juízo da ....ª Vara Cível, a qual tem por finalidade a declaração de
inexistência de relação jurídica que obrigue a autora ao pagamento de encargos
que infringem a ordem constitucional e ordinária vigente, conforme será
demonstrado na seqüência.
2. É interessante mencionar que a presente ação só foi proposta após a Requerida
ter entrado em juízo para a discussão das nulidades que viciam o contrato,
conforme demonstra a certidão em anexo.
3. O Requerente, portanto, parece ter se movido a propor a presente medida
constritiva como represália à intenção da Requerida de fazer valer em juízo os
seus direitos.
4. Com relação à medida liminar concedida por Vossa Excelência, requer-se desde
já a sua reconsideração, uma vez que a apreensão dos bens trará prejuízo
irreparável à Requerida, pois esses são essenciais à continuidade do trabalho da
empresa.
5. A remoção dos mesmos acarretará a paralisação de toda atividade industrial,
especialmente de seus empregados, acarretando danos irremediáveis, os quais
certamente resultarão na falência da Requerida, pois os bens em questão
constituem praticamente a totalidade do maquinário utilizado nas suas
empreitadas.
6. Trata-se de bens como caminhões, tratores esteira, motoniveladoras,
imprescindíveis para a continuidade das obrigações da empresa, uma vez que estes
equipamentos são utilizados diariamente na atividade da empresa.
7. Como consectário dos direitos e garantias individuais asseguradas pela
Constituição de 1988, o contrato que preveja a restituição sumária do bem, sem
oportunidade de contraditório, fere princípios básicos constitucionalmente
garantidos no seu art. 5º:
"LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal;
[...]
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório a ampla defesa, com os meios inerentes."
8. Ao se restituir sumariamente os bens, como pretende a Requerente, estará
sendo cometida uma arbitrariedade, pois não há chance para o contraditório.
Assim vem entendendo a jurisprudência conforme a recente decisão da 14ª Vara da
Justiça Federal de São Paulo, compreendendo que não apenas o DL 911, mas toda a
legislação que permita perda sumária de bens, deixou de vigorar a partir da
Constituição de 1988, verbis:
"Trata-se de considerar o 'due process of law' em sua inteireza, ou seja, em
todo processo, seja administrativo, seja judicial, há de se conformar com as
regras previamente estabelecidas em lei, vedada, sob qualquer pretexto, a mais
tênue maneira de desrespeito procedimental ou de alteração de seu conteúdo."
(Guia Jurídico, Ainda removendo entulhos, 11/17, janeiro de 1993).
9. O Tribunal de Alçada do Estado do Paraná também compreende que a restituição
sumária constitui lesão a direitos e garantias. Em recente acórdão do dia 14 de
maio de 1994, a 4ª Câmara Cível julgou, seguindo orientação firme de
precedentes, no mesmo sentido:
"ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - BUSCA E APREENSÃO DEFERIDA LIMINARMENTE - BEM DEIXADO NA
QUALIDADE DE DEPOSITÁRIA FIEL - ADMISSIBILIDADE DIANTE DAS DIFICULDADES QUE A
MEDIDA ACARRETARIA À DEVEDORA, COM REFLEXOS SOCIAIS INDISCUTÍVEIS. RECURSO
DESPROVIDO."
10. Inobstante isto, a apreensão de todos os bens constitui um exagero, eis que,
conforme demonstrativos juntados aos presentes autos pelo próprio Banco, o
maquinário alienado representa o dobro do crédito que o Requerente afirma ter.
Portanto, as garantias se apresentam indubitavelmente excessivas e
desnecessárias.
A QUESTÃO VISTA SOB O ÂNGULO DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR
11. Os elementos que integram a relação de consumo fazem-se presentes no
instrumento contratual que é objeto de análise, o que implica na aplicação do
Código de Defesa do Consumidor.
O Requerido enquadra-se na definição do art. 3º do CDC ao subsumir-se à condição
de comerciante de produtos e prestador de serviços. As instituições financeiras
são comerciantes de produtos por força de disposição do art. 119 do Código
Comercial e art. 2º, § 1º da Lei das Sociedades Anônimas. Dos produtos que a
instituição financeira comercializa, o dinheiro, tem especial relevância
enquanto bem juridicamente consumível, como o são as demais mercadorias em
geral. Quanto à natureza dos serviços prestados pelo Requerido na situação em
exame, o legislador foi expresso ao incluir como objeto da relação de consumo a
expressão "natureza bancária" no § 2º, do art. 3º, do CDC. É nesse sentido a
primorosa lição do eminente professor paulista Nelson Nery Júnior:
"Os bancos são comerciantes de produtos (art. 119, do Código Comercial; art. 2º,
§ 1º da Lei das S/A) e também prestadores de serviços, de sorte que sempre são
considerados fornecedores para o CDC (art. 3º, caput, para o BANCO COMERCIANTE
DE PRODUTOS, e art. 3º, § 2º, para o BANCO PRESTADOR DE SERVIÇOS). Dos
"produtos" vendidos pelo banco, o dinheiro tem relevância como bem juridicamente
consumível (art. 51 do Código Civil), como o são as mercadorias em geral." (in
Os Princípios Gerais do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, Revista de
direito do consumidor nº 3. Revista dos Tribunais: São Paulo, 1992).
12. No outro pólo da relação encontram-se os autores, como consumidores, nos
termos da definição do art. 2º, do CDC. É pessoa jurídica, tendo adquirido os
produtos e serviços da instituição financeira como destinatária final, para o
incremento de suas atividades produtivas. Está presente, pois, o requisito
finalístico contido na norma. A atividade da Requerente impede que repasse os
produtos e serviços obtidos junto ao fornecedor para terceiros estranhos à
relação de consumo.
13. Assim sendo, as irregularidades apontadas deverão ser consideradas sob a
ótica do Código de Defesa do Consumidor, a fim de que se dê a efetiva e adequada
tutela que se faz merecedora aos Requerentes em razão do pólo em que ocupam na
relação jurídica "sub judice", sendo-lhe devidos todos os direitos e garantias
de ordem material e processual propiciados pelo CDC.
NORMAS DE ORDEM PÚBLICA
14. As disposições exaradas no Código de Defesa do Consumidor são normas de
ordem pública, impedindo, portanto, que as partes disciplinem relações de forma
diversa aos princípios e comandos dispostos no aludido diploma.
15. A definição do que sejam normas imperativas ou de ordem pública no sé dada
pela inigualável clareza e erudição de Miguel Reale:
"Ordem pública aqui está para traduzir a ascendência ou primado de um interesse
que a regra tutela, o que implica a exigência irrefragável do seu cumprimento,
quaisquer que sejam as intenções ou desejos das partes contratantes ou dos
indivíduos a que se destinam. O Estado não subsistiria, nem a sociedade poderia
lograr seus fins, se não existissem certas regras dotadas de conteúdo estável,
cuja obrigatoriedade não fosse insuscetível de alteração pela vontade dos
obrigados." (Lições preliminares de direito. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 1988,
p. 131).
16. A principal conseqüência de uma norma jurídica de ordem pública é a
impossibilidade das partes contratantes afastarem sua incidência. Segundo o
citado mestre:
"Quando certas regras amparam altos interesses sociais, os chamados interesses
de ordem pública, não é lícito às partes contratantes dispor de maneira
diversa." (Idem, p. 131).
17. É exatamente o que pretende o Requerido, ao estipular cláusulas contratuais
que desrespeitam regras constitucionais, ordinárias, entre outras, o Código de
Defesa do Consumidor e instruções do Banco Central do Brasil, como adiante se
verá.
CONTRATOS DE ADESÃO
18. Os contratos trazidos à análise deste MM. Juízo, como a maior parte dos
contratos bancários, constituem-se em contratos de adesão, que segundo a
conceituação do artigo 54, da Lei nº 8.078/90, são aqueles cujas cláusulas
tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas pelo
fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou
modificar substancialmente seu conteúdo.
19. Os Requerentes, enquanto consumidores, por força da extensão conceitual
feita pelo artigo 29, da Lei nº 8.078/90, segundo o qual, para fins do Capítulo
V do CDC (Das Práticas Comerciais) e do Capítulo seguinte (Capítulo VI - Da
Proteção Contratual), possuem proteção especial em se tratando de relação de
consumo ajustada através de contrato de adesão.
Normalmente quando o consumidor procura um estabelecimento de crédito,
pretendendo a contratação de qualquer serviço ou obtenção de financiamento, o
faz por necessitar muito do crédito pretendido.
20. Nesta situação, não pode dar ao luxo de discutir as cláusulas da avença,
especialmente quando o banco fornecedor já apresenta o instrumento contratual
elaborado, restando ao consumidor, aderir a ele ou não. O fato do tomador de
dinheiro aderir a este contrato não significa que tenha tomado conhecimento
integral do seu conteúdo, nem que esteja de acordo com as cláusulas ajustadas.
Raras as vezes, sequer é propiciado ao empresário ler atentamente as condições
contratuais.
21. Desta forma, a cláusula inserida em contrato de adesão, que desatenda os
parâmetros ditados pelo CDC, é nula de pleno direito, conforme expressamente
dispõe o art. 51 desta lei.
22. Portanto, tendo sido utilizado pelo Banco o contrato de adesão, não resta
dúvida de que, evidenciada qualquer cláusula ou condição que afronte o Sistema
de Proteção do Consumidor, restará ao Requerente, na qualidade de consumidor da
instituição financeira, a revisão de tais condições, com o intuito de adequá-la
para o restabelecimento do equilíbrio contratual, ou, pleitear a declaração de
nulidade da mesma, dependendo do caso.
23. As cláusulas a seguir enumeradas mostram-se excessivamente onerosas aos
Requerentes, caracterizando abusividade por parte da Instituição Financeira -
Ré, consubstanciando desrespeito pelas seguintes normas cogentes do CDC:
"4) SUBSTITUIÇÃO DA GARANTIA - obrigatoriedade do estabelecimento de novas
garantias, ou seu reforço, a exclusivo critério do Banco (incisos IV, XIII, do
art. 51, e § 1º, inciso II);
6) VENCIMENTO ANTECIPADO - autoriza o Banco unilateralmente ao cancelamento do
contrato (inciso XI, do art. 51);
7) COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - possibilidade de cobrança de taxas por fator
estabelecido unilateralmente pelo Banco (inciso X, art. 51, c/c inciso III, do §
1º do art. 51);
8) PENA CONVENCIONAL - estipulação de multa contratual a base de 10% cumuladas
com juros moratórios adicionais (§ 1º, do art. 52);
11) UTILIZAÇÃO DE CLÁUSULA-MANDATO - impõem representante para concluir ou
realizar outro negócio jurídico pelo consumidor, inclusive emitindo e aceitando
títulos de crédito (inciso VIII, art. 51);
17) COMISSÃO DE ENCARGOS, ACRÉSCIMOS E DESPESA PARA LIQUIDAÇÃO DO CRÉDITO -
obriga os requerentes a ressarcir custos de cobrança cumulados com os
estipulados como mora e multa contratual (inciso XII, art. 51);
19) CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO - estabelece outra Comarca, que não a dos
requerentes, para a discussão do contrato (incisos IV e XV, art. 51)."
24. Ao lado destas cláusulas que afrontam as normas de ordem pública enumeradas
soma-se a falta de cláusulas com caracteres ostensivos, legíveis e com destaque
(§§ 3º e 4º, do art. 54, do CDC), apresentação da taxa anual de juros (inciso
II, do art. 52, do CDC), e, por fim, multa superior a 10% (§ 1º, do art. 52),
pela cumulação de outros encargos.
25. Cumpre ainda observar que o contrato trazido a exame perante este MM. Juízo
vincula-se a diversos contratos anteriores (já juntados aos presentes autos), os
quais previam juros absurdos, que passaram a incidir sobre juros a medida em que
foi sendo aditado o contrato inicial - celebrado em .... de .... de .... Tal
prática abusiva acabou por elevar a dívida a montante muito acima do valor
inicialmente mutuado.
UTILIZAÇÃO DE CLÁUSULA-MANDATO
26. A cláusula .... estabelece empresa, ligada ao Banco requerido, como
procuradora da Requerente para a emissão e aceite de títulos de crédito.
Trata-se da chamada cláusula-mandato, que pelo seu caráter absurdo e nocivo foi
expressamente vedada pelo Código de Defesa do Consumidor:
"Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais
relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
[...]
VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico
pelo consumidor."
27. Além de abusiva a cláusula "mandato" inserida no contrato de adesão, porque
possibilita ao credor a adoção de medidas como o pretexto e a cobrança da
cambial, cumulativamente a outras medidas com base no contrato do qual teria
originado, deixa os requerentes a mercê do Banco que, na maioria das vezes,
preenche abusivamente a cambial, não guardando exata observância as condições
legalmente ajustadas.
28. Por outro lado, como se trata de expediente utilizado pelo credor
financiador, a supressão deste tipo de cláusula em nada prejudica o agente
financeiro, visto que este ainda terá representado seu crédito pelo contrato e
pelas garantias deste, que, preenchidos os requisitos do artigo 585, inciso II,
do Código de Processo Civil, afigura-se título executivo extrajudicial.
29. O Superior Tribunal de Justiça, através da Súmula 60, já pontificou:
"É nula a obrigação cambial assumida por procuração do mutuário vinculado ao
mutuante, no exclusivo interesse deste."
ILEGALIDADE DA COBRANÇA COM CUMULAÇÃO DE VERBAS, COMISSÃO DE PERMANÊNCIA E
ANATOCISMO
30. Existe cláusula do contrato firmado entre as partes que contêm ilegalidade
que deverão ser declaradas nulas a fim de não lesar os Requerentes, que
contrataram com boa-fé.
31. A comissão de permanência nada mais é do que correção monetária acrescida de
juros superiores aos normalmente praticados no mercado. A cobrança de comissão
de permanência cumulada com correção monetária do débito configura, pois,
prática ilegal.
32. Neste sentido é a jurisprudência sumulada do Superior Tribunal de Justiça:
"SÚMULA 30 - A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis."
33. Impossível, pois, cobrar-se o débito com a cumulação pretendida, sendo
necessário a vedação de sua aplicação ao presente caso, pelo controle
jurisdicional.
34. Por sua vez, na forma como está prevista nos contratos, não poderá ser
utilizada como verba remuneratória, uma vez que a fixação de sua taxa ficou
exclusivamente a critério do Banco, infringindo o inciso X, do artigo 51, bem
como o inciso II do artigo 52, ambos do Código de Defesa do Consumidor:
"Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva a outorga de
crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre
outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:
(...)
II - montante de juros demora e da taxa efetiva anual de juros;"
35. Portanto, inexiste permissivo legal que contemple a possibilidade de
cobrança de taxa de comissão de permanência da forma exigida pelo Banco.
36. Além da enumeração destas cláusulas, que são nulas de pleno direito, por
cominarem exações vedadas por lei de ordem pública, o banco está fazendo incidir
na cobrança dos valores em atraso, taxas de juros de forma cumulativa, o que,
além de não estar previsto contratualmente, constitui-se em prática defesa pela
Resolução BACEN nº 1.129, a qual veda a cobrança de qualquer outra taxa de
remuneração além da comissão de permanência e dos juros de mora.
37. Prepondera, no Superior Tribunal de Justiça, o entendimento de que é vedada
a cumulação inclusive de multa contratual com os juros legais de mora, declarado
na seguinte decisão:
"EXECUÇÃO PROMOVIDA POR INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - MULTA CONTRATUAL -
INEXIGIBILIDADE CUMULATIVAMENTE COM A COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.
Nas execuções promovidas por instituições financeiras, a multa contratual não
pode ser exigida conjuntamente com a comissão de permanência e com os juros
legais de mora. Resolução 1.129 do Banco Central, editando decisão do Conselho
Monetário Nacional, proferido nos termos do art. 4º, VI e XI, da Lei nº 4.595,
de 31.12.64.Recurso especial provido em parte." (Resp. nº 90.0010584-1; Rel.
Athos Carneiro. P. DJU 09.09.91).
38. Nesse sentido também é incabível a utilização da Taxa Referencial - TR -
como índice de correção monetária, eis que esta verba comporta juros em sua
fórmula.
39. Muito embora o contrato deixe de apresentar a TR como indexador, os extratos
do saldo devedor fornecidos pelo Banco apresentam o aludido referencial.
40. A Taxa Referencial TR, bem como a taxa de comissão de permanência, ao
cumularem com estipulação de juros moratórios e contratuais, não podem ser
aplicados simultaneamente sob pena de configurarem anatocismo - cumulação de
juros sobre juros -, prática vedada por lei.
41. Isto porque, como reconheceu o Plenário do Supremo Tribunal Federal (ADIN nº
493-0/DF), que teve como relator o Sr. Ministro Moreira Alves, em publicação do
DJ no dia 04.09.92, este indexador apresenta como componente de sua equação
Juros, não se prestando como índice de correção monetária.
De acordo com a decisão abaixo ementada:
"Ocorrência, no caso, de violação de direito adquirido. A taxa referencial (TR)
não é índice de correção monetária, pois, refletindo as variações do custo
primário da captação a prazo fixo, não constituindo índice que reflita a
variação do poder aquisitivo da moeda. Por isso, não há necessidade de se
examinar a questão de saber se as normas que alteram índice de correção
monetária se aplicam imediatamente, alcançando, pois, as prestações futuras de
contratos celebrados no passado, sem violarem o disposto no art. 5º, XXXVI, da
Carta Magna." (ADIN nº 493-0/DF; DJ 04.09.92; p. 14.089).
42. Portanto, configura-se impraticável a aplicação de referencial indexador que
contenha juros como componente da equação que define a desvalorização monetária.
43. O anatocismo está expressamente proibido pelo teor do art. 4º, do Decreto nº
22.626/33. Inobstante o "nomem iuris", o referido veículo normativo, pelo
fenômeno da recepção, tem eficácia de lei ordinária. O seu conteúdo está
reconhecido na Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal, ao declarar a
impossibilidade da cobrança de juros sobre juros. Exposando este entendimento,
trazemos a colação recente julgado no Superior Tribunal de Justiça que assim
decidiu a respeito da matéria:
"... súmula 121 não está superada pela de número 596. Na verdade, embora
relacionada ambas com juros e com o Decreto nº 22.626/33, apresentam nítida
distinção. (... omissis ...)
Enquanto o enunciado nº 596 se refere ao art. 1º, do Decreto 22.626/33, o
verbete 121 se apóia no art. 4º do mesmo diploma, guardando sintonia com a regra
que veda o anatocismo, ou seja, a cobrança de juros sobre juros." (RE nº
1.285-GO. 4ª Turma. Unânime. 04.11.89).
44. Está configurada, portanto, a prática de anatocismo por parte do Banco,
proporcionando seu enriquecimento ilícito em detrimento dos Requerentes. O
anatocismo é vedado no ordenamento jurídico brasileiro, pela Lei de Usura, pela
Resolução 1.129 do Banco Central e pela Constituição Federal.
DAS TAXAS DE JUROS ABUSIVAS
45. O contrato estabelece juros reais exorbitantes, muitas vezes acima dos
limites aceitos pelo sistema financeiro instituído pela Constituição Federal.
Sobre o tema da nocividade de juros reais elevados e aplicabilidade imediata do
dispositivo constitucional, o eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal,
Paulo Brossard, teve oportunidade de assinalar:
"Por maiores que sejam as referências dadas às autoridades monetárias, não posso
fechar os olhos para o fato certo e irremovível que está diante de nós e que a
todos envolve e atormenta: não é de hoje que se pretende combater a inflação
tornando o dinheiro mais caro. O expediente tem sido recomendado e praticado em
toda parte. Mas creio que em nenhuma parte ele tenha sido usado nas doses
brutais aqui empregadas - em meia dúzia de semanas as taxas subiram a 4.000%. O
mais grave não determina lhe é supérfluo o auxílio supletivo da lei, para
exprimir tudo de que o intenta, e realizar tudo que exprime (...). Quando essa
regulamentação normativa é tal que se pode saber, com precisão, qual a conduta
positiva ou negativa a seguir, relativamente ao interesse descrito na norma, é
possível afirmar-se que está completa e juridicamente dotada de eficácia plena,
embora possa não ser socialmente eficaz. Isso se reconhece pela própria
linguagem do texto, porque a norma de eficácia plena dispõe peremptoriamente
sobre os interesses regulados." (Artigo in Jornal Zero Hora, edição de
04.11.1991, p. 04. Tb. LEX JSTJ e TRF, vol. 41, p. 13).
46. Nesse sentido, citamos trecho de um artigo do eminente jurista Adriano
Kalfelz Martins:
"Em nenhum momento da história econômica e jurídica do Brasil houve tão
expressamente determinada a limitação da taxa de juros reais, como na atual
Constituição. O art. 192, § 3º, não excetua ninguém de seu espectro de eficácia,
não deixa lacunas e, muito menos, cria expectativas de exceção. Pelo contrário,
é taxativo e deve-se conceder-lhe um mínimo de eficácia, pois senão é melhor que
o risquemos da Carta Magna, sob pena de nós, estudantes dos fatos jurídicos,
compactuarmos com a hipocrisia e a imoralidade que se assentou em alguns setores
da sociedade." (in LEX JSTJ e TRF, vol. 41. p. 7-34).
47. Ora, observa-se que a norma citada tem eficácia plena, posto que seus
efeitos estão claramente colocados, regulando uma conduta que pode ou não
ocorrer. A eficácia imediata da norma constitucional é regra, necessitando de
lei complementar apenas aquelas disposições que por seu conteúdo são
insuficientes, o que não vem ao caso. O referido preceito contém uma proibição,
esta é imperativa, sendo totalmente ilógico que argumente-se a necessidade de
Lei Complementar que o regule.
48. Tal é o entendimento do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, através de sua
3ª Câmara Cível:
"É auto-aplicável o § 3º, da Constituição da República, que proíbe cobrança de
juros acima de 12% do valor atualizado do débito, pelo que exerce agiotagem que
infringe a regra." (Apelação Cível nº 115947-7, Relator Ximenes Carneiro).
49. Também assim o entendeu a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Paraná:
"JUROS - Limite Constitucional. Art. 192, § 3º da CF. Norma auto-aplicável.
Necessidade de regulamentação somente no tocante à definição da ilicitude penal,
naturalmente em respeito ao princípio da reserva legal." (Apelação Cível nº
43000-4, Relator Walter Borges Carneiro).
50. Conclui-se que a referida norma possui aplicabilidade imediata devido ao seu
caráter limitativo e impositivo, por menos que queiram alguns setores da nossa
sociedade, como os banqueiros que desejam continuar cobrando taxas de juros
imorais e exorbitantes.
O PEDIDO
51. Diante do exposto, presentes os requisitos legais, respeitosamente na
presença de Vossa Excelência, requer-se desde já a reconsideração da decisão de
fls., com eventual revogação da medida liminar constritiva. Caso este não seja o
entendimento de Vossa Excelência, requer-se que nomeie a própria Requerida como
depositária dos bens na pessoa de seus diretores, evitando a paralisação das
atividades da empresa e a ocorrência dos danos irreparáveis acima apontados.
Ao final, requer-se o julgamento de total improcedência do pedido formulado, eis
que o contrato no qual se baseia está eivado de nulidades, condenando o
Requerente ao pagamento de todas as custas processuais, assim como dos
honorários advocatícios.
Protesta-se pela produção de todas as provas em direito admitidas, especialmente
pelo depoimento pessoal do representante legal do réu, perícia contábil e oitiva
de testemunhas.
N. Termos,
P. Deferimento.
...., .... de .... de ....
..................
Advogado