Contestação à ação de indenização por erro médico, em que o réu alega que tal atividade é de meios e não de resultado.
EXMO. SR. DR. JUIZ DA .........ª VARA DA JUSTIÇA FEDERAL - SEÇÃO JUDICIÁRIA
DE .......
Autos n.º: ............
Autora: ...............
Réu: ........................
Hospital ............, pessoa jurídica de direito público, entidade autárquica
federal, com sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado
....., por intermédio de seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a)
(procuração em anexo - doc. 01), com escritório profissional sito à Rua .....,
nº ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe notificações e
intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência apresentar
CONTESTAÇÃO
à ação de indenização por erro médico proposta por ....., pelos motivos de fato
e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
A versão dos fatos, tal como apresentada na inicial, encaminha o raciocínio para
conclusões equivocadas. As alegações efetuadas para a demonstração dos
acontecimentos conduzem a um nexo de causalidade e a imputação de culpa que,
observados mais de perto, não estão bem caracterizados. Daí porque a alegada
responsabilização não merece prosperar.
Muito embora as disposições de lei que embasam a peça vestibular no tocante ao
pedido indenizatório refiram-se a responsabilidade objetiva, observa-se a
referência a culpa presumida, ou seja, faz-se menção também à responsabilidade
subjetiva, o que implica necessariamente a caracterização da culpa, além do
inarredável liame de causalidade entre o dano e a ação praticada. Nenhum desses
elementos vem demonstrado pela autora, porém.
Diga-se, isso sim, que a versão ofertada pela inicial, dos fatos alegados para
demonstração dos danos sofridos pela autora em decorrência de uma cirurgia
realizada no Hospital ........................da ora contestante, é de toda
equivocada.
A doutrina especializada no estudo das falhas profissionais da Medicina,
acontecimentos a que a linguagem técnica denominou de erro médico é peremptória
em rejeitar o erro presumido, assim pacificado pelos nossos Tribunais.
Esse estudo de erro médico impõe a diferenciação entre o que se denomina de
acidente imprevisível e mal resultado, adiante esclarecido.
DO DIREITO
Em conferência de âmbito nacional no FÓRUM SOBRE ERRO MÉDICO, em Limeira/SP,
publicada no Arquivo do Conselho Regional de Medicina do Paraná, vol. 7, n.º 27
- jul/set-1990, pág. 148, assim se discorreu sobre a referida diferenciação:
"... Daí a necessidade de se estabelecer, desde logo, a diferença entre erro
médico, acidente imprevisível e mal resultado. No acidente imprevisível há um
resultado lesivo, declaradamente oriundo de caso fortuito ou força maior, à
integridade física ou psíquica do paciente, durante o ato médico ou em face
dele, porém incapaz de ser previsto e evitado, não só pelo autor, mas por outro
qualquer, em seu lugar. É o infelicitas factis. O mal resultado seria aquele
proveniente de uma situação incontrolável e de curso inexorável. Ou seja, aquele
resultado decorrente da sua própria circunstância e evolução, em que as
condições atuais da ciência e a capacidade profissional ainda não oferecem
solução. Por isso, a consagração da doutrina que afirma ter o médico com o
paciente uma obrigação de meios ou de diligência e não uma obrigação de
resultado. Ele assume o compromisso de prestar meios adequados, de agir com
diligência e de usar seus conhecimentos na busca de um bom resultado, sabe Deus
nem sempre possível.
O erro médico, ao contrário do acidente imprevisível e do mal resultado, é
decorrência da culpa em sentido estrito. Na sua investigação há que se levantar
se houve negligência, imperícia ou imprudência.
Conforme atesta o prontuário anexado à presente resposta, cuja juntada ora se
requer, a autora foi internada no Hospital ................. no dia ........,
com queixa principal .................. A cirurgia realizada não consistia em um
procedimento estético, mas, tão somente, em uma intervenção cirúrgica
reparadora, o que descaracteriza a obrigação de resultado para com a estética da
paciente, uma vez que não se tratava de cirurgia plástica.
Os exames mostrava sinais de
...............................................................................................................
O plano cirúrgico era de
.......................................................................................................................
Tendo em vista o intuito reparador da cirurgia, qual seja, alterar a estrutura
das pálpebras para possibilitar uma melhor visibilidade, percebe-se que a
intervenção cirúrgica não possuía um caráter estético, mas simplesmente um
conteúdo de profilaxia.
Saliente-se, por isso, que as alegações de que as pálpebras teriam sido
seccionadas de maneira imprudente resultando em danos estéticos não deve
prosperar, uma vez que a intenção do procedimento era proporcionar um tratamento
ao problema apresentado , e não uma melhor aparência à paciente, o que demonstra
que a obrigação, por possuir um caráter terapêutico, não era de resultado, mas
sim de meio.
É oportuno salientar, que o problema causado anteriormente pelas pálpebras da
paciente foi devidamente solucionado, não tendo restado qualquer tipo de
seqüelas à saúde da mesma.
Da leitura do prontuário é possível depreender que a paciente foi devidamente
atendida, não se encontrando qualquer elemento informador de ato ausente de
cuidados, precipitado ou insensato (imprudente), ou ainda descaso, indolência,
inércia (negligência), ou despreparo prático ou científico (imperícia).
Como, então, insistir-se numa possível omissão de tratamento ou em ato ilícito
que não existiu??? Se tanto a técnica utilizada como a recuperação do
procedimento cirúrgico foram regulares, como demonstra o prontuário anexo, nas
diferentes fases do pós-operatório, como caracterizar a "ação ou omissão
voluntária, negligência, ou imperícia" da equipe médica da Ré ???
O Hospital ........................da ora ré acha-se, como todos os demais
nosocômios, submetido às regras do Conselho Federal de Medicina - CFM -, sob
fiscalização constante deste.
Dito isso, tem-se que o Corpo Clínico do Hospital .................., por meio
dos diferentes componentes da sua equipe médica, quando do tratamento ministrado
ao paciente agiu dentro das previsões científicas e doutrinárias referentes aos
atos que lhe incumbiam.
Não há, insiste-se, o que ser reparado pela autarquia ora ré. Todos os esforços
e meios técnicos compatíveis e disponíveis no Hospital
........................foram utilizados no tratamento a que se submeteu ao
autor, com a diligência e presteza necessárias e compatíveis.
A obrigação do médico para com o paciente se reveste da natureza de obrigação de
meios e não de obrigação de resultado. Essa a tese doutrinária, seguida da
fluente jurisprudência dominante dos nossos Tribunais( em conformidade com o
Código Civil de 1916), tais como, exemplificativamente, colacionamos abaixo:
RESPONSABILIDADE CIVIL - MÉDICO - Danos físicos atribuídos a tratamento por ele
ministrado - Obrigação de meio e não de resultado - Regularidade da conduta do
profissional - Culpa não configurada - Indenização afastada - Recurso provido -
Voto vencido - Inteligência do art. 1545 do CC. "Se a prescrição da medicação
foi pertinente e cercada das cautelas recomendáveis e não havendo prova de que o
profissional da Medicina foi negligente, imperito ou imprudente no
acompanhamento do tratamento, não há como considerar procedente a ação de
indenização." (decisão da Apelação n.º 11.267-1 do Tribunal de Justiça de São
Paulo, relator Des. Fonseca Tavares, de 19.3.1986).
INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE CIVIL - Erro médico - Inocorrência - Perícia
conclusiva no sentido de que a equipe médica atendeu aos recursos e normas
usuais da técnica cirúrgica - Dores da apelante que não tiveram origem direta no
ato cirúrgico, mas no processo de cicatrização - Ação improcedente - Recurso não
provido. (Apelação Cível n.º 223.249-1 - São Caetano do Sul - Relator EDUARDO
BRAGA - CCIV 3 - V.U. - 14.3.1995).
INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE CIVIL - Hospital - Erro Médico - Não comprovação
- Alta médica precipitada, após cesariana - Perda do útero - Causa da infecção
que ensejou a perda do órgão não identificada o que afasta a comprovação da
culpa - Ação improcedente - Recurso provido. (Relator Ney Almada - Apelação
Cível n.º 185.784-1 - Franco da Rocha - 6.5.1993).
MÉDICO - RESPONSABILIDADE CIVIL - CULPA - INOCORRÊNCIA - APELO PROVIDO. A
responsabilidade civil dos médicos decorre de culpa provada e não presumida. Não
resultando provado nos autos que o apelante agiu com imprudência, imperícia ou
negligência, nem verificada a hipótese de erro grosseiro, mas, ao contrário,
consoante laudo técnico, unanime, que houve uma complicação natural suscetível
as cirurgias desta natureza (quesito 6- fls. 66), dá-se provimento ao apelo para
julgar improcedente a ação, com inversão dos ônus da sucumbência.
É sensato e justo, por isso, que tanto o Hospital da ora ré como os seus médicos
sejam isentados das responsabilidades imputadas contra si, vez que os males que
afligiram a autora não decorreram de erro ou omissão da equipe médica do
Hospital ........................da .........................
O pedido da autora vem embasado, no artigo 186 do Novo Código Civil, é de se
observar que o aludido dispositivo refere-se à responsabilidade objetiva, que
impõe o dever de reparação se restar indubitável o liame de causa e efeito entre
o dano ocorrido e o ato praticado.
Como se está na esfera estatal, o que deve se indagar é sobre o nexo de
causalidade entre a ação ou omissão do Estado e o evento danoso pois, para que
seja imputada ao Estado responsabilidade civil por danos causados por agente
público há que resultar cumpridamente provado o nexo de causalidade entre a
conduta do agente e os prejuízos havidos.
A obrigação do Estado de reparar o dano depende da prova, pelo lesado, não
apenas de que sofreu o dano, mas que o sofreu em razão de um ato praticado (ou
de uma omissão) pelo servidor público.
Conforme já se ressaltou, as afirmações efetuadas pela própria autora afastam a
possibilidade de responsabilização da ........................, eis que
comprovam a inexistência de relação de causa e efeito entre os danos alegados e
a atuação procedimental do Hospital de Clínicas. Para evidenciar uma vez mais a
impropriedade das alegações, ressalta-se a ausência de nexo de causalidade entre
os males cujo sofrimento alega a autora e qualquer atuação errônea ou mesmo
omissão por parte dos profissionais do quadro do Hospital
........................da .........................
Reitera-se, portanto que, se danos houve para a autora, esses não decorreram da
atuação do Hospital ........................da ........................,
porquanto os documentos ora juntados revelam o que é de conhecimento médico: a
bibliografia médica aponta para a possibilidade de surgirem algumas complicações
decorrentes de fatores externos, em função da reação do próprio organismo do
paciente.
Inexistente o nexo de causalidade entre a ação do Hospital
........................e os danos alegados pela autora, eis que evidenciado um
desvio na causa do evento danoso; descaracterizado está, portanto, o liame de
causa e efeito a ensejar a responsabilidade da .........................
Silvio RODRIGUES (Direito Civil:Responsabilidade Civil. 12. Ed. São Paulo:
Saraiva, 1989, p. 18) observa, quanto à relação de causalidade:
"Para que surja a obrigação de reparar, mister se faz a prova de existência de
uma relação de causalidade entre a ação ou omissão culposa do agente e o dano
experimentado pela vítima. Se a vítima experimentar um dano, mas não se
evidenciar que o mesmo resultou do comportamento ou atitude do réu, o pedido de
indenização, formulado por aquela, deverá ser julgado "improcedente".
Se inexiste causalidade entre o dano e o procedimento do agente público, no caso
sob exame representado pelos atos praticados pelos médicos, descabe o dever da
Fazenda Pública indenizar.
3. DA INDENIZAÇÃO PLEITEADA: DANOS MORAL, ESTÉTICO E MATERIAL.
De todo o exposto, já se faz presente raciocínio em desfavor da autora no que
tange ao atendimento da reparação de quaisquer dos danos pretendidos, eis que
não causados pelo Hospital ........................da .........................
É de se observar, também, que os pedidos indenizatórios que se seguem, até mesmo
o de cunho moral, são idênticos no sentido de visarem à mesma reparação,
cabendo, pois, argumentar se a somatória de todos não caracterizaria
locupletamento ilícito frente aos cofres públicos.
Em relação aos danos materiais, inadmissível o atendimento à pretensão da
autora, eis que não foram causados pela entidade ora ré.
Relativamente ao dano moral ressalte-se, de início, que a autora não teve, de
modo algum, seus atributos de ser humano atingidos, tais como a sua honradez,
seu nome, seus valores espirituais.
É de se levar em conta, nesse particular, que o chamado dano estético (cuja
reparação pretende a autora mediante custeio de cirurgia plástica reparadora)
insere-se na definição jurídica de dano moral, eis que caracterizado pela lesão
à beleza física, à harmonia das formas externas de alguém, representa uma ofensa
a um direito da personalidade (KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do
médico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996, p.87-88). Portanto, as
considerações seguintes sobre dano moral ao dano estético também se aplicam,
porquanto o segundo está inserido no conceito do primeiro.
O ressarcimento por dano moral (e também o estético) não se impõe no caso dos
autos, vez que o dano moral advém tão somente do ato ilícito praticado pelo
agente causador.
É o entendimento jurisprudencial, conforme se depreende, a título de exemplo, da
decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (Ap. 181.514-1/1 - 4ª
C.Cív. - Rel. Des. Olavo Silveira - j. 11.02.93):
"Dano moral. Indenização. Erro médico. Fato não comprovado.Verba, ademais, que
se justifica quando o ilícito resulte de... Improcedência da ação decretada.
Declaração de voto.
É imperioso lembrar que o dano moral só se justifica quando o ilícito resulte de
ato doloso, em que a carga de repercussão ou perturbação nas relações psíquicas,
na tranqüilidade, nos sentidos e nos afetos de uma pessoa, se reflita como
decorrência da repulsa ao ato intencional do autor do crime. Tal carga, à
evidência, não pode ser encontrada num delito culposo, especialmente como no
caso, sem demonstração de culpa, em qualquer de suas modalidades e ressalte-se,
duvidosa até a prova da ocorrência do apontado erro médico."
No caso sob exame, nenhum ato comissivo ou omissivo eivado de ilicitude foi
realizado pelos médicos da ora ré. Ao contrário, no tratamento da autora sempre
foram envidados todos os esforços pela equipe médica do Hospital
........................para que o mesmo recebesse os cuidados que o seu quadro
clínico requer.
Assim, não há pressuposto legal à reparação de dano moral requerida.
Conclui-se, pois, pela completa improcedência do pedido de reparação dos danos
alegados, porquanto nenhum deles vem revestido de irrefutável prova e em versão
juridicamente aceitável.
DOS PEDIDOS
De todo o exposto, respeitosamente requer:
1. A produção das provas em direito admitidas, especialmente pericial e
testemunhal e juntada de documentos, nesta oportunidade e posteriormente, os que
se fizerem necessários e oportunos.
2. Sejam todos os pedidos veiculados pelo autor julgados improcedentes, ante a
ausência de fundamentação fática e jurídica, com a condenação nas verbas de
sucumbência.
3. Protesta-se pela juntada dos documentos que acompanham a presente (cópias do
prontuário médico completo da paciente autora).
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]