Ação civil pública proposta em face de propaganda omissiva de construtora de edifícios.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
...., associação civil sem fins lucrativos, instituída especialmente para
promover a defesa em juízo dos direitos difusos, coletivos e individuais
homogêneos pertinentes à cidadania, aos consumidores e outros, na forma do seu
estatuto social, regularmente constituída e registrada no....Ofício de Registro
Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca do ....., com sede na rua ....., por seu
advogado no final assinado, conforme instrumento de mandato anexo, que recebe
intimações na sede da associação autora (doc.2), vem mui respeitosamente perante
V.Exa. propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR
em face de
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir
aduzidos.
DOS FATOS
Conforme se vê da publicidade veiculada no Jornal ....., a empresa demandada ali
expôs à venda os apartamentos em construção do Edifício ......
Outras informações, além da própria imagem do Edifício, dão conta de que os
apartamentos são totalmente nascentes e que as prestações são corrigidas pelo
INCC, mais juros de 1% a.m. e que, em atenção à Lei nº4591/64, as fotos e
ilustrações têm caráter exclusivamente promocional, por se tratar de bem a ser
construído (Jornal .....)
De igual modo, outras tantas informações que constam do anúncio publicitário,
também se vêem estampadas nos impressos da empresa demandada, obtidos na página
www......, exposta na mesma publicidade, relativamente ao mesmo edifício e
outros, onde se vê detalhamento de preços, planta baixa, croquis de localização
(docs. .....).
À primeira vista, a informação nessa oferta de venda publicitária e nos
impressos parece completa. Todavia, dela não consta a informação mais relevante
para os consumidores em geral. Trata-se da ausência do número do registro dos
documentos, tais como título de propriedade de terreno, certidões negativas de
impostos, histórico dos títulos de propriedade, projeto de construção, cálculo
das áreas, certidão negativa e memorial de construção, dentre outros
É caso, pois, de publicidade omissiva que, muito embora dirigindo-se a toda a
coletividade, a quem pretende vender os apartamentos de que trata o item
precedente, deixa de realçar informação importantíssima e essencial para os
consumidores, consoante se demonstrará em seguida.
DO DIREITO
De fato, desde longa data, tal se vê do § 3º do art.32 da Lei 4.591, de 16.12.64
(Lei da Incorporação Imobiliária),
“O número do registro, bem como a indicação do cartório competente, constará,
obrigatoriamente, dos anúncios, impressos, publicações, propostas, contratos,
preliminares ou definitivos, referentes à incorporação, salvo dos anúncios
classificados” (grifou-se).
Já o art.31 da Lei 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor), de forma cogente
assevera que:
“A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações
corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas
características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de
validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à
saúde e segurança dos consumidores” (grifou-se)
De outra parte, diz o § 1º do art. 37 do mesmo diploma legal que
“É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter
publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo
por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza,
característica, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer
outros dados sobre produtos e serviços”. (grifou-se)
Quer isto dizer que a oferta ao público consumidor há que fazer-se com
observância de preceptivos legais, disso decorrendo que o comportamento
transgressivo e, portanto, ilegal, consuma-se com a simples exposição à venda de
produtos e serviços, desde que desacompanhada das informações consideradas
essenciais.
Versando sobre o dever de informar, preleciona o eminente professor Roberto
Senise Lisboa, na sua obra Contratos Difusos e Coletivos, ed. RT, 1997, pág.
159:
“Em qualquer modelo contratual, o direito à informação clara e precisa é de suma
importância, verificando-se a sua ocorrência em razão do princípio da boa-fé
entre as partes. A obrigação do predisponente de prestar a informação devida é
pertinente desde a oferta, por qualquer meio, sob pena de responsabilização
pré-contratual, se resultar dano a terceiro interessado, na formação do negócio
jurídico em questão. A incompatibilidade com a boa-fé não pode, de qualquer
forma, se verificar nas relações de consumo, por ser concepção norteadora de
todo o sistema consumerista brasileiro (art. 4º, III, parte final da Lei
8.078/90)”.
O eminente civilista Everaldo Augusto Combler, reportando-se aos deveres do
incorporador, na sua obra Responsabilidade Civil na Incorporação Imobiliária,
ed. RT, 1998, págs.199/200, adverte:
“Destarte, o lançamento da incorporação assume os contornos de uma oferta à
pessoa indeterminada, ficando o incorporador a ela vinculado desde o momento em
que essa oferta chega ao conhecimento público. Resulta inequivocamente do texto
legal que o memorial registrado no Registro de Imóveis integra os contratos de
incorporação, celebrados com os adquirentes das unidades autônomas, não podendo
ser unilateralmente modificada por qualquer das partes, de tal forma que, para
garantia do adquirente, é como se todos os dados do memorial estivessem
transcritos no contrato de incorporação (...) O número do registro, bem como a
indicação do cartório competente, deverá constar, obrigatoriamente, dos
anúncios, impressos, publicações, propostas, contratos preliminares ou
definitivos, referentes à incorporação (art. 32, 3º da LCI)” – grifou-se .
A omissão ora verificada na publicidade e nos impressos representa pesado ônus
para toda a sociedade de consumo. Tal se diz porque, conforme dispõe a lei de
forma cogente, o incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas
após ter arquivado, no Cartório Registral competente, os documentos já
mencionados precedentemente, dentre eles o memorial descritivo. Demais disso,
esse número do registro deve ser informado nas publicidades.
Veja-se a respeito da omissão publicitária o magistério do eminente jurista
Antonio Herman Benjamin et allii (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, 6ª
ed. Forense Universitária, 1999, pág.293):
“A publicidade pode ser enganosa tanto pelo que diz como pelo que não diz.
Enquanto na publicidade enganosa comissiva qualquer dado do produto ou serviço
presta-se para induzir o consumidor em erro, na publicidade enganosa por
omissão, só a ausência de dados essenciais é reprimida. De fato, não seria
admissível que, em quinze segundos de um anúncio televisivo, o fornecedor fosse
obrigado a informar o consumidor sobre todas as características e riscos de seus
produtos ou serviços. Assim, nos termos da lei e nos passos do Direito
Comparado, só aquelas informações essenciais são obrigatórias. Por essenciais
entendam-se as informações que têm o condão de levar o consumidor a adquirir o
produto ou serviço” (grifou-se)
Portanto, não há dúvida de que a informação publicitária exaustiva, seja aquela
constante de veiculação através da imprensa escrita, como é o caso, sejam
aqueloutras que, de igual forma, expõem à venda através de impressos, devem
ostentar o número do registro do Cartório Registral, a fim de que os
consumidores possam ali inteirar-se das efetivas condições relativas ao bem que
estão adquirindo, seja quanto aos direitos de propriedade, seja em relação a
outros direitos conexos, pois que o direito à informação representa o
asseguramento do equilíbrio contratual e do princípio da boa-fé objetiva em todo
e qualquer ato de relação de consumo, especialmente na oferta.
DOS PEDIDOS
Ante o exposto, e considerando-se que se vê demonstrado o ‘periculum in mora’ (a
probabilidade efetiva de aquisição pelos consumidores dos apartamentos
ofertados, sem o conhecimento devido de aspectos fundamentais a eles
pertinentes), sendo indiscutível o ‘fumus boni iuris’, de vez que se pede tão
somente o cumprimento da lei, ora descumprida de forma danosa a todos os
potenciais compradores dos apartamentos e que poderão experimentar a
irreparabilidade do dano, em face da ausência do número do registro no Cartório
Registral, que impede o conhecimento detalhado de situações fáticas e jurídicas
dos imóveis ofertados, requer a Associação autora a V. Exa. que se digne
conceder medida liminar, independentemente da audição da parte demandada, tendo
em vista principalmente a relevância do fundamento da demanda e o justificado
receio de dano que venha de ser causado a coletividade de consumidores, sob a
forma de ilícito continuado (art.84, § 3º do CDC), para o fim de determinar que
a empresa demandada passe a indicar o número do registro do imóvel no Cartório
competente, relativamente ao Edifício...., em fase de incorporação, tanto nas
publicidades, quanto nos anúncios, impressos, publicações, e propostas,
referentes ao mesmo edifício, ora em construção.
Posto isso, na forma do art. 282 e seguintes do CPC, Lei nº7.347/85, c.c os
arts. 81, 84, 6º, III, 30, 31, 37, § 1º, do CDC, 32, §§ 1º e 3º da Lei 4.591/64,
demais legislação aplicável à espécie, é a presente para requerer a citação da
empresa demandada, pedindo-se que seja julgada procedente a presente ação, para
o especial fim de ser a demandada compelida, sob pena de pagar multa diária de
R$..... a
I. Indicar, de forma adequada, clara e ostensiva, o número de registro do
Edifício..... e outros, ora em construção ou que venha expor à venda, em todas
as publicidades, anúncios, impressos, publicações e propostas, bem como oferta
informatizadas, a partir da ciência da presente demanda, sob pena de cominação
de multa de R$....., por cada dia de descumprimento.
II. Seja ainda a empresa demandada condenada ao pagamento das custas processuais
e dos honorários advocatícios, estes que deverão ser fixados com observância do
§ 3º do art. 20 do CPC, na base de 20% sobre o valor da causa
III. Protesta-se por todos os meios de prova admitidos em Direito, especialmente
pelo depoimento pessoal do representante legal da demandada, oitiva de
testemunhas, demais provas compatíveis com a natureza da demanda, muito embora
se trate de questão unicamente de Direito, pelo que, s.m.j., pede-se também seja
adotado o julgamento antecipado da lide.
IV. Pede-se ainda a dispensa do pagamento de custas, emolumentos outros
encargos, desde logo, a teor do art. 18 da Lei n.º 7.347/85 e do art. 87 da Lei
n.º 8.078/90.
Dá-seà causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]