Mandado de segurança contra ato de superintendente do
INSS, para que não proceda à cobrança de contribuição sobre pró-labore, ante
a inconstitucionalidade da Lei complementar 84/96.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DA .... VARA DA JUSTIÇA FEDERAL DA SUBSEÇÃO
DE .... - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO .....
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., por intermédio de seu advogado (a) e bastante
procurador (a) (procuração em anexo - doc. 01), com escritório profissional sito
à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe
notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa
Excelência impetrar
MANDADO DE SEGURANÇA
em face de
Ato de Superintendente do INSS, na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade
....., Estado ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
Instituída originariamente pela Lei nº 7787 de 03.07.89 a contribuição incidente
sobre o "PRÓ-LABORE" e pagamentos a autônomos, diretores e administradores,
ratificada pela Lei nº 8212/91 em seu artigo 22, inciso I.
DO DIREITO
Questionada a exação, restou declarada sua incontitucionalidade, através de
festejada decisão do Supremo Tribunal Federal, que julgando o Recurso
Extraordinário nº 166.772-9/RS assim decidiu:
"EMENTA - INTERPRETAÇÃO - CARGA CONSTRUTIVA - EXTENSÃO. Se é certo interpretação
traz em si carga construtiva, não menos correta exsurge a vinculação à ordem
jurídico constitucional. O fenômeno ocorre a partir das normas em vigor,
variando de acordo com a formação profissional e humanística do intérprete. No
exercício gratificante da arte de interpretar, descabe "inserir na regra do
direito o próprio juízo - por mais sensato que seja - sobre a finalidade que
"conviria" fosse por ela perseguida" - Celso Antônio Bandeira de Mello - em
parecer inédito. Sendo o direito uma Ciência, o meio justificar o fim, mas não
este àquele.
CONSTITUIÇÃO - ALCANCE POLÍTICO - SENTIDO DOS VOCÁBULOS - INTERPRETAÇÃO. O
conteúdo político de uma Constituição não é conducente ao desprezo do sentido
vernacular das palavras, muito menos ao do técnico, considerados institutos
consagrados pelo Direito. Toda ciência pressupõe a adoção de escorreita
linguagem, possuindo os intuitos, as expressões e os vocábulos que a revelam
conceito estabelecido com a passagem do tempo, quer por força de estudos
acadêmicos, quer, no caso do Direito, pela atuação dos Pretórios.
SEGURIDADE SOCIAL - DISCIPLINA - ESPÉCIES - CONSTITUIÇÕES FEDERAIS - DISTINÇÃO.
Sob a égide das Constituições Federais de 1934, 1946 e 1967, bem como a Emenda
Constitucional nº 01/69, teve-se a previsão geral do tríplice custeio, ficando
aberto campo propício a que, por norma ordinária, ocorresse a regência das
contribuições. A Carta da República de 1988 inovou. Em preceitos exaustivos -
incisos I, II, III do artigo 195 - impôs contribuições, dispondo que a lei
poderia criar novas fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da
seguridade social, obedecida a regra do artigo 154, inciso I, nela inserta (§ 4º
do artigo 195 em comento).
CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - TOMADOR DE SERVIÇOS - PAGAMENTOS A ADMINISTRADORES E
AUTÔNOMOS - REGÊNCIA. A Relação jurídica mantida com administradores autônomos
não resulta de contrato de trabalho e, portanto, de ajuste formalizado à luz da
consolidação das Leis do Trabalho. Daí a impossibilidade de se dizer que o
tomador dos serviços qualifica-se como empregador e que a satisfação do que o
devido ocorra via folha de salários. Afastando o enquadramento no inciso I do
artigo 195 da constituição Federal, exsurge a desvalia constitucional da norma
ordinária disciplinadora da matéria. A referência contida no § 4º do artigo 195
da Constituição Federal, e no inciso I do artigo 154 nela insculpido, impõe a
observância de veículo próprio - a lei complementar. Inconstitucionalidade do
inciso I do artigo 3 da lei nº 7.787/899, no que abrangendo o que pago a
administradores e autônomos. Declaração de inconstitucionalidade limitada pela
controvérsia dos autos, no que são envolvidos pagamentos a avulsos.." (STF RE
166.772, RS, DJU-I, p. 12.246, 20/05/94, Rel. Ministro Marco Aurélio).
Como conseqüência, o Senado Federal, mediante Resolução nº 14/95, suspendeu os
efeitos do artigo 3º inciso I da Lei nº 7.787/89.
Igualmente inconstitucional foi declarado o artigo 22, inciso I da Lei nº
8.212/91, mediante decisão do Supremo Tribunal Federal, quando julgou o ADIN nº
1.102-2, com publicação datada de 16.10.95 através do DJU-I, p. 34.570.
Tendo em vista que um dos tópicos da declaração de inconstitucionalidade da
exação refere-se a ausência de Lei Complementar, em 18.01.96 foi editada a Lei
complementar nº 84, regulamentada pelo Decreto nº 1826/96. Superada,
temporariamente, a questão formal da norma, há que ser analisada a inteligência
técnico-jurídica da letra da lei que assim estabelece:
"Art. 1º - Para a manutenção da Seguridade social, ficam instituídas as
seguintes contribuições sociais:
I - a cargo das empresas e pessoas jurídicas, inclusive cooperativas, no valor
de quinze por cento do total das remunerações ou retribuições por elas pagas ou
creditadas no decorrer do mês, pelos serviços que lhes prestam sem vínculo
empregatício, os segurados empresários, trabalhadores autônomos, avulsos e
demais pessoas físicas; e
II - A cargo das cooperativas de trabalho, no valor de quinze por cento do total
das importâncias pagas, distribuídas ou creditadas a seus cooperados, a título
de remuneração ou retribuição pelos serviços que prestem a pessoas jurídicas por
intermédio delas".
Ocorre, que muito embora atendido o aspecto normativo, o simples fato de
alterar-se a norma disciplinadora da exigência não possui o condão de
conferir-lhe constitucionalidade, dado que permaneceu as violações ao texto da
Lei Maior, no que se refere ao artigo 195, § 4º c/c art. 154, I, que determinam:
"Art. 195 - ....
§ 4º - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção
ou expansão da seguridade social, obedecendo o disposto no artigo 154, I".
E assim prevê o mencionado artigo:
"Art. 154 - A União poderá instituir:
I - Mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde
que não sejam cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios
dos discriminados nesta Constituição."
Ocorre que a contribuição instituída pela Lei Complementar nº 84/96 apresenta o
fato gerador e a base de cálculo em inaceitável identidade com o imposto sobre a
renda, que assim está fundamentado em sua essência constitucional, mediante o
disposto no art. 153, III da Lei Maior, "verbis":
"Art. 153 - Compete a União instituir impostos sobre:
I - ....
II - ....
III - renda e proventos de qualquer natureza".
E pela definição contida no Código Tributário Nacional, resta clara a intenção
de incidência do Imposto de Renda, senão vejamos:
"Art. 43 - O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de
qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica
ou jurídica:
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação
de ambos;
II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos ao acréscimos
patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
Art. 44 - A base de cálculo do imposto é montante real, arbitrado ou presumido,
da renda e dos proventos tributáveis."
Por sua vez, as Leis nº 9249 e 9250 de 1996 ratificaram na íntegra o contido nos
artigos 7 e 25 da Lei nº 8981/95, "verbis";
"Art. 7º - A partir de 1º de janeiro de 1995, a renda e os proventos de qualquer
natureza, inclusive os rendimentos e ganhos capitais, percebidas por pessoas
físicas residentes ou domiciliados no Brasil, serão tributados pelo imposto de
renda na forma da legislação vigente, com as modificações introduzidas por esta
lei.
....
Art. 25 - A partir de 1º de janeiro de 1995, o imposto de renda das pessoas
jurídicas, inclusive das equiparadas, será devido à medida em que os
rendimentos, ganhos e lucros forem sendo auferidos."
Desta forma, resta evidente que a Contribuição instituída pela Lei Complementar
nº 84 de 18.01.96 apresenta-se com o mesmo fato gerador e a mesma base de
cálculo do imposto sobre a renda. A par disto, é relevante frisar que a previsão
de incidência da exação sobre os totais das remunerações ou retribuições pagas
pelas empresas aos que lhe prestam serviços sem vínculo empregatício
(empresários, autônomos, avulsos) é a revalidação de obrigação já julgada
inconstitucional.
Além disto, quando se trata da contribuição incidente sobre os autônomos, esta
apresenta o mesmo fato gerador e base de cálculo do ISS - Imposto Sobre Serviços
de Qualquer Natureza.
Tal assertiva resta evidente pelos dispositivos constantes dos artigos 8º e 9º
do Decreto-Lei nº 406/68, que assim estabelece:
"Art. 8º - O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer
natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional
autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa.
Art. 9º - A base de cálculo do imposto é o preço dos serviços."
Relevante ainda é o fato de que após 60 dias de sua exigibilidade (o que se deu
a partir de maio/96), a contribuição ter tido a alíquota alterada de 15% para
20%, através da Medida Provisória nº 1463-3 de 26.07.96.
Ora, alterada a alíquota e sendo esta um dos elementos essenciais da
contribuição, perdeu esta a formalidade que lhe era conferida pela Lei
Complementar.
Ademais, sendo os autônomos contribuintes do ISS, os seus serviços já são
tributados pelo carnê de contribuição, ocorrendo bitributação no ato do
recolhimento da contribuição ora combatida, se assim for atendida pelo tomador
de serviços. O mesmo diga-se do empresário contribuinte, que poderá estar
contribuindo pelo carnê.
A par da bitributação, verifica-se ainda a cumulatividade de tributos sobre a
mesma base de cálculo e fatos geradores em relação ao imposto de renda e ao
imposto sobre serviços, o que fere o disposto no art. 154, I da Constituição
Federal e por extensão, o art. 195, parágrafo 4º da Lei Maior.
E, por derradeiro, ressalta-se a violação ao consagrado princípio constitucional
tributário da anterioridade, visto que publicada a Lei Complementar nº 84 em
19.01.96 é exigida a contribuição desde maio/96, quando pela ordem
constitucional, somente poderia produzir efeitos a partir de 1997.
Comentando a matéria, assim discorre o Eminente Sacha Calmon Navarro Coelho:
".... as contribuições sociais novas não incidentes sobre salários, lucros,
faturamento e prognósticos, exigem lei complementar para serem criadas e/ou
modificadas e submetem-se, ademais, aos limitativos do art. 154, I da CF
(proibição de ter fato gerador e base de cálculo idênticas à de impostos
existentes e não ter natureza cumulativa, por isso que a técnica de incidência
terá que ser não-cumulativa." (IN Comentários à Constituição de 1988 - Sistema
Tributário, Forense, 1ª Ed., 1990, p. 166/167).
Assim, demonstrada a inconstitucionalidade da pretensão contida na Lei
Complementar nº 84/96.
DOS PEDIDOS
Estando presentes os pressupostos constantes do art. 7º, II da Lei nº 1533/51,
buscam os Impetrantes o socorro do Poder Judiciário, requerendo se digne V. Exa.
conceder liminarmente o pedido para garantir-lhes o direito de não recolher, por
constitucional, a contribuição sobre "pró-labore" pagas a empresários,
autônomos, avulsos e pessoas físicas, de que trata a Lei Complementar nº 84/96,
alterada pela Medida Provisória nº 1463-3 de 26.07.96. Subsidiariamente,
requerem seja julgada inconstitucional a exigibilidade da exação no mesmo
exercício de sua criação, com a devolução dos valores já recolhidos, pelo o
período.
Requer se digne V. Exa. determinar a notificação da Autoridade Coatora e, após
ouvido o Ministério Público, digne-se conceder definitivamente a segurança,
confirmando a liminar para a finalidade de garantir às impetrantes o direito de
não recolher a contribuição.
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]