APROPRIAÇÃO INDÉBITA - RECURSO E RAZÕES - SÓ VÍTIMA - RÉ CITADA POR EDITAL
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ª VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE _________
Processo-crime nº _________
Objeto: apelação de sentença condenatória e oferecimento de razões
_________, brasileira, convivente, do lar, atualmente, tida, reputada e
havida como em lugar incerto e não sabido, pelo Defensor subfirmado, vem,
respeitosamente, a presença de Vossa Excelência, nos autos do processo crime em
epígrafe, ciente da sentença condenatória de folha ___ até ____, interpor, no
prazo legal, o presente recurso de apelação, por força do artigo 593, inciso I,
do Código de Processo Penal, eis encontrar-se desavinda, irresignada e
inconformada com apontado decisum, que lhe foi prejudicial e sumamente adverso.
ISTO POSTO, REQUER:
I.- Recebimento da presente peça, com as razões que lhe emprestam lastro,
franqueando-se a contradita ao ilustre representante do parquet, remetendo-o,
após ao Tribunal Superior, para a devida e necessária reapreciação da matéria
alvo de férreo litígio.
Nesses Termos
Pede Deferimento
_________, ____ de _________ de _____.
DEFENSOR
OAB/
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO _________
COLENDA CÂMARA JULGADORA
ÍNCLITO RELATOR
"Julgar alguém sem ouvi-lo é fazer-lhe injustiça, ainda que a sentença seja
justa" [*] SÊNECA
"A verossimilhança, por maior que seja, não é jamais a verdade ou a certeza,
e somente esta autoriza uma sentença condenatória. Condenar um possível
delinqüente é condenar um possível inocente" [*] NELSON HUNGRIA
RAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO FORMULADAS POR: _________
Volve-se o presente recurso contra sentença condenatória editada pelo notável
e operoso julgador monocrático titular da ____ª Vara Criminal da Comarca de
___________, DOUTOR ________, o qual em oferecendo respaldo parcial de agnição à
denúncia, condenou a apelante a expiar, pela pena de (01) um ano de reclusão,
acrescida da reprimenda pecuniária cifrada em (10) dez dias-multa, dando-o como
incurso nas sanções do artigo 168, caput, do Código Penal sob a franquia do
regime aberto.
A irresignação da apelante, subdivide-se em dois tópicos. Num primeiro
momento repisará a tese da negativa da autoria proclamada pela ré, desde na
natividade da lide, a qual, contristadoramente, não encontrou eco na sentença
repreendida; para, num segundo e derradeiro momento, discorrer sobre a ausência
de provas robustas, sadias e convincentes, para outorgar-se um veredicto
adverso, em que pese tenha sido este parido, de forma equivocada pela sentença,
ora respeitosamente reprovada.
Passa-se, pois, a análise em conjunto da matéria alvo de debate.
Consoante sinalado pela ré, na única oportunidade em que lhe foi facultado
falar nos autos (vide termo de declarações junto ao orbe policial de folha
__/__), a mesmo foi categórica e peremptória em negar ter perpetrado o delito de
apropriação indébita, que lhe é irrogado, data maxima venia, de forma temerária
pela sentença aqui acerbamente hostilizada.
Gize-se, que a tese pelo mesma argüida, não foi ilidida e ou rechaçada com a
instrução criminal, e deveria, por imperativo, ter sido acolhida, totalmente.
Obtempere-se, que a prova judicializada, é completamente estéril e infecunda,
no sentido de roborar a denúncia, haja vista, que o Senhor da ação penal, não
conseguiu arregimentar um única voz, isenta e confiável, que depusesse contra a
ré, no intuito de incriminá-la, do delito a que remanesceu, indevidamente,
subjugada.
Efetivamente, perscrutando-se com sobriedade e comedimento a prova de índole
inculpatória produzida com no dedilhar da instrução, tem-se que a mesma
centra-se e resume-se, única e exclusivamente na palavra da sedizente vítima do
tipo penal, o que delata sua precariedade e rotunda ausência de credibilidade,
de sorte que detém interesse direto no desfecho positivo da ação penal, a qual
foi instaurada justamente para atender os reclamos desta.
Em assim sendo, tem-se, que a palavra da vítima do fato deve ser recebida com
extrema reserva, haja vista, que possui em mira, incriminar a ré, agindo por
vindita(1) e não por caridade(2) - a qual segundo apregoado pelo Apóstolo e
Doutor do gentios, São Paulo(3), é a maior das virtudes - mesmo que para tanto
deva criar uma realidade fictícia, logo inexistente.
Nesta senda é a mais lúcida jurisprudência, coligida junto aos tribunais
pátrios:
"As declarações da vítima devem ser recebidas com cuidado, considerando-se
que sua atenção expectante pode ser transformadora da realidade, viciando-se
pelo desejo de reconhecer e ocasionando erros judiciários" (JUTACRIM, 71:306)
No mesmo quadrante é o magistério de HÉLIO TORNAGHI, citado pelo
Desembargador ÁLVARO MAYRINK DA COSTA, no acórdão derivado da apelação criminal
nº 1.151/94, da 2ª Câmara Criminal do TJRJ, julgada em 24.4.1995, cuja
transcrição parcial afigura-se obrigatória, no sentido de colorir e emprestar
consistência as presentes razões: "Tornaghi bem ressalta que o ofendido mede o
fato por um padrão puramente subjetivo, distorcido pela emoção e paixão. Nessa
direção, poder-se-ia afirmar que ainda que pretendesse ser isento e honesto,
estaria psicologicamente diante do drama que processualmente o envolve, propenso
a falsear a verdade, embora de boa-fé..." (*) in, JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL:
PRÁTICA FORENSE: ACÓRDÃOS E VOTOS, Rio de Janeiro, 1999, Lumen Juris, página 19.
Assim, se for expurgada a palavra da vítima, bem como a declinada pela
testemunha solteira, inquirida à folha ___ verso - a qual é de uma inocuidade
solar, visto que não presenciou os fatos descritos pela denúncia - ambas,
notoriamente parciais e tendenciosas, em suas quiméricas e débeis assertivas,
nada mais resta a delatar a autoria do fato imputado, aleatoriamente, a
apelante.
Sinale-se, outrossim, que para referendar-se uma condenação no orbe penal,
mister que a autoria e a culpabilidade resultem incontroversas. Contrário senso,
a absolvição se impõe por critério de justiça, visto que, o ônus da acusação
recai sobre o artífice da peça portal. Não se desincumbindo, a contento, de tal
tarefa, marcha, de forma inexorável, a peça esculpida pelo integrante do parquet
à morte.
Neste alheta, veicula-se imperiosa a compilação de arestos oriundos da cortes
de justiça:
"Por pior que seja a vida pregressa de um cidadão, tal circunstância, que
geralmente se reflete na fixação da pena, não serve como prova substitutiva e
suficiente de uma autoria não induvidosamente apurada no conjunto probatório"
(Ap. 135.461, TACrimSP, Rel. COSTA MENDES.
"A prova para a condenação deve ser robusta e estreme de dúvidas, visto o
Direito Penal não operar com conjecturas" (TACrimSP, ap. 205.507, Rel. GOULART
SOBRINHO)
"O Direito Penal não opera com conjecturas ou probabilidades. Sem certeza
total e plena da autoria e da culpabilidade, não pode o Juiz criminal proferir
condenação" (Ap. 162.055. TACrimSP, Rel. GOULART SOBRINHO)
"Sentença absolutória. Para a condenação do réu a prova há de ser plena e
convincente, ao passo que para a absolvição basta a dúvida, consagrando-se o
princípio do 'in dubio pro reo', contido no art. 386, VI, do C.P.P" (JUTACRIM,
72:26, Rel. ÁLVARO CURY)
Mesmo, admitindo-se, a título de mera e surrealista argumentação, que sobeje
no bojo dos autos duas versões dos fatos, a primeira proclamada pela apelante,
desde a aurora da lide, a qual a exculpa, e a segunda encimada pelo dono da
lide, o qual pretextando defender os interesses da sedizente vítima, inculpa
graciosamente a recorrente, pelo delito, deve, e sempre, prevalecer, a versão
declinada pela ré, calcado no vetusto, mas sempre atual princípio in dubio pro
reu.
Neste diapasão é a mais abalizada jurisprudência, que dimana dos pretórios,
digna de decalque face sua extrema pertinência ao caso em discussão:
"Inexistindo outro elemento de convicção, o antagonismo entre as versões da
vítima e do réu impõe a decretação do non liquet" (Ap. 182.367, TACrimSP, Rel.
VALENTIM SILVA)
"Sendo conflitante a prova e não se podendo dar prevalência a esta ou àquela
versão, é prudente a decisão que absolve o réu" (Ap. 29.899, TACrimSP, Rel.
CUNHA CAMARGO).
"Sem que exista no processo uma prova esclarecedora da responsabilidade do
réu, sua absolvição se impõe, eis que a dúvida autoriza a declaração do non
liquet, nos termos do art. 386, VI, do CPP" (Ap. 160.097, TACrimSP, Rel.
GONÇALVES SOBRINHO).
Donde, inexistindo prova segura, correta e idônea a referendar e sedimentar a
sentença, impossível veicula-se sua manutenção, assomando imperiosa sua
ab-rogação, sob pena de perpetrar-se gritante injustiça.
Registre-se, que somente a prova judicializada, ou seja àquela depurada na
pira do contraditório é factível de crédito para confortar um juízo de
reprovação. Na medida em que a mesma revela-se frágil e impotente para secundar
a denúncia, assoma impreterível a absolvição da ré, visto que a incriminação de
clave ministerial, quedou-se defendida em prova falsa, sendo inoperante para
sedimentar uma condenação, não obstante tenha esta vingado, contrariando todas
as expectativas!
Destarte, todos os caminhos conduzem, a absolvição da ré, frente ao conjunto
probatório domiciliado à demanda, em si sofrível e altamente defectível, para
operar e autorizar um juízo epitímio contra a apelante.
Conseqüentemente, a sentença estigmatizada, por se encontrar lastreada em
premissas inverossímeis, estéreis e claudicantes, clama e implora por sua
reforma, missão, esta, reservada aos Preclaros Desembargadores, que compõem essa
Augusta Câmara Secular de Justiça.
ANTE AO EXPOSTO, REQUER:
I.- Seja cassada a sentença judiciosamente buscada desconstituir,
expungindo-se da sentença o veredicto condenatória, uma vez a ré negou de forma
imperativa sua participação, desde o rebento da lide, cumprindo ser absolvida,
forte no artigo 386, IV, do Código de Processo Penal; e ou na remota hipótese de
soçobrar a tese mor (negativa da autora), seja, de igual sorte, absolvida, forte
no artigo 386, VI, do Código de Processo Penal, frente a manifesta e notória
deficiência probatória que jaz reunida à demanda, impotente em si e por si, para
gerar qualquer juízo adverso.
Certos estejam Vossas Excelências, mormente o Insigne e Culto Doutor
Desembargador Relator do feito, que em assim decidindo, estarão julgando de
acordo com o direito, e, sobretudo, restabelecendo, perfazendo e restaurando, na
gênese do verbo, o primado da JUSTIÇA!
_________, ____ de _________ de _____.
DEFENSOR
OAB/
NOTAS
(1) "O inverso da caridade é a vingança" Camilo Castelo Branco.
(2) "A caridade cristã não se limita a socorrer o necessitado de bens
econômicos; leva-nos, antes de mais nada, a respeitar e a defender cada
indivíduo enquanto tal, na sua intrínseca dignidade de homem e de filho do
Criador" J. ESCRIVÁ DE BALAGUER (Cristo que passa, nº 72)
(3) 1º Coríntios 13,1-13