Interposição de embargos de declaração, ante omissão em acórdão proferido em apelação criminal.
EXMO. SR. DR. JUIZ RELATOR DOS AUTOS DE APELAÇÃO CRIMINAL SOB Nº ...., DE
.... - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ....
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente, nos autos em que é autor ....., à presença de Vossa Excelência
interpor
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
ao ven. Acórdão nº...., prolatado à unanimidade, pelos eminentes Juizes da ....ª
Câmara Criminal, pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
O embargante no Juízo de origem da Comarca de ...., do Estado de ...., nos autos
de Ação Penal sob nº ...., em que é Autor o ...., teve contra si julgada
procedente a ação penal.
Em recurso apelatório, regularmente ajuizado, demonstrou e provou "ex abundantia"
o prejuízo sofrido pelo acusado em seu direito de defesa, eis que não foi
considerada satisfatoriamente a confissão feita pelo mesmo quando do início das
investigações, sendo que nunca o descobririam se ele não fosse à delegacia,
confessar os fatos que no mínimo abrandariam a rigorosa e desproporcionada pena
imposta ao mesmo, pois, o exame fiel do caso descaracteriza a conduta em que,
por assim dizer, foi enquadrada como ilícita.
Inconformou-se o ora embargante com a pena imposta: 1 ano e 9 meses de reclusão,
10 dias - multa (1/30 do salário mínimo), e trabalho para a comunidade durante
.... horas semanais; pois que o Juízo de primeira instância realizou um cálculo
por demais rigoroso para as circunstâncias próprias do caso em questão.
Ademais, a ven. Decisão de segunda instância é incompleta, pois, evidentemente,
traz vício que comporta um substancial inconformismo para a parte que sofreu a
sua omissão.
DO DIREITO
Segundo Pontes de Miranda:
"A sentença, quando falta o relatório, a motivação ou o dispositivo, é
relacionalmente omissa. Quando, todavia, incidir na falta de alguma coisa que
deveria integrar o relatório, a motivação o próprio dispositivo, ela é
ontologicamente omissa."
Daí se concluir, conforme o entendimento de Pontes de Miranda, notoriamente
respeitado pela profundidade e certeira análise das questões jurídicas que
deixou publicadas, que a sentença relacionalmente omissa é ineficaz, importando
em gravame para as partes.
A omissão ontológica e a relacional são hipóteses de error in procedendo, porque
a sentença não preenche os requisitos do parágrafo único do art. 280 do Código
de Processo Civil, aplicando-se aqui, no processo penal o mesmo raciocínio, uma
vez que, a melhor doutrina e jurisprudência o indicam, possibilitando a
fundamentação adequada e justa na solução das lides.
Ainda, segundo ensinamentos de Ivan Campos de Souza, a omissão que enseja os
embargos de declaração pode verificar-se em qualquer dos elementos da sentença e
tanto pode ser absoluta (omissão total sobre o ponto que o Juiz deveria
pronunciar-se) como relativa (o pronunciamento sobre o ponto existe, porém é
incompleto). É de ressaltar que quando o vício da omissão incide sobre o
dispositivo da sentença, o pronunciamento do juiz fica incompleto, inacabado;
nesse caso o prejuízo é maior para a ordem jurídica do que, mesmo, para as
partes litigantes, pois a omissão reflete "descumprimento pelo próprio Estado,
de seu dever de jurisdição". (cf. Baptista, Sonia Maira Hase de Almeida. Dos
Embargos de Declaração. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1991, pp.
120-122).
Concretamente, o acórdão embargado não faz qualquer menção à confissão, que,
justamente com os depoimentos foram os alicerces da sentença de primeira
instância. Portanto, segundo o entendimento do autor acima citado, a omissão não
seria somente relativa, ou incompleta, mas, omissa totalmente - absoluta - pois
no acórdão não houve pronunciamento sobre o ponto da confissão, e que deveria
ter sido pronunciado, porquanto a matéria, de relevância inconteste, ficou
pré-questionada nas razões de apelação da defesa.
Segundo Borges da Rosa:
"Há omissão quando há falta de menção de expressão ou de idéia ou de proposição,
quando o julgador silencia, não devendo fazê-lo." (cf. Nogueira, Paulo Lúcio.
Curso Completo de Processo Penal. 6ª Ed.. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 363).
Sendo "a confissão a própria prova, consistente no reconhecimento da autoria por
parte do acusado", à ela, entretanto, não se deve atribuir valor probatório
absoluto. Muitas vezes, circunstâncias várias podem levar um indivíduo a
reconhecer-se culpado de uma infração que não tenha praticado. Motivos como
enfermidade mental, fanatismo, espírito de sacrifício, etc.
"O Estado não quer que um inocente pague pelo verdadeiro culpado. Há pois,
interesse público em jogo, devendo o juiz confrontar a confissão com as demais
provas, pesquisando possível compatibilidade ou concordância, para não incidir
no erro de aceitar como verdadeira uma auto-acusação falsa."
Deverá, o juiz, além de tudo, apreciar o "animus confitendi", se é livre ou não,
as qualidades psíquicas do imputado, os motivos da confissão, as circunstâncias
que envolveram o desenvolvimento dos acontecimentos, o correto sopesar de tais
circunstâncias e seu inserimento na aplicação da Norma de Direito.
Ora, vê-se que o ven. Acórdão não analisou a questão a respeito da confissão do
acusado, nem sequer a mencionou. Ocorre que foi mal analisada na sentença de
primeira instância e, "data vênia", ignorada na segunda instância, sendo que
deveria ter apreciado a matéria, mas não o fez. As circunstâncias que envolveram
o fato foram omitidas na decisão do órgão colegiado, embora indubitavelmente
deveria ter sido objeto de análise mais detida; posto que, como já foi tratado
anteriormente à confissão não lhe é atribuída um valor absoluto, não mais é
considerada "regina probationum", mister se faz, assim, o exame detalhado do
assunto, para a correta extração de conseqüências que fará atingir a finalidade
da prova no processo penal.
Pois, várias eram as circunstâncias que deveriam ser objetos de estudo. Pode-se
elencá-las: a pressão psicológica sofrida pelo ora embargante durante o tempo em
que estaria morando na casa do sogro, ouvindo por parte dele e da companheira
deste a cobrança diária de dinheiro; a impossibilidade de atender a sua família
nas necessidades materiais, que, consequentemente, acarreta graves conflitos; e
o conflito da própria consciência de saber-se inútil.
Ora, o embargante reconheceu ser o autor da infração, imediatamente, logo no
início, posto que, pessoa honesta que é, não pôde concluir a conduta que o
tipificaria penalmente. Aliás, no estado em que se encontrava, qual seja, o de
desempregado, necessitando de dinheiro para alimentar os filhos e conseguir
fazê-los sobreviver, ainda sem liberdade para escolher, há que ser entendido
inexoravelmente como fato relevante capaz de excluir o crime ou isentá-lo de
pena.
Além disso, antes que o prejuízo da empresa se efetivasse, o ora embargante, com
a sua confissão reconheceu sua responsabilidade e, sem levantar obstáculos que
pudesse agravar, adiantou-se a contar sobre a localização das peças,
garantindo-se assim, a veracidade da sua confissão.
A falta de menção sobre a questão da confissão no presente caso é omissão que
deve ser corrigida, pois:
"Trata-se de garantir às partes o direito de verem examinadas pelo órgão
julgador as questões de fato e de direito, que houveram por suscitado,
reclamando do juiz a consideração atenta dos argumentos e provas trazidos.
A questão liga-se à motivação da sentença, entre cujas justificativas políticas
também se insere o direito de as partes verem apreciados seus argumentos e
provas, direito esse a ser exatamente aferido na motivação.
Resulta daí que a carência de motivação pode revestir-se de diversos aspectos,
apresentando-se em três situações diversas: a) ...; b) ...; e c) quando, embora
no seu contexto a sentença pareça motivada, tenha omitido o exame de um fato
decisivo para o Juízo que leve a crer que, se o juiz o tivesse examinado, teria
alcançado uma decisão diversa - carência de motivação extrínseca." (Bellavista).
(cf. Grinover, Fernandes & Gomes Filho. As Nulidades no Processo Penal. 3ª Ed.,
São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 1993, pp. 108-109)
Vale a pena conferir a decisão do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo:
"Recurso Crime - Embargos de Declaração - Recebimento - Circunstância que
importa, na espécie, anulação da decisão embargada - Admissibilidade -
Inteligência dos arts. 619 e 620 do CPP." (cf. RT 606/295).
De sorte, a lei deve ser aplicada ao fato da causa, de forma justa e correta,
fato que não aconteceu no presente caso, onde o ven. Acórdão embargado incorreu
em omissão, como o acima apontado de forma objetiva e incontroversa.
Sem embargo, dever de justiça, acatamento e apreço ao ven. Acórdão, muito mais
aos seus dignos e competentes Magistrados, que o prolataram com inegável mérito,
tal omissão, entretanto, há que ser suprida, porque a apelação devolve ao
tribunal o conhecimento da matéria impugnada, vigendo o princípio processual
"tantum devolutum quantum appelatum".
DOS PEDIDOS
Como essa falta de apreciação pode ser suprida no julgamento de embargos de
declaração, servem estes, para requerer, que seja suprida apontada omissão.
Incontroversamente, menos pelo que ora argumenta, mas muito mais pelo que será
aclarado pelos nobres e eminentes Magistrados, com a competência e inteligência,
como é de iterativo proceder, sobremaneira o seu digno Relator.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]