Defesa prévia em ação penal, na qual se alega a obtenção de provas por meios ilícitos.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CRIMINAL DA COMARCA DE .....
Autos processuais nº ..........
Autor: A Justiça Pública
Réu: ...................
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
DEFESA PRELIMINAR
aos termos e fatos narrados pela r. denúncia, na Ação Penal supra enumerada que
lhe move a JUSTIÇA PÚBLICA DO ESTADO DO ............., fazendo-o nos exatos
termos permitidos pelo ordenamento jurídico vigente, esperando, ao final, ver
providas suas razões de ingresso, culminando com a rejeição da peça inicial e
conseqüente arquivamento do presente procedimento.
PRELIMINARMENTE
DA TEMPESTIVIDADE.
Inicialmente, cumpre ressaltar a tempestividade da presente defesa preliminar,
evitando-se futuras discussões acerca do presente tópico.
O prazo para a apresentação da defesa preliminar encontra-se disposto em nosso
Código de Processo Penal, que determina:
Artigo 514
Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz
mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por
escrito, dentro do prazo de quinze dias.
Desta forma, tendo sido o acusado notificado aos ...................
(segunda-feira) e tendo sido o mandado acostado aos autos na mesma data,
verifica-se que o prazo começou a fluir aos .......... (terça-feira),
vencendo-se assim, aos .............. (terça-feira), data em que a presente
restará protocolizada em cartório.
DOS FATOS
A r. peça exordial, formulada pelo Ilustre Representante do Ministério Público,
narra que, em data de ........., o aqui acusado teria se apresentado como fiscal
em um estabelecimento comercial nesta Comarca de ..........., solicitando a
apresentação de blocos de notas fiscais e livros de entrada e saída de
mercadorias.
O responsável pela empresa, naquele momento, teria informado ao réu que os
documentos solicitados não se encontravam nas instalações da empresa mas com o
contador, razão pela qual o acusado notificou o comerciante para que, em 24
horas, apresentasse referidos livros.
No dia seguinte, tal seja aos ..........., o aqui acusado novamente compareceu
às instalações da empresa para então fiscalizar os livros, momento em que lhe
foi ofertada uma garrafa de vinho pelo comerciante, como um presente pela sua
suposta compreensão do dia anterior, presente este que foi aceito pelo acusado.
Neste momento, adentraram no estabelecimento dois policiais, os quais deram voz
de prisão em flagrante e conduziram o réu para a delegacia local. Concluído o
inquérito policial, este foi remetido à Promotoria Pública, tendo sido ofertada
denúncia, tendo o aqui acusado como incurso em crime de corrupção passiva, este
tipificado pelo Código Penal, em seu artigo 317.
Tais os fatos constantes da r. denúncia.
DO DIREITO
O artigo 317 do Código Penal, que trata do crime de corrupção passiva, assim
determina:
Artigo 317
Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que
fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou
aceitar promessa de tal vantagem:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa.
Da análise do referido diploma legal, verifica-se que a conduta consiste em o
funcionário solicitar ou receber a vantagem ou aceitar a promessa de recebê-la,
devendo existir o nexo de causalidade entre a conduta do funcionário e a
realização do ato funcional, pois, caso contrário inexistirá o delito
questionado.
Nos presente autos, inexiste este nexo de causalidade pois, o presente ofertado
pelo comerciante em nada alterou os fatos pois estava lá para fiscalizar os
documentos solicitados, o que somente não ocorreu em virtude do aparecimento dos
dois policiais que lhe deram voz de prisão. Inexiste pois, vantagem percebida ou
que pudesse ser percebida pelo acusado, razão pela qual inexiste crime.
Ainda, "presentes" comuns, de pequena importância econômica, em face da correção
de atitude de um funcionário, não integram o delito, pois não houve da parte do
funcionário a consciência de estar aceitando uma retribuição pela prática de um
ato de ofício, que é essencial ao dolo de corrupção.
Em virtude do presente, não houve nenhuma ação ou omissão do acusado e,
tampouco, a promessa que qualquer vantagem, não configurando, portanto, como ato
típico.
Da mesma forma ensina o doutrinador Damásio de Jesus :
"Deve haver nexo de causalidade entre a conduta do funcionário e a realização do
ato funcional. Caso contrário, inexistirá o delito questionado, podendo surgir
outro."
Inexistindo ato ilícito ou conduta tipificada deve restar a r. denúncia
rejeitada em todos os seus termos, o que fica desde já requerido.
Ainda, verifica-se no caso aqui em análise a imposição de flagrante preparado,
este rejeitado pelo nosso ordenamento jurídico, conforme disposição sumular do
Egrégio Supremo Tribunal Federal:
Súmula 145
Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a
sua consumação.
O crime tipificado pelo artigo 317 do Código Penal somente pode ser tido como
consumado no instante em que a solicitação chega ao conhecimento de terceiro, ou
em que o funcionário prometa ou efetivamente concede uma vantagem.
Tal não era o desiderato do acusado, entretanto, se o fosse, verifica-se que as
providências policiais tornaram impossível a consumação do crime. Trata-se,
portanto, de crime impossível pela inexistência ou impropriedade absolutas do
objeto material que permitiria a consumação. E crimes impossíveis não podem ser
punidos, pois assim dispõe o Código Penal Brasileiro:
Artigo 17
Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta
impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.
Havendo o flagrante preparado, pela possível existência de um crime -
ressaltando-se que meras suposições não podem basificar procedimentos judiciais
- verifica-se que houve ainda a obtenção de provas por meios ilícitos,
nulificando o auto de prisão em flagrante.
Diante de todo o acima exposto, permite-se o acusado, na exata forma
dimensionada pelo ordenamento jurídico vigente, requerer seja, em virtude da
ausência de conduta típica, da existência de flagrante preparado que acarreta em
crime impossível e da falta de preenchimento de todos os elementos do tipo
descrito pelo artigo 317 do Código Penal, rejeitada a r. denúncia em todos os
seus termos, na exata forma dimensionada pelo artigo 516 do Código de Processo
Penal.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]