Alegações finais em roubo qualificado pelo concurso de agentes.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CRIMINAL DA COMARCA DE .....,
ESTADO DO .....
O MINISTÉRIO PÚBLICO, por seu promotor de justiça, vem mui respeitosamente, nos
autos em que responde como réu ....., pelo crime de roubo qualificado por
concurso de agentes, à presença de Vossa Excelência interpor
ALEGAÇÕES FINAIS
pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra .......................,
imputando-lhe a prática do crime de ROUBO qualificado pelo concurso de agentes e
CORRUPÇÃO DE MENOR (artigos 157, § 2º, inc. II do Código Penal Brasileiro e 1º
da Lei 2.252/54), eis que, conforme descrito na exordial,"No dia
......................, por volta de 2:00 horas, o denunciado, livre, consciente
e agindo de comum e prévio acordo com os adolescentes R. e I., subtraiu, para
proveito de todos, mediante grave ameaça empreendida com o uso de uma pistola de
brinquedo, a quantia de R$ ............. de propriedade do Posto ...........,
situado na ...............
Para tanto, os assaltantes chegaram a pé no referido posto de gasolina e,
enquanto perguntavam sobre a existência de cervejas e cigarros para venda, o
menor I. exibiu a mencionada arma, anunciando o assalto e assim ameaçando os
frentistas T.P.S. e J.S.S., que acreditaram tratar-se de arma verdadeira.Após
terem os agentes, desta forma, impedido pudessem as vítimas esboçar qualquer
reação, o denunciado C. retirou dos bolsos do frentista J. a quantia de R$ 40,00
(quarenta reais), enquanto o menor R. subtraia do frentista Timóteo a quantia de
R$ 65,00 (sessenta e cinco reais), após o que evadiram-se os três do local.Assim
agindo, logrou o denunciado concorrer para a corrupção dos menores já aludidos,
com os mesmos praticando ação típica e antijurídica".
O réu foi regularmente citado, por requisição, e interrogado às fls. 50, ocasião
em que negou haver cometido roubo contra as vítimas, pois desconhecia que os
menores que o acompanhavam estivessem com tal propósito.A defesa técnica
apresentou alegações preliminares às fls. 56/57.Além da prova documental juntada
aos autos, foram ouvidas as testemunhas arroladas pela acusação (fls. 62/69) e
pela defesa (fls. 72/74).
Encerrada a instrução criminal, não havendo requerimento de diligências na fase
do art. 499 do Código de Processo Penal, determinou-se a abertura de vista às
partes para alegações finais.Em breve síntese, é o relatório.
II.Analisada a prova produzida sob o crivo do contraditório, na presença das
partes e do juiz natural da causa, convence-se o Ministério Público acerca da
veracidade das imputações contidas na denúncia.A existência material do crime de
roubo está evidenciada pela apreensão, em poder dos comparsas do acusado (fls.
33/34), da arma de brinquedo usada para intimidar as vítimas bem como a
importância roubada, pertencente ao Posto .......................
Em seu interrogatório, procurou o acusado sustentar uma versão inconsistente e
não demonstrada, alegando desconhecer a intenção delituosa dos adolescentes que
o acompanhavam.Essa tentativa do réu, de iludir esse r. juízo, esbarrou não
apenas na firme e esclarecedora narrativa das vítimas e das testemunhas, mas
também nas próprias declarações dos adolescentes que o acompanhavam.Deveras, ao
ser ouvido em juízo (fls.63), T.P.S. foi enfático ao dizer:"que no dia dos fatos
o depoente estava de serviço no posto ...................... juntamente com seu
colega J.;
que por volta de 02:00 horas da manhã, chegou o acusado aqui presente, o menor
I. e R.; que inicialmente o trio perguntou se vendiam cervejas, ao que
responderam afirmativamente; que logo depois pediram um fogo, que foi neste
momento que I. enfiou as mãos sobre as vestes e puxou uma arma dizendo que era
um assalto e que o depoente e seu colega J. deveriam entregar todo dinheiro que
tinham e correrem para trás do posto; que o depoente e seu colega atenderam a
ordem e procuraram o orelhão, de onde ligaram para a polícia; que cinco minutos
depois a polícia chegou, tendo o depoente e seu colega passado as
características dos assaltantes; que a polícia saiu e voltou cerca de vinte
minutos depois, trazendo o acusado presente a esta audiência e o menor R., os
quais foram reconhecidos como sendo os o que participaram do assalto; que os
acusados subtraíram do depoente, a importância de sessenta e cinco reais e de
seu colega J., quarenta e três reais; que o dinheiro fora apreendido em poder do
acusado e dos menores, a restituído ao posto, a quem pertencia; que o depoente
fora abordado pelo menor R., enquanto o acusado presente a esta audiência
encarregou-se de abordar Jerenilson; que o depoente esclarece que o menor I.
ficou afastado cerca de dois metros, com a arma em punho, enquanto o acusado
presente a esta audiência abordou J. e R. ocupou e subtraiu os bens do
interrogando.
Às perguntas do MP, respondeu: que quem perguntou pela cerveja e o fogo foi o
menor I., que estava armado. As perguntas da defesa, respondeu: que o depoente
esclarece que entregou o dinheiro para R., o acusado aqui presente pegou o
dinheiro de Jerenilson; que o depoente não assistiu a apreensão dos bens
subtraídos. "Em igual direção o depoimento do frentista J. (fls. 65/6), ao
asseverar que:"... que neste momento I. arrancou de uma arma, anunciou o assalto
e exigiu a entrega do dinheiro que o depoente e seu colega T. tinham em seus
poderes; que o acusado R. abordou T. e o depoente fora abordado pelo I. e o
acusado aqui presente, que estavam a distância de um metro, aproximadamente; que
o acusado e seus comparsas exigiram a entrega do dinheiro, tendo o interrogando
tirado o dinheiro do bolso e estendido a seus agressores, com a cabeça baixa,
sem olhar quem foi que apanhou o dinheiro, sendo certo que foi o acusado ou o
menor I. que apontava a arma; que consumado o roubo, o depoente e seu colega T.
receberam ordens para irem para trás do posto, onde usaram um orelhão e ligaram
para a polícia; que a polícia chegou no local cerca de dez minutos depois,
quando então o depoente e seu colega passaram as características dos
assaltantes, tendo a polícia saído no encalço dos elementos; que tempos depois a
polícia retornou ao posto trazendo o acusado presente a esta audiência e o menor
R., os quais foram apontados e reconhecidos como os autores do crime; que parte
do dinheiro subtraído fora subtraído em poder de R..
Às perguntas do MP, respondeu: que o depoente durante o assalto não percebeu que
a arma utilizada era de brinquedo; que o depoente ficou extremamente amedrontado
com o uso da arma exibida; que o acusado presente a esta audiência assistiu ao
roubo calado, sem nada falar; que era o menor I. que dava as ordens. As
perguntas da defesa, respondeu: que o depoente não assistiu a busca e apreensão;
que o acusado não estava armado; que até então o depoente não conhecia o acusado
C.A.; que o depoente suportou prejuízo de trinta e dois reais; que o depoente
não teve e não tem qualquer dúvida de que o acusado presente a esta audiência
participou da execução dos atos delitivos".
Também em apoio à narrativa acusatória, os policiais militares que efetuaram a
prisão em flagrante dos acusados (A.F., F. J. e R. E.) disseram que as vítimas
reconheceram o acusado e os adolescentes que cometeram o roubo, poucos minutos
após seu cometimento. O policial A., inclusive, foi categórico em afirmar (fls.
67)"...que o depoente conversou com o acusado presente a esta audiência e
esclarece que o mesmo assumiu a autoria do delito, dizendo ter cometido o crime
juntamente com R. e I.; que Às perguntas do MP, respondeu: que com base nas
informações do acusado, I. fora localizado e deito; que o depoente ouviu o menor
R. que confirmou ter praticado o crime juntamente com o acusado e I.; que o
depoente esclarece que primeiro conversou com R., para depois conversar com o
acusado C., presente a esta audiência; que o depoente também entrevistou I. que
confirmou a autoria do delito e a participação dos demais".
À sua vez, embora não colhido sob o pálio do contraditório e na presença do juiz
natural da causa - o que enfraquece seu valor probatório - não se pode desprezar
o teor dos depoimentos dos adolescentes, que confirmaram, perante a autoridade
policial (fls. 35/36), a participação delitiva do acusado.No que concerne,
porém, ao crime positivado no art. 1º da Lei 2.252/51, não se produziu prova
cabal de que o acusado tenha corrompido ou facilitado a corrupção dos
adolescentes I. e R., o que torna temerária a condenação do réu por tal
imputação.
Deste modo, o Ministério Público não tem qualquer dúvida em afirmar que o
acusado cometeu o roubo narrado na denúncia, mas se sente inseguro em afirmar
caracterizada a corrupção moral dos adolescentes retro-referidos.III.Convencido
da autoria do roubo e de sua autoria, há, todavia, aspectos favoráveis ao réu
que merecem ser observados, em nome da correta aplicação da lei penal, objetivo
perseguido pelo Ministério Público pari passu à sua função acusatória.
Primeiramente, impõe dizer-se que o réu é menor de 21 anos, e que não registra
antecedente penal.De outro lado, a prática do roubo não se revestiu de qualquer
ato de violência, porquanto consistiu na intimidação das vítimas por meio da
ostentação de uma arma que, a despeito de ser idônea para causar, como
efetivamente causou, temor nos frentistas lesados, era de brinquedo, sem
capacidade, pois, para causar dano à integridade corporal das vítimas.
Em decorrência, principalmente, dessa última constatação, forçoso é concluir que
as penas a que está sujeito o acusado mostram-se desproporcionais e notoriamente
injustas se levarmos em conta a lesão jurídica e econômica produzida pela ação
dos réus, consistente na subtração de quantia pequena em dinheiro
(R$105,00).Para esse tipo de comportamento, prevê o nosso Código Penal uma
sanção mínima de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime
semi-aberto (art. 157, § 2º, II c/c art. 33, 2º, "b" do Código Penal), punição
que, mesmo sabendo-se dos benefícios a que fará jus o condenado, é, convenhamos,
algo absolutamente desproporcional em relação à gravidade da conduta por ele
perpetrada.
Antes mesmo de qualquer questionamento em relação ao quantum da pena fixada
abstratamente pelo legislador, convém não olvidar outro postulado do direito
penal moderno, qual seja, o "princípio da necessidade" da sanção. No dizer de
LUIGI FERRAJOLI"La pena ¾ según la tesis ya aludida que une a Montesquieu,
Beccaria, Romagnosi, Bentham y Carmignani ¾ debe ser "necesaria" y "la minima de
las posibles" respecto al fin de la prevención de nuevos delitos". (grifamos)A
opção histórica pela fixação, através do legislador, de limites mínimos e
máximos da pena, privando o juiz de uma maior liberdade na dosimetria da
resposta penal ao crime, decorreu de uma reação ao que, outrora se chamou de
despotismo judicial.
DO DIREITO
Mostra-se insatisfatório e não mais justificável esse privilégio legislativo à
medida em que "...informada por un abstrato principio de igualdade legal, es el
fruto de una total incomprensión de la epistemología del juicio y en particular
del específico, insuprimible momento de la actividad de juzgar que es la
comprensión equitativa del hecho legalmente denotado; y que este equívoco se
traduce de hecho en un sistema inicuo, que equipara injustamente situaciones
iguales en cuanto a los elementos denotados por la ley pero diversas en cuanto a
los rasgos específicos del hecho. Dos hechos, hicimos ver entonces, aun cuando
igualmente denotados como hutos o como homicidios en proposiciones igualmente
verdaderas, no son nunca del todo iguales: será distintos, por singulares e
irrepetibles, los móviles y las modalidades de la acción, la gravedad del daño,
la intensidade de la culpa, las evenuales razones o justificaciones, etc" -
grifamos Conclui o inigualável e atualizado jusfilósofo italiano que"... al
menos para las penas privativas de libertad no está justificada la estipulación
de un mínimo legal: sería oportuno, en otras palabras, confiar al poder
equitativo del juiz la elección de la pena por debajo del máximo estabelecido
por la ley, sin vincularlo a un límite mínimo o vinculándolo a un límete minimo
bastante bajo" .Infelizmente, em nosso país a discussão sobre esse tema é ainda
embrionária, o que produz situações absurdamente incompatíveis com o equilíbrio
de um Estado de Direito, como, v.g., ocorreu recentemente com a edição da Lei
9.677/98, conforme tivemos oportunidade de assinalar .Isso não impede, porém,
que tentemos corrigir eventuais distorções legais, via interpretação
atualizadora da norma, à luz dos princípios constitucionais erigidos à categoria
de direitos fundamentais do homem.Já em relação ao princípio da
proporcionalidade, assinala FERRAJOLI que "... expresado en la antigua máxima
poena debet commensurari delicto es un corolario de los principios de legalidade
y de retributividad, que tiene en éstos su fundamento lógico y axiológico".
"Nesse contexto ¾ leciona SUZANA DE TOLEDO BARROS ¾ que"...o princípio da
proporcionalidade, como se pretende demonstrar, tem fundamental importância na
aferição da constitucionalidade de leis interventivas na esfera de liberdade
humana, porque o legislador, mesmo perseguindo fins estabelecidos na
Constituição e agindo por autorização desta, poderá editar leis consideradas
inconstitucionais, bastando para tanto que intervenha no âmbito dos direitos com
a adoção de cargas coativas maiores do que as exigíveis à sua efetividade"
(grifamos).
Parece-me evidente que, no caso ora em exame, verifica-se uma desproporção entre
a medida mínima da pena prevista para o crime atribuído ao acusado (roubo
qualificado pelo concurso de agentes) e a lesividade social, jurídica e
econômica de suas conduta, a exigir a pronta intervenção judicial, que, de
nenhum modo, subverteria o ordenamento jurídico positivo, mas, ao contrário, o
legitimaria.Em tal direção coloca-se o Ministro CERNICCHIARO" A lei precisa
ajustar-se ao princípio.
Em havendo divergência, urge prevalecer a orientação axiológica. O direito
volta-se para realizar valores. O Direito é o trânsito para concretizar o justo.
(...) O juiz é o grande crítico da lei: seu compromisso é com o Direito! Não
pode ater-se ao positivismo ortodoxo. O Direito não é simples forma.(...)
Insista-se: o juiz tem dever de ofício de recusar a aplicação de lei injusta. O
juiz precisa tomar consciência de seu papel político: integrante de Poder.
Impõe-se-lhe visão crítica. A lei é meio. O fim é o Direito"No mesmo sentido,
observa LUIZ FLÁVIO GOMES , ao concordar com a afirmação de que"... no campo da
filosofia já está superada a posição de que o juiz deve obedecer cegamente a
lei, pois o juiz cumpridor mecânico das leis é o que mandou judeus (na Alemanha
nazista) para o forno. Quando a lei é injusta, portanto, deve ser repudiada, mas
de acordo com uma lógica racional, razoável, conforme salientou GOFFREDO TELLES,
não de acordo com os critérios pessoais de cada magistrado, que pode conduzir a
uma "ditadura oligárquica dos juízes".
Todas essas preocupações, ressalte-se, derivam também da firme convicção de que
a modalidade de punição prevista para o tipo de crime em questão,
independentemente de sua real lesividade, não tem cumprido, de longe, qualquer
de suas finalidades.Forçoso concluir que o Estado não tem sido capaz de
apresentar meios de transformar a sanção penal em algo realmente útil à
sociedade e ao indivíduo. Ao invés de recuperar infratores, tem-se prestado a
prisão para produzir criminosos, embrutecendo e ser humano que para lá é
enviado.No dizer de ROBERTO LYRA, "seja qual for o fim atribuído à pena, a
prisão é contraproducente. Nem intimida, nem regenera.
Embrutece e perverte. Insensibiliza ou revolta. Descaracteriza e desambienta.
Priva de funções. Inverte a natureza. Gera cínicos e hipócritas. A prisão,
fábrica e escola de reincidência, habitualidade, profissionalidade, produz e
reproduz criminosos. "A falência de nosso sistema carcerário tem sido apontada,
acertadamente, como uma das maiores mazelas do modelo repressivo brasileiro,
que, hipocritamente, envia condenados para penitenciárias, com a apregoada
finalidade de reabilitá-lo ao convívio social, mas já sabendo que, ao retornar à
sociedade, esse indivíduo estará mais despreparado, desambientado, insensível e,
provavelmente, com maior desenvoltura para a prática de outros crimes, até mais
violentos em relação ao que o conduziu ao cárcere.
A penitenciária, equiparada por F. CARNELUTTI a um cemitério, onde se encontram
sepultados vivos, é o último lugar possível para esperar-se do apenado uma
recuperação. Nas palavras de FREDERICO ABRAHÃO DE OLIVEIRA ,"O fundamento da
pena, aquela utopia da reeducação, não tem a menor possibilidade - hoje - de ser
comprovado. O universo da prisão, já passados dois séculos do surgimento da pena
privativa de liberdade, é fortemente questionado. Não se questione a
punibilidade, nem a pena privativa de liberdade, mas é necessário que se levante
a voz contra o ambiente prisional e sua hipócrita possibilidade de reeducação e
ainda contra o que denominamos neste trabalho de pena acessória social".Daí a
importância de uma postura corajosa, porém enquadrável na moldura do direito,
como a que propugna EUGÊNIO RAUL ZAFFARONI , ao recomendar:"
Quando em nível de previsão abstrata ou, em caso concreto e por circunstâncias
particulares ao mesmo, a pena repugne os mais elementares sentimentos de
humanidade, envolva uma lesão gravíssima à pessoa em razão de sua circunstância,
ou incorpore um sofrimento de que já padeceu o sujeito em razão do fato, a
agência judicial, em função do principio republicano de governo, deve exercer
seu poder de dispensar a pena ou de imputá-la legalmente mínima, fato
juridicamente admissível, que pode parecer supralegal, mas é, por outro lado,
intraconstitucional".No caso corrente, não há dúvida de que a pena abstratamente
prevista pelo legislador penal é excessiva e desproporcional ao delito cometido.
Os acusados tomaram da vítima a importância de R$105,00. Não empregaram
violência. Usaram, como meio intimidativo, um simulacro de arma sem nenhuma
potencialidade danosa, no sentido físico.O valor roubado foi apreendido e deve
ser restituído aos seus proprietários ou possuidores, conforme se postulará
adiante.
O acusado não reagiu à prisão. Está preso até a presente data, em cela
sabidamente imprópria aos fins da prisão (cautelar ou penal). Trata-se de jovem
recém ingressado na maioridade penal, que, associado a dois adolescentes, optou
pela ação criminosa e está sendo punido por tal iniciativa, inclusive com a
perda do abrigo de seu lar, do carinho de seus familiares e de suas atividades
estudantis. Demonstrou, porém, como sugerem as cartas anexadas aos autos,
arrependimento por seu comportamento.Enfim, deve o acusado ser punidos pelo
direito penal, mas, na medida do necessário, sem excessos. Deveras,"a coerção
penal deve reforçar a segurança jurídica, mas, quando ultrapassa o limite de
tolerância na ingerência aos bens jurídicos do infrator, causa mais alarme
social do que o próprio delito."
Houvesse o acusado empregado grave violência, feito uso de arma de fogo, ou
tivesse causado profundo sofrimento moral e físico às vítimas, a pena mínima de
cinco anos e quatro meses talvez se revelasse até mesmo pequena. Mas não foi o
que ocorreu.Fazendo-se um paralelo para fins de argumentação, a
desproporcionalidade das sanções penais previstas pelo legislador permite que,
abstratamente, a pessoa que cometeu, por pura maldade, um crime de lesões
corporais gravíssimas, causando incapacidade permanente para o trabalho, perda
ou inutilização de membro, sentido ou função da vítima, ou mesmo deformidade
permanente e até mesmo o aborto, estará sujeito à pena mínima de 2 (dois) anos
de reclusão.Que ironia! Roubar, sem violência física, inexpressiva importância
em dinheiro, conduz o agente, pela fria e abstrata previsão legal, à pena mínima
de 5 anos e 4 meses de reclusão. Mas a sua agressão, de forma violenta, cruel, e
com resultados danosos permanentes e terríveis para a vítima, sujeita-o a apenas
dois anos de reclusão.IV.
Impõe-se corrigir tal distorção legislativa, a fim de que se faça a justiça do
caso concreto.Inobstante proceder-se a um juízo positivo de condenação, já que
provados os fatos articulados na denúncia, o caminho que se mostra mais justo e
acertado é adequar-se a correspondente reprimenda penal à medida do necessário
("proibição do excesso"). Para tanto, basta que se invoque a supremacia da norma
Constitucional, onde se proclama a existência de um Estado Democrático de
Direito (art. 1º), no qual a "dignidade da pessoa humana" (inc. III) se
apresenta como um de seus suportes, assentando-se, nesse contexto normativo
supra-legal, o princípio da proporcionalidade.Para a justa individualização da
sanção penal (art. 5º inc. XLVI da Lex Legis) no caso em exame, atento às
ponderações ora externadas, mas sem olvidar a exigência da reserva legal, parece
mais racional impor aos acusados, no tocante à imputação de roubo qualificado, a
pena correspondente ao furto qualificado (art. 155, § 4º, inc. IV do Código
Penal).
Com efeito, se a grave ameaça foi, conquanto suficiente para intimidar as
vítimas, inócua para produzir-lhes lesão física, mostra-se mais consentânea,
ante as reflexões desenvolvidas nesta peça, a sanção penal cabível para o crime
de furto, pois a conduta do réu, despida de violência e com meio intimidativo
inidôneo a reproduzir resultado lesivo à integridade física das vítimas, mais se
assemelha ao furto do que ao roubo.Logo, ainda que se sustente a capacidade de
uma arma de brinquedo encaixar-se no conceito da elementar da "grave ameaça",
inerente ao tipo do art. 157 do Código Penal, conforme pacífica jurisprudência e
doutrina, impõe-se a escolha por uma pena que seja a proporcional
correspondência do modelo concreto, material, do agir ilícito, e que mais se
aproxime dos objetivos de retribuição, reeducação e prevenção da pena.
DOS PEDIDOS
À vista de todo o exposto, o Ministério Público requer a Vossa Excelência a
procedência parcial da pretensão punitiva, a fim de que o acusado seja condenado
às penas do art. 155 § 4º, inc. IV do Código Penal, absolvendo-o quanto à
imputação prevista no art. 1º da Lei 2.252/54.
Requer, na oportunidade, seja determinada, de imediato, a restituição às vítimas
da importância apreendida (fls. 33 e 34), produto do roubo.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]