CONTRATO DE MÚTUO - SFH - FINANCIAMENTO DE IMÓVEL - AUMENTO ABUSIVO -
CONTRATO DE ADESÃO - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - ART 42 CDC
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ....ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DA
COMARCA ...., DO ESTADO DO ....
A Associação ...., entidade sem fins lucrativos com registro no Cartório
Privado de Registro Civil das Pessoas Jurídicas sob nº .... do protocolo A-....
registrado sob nº .... do Livro A-.... em .... de .... de ...., com abrangência
na Comarca de .... e região, inscrita junto ao CNPJ/MF sob nº ...., e com sede
na Rua .... nº ...., telefone ...., na Comarca de ...., Estado do .... (doc. nº
....), representada neste ato, por seu presidente, o Sr. .... (qualificação),
portador da Cédula de Identidade/RG nº ...., e do CNPF/MF nº ...., residente e
domiciliado na Rua ... nº ...., conjunto residencial ...., na Comarca de ....,
Estado do .... (doc. nº ....), por seus procuradores ao final subscrito, os
advogados ....., devidamente inscrito junto à OAB/...., sob nº ...., ambos com
escritório profissional sito na Rua .... nº ...., sala ...., telefone ...., na
Comarca de ...., Estado do ....., conforme instrumento de procuração em anexo
(doc. nº ....), vem respeitosamente a presença de Vossa Excelência, propor a
presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE COM PEDIDO LIMINAR CONTRA DANOS A
INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
contra, ...., instituição financeira sob forma de empresa pública federal,
instituída nos termos do Decreto-lei nº 759, de 12 de agosto de 1969, regendo-se
atualmente pelo estatuto aprovado pelo Decreto nº 1.138 de 09 de maio de 1994,
inscrita no CNPJ/MF sob nº ....., com sede em ..../...., e Superintendência
Regional no Estado do ...., na Comarca de ...., na Rua .... nº ....;
...., pessoa jurídica de direito público, com endereço na Rua .... nº ...., na
Comarca de ...., Estado do ....
...., com sede na Av. .... nº ...., na Comarca de ...., Estado do ...., inscrita
no CNPJ/MF sob nº ....
...., sociedade de economia mista, criada nos termos da Lei Estadual nº 5.113,
de 14 de maio de 1965, inscrita no CNPJ/MF sob nº ...., com sede na Comarca de
...., Estado do ....
Fazem parte integrante desta exordial, oito documentos devidamente enumerados.
Pelos fundamentos de fato e de direito a seguir:
DO CABIMENTO DA AÇÃO
Esta ação visa defender os interesses individuais homogêneos dos mutuários do
Conjunto Habitacional ...., localizado na Comarca de ...., Estado do ...., que
estão pagando, estão sendo chamados a pagar, ou vão pagar as prestações do
financiamento dos imóveis do referido conjunto habitacional, ou ainda, estão
perdendo tais imóveis por inadimplência em função dos altos valores das
prestações calculados pela ...., valores estes, estipulados em contratos de
adesão, que apresentam vícios de superfaturamento, conforme adiante se
esclarecerá.
A Associação proponente busca o abrigo da Ação Civil Pública em função de se ter
configurado o interesse individual homogêneo de todos os contratantes de
financiamentos da ...., como os mutuários, residentes no conjunto habitacional
....
O texto constitucional, especificamente em seus artigos 5º, inciso XXXII, e 170,
inciso V, ampliou o alcance do instrumento processual criado anteriormente pela
Lei nº 7.347/85, para que a Ação Civil Pública tenha por escopo de ser, também,
uma demanda substitutiva de múltiplos feitos individuais, quando estes cuidam de
interesses individuais homogêneos ou direitos coletivos, assim entendidos os
direitos complexos e comuns a uma generalidade de pessoas, caracterizadas não só
pelo confronto entre "indivíduo versus autoridade" como também pelo conflito de
interesses de feição meta-individual, como é o caso presente, em que se cuida de
representar judicialmente os interesses dos mutuários domiciliados no conjunto
habitacional ...., na Comarca de ...., Estado do ...., questão que encerra,
neste caso, inafastável interesse coletivo previsto no inciso III, do parágrafo
único do artigo 81, do Código de Defesa do Consumidor.
Ademais, pelo CDC, os mutuários do setor de construção de habitação, do Sistema
Financeiro da Habitação, gerenciado pelas rés .... e ...., enquadram-se em seu
artigo 3º, quando as rés se lhes prestam os serviços mencionados, ou seja,
enquanto sujeitos passivos de uma relação de mútuo habitacional, que monopoliza
o contrato celebrado impondo-lhes condições pré-determinadas, e contra as quais
não podem os mutuários se insurgir, devendo acatá-las na íntegra.
Por outro lado, o artigo 21 da Lei nº 7.347/85, com a redação determinada pelo
mesmo Código de Defesa do Consumidor, afasta qualquer óbice que poderia ser
levantado com relação ao cabimento desta ação, quando afirma:
"Art. 21 - Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e
individuais, no que for cabível, os dispositivos do Código de Defesa do
Consumidor."
Ressalte-se ainda, sobre a matéria, o comentário de Daniel Roberto Fink:
"Todo o título III do CDC, portanto, pode ser utilizado nas ações de que trata a
LACP, disciplinando o processo civil dos interesses difusos coletivos ou
individuais."
Sem embargos dos argumentos acima colocados, pedidos vênia para transcrever o
artigo 2º, da Lei nº 8.078/90, que define o que seja consumidor:
"Art. 2º - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza
produto ou serviço como destinatário final, equiparando-se a consumidor a
coletividade de pessoas que haja intervindo nas relações de consumo."
Portanto, é lógica a dedução de que o mutuário se enquadra na definição de
consumidor, seja por ser adquirente de um produto, a moradia, seja pela
utilização do crédito financeiro de um serviço mediante sua remuneração.
Neste sentido, dispõe, de modo a encerrar a questão, o artigo 3º, § 2º, da Lei
nº 8.078/90:
"Art. 3º - ...
§ 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante
remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e
securitária."
DA LEGITIMIDADE ATIVA
A Associação proponente busca amparo legal, nos dispositivos da Lei nº 7.347/85,
que dispõe em seu artigo 5º, incisos I e II, quanto a legitimidade ativa os
seguintes requisitos:
"I - Esteja constituída a pelo menos um ano, nos termos da lei civil;
II - Inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente,
consumidor (...) ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo."
A comprovação de que a Associação proponente possui tais requisitos, está
contida nos documentos anexos (doc. nº ....).
DA LEGITIMIDADE PASSIVA
No que se refere à legitimidade passiva das rés, pedimos vênia para transcrever
os ensinamentos do douto administrativista Dr. Hely Lopes Meirelles:
"A legitimação passiva estende-se a todos os responsáveis pelas situações ou
fatos ensejadores da ação, sejam pessoas físicas ou jurídicas, inclusive as
estatais, autárquicas ou paraestatais, porque tanto estas como aquelas podem
infringir normas de direito material de proteção ao meio ambiente ou ao
consumidor, incidindo na previsão do artigo 1º da Lei 7.347/85, expondo-se ao
controle judicial de suas condutas."
(in Mandado de Segurança, citação à página 122, 14ª edição, 1990, Malheiros
Editores Ltda.).
Tenha-se, ainda presente, que nos termos do Código de Defesa do Consumidor são
legitimados passivos:
"Art. 12 - O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, o
importador ... independentemente da existência de culpa, pela reparação dos
danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projetos,
fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou
acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua utilização e riscos."
No mesmo sentido, com a devida vênia transcrevemos o disposto no art. 22 do
mesmo Código:
"Art. 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias,
permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigadas a
fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais,
contínuos.
Parágrafo único - Nos casos de descumprimento total ou parcial, das
obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a
cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código."
Tais argumentos jurídicos deixam claro a responsabilidade das pessoas jurídicas
que figuram no polo passivo da presente ação, no entanto, reafirmando a
legitimidade passiva, ou seja a responsabilidade civil da .... e da ...., cumpre
ressaltar o disposto no Decreto-lei nº 2.291, de 21 de novembro de 1986, que
extinguiu o Banco Nacional de Habitação (BNH), que em suas alíneas "b" e "c", do
parágrafo 1º, de seu artigo 1º, dispõem:
"Art. 1º - ...
Parágrafo 1º - A Caixa Econômica Federal sucede o BNH em todos os seus direitos
e obrigações, inclusive:
a) ...
b) Na gestão do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, do Fundo de Assistência
Habitacional e do Fundo de Apoio à Produção de Habitação para a população de
baixa renda;
c) Na coordenação e execução do Plano Nacional de Habitação Popular - PLANHAP, e
o Plano Nacional de Saneamento Básico - PLANASA, observar as diretrizes fixadas
pelo Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente."
Ainda com relação à legitimidade passiva, as rés firmaram, em .... de .... de
...., Contrato de Empréstimo para Execução de Empreendimento Habitacional
através do PROHAP/Setor Privado, para construção do Conjunto Habitacional ....
(doc. nº ....).
Tal contrato, caracteriza-se como um contrato padrão para financiamento e
construção de empreendimentos habitacionais, financiados e construídos com
recursos do FGTS, recursos estes geridos pela ....
Este contrato atende aos requisitos estipulados pela Circular Normativa nº
132/90, que define o procedimento para a obtenção de financiamento para
construção de Conjuntos populares com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço - FGTS.
Neste contrato figura como Credora, a ...., como Devedora, a Construtora ...., e
como Interveniente e Doadora em Garantia Hipotecária, a Companhia ...., dentre
outros.
Por este contrato, a .... concede empréstimo à Construtora ...., para a produção
e comercialização de .... (....) unidades habitacionais integrantes do Conjunto
Habitacional ...., conforme a cláusula segunda do referido contrato.
O parágrafo único da referida cláusula estipula que os recursos correspondentes
terão a seguinte destinação específica: Habitação, infra-estrutura, custo de
projeto, remuneração do agente de assessoria técnica, PRODEC, despesa de
legalização do empreendimento e taxa de administração da ....
Tal alusão a este contrato, tem o intuito de demonstrar a Vossa Excelência, de
forma inequívoca, a responsabilidade da ...., da ...., da ...., e por fim da
...., senão vejamos:
O parágrafo único da cláusula sétima deste contrato estipula que:
"PARÁGRAFO ÚNICO - A entrega da última parcela do empréstimo (...), ficará
condicionada à verificação, pela CEF:
a) da conclusão total da obra e de que nela foram investidas todas as parcelas
anteriores entregues;"
Quanto a Construtora ...., assim dispõe a cláusula décima segunda do referido
contrato:
"CLÁUSULA DÉCIMA - SEGUNDA - DA DECLARAÇÃO DA DEVEDORA E CONSTRUTORA: Declara a
DEVEDORA e construtora, já qualificada, como responsável pela execução da obra
objeto deste financiamento:
I) ...
II) ...
III) ...
IV) que executará as obras mencionadas, observando as plantas e demais
documentos aceitos pela CEF;
V) que responderá pela segurança, solidez da construção, bem como pelos
requisitos técnicos indispensáveis ao bom andamento da obra;"
Apesar dos fortes argumentos anteriores colocados, e com a costumeira vênia,
transcrevemos o disposto na Constituição Federal, em seu art. 37, § 6º:
"Art. 37 - ...
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa
qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa."
Pinto Ferreira, em comentário ao dispositivo constitucional sobredito (in
Constituição Brasileira, Vol. II, pág. 398/399) ensina que a responsabilidade
civil:
"É a obrigação de reparar o dano causado."
E que:
"Ela se origina de simples imposição legal (responsabilidade objetiva), ou de
fato ilícito praticado por agente responsável, ou pessoa por quem tal agente
responde, ou por alguma coisa pertencente ao agente."
Ainda, segundo Pinto Ferreira, (in Constituição Brasileira, Vol. II, pág. 404):
"O Estado pode ser obrigado ao ressarcimento do dano causado sempre que ocorre a
culpa 'in elegendo', a culpa 'in vigilando' e a culpa 'in omitendo', sem
prejuízo de sua responsabilidade objetiva."
Isto colocado, entendemos como clara a responsabilidade civil das rés e sua
legitimidade passiva.
DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL
Nesta ação está em discussão a responsabilidade objetiva da ...., da ...., da
.... e da ...., sobre danos causados a consumidores, no caso, mutuários do
Conjunto Habitacional ....
Neste sentido, dispõe o inciso I, do artigo 109 da Constituição Federal de 05 de
outubro de 1988, que:
"Art. 109 - Aos Juizes Federais compete processar e julgar:
I - As causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal
forem interessadas na condição de autora, rés, assistentes ou oponentes ..."
Portanto é clara, em função do texto constitucional, a competência da Justiça
Federal para o ajuizamento da presente ação.
DOS FATOS
A ...., concedeu em .... de .... de ...., à ...., empréstimo de, à época, R$
.... (....) através de Contrato de Empréstimo, para Execução de Empreendimento
Habitacional através do PROHAP/Setor privado, obedecendo o cronograma de
desembolso anexo ao contrato (doc. nº ....), com recursos do Fundo de Garantia
por Tempo de Serviço - FGTS, tendo como objetivo a produção e comercialização de
.... unidades habitacionais integrantes do Conjunto Habitacional ....,
localizado na Comarca de ...., Estado do ...., na conformidade do projeto aceito
pela ...., cujos elementos técnicos, econômicos e financeiros passaram a fazer
parte integrante do referido contrato, tendo sido estabelecido que os recursos
correspondentes teriam a seguinte destinação específica: Habitação,
infra-estrutura, custo de projeto, remuneração do agente de assessoria técnica,
PRODEC, despesa de legalização do empreendimento e taxa de administração da ....
Tal empreendimento, está compreendido em seus elementos técnicos, econômicos e
financeiros, bem como em seus demais atos, no processo arquivado junto a ....
sob nº ....
Ocorre que em fins do mês de .... de ...., o então Exmo. Sr. Governador do
Estado do ...., Sr. ...., e o Sr. ...., à época, Secretário de Habitação do
Estado do ...., denunciaram insistentemente a existência de fraudes e
superfaturamento na construção e comercialização de imóveis, no Estado do ....,
construídos com recursos geridos pelo Sistema Financeiro da Habitação.
No período compreendido entre o final do mês de .... e durante o mês de .... de
...., o Governador do Estado do ...., fez veicular anúncios insistentemente
repetidos nas emissoras de televisão, mostrando imóveis financiados pela ....,
acompanhado dos seguintes termos:
"VEJA SÓ AS CASAS QUE A CAIXA ECONÔMICA CONSTRÓI NO PARANÁ!
CASAS DE 20 A 27 METROS QUADRADOS, DE PÉSSIMO ACABAMENTO E QUE CUSTAM ATÉ
SEISCENTOS MIL CRUZEIROS O METRO QUADRADO!
O MESMO PREÇO DE UM APARTAMENTO EM BAIRRO NOBRE EM QUALQUER GRANDE CIDADE!
A CAIXA CONSTRÓI ESTAS CASAS EM ACERTO DIRETO COM AS EMPREITEIRAS!
AS RESPONSABILIDADES DEVEM SER APURADAS!
ISSO PRECISA TER UM FIM!
ESTA É UMA DENÚNCIA DO PARANÁ!
UM ESTADO DO AMOR PELO BRASIL!
Tais denúncias, em função da publicidade e notoriedade que alcançaram,
tornaram-se de domínio público, dispensando, portanto, prova material.
As mesmas denúncias chegaram também, às manchetes dos jornais (doc. nº ....).
A notícia das denúncias foi levada ao Congresso Nacional, pelo então Governador,
o Sr. ........., que posteriormente foi convocado a prestar esclarecimentos e
informações à famosa CPI da corrupção (doc. nº ....).
Em virtude da repercussão alcançada pelas denúncias do Governo do Paraná,
através de seu Governador, à época, a Requerida ...., instaurou através da
portaria nº 235/92, de 06 de julho de 1992 e complementada pela portaria nº
263/92 de 15 de julho de 1992, uma Comissão de Sindicância para apurar a
veracidade das denúncias colocadas na televisão e na imprensa.
O resultado desta Comissão, consubstanciou-se no relatório apresentado pela
mesma, em 21 de agosto de 1992 (doc. nº ....).
Neste relatório, a referida Comissão esclarece ter feito análise em ....
processos de construção de conjuntos habitacionais (pág. 3, item 3.4 do doc. nº
....) a título de amostra, ante o extenso número de conjuntos habitacionais
financiados pela Requerida, a ...., em todo o Estado do ....
Afirma ainda, que foram constatadas irregularidades em praticamente todos os
conjuntos analisados, não sendo, porém, possível apurar o quantum da fraude, ou
seja, o exato valor da diferença paga a mais à empreiteiras, em relação ao custo
real dos conjuntos construídos, com financiamento da Requerida, a ...., em
função da ausência generalizada de quaisquer subsídios a nível de projetos,
orçamentos, memoriais descritos e detalhamento técnico dos serviços a serem
executados, que pudesse permitir uma apropriação precisa de custo a nível
analítico, envolvendo consumo de material e produtividade de mão de obra (pág.
14, item 6.1.5.2. do doc. nº ....).
Ainda assim, foi possível constatar em alguns conjuntos, uma diferença
significativa entre o valor às empreiteiras e o valor de custo de alguns
conjuntos habitacionais. A título de exemplo, posto que o relatório enumera uma
série de outros conjuntos, pedimos vênia para citar o caso do conjunto
habitacional .... situado na Comarca de ...., Estado do ...., portanto no mesmo
Estado em que se situa o Conjunto Habitacional ...., objeto da presente Ação.
No caso do Conjunto ...., a Comissão averiguou um valor de avaliação de .... UPF,
já colocados aí, as taxas, encargos, etc., sendo que o valor avaliado para
contratação e, portanto, efetivamente pago foi de .... UPF, verificando-se,
assim, uma diferença de .... UPF, equivalente a ....% a mais do que o valor do
custo, e o que é mais grave, este será o valor, após dividido pelo número de
imóveis que compõe o conjunto, a ser repassado aos mutuários deste mesmo
conjunto (pág. 10, item 6.1.1., alínea H, do doc. nº ....).
Muito embora o Conjunto Habitacional ...., não tenha sido, especificamente,
objeto de análise da referida Comissão, não é preciso muito esforço de abstração
para se concluir, devido a generalidade de irregularidades constatadas, pela
suspeita, quase certeza, de que o Conjunto Habitacional em tela, também possua
embutido em seu valor final, superfaturamento e outras irregularidades de toda
ordem.
Ora, fossem apenas as denúncias do Governo do Estado do ...., na pessoa do Ex.
Governador, Sr. .... e do Secretário de Habitação, à época o Sr. ...., poderia
até se questionar dos fundamentos da presente ação, mas, no entanto, até mesmo a
Requerida, ...., comprovou a veracidade das denúncias, através do relatório
supramencionado, o que deixa claro a necessidade e o fundamento da tutela
jurisdicional pretendida.
Não se pode negar o prejuízo sofrido pelos mutuários do Conjunto Habitacional
...., não só pelos excessivos valores cobrados nas prestações impostas pela
Requerida, ...., como também pelo repasse do superfaturamento havido, que os
mutuários terão de suportar por todo o período que durar o financiamento, ou
seja, pelo período de vinte e cinco anos.
Ademais, ainda que infundadas tais denúncias, no que se refere ao Conjunto
Habitacional ...., permanece pairando sobre a cabeça dos mutuários, a suspeita
de terem o seu direito à aquisição de imóvel próprio a preço de custo, ameaçado
pelo repasse do superfaturamento ao preço do imóvel, o que por si só justifica o
conhecimento da presente ação e, por conseguinte, a prestação da tutela
jurisdicional ao caso em tela.
Data vênia, acredita a autora que, devido a dificuldade de se avaliar, com
exatidão e certeza o valor do superfaturamento e as demais irregularidades,
surge como inafastável a necessidade de se proceder a investigação de todo o
processo envolvendo a construção e comercialização do referido Conjunto
Habitacional, o que se pretende fazer durante a instrução processual e que
pressupõe, de forma inconteste, a realização de perícia técnica, a ser requerida
pela autora em momento oportuno, nos imóveis, ainda que por amostragem, que
compõe o Conjunto Habitacional ....
Ad cautelam, sem embargo de entendimento diverso que Vossa Excelência tenha,
gostaria a autora, com a devida vênia, de finalizar este tópico afirmando que:
"A COMPLEXIDADE MATEMÁTICA DO ASSUNTO NÃO ELIDE O DIREITO DE FATO."
DA MEDIDA LIMINAR
O contrato por instrumento particular de compra e venda, mútuo com obrigações e
quitação parcial, celebrado entre as Requeridas ...., ...., e como Interveniente
Anuente, a ...., com os mutuários do Conjunto Habitacional .... (doc. nº ....,
anexado a título de exemplo, posto que, todos os demais contratos entre as
partes são idênticos), caracteriza-se como um contrato de adesão, uma vez que é
vedado aos mutuários a alteração de qualquer cláusula contratual - ou assina e
submete-se ao contrato sem discuti-los, ou fica impossibilitado de adquirir o
financiamento - restado ao mutuário, em casos extremos, o recurso,
constitucionalmente assegurado, à tutela jurisdicional.
No que pertine aos contratos de adesão, prescreve o caput do artigo 54 do CDC:
"Art. 54 - Contrato de Adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas
pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de
produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar
substancialmente seu conteúdo."
Ainda, que possua a denominação de "contrato por instrumento particular de
compra e venda", possui, tal contrato, feição de contrato público, já que
sabe-se e desde Roma se afirma que:
"O nome não faz o direito."
A relação mutuário e instituição financeira é creditícia, e, em assim sendo,
mesmo que os contratos de mútuo, no âmbito do SFH possuam natureza jurídica de
contrato de adesão, este necessariamente não deve proteger somente quem os
elabora, em razão de sua previsão legal ser oriunda de norma de direito público.
Justamente, por não ser o mutuário quem elabora as normas e cláusulas
contratuais, dada a natureza do contrato de adesão, é que se deve proteger o
interesse do mutuário/devedor - normalmente o menos favorecido economicamente, a
fim de permitir, no mínimo, um equilíbrio entre as partes, evitando-se, assim, a
existência de uma relação draconiana felizmente quebrada, agora, pelo Código de
Defesa do Consumidor, livrando-o do ônus que se impunha à parte menos
favorecida.