Ação revisional de contrato relativo à cartão de crédito, cumulada com pedido de repetição de indébito.
EXCELENTÍSSIMO DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE
......
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
AÇÃO REVISIONAL DE ENCARGOS FINANCEIROS CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO
em face de
..... administradora de cartão de crédito, pessoa jurídica de direito privado,
inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com sede na Rua ....., n.º ....., Bairro
......, Cidade ....., Estado ....., CEP ....., representada neste ato por seu
(sua) sócio(a) gerente Sr. (a). ....., brasileiro (a), (estado civil),
profissional da área de ....., portador (a) do CIRG nº ..... e do CPF n.º .....,
por intermédio de seu advogado (a) e bastante procurador (a) (procuração em
anexo - doc. 01), com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro
....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem
mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor:
DOS FATOS
O REQUERENTE firmou com a REQUERIDA, contrato de utilização de cartão de
crédito, tendo o mesmo o n.º .................... Ocorre que não pode prosperar
a forma de cálculo utilizada pela REQUERIDA para apuração do débito do
REQUERENTE conforme se demonstrará.
DO DIREITO
1. Da possibilidade de revisão do contrato
Os encargos e fórmula de apuração dos mesmos adotados pela REQUERIDA ocasionam
um acréscimo no valor das prestações que as tornam impossíveis em serem
cumpridas. A capitalização dos juros e as taxas cobradas pela REQUERIDA elevaram
de sobremaneira o valor do crédito obtido. A relação entre as partes ora
litigantes deve ser mantida pelo princípio da boa-fé nos contratos, eis que o
Requerente não pretendendo esquivar-se do pagamento de eventuais débitos junto à
REQUERIDA, cumpriu religiosamente com os pagamentos que foram possíveis.
Entretanto exige que seja aplicado os índices de correção adequados e que não
causem o locupletamento ilícito a nenhuma das partes.
Muito embora o Código Civil não contenha preceito expresso no sentido de que as
relações jurídicas devam ser realizadas com base na boa-fé, essa circunstância
decorre dos princípios gerais do direito, e a exigência de as partes terem de
comportar-se segundo a boa-fé tem sido assim proclamada tanto pela doutrina
quanto pela jurisprudência. O comportamento das partes com base nesta mútua
confiança tem como consequência a possibilidade de revisão do contrato celebrado
entre elas, pela incidência da cláusula rebus sic stantibus. Em respeito à
mantença dessa boa-fé, os encargos pactuados devem ser analisados e revistos
pelo Juízo, a fim de proporcionar à lide a solução mais justa e acorde aos
princípios gerais de direito.
2. Quanto à relação contratual tem-se:
a) Da adesão.
O contrato firmado pelo Requerente pode ser qualificado como contrato de adesão
pois teve que se submeter em aceitar, em bloco, as cláusulas estabelecidas pela
REQUERIDA, aderindo a uma situação contratual que se encontrava definida em
todos os seus termos. Na relação jurídica existente entre as partes ora
litigantes, há predomínio categórico da vontade da Requerida, que impôs
condições contratuais favoráveis somente a si, em detrimento da Requerente. Os
excessivos encargos prejudicam a comutatividade contratual e exigem intervenção
judicial para coibir a aplicação integral dos encargos a que está submetida a
Requerente perante a Requerida.
b) Da Aplicação Do Código De Defesa Do Consumidor.
As normas contidas na Lei 8.078 estão exercendo uma influência sobre todo o
sistema jurídico, fortalecendo as tendências jurisprudenciais que apreciavam com
mais severidade os contratos de adesão, a repressão aos abusos de direito e a
aplicação mais ampla da própria teoria da imprevisão, justificando-se, assim, um
trabalho preventivo de revisão dos modelos contratuais e o eventual reexame de
alguns modelos operacionais. Da mesma forma, o consumidor está sendo mais
protegido após a assinatura do contrato, judicialmente, nas quais a
aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ocasiona uma maior
possibilidade de discussão das cláusulas firmadas.
O reconhecimento da hipossuficiência da parte que contrata com uma empresa do
porte da REQUERIDA, seja pessoa jurídica ou física, ocasiona, no curso do
processo, principalmente a inversão do onus probandi, ficando a REQUERIDA
responsável em provar toda a evolução do débito que cobraria, explicitando os
percentuais das taxas de juros, o método para o cálculo.
A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de
administração de cartão de crédito, encontra guarida no artigo 52 dessa Lei, no
qual se prevê regras para o "fornecimento de produtos ou serviços que envolva a
outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor (.)".
Dessa forma, há de se reconhecer a hipossuficiência do Requerente que, na hora
da contratação, subordinou-se à regras impostas pela REQUERIDA, sem poder
discutir as cláusulas contidas no contrato. Com relação à inversão do ônus da
prova que a aplicação do Código de Defesa do Consumidor acarreta, não se nega
que o artigo 333 do Código de Processo Civil e seus parágrafos estabeleçam que
incumbe ao autor o ônus da prova quanto ao fato constitutivo de seu direito e ao
réu quanto à alegação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito
do requerente.
Porém, sabidamente, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 6º, inciso
VIII, prevê esta inversão na distribuição do ônus da prova em favor do
consumidor, pois é evidente que em determinados casos o consumidor, não terá
acesso a outros dados que o Requerido detém, face ao monopólio de informações
que pertence à REQUERIDA. Nesse sentido, o Código de Defesa do Consumidor
menciona:
"Art. 6º. São direitos básicos do consumidor. VIII - a facilidade da defesa de
seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova a seu favor, no
processo civil, quando a critério do juiz for verossímil a alegação ou quando
for hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência."
Certamente, como será demonstrado, houve abusividade no contrato, o que somente
poderá ser verificado através de perícia contábil. Diante da hipossuficiência da
Requerente, deve-se inverter o ônus da prova, obrigando-se a REQUERIDA a
demonstrar, documentalmente todos os procedimentos adotados no cálculo, desde o
início da relação contratual.
3. Quanto à forma de cálculo:
a) Da capitalização dos juros.
Cumpre-se afirmar que os juros compensatórios ou remuneratórios não podem ser
capitalizados. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça, bem como dos
demais Tribunais brasileiros, é de que a capitalização de juros não é permitida.
Esta atitude advém da aplicabilidade do Decreto 22.626/33. Com efeito, o artigo
4º da Lei da Usura proíbe expressamente a cobrança de juros sobre juros
(anatocismo); a Súmula 121 do STF veio dar maior ênfase para este dispositivo
legal, proibindo também a capitalização de juros, ainda que expressamente
convencionada. Nesse mesmo sentido é a explicação de Theotônio Negrão, in Código
Civil, 12ª ed., 1993, p. 601: "Esta Súmula (121 do STF) deve ser harmonizada com
a de n.º 596. A capitalização de juros é vedada mesmo em favor das instituições
financeiras".
Sobre este tema, em concordância com o parecer desse Doutrinador, decidiu-se:
"Direito Privado. Juros. Anatocismo. Vedação incidente também sobre instituições
financeiras. Exegese do Enunciado n.º 121, em face do n.º 596, ambos Súmulas do
STF. Precedentes da Excelsa Corte. A capitalização de juros (juros de juros) é
vedada pelo direito, mesmo quando expressamente convencionada, não tendo sido
revogada a regra do artigo 4º do Decreto n.º 22.626/33 pela Lei 4.595/64. O
anatocismo, repudiado pelo verbete n.º 121 da Súmula do STJ, não guarda relação
com o enunciado n.º 596 do STF" (STJ, Ap. Cível n.º 135.460, Rel. Min. Sávio
Figueiredo, junho/1991).
"A dicção do art. 1º da Lei de Usura, nunca revogada, não permite a estipulação
de taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal, e o art. 4º veda o
anatocismo. Mostrando-se abusiva a cobrança de encargos feita a apelada não foi
esta constituída em mora validamente, pois sequer poderia saber o valor correto
para uma eventual consignação. Apelação desprovida" (Tribunal de Alçada do Rio
Grande do Sul. Ap. Cível n.º 195144589, data 28/03/1996, Quinta Câmara Cível,
Relator Marcio Borges Fortes).
Portanto, denota-se que as Instituições Financeiras não podem efetuar a cobrança
de juros dos juros ou corrigir monetariamente juros, não sendo permitido a
mencionada capitalização sob a alegação da Súmula 596 permitir, pois a mesma
sequer menciona a capitalização no seu corpo. No caso em questão, conforme
demonstrado no "Parecer técnico", os juros foram mensalmente capitalizados
(calculados sobre os juros anteriormente debitados) pela REQUERIDA em flagrante
violação à Lei.
b) Da impossibilidade das administradoras de cartão de crédito cobrarem juros
acima do limite constitucional.
A cobrança de juros acima do limite constitucional só é permitida às
Instituições financeiras, excluídas da regra do art. 193 § 3º da Constituição
Federal. As administradoras de cartão de crédito, entretanto, nos termos do art.
17 da Lei 4595/64, não são Instituições Financeiras.
ART.17 - Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação
em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade
principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos
financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a
custódia de valor de propriedade de terceiros. Portanto, as administradoras de
cartão de crédito estão sujeitas à Lei 22.626/33, a denominada Lei da usura, que
por sua vez proíbe a cobrança de juros acima do permissivo legal.
ART.1 - É vedado, e será punido nos termos desta Lei estipular em quaisquer
contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal. § 1º (Revogado pelo
Decreto-lei nº 182, de 05/01/1938). § 2º (Revogado pelo Decreto-lei nº 182, de
05/01/1938). § 3º A taxa de juros deve ser estipulada em escritura pública ou
escrito particular, e, não o sendo, entender-se-á que as partes acordaram nos
juros de 6% (seis por cento) ao ano, a contar da data da propositura da
respectiva ação ou do protesto cambial. Os juros estão limitados legalmente a
12% ao ano. Neste sentido, as administradoras de cartão de crédito só poderiam
cobrar juros no limite de 0,5% ao mês.
Portanto, é nula a cláusula que prevê a cobrança de juros acima do permissivo. A
questão já está sendo apreciada pelo STJ (Resp 194843 RS) sendo que o Ministro
Carlos Alberto Menezes Direito votou como relator pela impossibilidade das
administradoras de cartão cobrarem juros acima do limite constitucional.
Em segunda instância o TJRS por unanimidade havia julgado favoravelmente ao
consumidor (Dario João Wendling X BB Administradora de Cartões Ltda). c) Dos
valores devidos pela REQUERIDA Aplicando-se a forma "simples" de cálculo de
juros, observa-se conforme demonstrado no "laudo de apuração de valores", que o
REQUERENTE tem um crédito do de R$3.550,26 (três mil quinhentos e cinquenta
reais e vinte seis centavos).
Portanto, merecem deferimento os pedidos abaixo formulados.
DOS PEDIDOS
Pelo exposto, requer-se à Vossa Excelência:
Seja citado a Requerida na pessoa que legalmente o represente, através de carta
com aviso de recebimento, (ARMP) para que, querendo, conteste a presente ação no
prazo legal, sob pena de revelia; Seja julgado totalmente procedente a ação
excluindo-se a capitalização mensal dos encargos financeiros aplicados pela
REQUERIDA;
Determine-se a exclusão, de todos os juros cobrados acima do limite
constitucional.
Seja a REQUERIDA intimada para proceder juntada do contrato de utilização do
cartão de crédito; planilha indicando os juros aplicados durante a vigência do
mesmo e contrato social com as devidas alterações, sob as penas do artigo 359 o
CPC.
5) Seja a REQUERIDA condenada a devolver ao REQUERENTE a importância de
R$3.550,26 (três mil quinhentos e cinquenta reais e vinte seis centavos). A
inversão do ônus da prova, de acordo com o artigo 6º, inciso VIII, por estar
caracterizada a relação de consumo entre as partes; A condenação da Requerida ao
pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, se devidos;
A produção de todos os meios de prova em direito admitidos, especialmente
pericial e testemunhal.
Dá-se à causa o valor de R$......
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]