Ação civil pública para inspeção sanitária em produtos de origem animal.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ........., através de seu representante legal
que a presente subscreve, no exercício da função de Curador de Proteção ao
Consumidor desta comarca, legitimado pelo art. 129, inciso III, da Constituição
Federal, e com fundamento no art. 81 do Código de Processo Civil, arts. 3°, 5º,
11 e 12, da Lei 7.347/85, e arts. 81, parágrafo único, inciso I, 83 e 84, § §
3°, 4° e 5°, do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), vem, perante
Vossa Excelência, para ajuizar
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
em face de
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., pelos motivos de
fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS (...)
DO DIREITO
Nos precisos termos do art. 2º, incisos III, IV e V da Lei 7.889/89:
"Sem prejuízo da responsabilidade penal cabível, a infração à legislação
referente aos produtos de origem animal acarretará, isolada ou cumulativamente,
as seguintes sanções:
III-. Apreensão ou condenação das matérias-primas, produtos, subprodutos e
derivações de origem animal, quando não apresentem condições
higiênico-sanitárias adequadas ao fim a que se destinam, ou forem adulterados;
IV-. A suspensão de atividades que cause risco ou ameaça de natureza
higiênico-saniária ou no caso de embaraço a ação fiscalizadora;
V-. Interdição, total ou parcial, do estabelecimento, quando a infração
consistir na adulteração ou falsificação habitual do produto ou se verificar
mediante inspeção técnica realizada pela autoridade competente, a inexistência
de condições higiênico-sanitárias adequadas.
No mesmo diapasão, a Lei Estadual 10.691, de 09 de janeiro de 1996, que dispõe
sobre a inspeção e fiscalização dos produtos de origem animal, prescreve:
"Art 1°- É obrigatória a inspeção e fiscalização, sob ponto de vista industrial
e sanitário, de todos os produtos de origem animal, comestíveis e não
comestíveis, no Estado do ........
Art 2° - A inspeção e fiscalização de que trata esta Lei será executada, em
nível intermunicipal, pelo Departamento de Produção Animal da Secretaria da
Agricultura e Abastecimento, através da Coordenadoria de Inspeção Industrial e
Sanitária dos Produtos de Origem Animal.
Parágrafo 1º- (.)
Parágrafo 2º- (.)
Art 3°-. Nenhum estabelecimento, industrial ou entreposto, que faz comércio
intermunicipal de produtos de origem animal, poderá funcionar, no Estado do Rio
Grande, sem estar previamente registrado na Coordenadoria de Inspeção Industrial
e Sanitária dos Produtos de Origem Animal, na forma de regulamento e demais atos
complementares que venham a ser baixados pelo Poder Executivo.
(...)
Art. 5° - Sem prejuízo das responsabilidades civil e penal cabíveis, a infração
às disposições desta Lei sujeitará o infrator às penalidades previstas na Lei
Federal nº 7.889, de 23 de novembro de 1989." Não é diferente o disposto na Lei
3.871/94, do Município de Pelotas, ao disciplinar a inspeção sanitária e
industrial dos produtos de origem animal. Veja-se:
"Art 1° - 0 Município realizará prévia fiscalização, sob o ponto de vista
industrial e sanitário, de todos os produtos de origem animal comestíveis ou não
comestíveis, sejam ou não adicionados de produtos vegetais, preparados,
manipulados, recebidos, acondicionados e em trânsito, para ou de,
estabelecimentos industriais ou entrepostos, de origem animal, que façam apenas
comércio municipal.
Parágrafo único - o registro no órgão municipal competente é condição
indispensável para o funcionamento dos estabelecimentos industriais ou
entrepostos de produtos de origem animal referidos no "caput" deste artigo.
Art 2° - 0 Município adota, para as infrações apuradas em inspeção sanitária e
industrial dos produtos de origem animal, em sua fiscalização, o elenco de
sanções previstas pelo artigo 2° da Lei Federal n° 7.889, de 23 de novembro de
1989.".
Assim, ao fornecer produtos de origem animal sem qualquer licença e/ou
fiscalização dos órgãos sanitários competentes, está o requerido, na verdade,
entregando ao mercado produtos impróprios ao consumo. Nesse sentido, é o
disposto na parte final do inciso II, parágrafo 6º, artigo 18 da Lei 8.078/90
(Código de Defesa do Consumidor).
"Art 18- (...)
§ - São impróprios ao uso e consumo:
I - (...);
II - (...);
III- os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados,
corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles
em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou
apresentação..." (grifei).
Ademais, tal prática comercial (colocar no mercado de consumo produtos de origem
animal sem qualquer fiscalização dos órgãos de inspeção sanitária) e reputada
como abusiva pelo inciso VIII do artigo 39 do Estatuto de Proteção ao
Consumidor:
"Art. 39 - E vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras
práticas abusivas:
(...)
VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo
com as normas expedidas pelos órgãos competentes...".
De outra banda, "a defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das
vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo"
(art. 81 do CDC). E "a defesa coletiva será exercida quando se tratar de
interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os
transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato" (inciso I, parágrafo único,
do art. 81 do CDC).
No caso em tela, é evidente que se pretende a defesa coletiva de um número
indeterminado de consumidores, todos expostos a uma prática comercial abusiva.
Ou seja, o requerido, ao comercializar pnodutos de origem animal sem qualquer
fiscalização, coloca em risco a incolumidade física de um número indeterminado
de pessoas - consumidoras de carnes e outros derivados do matadouro clandestino.
E a legitimidade do Ministério Público, para a defesa coletiva de tais
interesses ou direitos difusos em juízo, está estampada no inciso I do artigo 83
da Lei de Proteção ao Consumidor, bem como no artigo 5°, combinado corn o artigo
1°, inciso II, do Lei da Ação Civil Pública.
Outrossim, a Lei 8.078/90, em seus artigos 83 e 84, dispõe: "Art 83- Para a
defesa dos direitos e interesses protegidos por este Código são admissíveis
todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela".
Art. 84- Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não
fazer, o Juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará
providências que assegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento.
§5° - Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático
equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como busca e
apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra, impedimento de
atividade nociva, além de requisição de força policial" (grifei).
Dispõe, ainda, a Lei 7347/85 (Lei da Ação Civil Pública) em seu art 11:
"Art 11 - Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou
não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou
a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou cominação de
multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de
requerimento do autor." (grifei).
Em complemento, dispõem os artigos 798 e 799 do Código de Processo Civil:
"Art. 798 - Além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código
regula no Capítulo II deste livro, poderá o juiz determinar as medidas
provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte,
antes do julgamento da lide, cause ao direito de outra lesão grave e de difícil
reparação.
Art 799 - No caso do artigo anterior poderá o juiz, para evitar dano, autorizar
ou vedar a prática de determinados atos, ordenar a guarda judicial de pessoas e
depósitos de bens e impor a prestação do caução" (grifei).
Por fim, a matéria versada na presente ação tem suporte legal na Lei Federal
1.283/50, que dispõe sobre inspeção dos produtos de origem animal e vegetal;
Decreto Federal 30.691/52, que especifica quais os requisitos que o matadouro
deve observar para poder funcionar regularmente, e sanções a serem aplicadas;
Decreto Federal 1.255/62, que institui alterações no Decreto 30.691/52; Lei
Federal 6.437/77, que tipifica infrações à legislação sanitária e às sanções
respectivas; Lei Federal 5.760/71, que dispõe sobre inspeção sanitária de
produtos de origem animal; Decreto 73.116/73, que regulamenta a Lei 5.760/71;
Lei Federal 7.889/98; Lei Estadual 10.691/96, que dispõe sobre a inspeção
estadual de produtos de origem animal; Decreto Estadual 39.688/99, que
regulamenta a Lei 10.69 1/96; Lei Municipal 3.871/94, que dispõe sobre a
inspeção sanitária e industrial dos produtos de origem animal no Município de
......... e Decreto Municipal 3.894/98, que regulamenta a Lei 3.871/94, sem
prejuízo das demais legislações invocadas e outras pertinentes.
DOS PEDIDOS
Preliminarmente
Consoante dispõe o art 3° da Lei n° 7.347/85, a ação civil pública poderá ter
por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou
não fazer e, neste caso, o juiz determinará o cumprimento da prestação da
atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução
específica, ou compatível, independentemente de requerimento do autor.
Além disso, para tal cumprimento (art 12) da obrigação de fazer ou não fazer,
"poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em
decisão sujeita a agravo".
No mesmo sentido, ainda, é o disposto no parágrafo terceiro do artigo 84 do
Código de Defesa do Consumidor, ao consignar: "sendo relevante o fundamento da
demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito
ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o
réu."
A doutrina situa tal procedimento no âmbito do exercício do Poder de Cautela,
exigindo, portanto, a implementação de dois requisitos essenciais: o "fumus boni
juris" que é a "plausibilidade do direito substancial invocado por quem pretende
a segurança". E, o "periculum in mora", configurado em "um dano potencial, um
risco que corre o processo principal de não ser útil ao interesse demonstrado
pela parte, em razão do periculum in mora" (Humberto Theodoro Júnior, In
Processo Cautelar, 3ª Ed., Edição Universitária de Direito, 1978, pág. 73).
No entender do Ministério Público, o "fumus boni juris" está patenteado pela
legislação citada, da qual o requerido vem fazendo tábula rasa. Não há dúvida de
que as atividades desenvolvidas pelo requerido se constituem em uma prática
comercial abusiva, que viola o direito liquido e certo de toda uma população de
consumir produtos de origem animal, cm condições satisfatórias de higiene e
salubridade, asseguradas mediante prévia inspeção sanitária.
Quanto ao "periculum in mora", este se encontra demonstrado concretamente
através do grave risco de dano irreparável à saúde da população, evidenciado nas
manifestações do médico-veterinário :
"... podemos constatar e afirmar, que o abate e o comércio clandestino de
produtos de origem animal são um problema sério, pois colocam em risco a saúde
da população que consome estes produtos que são lançados no comércio sem nenhum
tipo de inspeção sanitária, deixando esta população altamente vulnerável ao
contágio de doenças e zoonoses (enfermidades dos animais que são transmitidas
naturalmente ao homem) dentre as quais podemos citar Tuberculose, Cisticercose,
Hidatidose, além de um número grande de toxinfencóes alimentares oriundas da
falta de higiene nos locais onde são produzidos.." (f/s. 26 do EA 114/99).
Por fim, a aplicação da medida liminar deve obrigar o responsável pelo matadouro
clandestino, sob pena pecuniária prevista no ant. 11 da Lei 7.347/85, a cessar
imediatamente a atividade nociva. Caso contrário, deve ser aplicada multa diária
por desobediência à ordem liminar.
E, em conseqüência de todo o exposto, REQUER-SE:
Seja ordenado, inaudita altera pars e sem justificação prévia, ao requerido que
se abstenha de realizar qualquer tipo de abate clandestino de animais (bovinos,
suínos, ovinos, caprinos, etc.), sob pena de multa diária correspondente a R$
500,00 (quinhentos reais) por dia de descumprimento, sem prejuízo de eventuais
sanções penais, civis e administrativas, caso persista o abate clandestino;
Seja determinado o fechamento do matadouro clandestino, localizado na
............, Município de .........., nesta comarca, expedindo-se mandado
judicial para esse fim, lacrando-se o estabelecimento por Oficiais de Justiça,
lavrando-se o auto respectivo;
Seja oficiado aos órgãos abaixo declinados, a fim de que, por intermédio de suas
redes de fiscalização, comuniquem este Juízo sobre qualquer violação das
determinações retro, com vistas a imposição das multas e sem prejuízo das
medidas penais cabíveis: - Coordenadoria de Inspeção Industrial e Sanitária dos
Produtos de Origem Animal - CISPOA, do Departamento de Produção Animal - DPA, da
Secretaria da Agricultura e Abastecimento - SAA, agência local - Rua
..........., n° ......, na pessoa do Chefe da Fiscalização - , - Serviço de
Inspeção Municipal de ......(........), Avenida ........., ....... (Secretaria
Municipal de Desenvolvimento Rural), na pessoa da médica-veterinária: -
Secretaria Municipal de Saúde e Bem Estar Social, Vigilância Sanitária, na
pessoa do Chefe do Serviço de Fiscalização Sanitária, médico-veterinário.
REQUER-SE, finalmente:
A citação do requerido ............. para, querendo, contestar os termos da
presente ação e acompanhá-la até final sentença, com sua condenação na obrigação
de não fazer consistente em abster-se de realizar qualquer tipo de abate
clandestino de animais (bovinos, suínos, ovinos, caprinos ou outro qualquer
semovente), sob pena de cominação de multa diária no valor e na forma acima
apontados (item 3.1.1.), determinando-se, em caráter definitivo, a interdição do
matadouro clandestino;
Seja o requerido condenado a indenizar os danos causados pelo comércio
clandestino de produtos de origem animal em condições impróprias ao consumo, a
serem apurados em liquidação de sentença (art. 13 da Lei n° 7.347/85), ao ônus
da sucumbência, aos honorários de peritos judiciais e demais cominações de
estilo;
Protesta-se provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos,
notadamente o depoimento pessoal do réu, juntada de novos documentos, oitiva de
testemunhas, laudos periciais, esclarecimentos de peritos em juízo, e tudo o
mais que se fizer necessário ao completo esclarecimento da verdade sobre os
fatos aqui versados;
A concessão da gratuidade processual ao autor, nos termos do artigo 16 da Lei n°
7.347/85;
Dá-se à causa o valor de R$.....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]