Contestação à ação de indenização por transfusão de
sangue infectado, sob alegação de ilegitimidade passiva.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ... VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE
.... - ESTADO DO ....
AUTOS Nº ......
.... autarquia estadual, ex vi da Lei nº 9.663/91, regulamentada pelo Decreto nº
1.421/92, atual denominação da autora Fundação ...., com endereço na Rua .... nº
...., na Comarca de ...., Estado do ...., vem, à presença de Vossa Excelência,
com respeito e urbanidade, por intermédio de sua advogada que adiante assina,
inscrita na OAB/...., sob o nº ...., apresentar
CONTESTAÇÃO
à ação de indenização intentada por ....., brasileiro (a), (estado civil),
profissional da área de ....., portador (a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º
....., residente e domiciliado (a) na Rua ....., n.º ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
1. LEGITIMIDADE
Através da Deliberação nº 119 de 1989, foi aprovado o Regimento Interno e
Estrutura Organizacional do Centro de Hemoterapia do .... da Fundação ....,
atual denominação do Instituto de Saúde do .... autarquia estadual, ex vi da Lei
nº 9.663/91, regulamentada pelo Decreto nº 1.421/92.
O Centro de Hematologia e Hemoterapia do .... - ...., é uma unidade da diretoria
de Vigilância e Pesquisa do Instituto de Saúde do ...., em conformidade com o
Decreto nº 2.927 de 26 de maio de 1988.
Assim, a .... não tem personalidade jurídica própria, respondendo por si o
Instituto de Saúde do ...., conforme Lei nº 9.663 de 16 de junho de 1991,
Decreto nº 1.421/92 e Decreto-lei nº 2.927/88 e Deliberação 119/89.
Desta forma, requer desde já, seja reautuado os presentes Autos, para que conste
como Segundo Requerido o Instituto de Saúde do ...., eis que este é que possui
legitimidade para responder a presente ação.
Cumpre, inicialmente, consignar que a entidade reclamada, quando na qualidade
anterior de fundação pública, tinha por finalidade essencial o apoio operacional
à Secretaria do Estado da Saúde, a que era vinculada, na realidade exercendo
atribuições da própria Secretaria do Estado, conforme dispõe o artigo 29 do
Decreto Estadual nº 2.927, de 26 de maio de 1988, Estatuto da Fundação ...., não
explorando, quaisquer atividades econômicas, por ter objetivos e finalidades
típicas de serviço público, voltadas a saúde pública. Note-se que com a
transformação ocorrida na estrutura jurídica da instituição (autarquização)
foram mantidas as finalidades, para as quais, foi esta entidade instituída,
estando vinculada, ainda, a Secretaria de Estado aludida, portanto, integrante
da administração indireta do Estado do .... (Lei nº 8.485/87) não explorando
quaisquer atividades econômicas por ter objetivos voltados ao serviço público.
Assim, antes, na qualidade de fundação pública, e agora, como autarquia
estadual, a Reclamada tem que respeitar um orçamento anual, somente podendo
realizar despesa para a qual haja a respectiva receita (art. 167 da CF) tem que
obedecer a limites para a fixação da remuneração de seus serviços (art. 169,
CF), não pode conceder aumento ou vantagens na remuneração de seus servidores
sem prévia dotação orçamentária e autorização específica na lei de diretrizes
orçamentárias (art. 169, § único da CF), além de outras regras postas pela Lei
Maior.
Deste modo, detinha como fundação, como detém, a Ré, atualmente, na condição de
autarquia, as prerrogativas e privilégios, inerentes a sua natureza pública, em
especial os constantes no Decreto-lei nº 779/69, tais como, prazo em dobro para
interposição de recursos, quádruplo para contestar (art. 188 C.P.C.), dispensa
depósito recursal (art. 511, § único C.P.C.), recurso ex officio, pagamento de
custas a final (art. 27 C.P.C.), etc., bem como disposições do Código de
Processo Civil, em especial o art. 730 e seguintes.
Por isso, requer-se a esse r. Juízo, que se reconheça, desde já, à Reclamada, os
privilégios e prerrogativas de sua condição pública, em especial as contidas no
Decreto nº 779/69, como também da Lei adjetiva referida.
2. DA ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM
Para que possamos desenvolver um raciocínio lógico, a cerca da ilegitimidade
passiva ad causam, ora alegada, demonstraremos como é feita a coleta de sangue,
a distribuição e a inexistência de qualquer ato que tenha provocado o contágio
do vírus da AIDS, antes, durante ou após o ato cirúrgico, na Requerente:
DO MÉRITO
1. DA COLETA DO SANGUE
A coleta de sangue realizada pela ...., segue as orientações legais em todos os
seus termos, o que se dá da seguinte forma:
A coleta de sangue do doador é efetuado assepticamente, através de punção
venosa, utilizando-se sistema fechado de bolsas plásticas especialmente
destinadas para este fim, descartáveis, apirogênicas e estéreis. É realizada por
pessoas capacitadas, supervisionadas por enfermeiros e/ou médicos.
Imediatamente após a coleta, o sangue é estocado em temperatura entre 1º a 6ºC
positivos, exceto quando destinado à preparação de concentrados de plaquetas,
quando é mantido entre 20º à 24ºC positivos, até o momento da separação das
plaquetas, observado o limite máximo de oito horas, contados da coleta. Ainda, é
observado a quantidade de anticoagulante de acordo com o volume de sangue
coletado.
O doador é devidamente qualificado na ficha de triagem, sendo que a unidade de
sangue e os tubos-pilotos são identificados através dos dados constantes da
ficha de triagem durante o ato da coleta e reconferidos ao término desta.
Os testes imunológicos e sorológicos são realizados nas amostras colhidas nos
tubos-piloto.
Os testes acima, determinam o grupo ABO, do tipo RH (D), do antígeno D fraco (D)
nas Rh (D) negativo, e dos testes para a exclusão das hepatites dos tipos B e C,
doença de Chagas, sífilis, SIDA/AIDS, dos anticorpos anti-HTLV-I/II e anti-HBc.
2. DA DISTRIBUIÇÃO DO SANGUE PELA ....
Toda e qualquer transfusão de produto hemoterápico só será liberado nos
seguintes casos:
1. Para estoque em outro serviço de hemoterapia. Neste caso a liberação só será
feita, mediante solicitação, por escrito, de médico do serviço de hemoterapia ao
qual se destina, com aposição de sua assinatura, nome legível e CRM local; após
verificada as condições necessárias para o correto acondicionamento e transporte
do produto.
2. Para transfusão em pacientes, após a realização das provas imunohemotalógicas
pré-transfusionais, o sangue só pode ser liberado mediante solicitação por
escrito, e/ou prescrição do médico requisitante, com aposição de sua assinatura,
nome legível e número do CRM local. A requisição de transfusão deve conter pelo
menos o nome completo e o número do registro hospitalar do paciente, tipo de
hemocomponente e quantidade solicitada.
A solicitação deve conter ainda a identificação do receptor, o produto
hemoterápico indicado e sua respectiva quantidade, a indicação da transfusão
e/ou dados que permitem avaliação correta do hemoterapeuta.
O serviço transfusional que recebe a unidade de sangue deve registrá-la,
obedecendo os mesmos critérios para sua liberação, só podendo ser utilizada (a
unidade de sangue) no paciente destinado pelo serviço de hemoterapia.
Assim, todo produto hemoterápico liberado pela ...., passa por rigorosos testes
laboratoriais, obrigatórios por lei. Após os testes laboratoriais, é feita a
Requisição de Transfusão - RT, ou seja, a solicitação por escrito do médico, o
sangue, para ser liberado deverá ser anotado no mapa de saída, onde constará o
nome do paciente que receberá a transfusão, o número da RT, ou o nome do local
para onde será enviado, somente no caso de estoque.
Nestes casos, o local receptor deverá ter arquivado o nome dos pacientes, as RTs,
e o número de bolsas utilizadas em cada paciente, lembrando ainda que, somente
bancos de sangue ou grandes Hospitais, que possuem locais próprios para
armazenamento estão habilitados a estocagem do produto.
O Hospital ...., antes Hospital ...., não recebe produtos hemoterápicos para
estocagem, sendo o sangue liberado somente quando solicitado.
Juntamos aos Autos os mapas de saída da .... de ..../..../.... à ..../..../....,
sendo que o período que ora Requerente efetivamente esteve internada foi de ....
à ..../..../...., tendo se submetido a intervenção cirúrgica em ..../..../....
Além destes mapas de saída, juntamos os de ..../..../.... à ..../..../...., data
em que a Requerente afirma ter sido operada.
Ao analisar os documentos acostados, Vossa Excelência poderá comprovar as
informações anteriormente fornecidas. Consta dos mapas de saída, o nome do
paciente que recebeu o sangue, o número da Requisição de Transfusão - RT o
produto hemoterápico indicado, sua respectiva dosagem, a indicação clínica do
procedimento, o nome do Hospital solicitante, ou o local onde o sangue foi
transfundido, ou o nome do local que recebeu o produto para estoque.
Ao mesmo tempo, o Hospital receptor deve manter Registro de Receptores, onde
deverá constar a data da transfusão, o nome do paciente, entre outros dados.
No Registro de Receptores de ..../..../.... à ..../..../...., do então na época
Hospital .... não consta o nome da Requerente, como também não consta dos mapas
de saída da ...., não existindo qualquer possibilidade de ter a Requerente ....
contraído o vírus da AIDS por intermédio de sangue fornecido pela .... ou
utilizado na cirurgia de Histercotomia, porque a Requerente não utilizou produto
hemoterápico, naquela ocasião.
Somente agora há registros de transfusão de Sangue na Requerente, no dia
..../..../...., recebeu duas unidades de Concentrado de Massa - RT .... e no dia
..../..../.... e ..../..../...., recebeu duas unidades de Concentrado de Massa e
quatro de Plasma - RTs .... e ...., respectivamente, sendo seu tipo sangüíneo A-
(negativo) - (RTs em anexo).
Além destes registros, a Vigilância Sanitária recebe cópia do Boletim Mensal de
Transfusão Sangüínea. Solicitamos então a Vigilância Sanitária todos os
registros em nome da Requerente, tendo sido fornecido apenas os registros de
transfusão acima mencionados (docs. anexos).
E mais, a descrição da operação, procedimento obrigatório em todas as cirurgias,
devem conter todos os acontecimentos ocorridos durante a cirurgia, e conforme
documento anexo, em nenhum momento foi utilizado sangue.
O anestesista em sua Folha de Anestesia, caso tivesse sido utilizado sangue,
deveria desenhar as bolsas de sangue no item manutenção. Transcreveremos alguns
dados constantes da folha: paciente: ....; data ..../..../....; estado mental:
lúcida; início .... h; término .... h; tempo de duração ....; CH .... (valor
recebido pelo anestesista pelo procedimento); técnica: anestesia epidoral
lombar.
Além da folha da anestesia, deve o anestesista preencher a folha "prescrições de
sala/anestesia", onde, em caso de utilização de sangue a anotação será feita nos
espaços em branco.
Também na autorização de internação, nº .... não consta a cobrança do módulo
transfusional, cujo o código é nº ...., ou seja, caso tivesse sido utilizado
sangue, contaria da autorização o código acima descrito.
Todas as provas ora juntadas aos Autos, não deixam qualquer dúvida de que a
Requerente não utilizou sangue no período que informou ter sido operada, e no
período que efetivamente foi operada.
3. DO DIREITO QUANTO A ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM
Surge a questão da responsabilidade civil, quando ocorre violação da norma ou
obrigação diante da qual se encontrava o agente.
O artigo 186 do Código Civil Brasileiro, tem a seguinte redação:
"Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar
direito, ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito."
Na sistemática do Código Civil, o ato ilícito é causa geradora de obrigação, e
este pressupõe culpa lato sensu do agente.
Mas para que surja a responsabilidade necessário se faz que exista um ato
praticado, ação ou omissão. Existindo ação ou a omissão, e existindo nexo causal
entre o dano e o ato praticado, existirá a responsabilidade.
No caso sub judice, inexiste ação ou omissão, o ato transfusão de sangue que a
parte alega ter existido, não ocorreu. Em nenhum momento, durante ou após a
cirurgia foi necessária ou foi utilizado qualquer produto hemoterápico.
A ordem jurídica impõe um dever geral e predominante de respeitar cada um a
esfera da atividade jurídica dos outros. A ora contestante trabalha com sangue,
um produto absolutamente necessário para salvar vidas, mas que também pode
tirá-las se contaminado com algum vírus, como o vírus da AIDS.
Exatamente e em função disto, são gastos milhões para se averiguar cada doação
de sangue, cada amostra que é recolhida pela .... É verdade que o homem é
falível, mas em razão do número de vidas que se pode botar em risco, é que são
feitos inúmeros exames, e os cuidados são redobrados.
A Requerente, por infelicidade do destino, contraiu o vírus da AIDS, mas o meio
pelo qual isto ocorreu, não foi uma transfusão de sangue. Qual foi, não nos cabe
questionar, mas podemos afirmar que não foi por meio de utilização de produto
hemoterápico fornecido pela ....
A .... é parte manifestamente ilegítima para responder ação, nos termos do
artigo 267, VI do Código de Processo Civil. Inexiste aqui, uma das principais
condições da ação, a legitimidade da parte.
A jurisprudência enuncia:
"RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO - NATUREZA - REQUISITO. Para haver
responsabilidade objetiva do Poder Público é necessário um comportamento
omissivo, porque sem ele jamais haverá causa; e, na hipótese de dano por
comportamento omissivo, a responsabilidade estatal será subjetiva, por depender
de procedimento doloso ou culposo, e, tal caso, é mister que aparte que postula
a ação carreie para os autos prova da culpa ou do erro."
(TJ-MG - Ac. unân. da 3ª Câm. Cív. publ. no DJ de 27.09.91 - Ap. 82.146/2 -
Capital - Rel. Des. Hugo Bengtsson).
E mais, o artigo 37, § 6º da CF/88, manteve a responsabilidade civil objetiva da
Administração, sob a modalidade do risco administrativo, não chegando ao extremo
do risco integral.
Dispõe o referido artigo:
"As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade,
causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos
casos de dolo ou culpa."
Nota-se, é necessário que o dano tenha sido provocado por seus agentes, isto é o
ato deve ter sido praticado por agente que naquele momento representava o
Estado, e a contrario sensu, não havendo sido praticado qualquer ato pela ora
Recorrente, não há que se falar em responsabilidade, seja esta material ou
moral.
Aliás, a Requerente apenas afirma ter sido utilizado sangue em si durante uma
cirurgia, mas não apresenta qualquer prova desta fato. Alega um fato
constitutivo de direito e em nenhum momento o prova, faz meras e sérias
acusações contra um órgão estatal sério e responsável. A .... por sua vez, por
intermédio do Instituto de Saúde do ...., junta aos Autos todas as provas
necessárias para demonstrar e provar que não foi utilizado qualquer produto
hemoterápico, que não foi feita nenhuma transfusão de sangue na Requerente,
inexistindo culpa e o nexo causal entre a culpa e o dano alegado.
Os Tribunais também entendem desta forma. Colacionamos jurisprudência neste
sentido, para demonstrar:
"RESPONSABILIDADE CIVIL POR PODER PÚBLICO - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO -
EXEGESE. De acordo com o art. 37, § 6º, da CF, as pessoas jurídicas de direito
público respondem pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a
terceiros. Nosso legislador constitucional adota a teoria do risco
administrativo, e por esta não se exige a prova da culpa do agente público. São
suficientes para caracterizar a sua responsabilidade a prova do dano causado
pelo agente público e o nexo causal entre a ação do agente e os danos." (STJ -
Ac. Unân. da 1ª T., publ. em 08.11.93 - Rec. Esp. 38.666-7-SP - Rel. Min. Garcia
Vieira - Advs.: Maria Beatriz de Biagi Barros e Carlos Alberto Freitas).
Por todo o exposto, requer desde já, o julgamento antecipado da lide, para que a
presente ação seja julgada improcedente pela ilegitimidade passiva de parte, em
razão da inexistência de ato que tenha ocasionado dano a Requerente.
4. DO REQUERIMENTO DE DANO MORAL E PATRIMONIAL
Caso sejam ultrapassados as preliminares argüidas, passamos a apresentar
contestação quanto ao mérito.
A responsabilidade civil, não pode ser atribuída a alguém, quando ocorre
violação da norma ou obrigação diante da qual se encontrava o agente.
A responsabilidade civil só será atribuída àquele que por um ato violador, ferir
direito alheio. Praticada a ação ou a omissão, e existindo nexo causal entre o
dano e o ato praticado, existirá a obrigação de se reparar o dano. No caso sub
judice, como já exposto no item referente a ilegitimidade passiva ad causam não
existiu qualquer ação ou omissão ensejadora de responsabilidade civil por parte
da Requerida ...., eis que inexistiu o ato transfusão de sangue alegado pela
parte.
A Requerente foi submetida a intervenção cirúrgica, isto é um fato. Entretanto
não foi necessária, durante ou após a cirurgia, a transfusão de sangue.
Legalmente a .... tem obrigação de analisar todo o "produto" recebido, antes de
distribuí-los nos estabelecimentos hospitalares e postos de distribuição, para
que sejam eliminadas as possibilidades de contaminação.
A .... é parte manifestamente ilegítima para responder a presente ação, nos
termos do artigo 267, VI do Código de Processo Civil. Inexiste aqui, uma das
principais condições da ação, a legitimidade da parte, tendo em vista ter a
Requerente adquirido o vírus da AIDS de outra forma, que não a contaminação por
transfusão sangüínea.
Colacionamos jurisprudência no item ilegitimidade ad causam demonstrando que
para que se estabeleça a responsabilidade por ato praticado por agente, é
necessário que tenha sido praticado o ato que lese uma pessoa, e que exista
entre ato praticado e o dano, exista nexo causal. Não foi praticado qualquer ato
pela ...., não há dano causado, não podendo existir nexo causal.
O artigo 37, § 6º da CF/88, já transcrito acima, manteve a responsabilidade
civil objetiva da Administração, sob a modalidade do risco administrativo, não
chegando ao extremo do risco integral.
Assim, é necessário que o dano tenha sido provocado por seus agentes, isto é o
ato deve ter sido praticado por agente que naquele momento representava o
Estado, e a contrario sensu, não havendo sido praticado qualquer ato pela ora
Recorrente, não há que se falar em responsabilidade, seja esta material ou
moral.
Assim inexistindo ação ou omissão, inexistindo culpa, dano e nexo causal,
inexiste qualquer direito a indenização, seja ela moral ou material, requerendo
desde já, a extinção do processo, com fulcro no artigo 267, VI do CPC.
Entretanto, por obrigação legal, contestaremos também os pedidos referentes ao
dano.
5. DO DANO
A Requerente alega que foi obrigada a vender propriedade para poder custear seus
tratamentos. Entretanto há apenas prova da venda de uma casa, e esta é provada
apenas por uma declaração.
A própria declaração deixa dúvidas. A Sra. .... declara que adquiriu no início
de ...., do Sr. .... uma residência, no valor de R$ .... (....), ora como
sabemos no ano de .... não era esta a moeda em vigência. Provavelmente, a Sra.
.... atribuiu aleatoriamente um valor a residência, se é que realmente existiu
referida transação.
Como se sabe, a transferência da propriedade é provada através de Certidão do
Registro de Imóveis, e não através de uma declaração.
De qualquer forma, o valor requerido é muito superior ao constante da
declaração.
Alega a Requerente que foi necessário desfazer-se de três residências e um
carro, entretanto provas inexistem. Não há qualquer prova nos Autos de que este
patrimônio sequer existiu.
E mais, muito mais.
A Requerente alega que percebia diariamente R$ ...., exercendo a profissão de
...., alegando ainda que parou de exercer a profissão há .... meses, em razão da
doença, requerendo então lucros cessantes referente a este período.
Há mais uma contradição entre o pedido e os fatos alegados. A Requerente requer
indenização por lucros cessantes desde .... de ...., entretanto só teve
conhecimento de sua doença em .... de ...., quando foi atendida pelo Hospital
...., fato este que pudemos comprovar através de documentos que ora acostamos.
E mais, a única prova constante dos Autos é que até .... de .... de ...., a
Requerente percebia mensalmente R$ .... (....), sendo que o salário mínimo da
época era de R$ .... (....), ou seja, a Requerente percebia pouco mais de ....
salário mínimo mensal.
O seu pedido de indenização retroativo a .... meses, nos leva a crer que, após
adoecer, começou a perceber diariamente .... salário mínimo mensal. Isto porque
a .... meses atrás, quando parou de exercer a profissão, era o mês de .... de
....
Ora os fatos foram alegados pela Requerente. Basta retroagir .... meses, para
constatar que a Requerente nunca exerceu a profissão de ...., já que em .... de
.... é a data em que a mesma encerrou seu contrato de trabalho junto ao ....
Se parou de trabalhar a .... meses como alega, quando trabalhou como ....?
De qualquer forma, se supormos que a Requerente trabalhou como ...., não há
qualquer prova nos Autos do valor percebido mensalmente. Afirma ser prestadora
de serviços, como tal deveria ter seu respectivo alvará de funcionamento, e
cópias dos recibos de prestação de serviços. Entretanto não há qualquer prova
nos Autos da existência de alvará para funcionamento ou qualquer cópia de recibo
de atendimento, ou da compra de algum produto utilizado em seu salão.
Isto demonstra que a Requerente não percebia o valor alegado e que sequer
exerceu a profissão de ...., e se exerceu não foi no período alegado, não
percebia o valor alegado, ou então não adoeceu no período alegado. De qualquer
forma, é praticamente impossível uma pessoa que percebe mensalmente um salário
mínimo passar a perceber este valor diariamente, e não possuir nenhuma prova a
este respeito.
Na verdade, o que prova a Requerente com as datas que forneceu, é que desde ....
de .... não exerceu atividade alguma, não trabalhou, assim são indevidos os
lucros cessantes pretendidos.
Equívocos, inverdades, enganos, meras alegações. A indenização visa repor ao
patrimônio daquele que sofreu dano provocado por outrem a seu valor, reparar um
dano não significa enriquecer-se ilicitamente, como pretende a Requerente. O
fato de ter contraído um vírus atualmente fatal, não pode servir de desculpa
para buscar indenização indevida.
Assim, não estão provados os danos emergentes e lucros cessantes requeridos. Por
cautela, caso não seja o entendimento de Vossa Excelência, requer sejam os
lucros cessantes calculados sobre o valor de .... salário mínimo mensal, e os
danos emergentes sobre R$ .... (....).
Quanto aos danos morais alegados, a quantificação requerida exorbita o padrão de
vida da Requerente.
Não estamos colocando preço no valor da saúde e da vida, mas a indenização
pretendida deve ser razoável, compatível com o padrão de vida da Requerente. De
qualquer forma, referido pedido deve também ser julgado improcedente, eis que
para que exista a responsabilidade de pagamento tanto do dano moral, como do
dano material, deve existir um ato, ação ou omissão por parte do Requerido, deve
haver culpa e nexo causal entre o ato e o dano.
Da mesma forma, não há que se falar em pensão, e neste tópico há dois aspectos a
serem contestados. O primeiro, como já provado, a .... não pode ser
responsabilizada por atos da vida particular da Requerente. Isto porque esta
contraiu o vírus da AIDS através de outra forma, que não transfusão sangüínea. A
Requerente em período anterior, durante ou posterior a cirurgia a qual foi
submetida, não utilizou produto hemoterápico. Outro ponto, é que na hipótese
absurda de ignorar-se todas as provas ora acostadas, não há qualquer comprovante
de renda da Requerente, que autorize uma condenação de R$ .... dia. A única
prova existente nos Autos é de que o ano de ...., último período trabalhado pela
Requerente, esta percebia pouco mais de .... salário mínimo mensal, e não
diário, como pretende. De qualquer forma, não auferia mais renda, já que desde
.... de .... não exercia qualquer profissão, não sendo devida qualquer
indenização; em não sendo este o entendimento, requer então seja reduzida a
pensão requerida, como todos os demais pedidos de indenização ao valor de um
salário mínimo mensal.
Desta forma, inexistindo ato, comissivo ou omissivo, não se pode falar em nexo
causal entre ato e dano. Assim improcedem os pedidos de indenização por dano
moral, material, lucros cessantes, ou pensão mensal, como requerido.
DOS PEDIDOS
Diante do exposto, pede e espera a reclamada sejam acolhidas as preliminares
levantadas, sendo julgado extinto o processo sem julgamento de mérito, com
fulcro no artigo 267, VI do Código de Processo Civil. Caso não seja este o
entendimento de Vossa Excelência, requer seja a presente ação julgada totalmente
improcedente, por não estarem provados os fatos ora alegados.
Requer ainda, caso sejam ultrapassadas as preliminares argüidas, sejam as
condenações requeridas, calculadas sobre o valor de .... salário mínimo mensal,
já que esta é a única forma de se calcular o valor da condenação, na hipótese de
existir, tendo em vista a inexistência total de comprovante de renda.
Requer ainda, seja reautuado os Autos, para que conste como segundo Requerido o
Instituto de Saúde do ....
Finalmente requer, seja oficiado o Hospital ...., para que traga aos Autos a
ficha de atendimento da Requerente de .... de ...., tendo em vista ter sido
nesta ocasião que foi detectada a contaminação da mesma.
Protesta-se provar o alegado com a produção de todas as provas em direito
admitidas, sem exceção, ouvida de testemunhas e juntada de novos documentos, e
todas as demais em direito admitidas, dentre outras que no entender de Vossa
Excelência se fizerem necessárias.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]