Contestação à ação anulatória de duplicata cumulada
com perdas e danos, alegando-se a ilegitimidade passiva da instituição
bancária, além de existência de contrato entre as partes.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
AUTOS Nº .....
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., por intermédio de seu advogado (a) e bastante
procurador (a) (procuração em anexo - doc. 01), com escritório profissional sito
à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe
notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa
Excelência apresentar
CONTESTAÇÃO
à ação anulatória de duplicata cumulada com perdas e danos, interposta por
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir
aduzidos.
PRELIMINARMENTE
DA ILEGITIMIDADE AD CAUSAM
A empresa ...., primeira requerida, através de corriqueira operação de desconto
bancário, passou ao peticionante várias duplicatas, entre elas, a indicada pela
requerente.
Em decorrência da falta de pagamento, e com o intuito único e exclusivo de
assegurar direito de regresso, o Banco .... apontou o título para protesto.
O direito brasileiro entende que:
"o portador de duplicata recebida com endosso-caução é parte legítima ativa ou
passiva, conforme o caso, para litigar em função dos direitos e ações que dela
resultarem." (in RT 604/5).
Esse tipo de operação (desconto) é muito empregada pelos estabelecimentos
bancários para garantir, com a cobrança da duplicata, o empréstimo realizado por
meio de contrato de mútuo com as empresas.
O banco, a verdade, não adquire a propriedade da duplicata, pois apenas está
exercitando um mandato, para receber a duplicata e imputar o seu valor por
condição avençada, na amortização ou liquidação da responsabilidade do
endossante, em função do mútuo ou empréstimo.
Tem-se que, quando o endosso implicar uma caução:
"o portador pode exercer todos os direitos emergentes da letra."
Isto é:
"ao receber o título pode praticar todos os atos necessários para a defesa e
conservação dos direitos emergentes da letra, de que está na posse." (Fran
Martins, Títulos de Crédito, p. 171).
Ainda Fran Martins na mesma obra, p. 168, ensina:
"Contudo, há outros que não fazem essa transferência, como o endosso-mandato,
que é aquele em que, por cláusula especial, o portador do título o transfere a
outra pessoa, que passa a exercer todos os direitos emergentes da letra, mas só
pode endossá-la na qualidade de procurador (Lei Uniforme, art. 18). Esse chamado
endosso-mandato ou endosso-procuração é, na realidade um falso endosso pois nem
transmite os direitos emergentes do título nem transfere a propriedade da letra,
mas simplesmente a sua posse."
Desta forma, a instituição bancária que ora contesta a ação é apenas e tão
somente cobradora bancária da duplicata, o que fazia em nome do verdadeiro
titular da mesma, que é a primeira requerida.
Forçoso concluir que o Banco Contestante nunca foi proprietário da cártula, pois
conforme demonstrado, no endosso-mandato não há transmissão de propriedade entre
mandante e mandatário, ou seja, a propriedade da cártula permanece integral e
exclusivamente com o mandante.
Portanto, uma vez vencida e impaga a duplicata, foi a mesma encaminhada à
protesto de forma regular e obrigatória à configuração da mora e para garantia
do direito de regresso, conforme preceito do § 4º, do artigo 13 da Lei nº
5.474/68, sempre no exercício do mandato que lhe fora conferido pelo mandante (e
real detentor do domínio sobre o título), o que restou feito em nome daquele e
não em nome próprio do Banco.
Relevante destacar que o contestante não tem como atestar a origem da transação
que findou na citada duplicata, ou seja, não tem como imiscuir-se nas atividades
comerciais da requerente e da primeira requerida (....).
Assim, como visto acima, o banco requerido na qualidade de portador da
duplicata, ao apontá-la para protesto, apenas exercitou seu direito para
assegurar o regresso conferido pela lei.
Assim preceitua o artigo 653 do Código Civil, verbis:
"Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome,
praticar atos, ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do
mandato."
Coaduna no mesmo pensamento, Silvio Rodrigues, em sua obra "Direito Civil - Dos
Contratos e Declarações Unilaterais de Vontade, pg. 182 e seguintes", vejamos:
"A circunstância de o mandatário receber poderes para agir em nome de outrem, ou
seja, a idéia de representação, mais do que qualquer outra, distingue o contrato
de mandato dos outros contratos, principalmente do de locação de serviços ...
... É a circunstância de que na locação de serviços o locatário atua para o
locador, enquanto no mandato o mandatário age em nome, no lugar e pelo
mandante."
Pelo exposto, resta comprovado que o Banco, não sendo credor direto, da mesma
forma não pode ser demandado no tocante à pretensão da nulidade do título.
Sendo assim, falta legitimidade à instituição financeira, mera portadora por via
de endosso-mandato, para figurar no polo passivo da ação.
A jurisprudência assim tem se manifestado acerca da questão:
"EXECUÇÃO - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM - AÇÃO PROPOSTA CONTRA ENTIDADE
FINANCEIRA CUSTODIANTE DO TÍTULO EXECUTIVO - PESSOA JURÍDICA QUE NÃO CONFUNDE
COM O EMITENTE E DEVEDOR DA CÁRTULA. Ementa: Embargos do devedor. Notas de
venda. Processo execução. Ação ajuizada contra o custodiante. Falta de
legitimidade passiva ad causam. Embargos procedentes. Execução extinta. O
custodiante de título executivo não tem legitimidade para estar no polo passivo
do processo de execução. Ademais, as notas de venda comprovantes das compras de
letras de câmbio custodiadas, não são documentos hábeis para a propositura de
processo de execução. Recurso conhecido e improvido." (TJ-MG - Ap. 32.458, 1ª C.
Cível, Rel. Des. João Martins - j. 12.06.90).
"LEGITIMIDADE ATIVA - EXECUÇÃO DE TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS - ENDOSSO-MANDATO
TRANSFERINDO A POSSE DOS TÍTULOS A BANCO PARA COBRANÇA - FATO QUE NÃO IMPLICA
TRANSFERÊNCIA DE PROPRIEDADE - TÍTULOS NÃO PAGOS DEVOLVIDOS AO CREDOR QUE
PROMOVE A EXECUÇÃO - PARTE LEGÍTIMA - DECRETO 57.595/66, (LEI UNIFORME AO
CHEQUE), art. 23. Tratando-se de endosso-mandato, em que a credora transfere ao
bando a posse dos títulos para que se efetive cobrança, não opera-se a
transferência da propriedade dos mesmos. Restituídos os títulos, por estar
frustrado o recebimento dos seus valores, eles são devolvidos à credora, que é
parte legítima para propor a execução." (Ap. Cível 759/90 0 Jandaia do Sul -
Rel. Ulysses Lopes, j. 25.04.90 in Paraná Judiciário 33/183).
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DUPLICATA. PROTESTO. DESCONTADO O TÍTULO, O
ESTABELECIMENTO BANCÁRIO LEVOU-O A PROTESTO, POR FALTA DE PAGAMENTO. NÃO PODE
SER CONDENADO A PAGAR PERDAS E DANOS, EM VIRTUDE DO PROTESTO DE ACORDO COM O
ART. 13, PARÁGRAFO 4º, DA LEI Nº 5.474/1968, O PORTADOR QUE NÃO TIRAR O PROTESTO
DA DUPLICATA, EM FORMA REGULAR E DENTRO DO PRAZO DE TRINTA DIAS, CONTADOS DA
DATA DO SEU VENCIMENTO, PERDERÁ O DIREITO DE REGRESSO CONTRA OS ENDOSSANTES E
RESPECTIVOS AVALISTAS. O BANCO, AO MANDAR A PROTESTO A DUPLICATA, EXERCE UM
DIREITO (O DE PROTESTAR O TÍTULO), COMO CONDIÇÃO PARA CONSERVAÇÃO DE UM OUTRO (O
DE REGRESSO). NÃO PODE FICAR SUJEITO A INDENIZAR EVENTUAIS PREJUÍZOS SOFRIDOS
PELA ORA AUTORA, COM O PROTESTO, PORQUE NÃO CONSTITUI ATO ILÍCITO O QUE É
PRATICADO NO EXERCÍCIO REGULAR DE UM DIREITO (CCB, ART. 160, I). DISSÍDIO NÃO
DEMONSTRADO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO." (Recurso Extraordinário nº
0097571/89, DJ 24.02.89 pg. 01896, Relator Ministro Neri da Silveira).
Pelas razões acima expostas, resta evidente que há ilegitimidade passiva ad
causam do Banco segundo requerido, devendo o feito ser extinto sem o julgamento
do mérito.
DO MÉRITO
No mérito, fica até mesmo inviabilizada a ampla defesa do Banco ora Contestante,
vez que, não participou de forma direta ou sequer indireta dos negócios que
deram margem à emissão e saque da duplicata contra a requerente, mas apenas e
tão somente foi encarregado da cobrança bancária ocasião em que o título já se
encontrava devidamente preenchido e, consequentemente com valor literal de
dívida líquida e certa.
Contudo é de mister importância ressaltar o relato da própria requerente quando
da inicial, no que tange a prova do real negócio entabulado entre ela
(requerente) e a primeira requerida:
Às fls. .... dos autos, primeiro parágrafo, a autora afirma que:
"... inclusive repassou à primeira ré, .... pagamentos efetuados por
fornecedores, referente à R$ .... pagos em mercadorias referente à .... cotas
(cujos comprovantes de recibo serão juntados oportunamente aos autos, por
encontrar-se na matriz da autora em ...., responsável pelo faturamento de
fornecedores à nível nacional)."
Note-se que foi juntado um único recibo à inicial de sustação de protesto, às
fls. ...., referente a uma fatura de nº ...., no importe de R$ .... Contudo pela
própria narrativa da inicial é de se presumir que o negócio entabulado entre a
requerente e a empresa requerida compreendia importância maior, da qual o
referido recibo faz apenas parte.
Contudo não há, ao menos por hora, nenhum vínculo entre o recibo e o título
sustado, além disto passados alguns meses da propositura da ação principal os
mencionados recibos que justificariam a inexigibilidade do título sustado não
foram juntados aos autos.
Data venia Excelência, apesar do ora peticionante não possuir subsídios no que
tange ao relacionamento estabelecido entre a requerente e a primeira requerida,
é por demais estranho que tais documentos até o momento não tenham surgido a fim
de emprestar um pouco de veracidade as alegações da requerente.
O que se pode concluir, inclusive, de tais alegações é que de fato a requerente
recebeu em nome da primeira requerida valores que posteriormente deveria
repassar-lhe, contudo não comprovou que de fato o fez ao menos integralmente.
Desta forma a requerente inobservou o contido no artigo 333, inciso I, pois
teria que instruir a inicial com documentos que emprestassem ao menos
plausibilidade ao Direito que invoca.
Nesta esteira de raciocínio ensina Nelson Nery Junior, in Código de Processo
Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, atualizado
até 01/08/97, 3ª ed., Editora Revista dos Tribunais, pg. 615, comentando o
artigo 333 do CPC:
"... Segundo a regra estatuída por Paulo, compilada por Justiniano, a prova
incumbe a quem afirma e não a quem nega a existência de um fato (DIG. XXII, 3,
2). O autor precisa demonstrar em juízo a existência do ato ou fato por ele
descrito na inicial como ensejador de seu direito."
No caso a requerente não provou o alegado em sede da inicial, nem mesmo deixou
claro que negócio de fato entabulou com a primeira requerida, pois que:
a) primeiro locou verbalmente espaço em suas dependências para que a primeira
requerida realizasse promoção de natal;
b) depois, ao que parece, lhe foi outorgado o direito de receber, em nome da
primeira requerida, os valores respectivos a venda das cotas promocionais, pois
segundo o que conta recebeu pelo menos R$ .... referente a venda das cotas que
mencionou.
Inobstante os fatos já alegados e a flagrante impossibilidade de permanecer o
segundo requerido figurando na lide, requer a improcedência da pretensão
manifestada na inicial por total falta de prova das alegações despendidas na
peça inaugural.
Por derradeiro, a título de argumentação, caso venha a provar a requerente, a
efetiva ocorrência da hipótese da peça vestibular, não se vislumbra culpa alguma
nos procedimentos do Banco requerido, ao efetivar o desconto da duplicata.
DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer:
a) seja acatada a preliminar argüida de ilegitimidade passiva ad causam,
extinguindo-se o processo sem julgamento do mérito em relação ao ora
peticionante;
b) se ultrapassada a preliminar, o que se admite apenas a título de
argumentação, no mérito deve ser julgada improcedente a presente ação, conforme
argumentos expendidos acima;
c) a produção de todas as provas em direito admitidas, principalmente depoimento
de testemunhas, dos representantes legais tanto da requerente como da primeira
requerida e juntada de novos documentos que se fizerem necessários ao deslinde
da causa;
d) condenação da requerente ao pagamento das custas processuais e honorários
advocatícios, na forma da lei.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]