Agravo regimental contra decisão de desembargador, ao determinar o bloqueio de conta estadual para pagamento de servidor público, o que deveria efetivar-se através de precatório.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DE .....
AGRAVO REGIMENTAL
PROC. ..... (MANDADO DE SEGURANÇA)
IMPETRANTE: ....
IMPETRADO: ....
O ESTADO DE ...., pessoa jurídica de direito público interno, representado
judicialmente pelo Procurador de Estado, abaixo-firmado, com endereço
profissional na sede provisória da Procuradoria Geral do Estado, sita na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe
intimações, vem, mui respeitosamente perante Vossa Excelência, nos autos do
MANDADO DE SEGURANÇA Nº ....., impetrado por ..., já devidamente qualificados,
contra ato atribuído ao Governador do Estado de ..... que teria excluído o nome
das impetrantes da folha de pagamento do Poder Executivo, desde...., interpor,
tempestivamente,
RECURSO DE AGRAVO EM MESA OU REGIMENTAL
em face de
respeitável despacho proferido por Vossa Excelência, às fls. ..... dos autos,
ainda não publicado, que determinou o BLOQUEIO DA CONTA de nº ...., do Banco
....., agência .....,, desta cidade de ..... , do Estado de ....., na ordem de
R$ ....., e a conseqüente liberação da importância em favor dos impetrantes,
pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
DO CABIMENTO E DA TEMPESTIVIDADE DO RECURSO
Dispõe o artigo ....., do Regimento Interno dessa Colenda Corte, que os
despachos dos Desembargadores Relatores do Tribunal de Justiça estão sujeitos a
agravo em mesa ou regimental.
Sendo o respeitável despacho, contra o qual o agravante se insurge, da lavra de
Vossa Excelência, Desembargador - Presidente do Tribunal de Justiça, obviamente
que a decisão proferida é passível de ser questionada via agravo regimental.
Por outro lado, sendo certo que, em decorrência do regramento insculpido no
artigo 188 do Código de Processo Civil, computa-se em dobro (portanto dez dias)
o prazo para recorrer quando a parte for a Fazenda Pública, no caso o Estado de
....., resta patente a tempestividade do presente recurso, porque o prazo
recursal somente começou a fluir a partir de ....., data em que foi concedida
vista ao Estado, e o art .....do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de
.... é claro quando excepciona o prazo recursal de cinco dias nas hipóteses
legalmente previstas.
DO MÉRITO
DOS FATOS
Mediante o venerando Acórdão nº ...., cujas conclusões foram publicadas no
Diário Oficial do Estado de ...., edição de ...., decidiu o Pleno desse Egrégio
Tribunal, à unanimidade de seus membros, conhecer do mandado de segurança
impetrado por ... e, por maioria, concedê-lo, determinando a reinclusão do nome
das impetrantes na folha de pagamento do Poder Executivo, desde .... até a data
em que se efetivassem os seus respectivos Atos de Exoneração, com o pagamento
simultâneo das indenizações devidas, pela adesão das impetrantes ao Programa de
Incentivo à Exoneração Voluntária - PDV.
Encaminhado cópia do referido Acórdão ao Excelentíssimo Senhor Governador do
Estado, através do ofício ....., de ....., para o seu devido cumprimento, deixou
o mesmo de ser cumprido em razão de o Estado de ..... haver interposto embargos
de declaração, protocolado nesse Egrégio Tribunal de Justiça em .....
Rejeitados os embargos opostos, interpôs o Estado de ..... Recurso Especial,
protocolado em .....
Ao referido recurso foi negado seguimento em fundamentado despacho do então
Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça, conforme se lê às fls. .....
dos autos.
Acontece que, usando de má-fé, as impetrantes protocolaram requerimento, a
partir de ...., alegando que o venerando Acórdão nº .... não houvera sido
cumprido, juntando planilhas com memória de cálculos, referentes a supostos
créditos que teriam junto ao Estado de ....., relativos aos salários de...., 13º
salário de 1997, férias proporcionais, retribuição por tempo de serviço e
bonificação de 20% (vinte por cento) sobre a indenização do PDV, que, segundo
ela, não lhe teriam sido pagos.
Sem solicitar qualquer explicação do Estado de .... a respeito dos fatos
narrados nos requerimentos protocolados pelas impetrantes, possibilitando,
assim, o exercício da ampla defesa e do contraditório, princípio constitucional
garantido aos litigantes em processo judicial, por conduto do artigo 5º, LV, da
Constituição Federal, decidiu a Presidência deste Tribunal determinar o bloqueio
da conta nº ....., Banco ....., agência .....,desta cidade de ....., do Estado
de ...., na ordem de R$ ..... a sua liberação, incontinenti, em favor das
impetrantes, consoante se depreende do despacho de fls. .....
DO DIREITO
1. DA ILEGALIDADE DA DECISÃO POR INFRINGÊNCIA AO DISPOSTO NO REGIMENTO INTERNO
DESTE TRIBUNAL
Não há no Regimento Interno do Tribunal de Justiça de ..... qualquer dispositivo
que permita ao seu Presidente, sem ouvir o Plenário, determinar bloqueios de
conta bancária sob o pressuposto de que não teria sido cumprido acórdão.
Ainda que tenha sido efetivado o bloqueio durante as férias coletivas do
Tribunal de Justiça, caberia ao seu Presidente requisitar informações da
autoridade impetrada, a respeito do que fora exposto nos requerimentos
protocolados pela impetrante, a fim de esclarecer a verdade dos fatos e
possibilitar ao Estado de .... o exercício do contraditório e da ampla defesa,
nos moldes assegurados aos litigantes, em processo judicial ou administrativo,
pelo artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal.
2. DA ILEGALIDADE DA DECISÃO POR VIOLAR O DISPOSTO NOS ARTIGOS 1º E § 3º, DA LEI
FEDERAL Nº5.021, DE 09 DE JUNHO DE 1966, QUE DISPÕE SOBRE O PAGAMENTO DE
VENCIMENTOS E VANTAGENS PECUNIÁRIAS ASSEGURADAS, EM SENTENÇA CONCESSIVA DE
MANDADO DE SEGURANÇA, A SERVIDOR PÚBLICO CIVIL
No artigo 1º da Lei nº 5.021/66 está expressamente consignado que o pagamento de
vencimentos e vantagens pecuniárias asseguradas, em sentença concessiva de
mandado de segurança, a servidor público estadual, somente será efetuado em
relação às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da
inicial.
A presente ação mandamental foi protocolada neste Tribunal em data de ....,
consoante se lê no carimbo de protocolo de fls. ....
Entretanto a ordem de bloqueio importou no somatório dos vencimentos
hipoteticamente devidos às impetrantes, servidoras públicas estaduais, no
período de .... a .....
Se a ação somente foi ajuizada em ....., como se pode ordenar o pagamento de
importâncias relativas aos meses de .... a ....?
Evidentemente que a ordem de bloqueio colide frontalmente com o disposto no
artigo 1º da Lei nº 5.021/66.
Se não bastasse essa ilegalidade, a ordem de bloqueio também se contrapõe ao §
3º do artigo 1º, acima referido.
Pelo § 3º do artigo 1º, da Lei nº 5.021/66, a sentença que importar em pagamento
de atrasados, será objeto, nessa parte, de liquidação por cálculos.
3. DA NECESSÁRIA SUBMISSÃO DOS CRÉDITOS DE NATUREZA ALIMENTÍCIA À EXECUÇÃO POR
PRECATÓRIOS
Como facilmente pode ser vislumbrado, o douto Desembargador-Presidente do
Tribunal de Justiça de ..... incidiu em erro ao afirmar que os créditos de
natureza alimentícia não se submetem à execução por precatórios.
Com efeito, o Pretório Excelso, em inúmeras vezes, já pacificou o entendimento
de que mesmo os créditos de natureza alimentícia devem seguir o trâmite da
execução por precatórios, apenas seguindo uma ordem especial, diversa da
modalidade seguida pelos créditos de natureza não-alimentícia.
Neste sentido, a jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal, bem
por isso - e ao versar o tema concernente à execução contra a Fazenda Pública -
orienta-se no sentido de que:
"O regime constitucional de execução por quantia certa contra o Poder Público -
qualquer que seja a natureza do crédito exeqüendo (RTJ 150/337) - impõe a
necessária extração de precatório, cujo pagamento deve observar, em obséquio aos
princípios éticos jurídicos da moralidade, da impessoalidade e da igualdade, a
regra fundamental que outorga a preferência apenas a quem dispuser de
precedência cronológica (prior in tempore, potior in jure).
A exigência constitucional pertinente à expedição de precatório - com a
conseqüente - com a conseqüente obrigação imposta ao Estado de estrita
observância da ordem cronológica de apresentação desse instrumento de requisição
judicial de pagamento - tem por finalidade (a) assegurar a igualdade entre os
credores e proclamar a inafastabilidade do dever estatal de solver os débitos
judicialmente reconhecidos (RTJ 108/463), (b) impedir favorecimentos pessoais
indevidos e (c) frustrar tratamentos discriminatórios, evitando in-justas
perseguições ditadas por razões de caráter político-administrativo.
A Constituição da República não quer apenas que a entidade estatal pague os seus
débitos judiciais. Mais do que isso, a Lei Fundamental exige que o Poder
Público, ao solver a sua obrigação, respeite a ordem de precedência cronológica
em que se situam os credores do Estado. A norma inscrita no art. 33 do ADCT/88,
embora preordenada a disciplinar, de modo favorável ao Poder Público, o
pagamento do débitos estatais oriundos de condenação judicial, não alcança as
obrigações cujo pagamento - afetado por injusta preterição da ordem de
precedência cronológica do respectivo precatório - veio a ser postergado
ilicitamente pela pessoa jurídica de direito público, em detrimento de credor
mais antigo.
A efetivação extraordinária do ato de seqüestro judicial da quantia necessária à
satisfação do débito (CF, art. 100, § 2º), motivada pela quebra da ordem de
precedência, impede que o precatório concernente ao credor mais antigo,
injustamente preterido, seja qualificado como pendente de pagamento para efeito
de aplicação da norma inscrita no art. 33 do ADCT/88.
O pagamento antecipado de credor mais recente, em detrimento daquele que dispõe
de precedência cronológica, não se legitima em face da Constituição, pois
representa comportamento estatal infringente da ordem de prioridade temporal
assegurada a todos os credores do Estado, de maneira objetiva e impessoal, pela
Carta Política.
O legislador constituinte, ao editar a norma inscrita no art. 100 da Carta
Federal, teve por objetivo evitar a escolha de credores pelo Poder Público.
Eventual vantagem concedida ao erário público por credor mais recente não
justifica, para efeito de pagamento antecipado de seu crédito, a quebra da ordem
constitucional de precedência cronológica.
O pagamento antecipado que daí resulte - exata-mente por caracterizar escolha
ilegítima de credor - transgride o postulado constitucional que tutela a
prioridade cronológica na satisfação dos débitos estatais e autoriza, em
conseqüência - sem prejuízo de outros efeitos de natureza jurídica e de caráter
político-administrativo -, a efetivação do ato de seqüestro." (RE 132.031-SP,
Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Dessume se, com isso, que a decisão vergastada feriu a disciplina
constitucional, devendo, por esta razão, ser reformada.
4. DA INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO CONSTITUCIONAL DO SEQÜESTRO DE VERBAS PÚBLICAS NA
HIPÓTESE DOS AUTOS
O seqüestro das verbas públicas determinado pelo magistrado-presidente é
totalmente ilegítima, ferindo a disciplina constitucional reservada aos
Precatórios.
De fato, a única permissão para o seqüestro, visando a garantia da satisfação de
créditos contra fazenda pública é somente - e tão somente - na hipótese de
preterimento do direito de preferência, na forma do § 2o, do art. 100, da CF/88,
com a redação dada pela Emenda Constitucional 30, de 13 de setembro de 2000:
"§2o. As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados
diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir
a decisão exeqüenda determinar o pagamento segundo as possibilidades do
depósito, e autorizar, a requerimento do credor, e exclusivamente para o caso de
preterimento de seu direito de precedência, o seqüestro da quantia necessária à
satisfação do débito".
Percebe-se, portanto, facilmente, que somente poderá ser autorizado o seqüestro
da quantia necessária à satisfação do débito, exclusivamente para o caso de
preterimento do direito do credor de precedência. Qualquer hipótese de seqüestro
de verbas públicas é ilegítimo, flagrantemente contrário à determinação do
preceito constitucional.
5. DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO CONTRADITÓRIO
Cumpre assinalar que a medida judicial ora impugnada foi tomada sem a necessária
ouvida do principal atingido pelas suas conseqüências, vale dizer, pelo Estado
de .....
De fato, ante a suposta determinação do bloqueio das contas estaduais (fundada -
frise-se - no inconstitucional argumento de que os créditos de natureza
alimentícia não se sujeitam ao precatório), era evidente a obrigatoriedade da
oitiva da parte atingida por esta decisão, in casu, do Estado de ...., através
de sua Procuradoria Geral, para que assim formalizasse sua posição.
Dessa forma, evitaria se a desagradável (e inconstitucional) surpresa
caracterizada pela prolação de uma decisão judicial, sem que nada pudesse fazer
o Poder estatal, maculando qualquer ideal de segurança jurídica, tal qual
ocorreu no caso em questão, em que o juiz deter-minou o seqüestro e o
levantamento de verbas públicas, em nítido prejuízo ao direito fundamental
processual do ente público.
Não é despiciendo lembrar que, mesmo nos casos em que pode agir de ofício, deve
o juiz, em nome do princípio constitucional do contraditório, ouvir as partes
que serão afetadas com a decisão, vez que o contraditório, em sua atual feição,
não mais se reduz àquela tradicional fórmula da "necessária informação" e
"eventual participação". De fato, hoje, o princípio é, além disso, uma imposição
contra "surpresas" dentro do processo.
Assim, "o conteúdo mínimo do princípio do contraditório não se esgota na ciência
bilateral dos atos do processo e na possibilidade de contraditá-los, mas faz
também depender a própria formação dos provimentos judiciais da efetiva
participação das partes. Por isso, para que seja atendido esse mínimo, insta a
que cada uma das partes conheça as razões e argumentações expendidas pela outra,
assim como os motivos e fundamentos que conduziram o órgão ju-dicial a tomar
determinada decisão, possibilitando-se sua manifestação a respeito em tempo
adequado (seja mediante requerimentos, recursos, contraditas etc.). Também se
revela imprescindível abrir-se a cada uma das partes a possibilidade de
participar do juízo de fato, tanto na indicação da prova quanto na sua formação,
fator este último importante mesmo naquela determinada de ofício pelo órgão
judicial. O mesmo se diga no concernente à formação do juízo de direito, nada
obstante decorra dos poderes de ofício do órgão judicial ou por imposição da
regra iura novit curia, pois a parte não pode ser surpreendida por um novo
enfoque jurídico de caráter essencial tomado como fundamento da decisão, sem
ouvida dos contraditores" (OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Garantia do
Contraditório. In: Garantias Constitucionais do Processo Civil. Ed. Revista dos
Tribunais, São Paulo, 1999, p. 144) - grifos nossos.
A par disso, como já decidiu o próprio Supremo Tribunal Federal, na ADIn 1662/Sp,
"não se concebe no direito constitucional brasileiro a efetivação de seqüestro
ouvindo-se exclusivamente o Ministério Público, sem observância do
contraditório".
Conclui-se, em face do que foi exposto, que a decisão deve ser imediatamente
suspensa, porquanto violadora ao art. 100, da CF/88, e prolatada sem a
necessária ouvida do Estado de .....
DOS PEDIDOS
Diante do exposto, vem o agravante requerer de Vossa Excelência que se digne
reconsiderar o seu respeitável despacho que determinou o bloqueio da conta nº
....., Banco ....., Agência ..... ,e sua liberação às impetrantes ou, no caso de
a importância ter sido sacada, determinar a sua devolução, acatando, assim, a
relevante fundamentação sustentada de ilegalidade da decisão.
Requer, ainda, caso Vossa Excelência mantenha a decisão consubstanciada no
respeitável despacho objurgado, que seja remetido o presente Agravo em Mesa ou
Regimental ao Plenário dessa Colenda Corte de Justiça, nos moldes previstos no
artigo .... previsto no Regimento Interno do Tribunal de Justiça de ...., a fim
de que seja processado e julgado o presente recurso, esperando o seu deferimento
no sentido de tornar sem efeito o despacho de fls. ..... e, como conseqüência,
determinar a devolução pela impetrante do dinheiro que, por ventura, tiver sido
sacado indevidamente dos cofres públicos, por entender o Estado de .... ser esse
um ato de altaneira JUSTIÇA.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]