Ação declaratória, pleiteando-se a nulidade de cláusula contratual que prevê a devolução de valores pagos, ante desistência de consórcio, sem a devida correção monetária.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL CUMULADA COM RESTITUIÇÃO DE
CRÉDITO
em face de
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir
aduzidos.
DOS FATOS
Através dos inclusos documentos constituídos da proposta de Adesão ao contrato
Padrão sob o nº ...., a Suplicante ingressou como consorciada no grupo ....,
cota .... em .... de .... de ...., que prevê a entrega de objeto do consórcio,
um veículo, marca ...., modelo ...., tipo ...., sob administração da ....,
conforme o contrato formulário de adesão.
Durante alguns meses a Requerente efetuou os pagamentos concernentes as parcelas
do grupo em que estava sem nenhum problema.
Acontece, porém, que os valores das parcelas a partir do mês de setembro de
1990, aumentaram astronomicamente, impossibilitando a Suplicante de continuar
efetuando os pagamentos das cotas.
Até a presente data, a Requerente efetuou pagamento de .... cotas do grupo, mais
os reajustes de caixa, totalizando a importância supra de R$ ...., estando
amortizado até o presente momento o equivalente a ....
Entretanto, em face da desproporção entre os aumentos das parcelas e os seus
rendimentos, a Autora, não possuindo mais condições de manter em dia os
pagamentos do seu grupo, foi forçada a comunicar à Suplicada a sua desistência
do grupo em virtude dos elevados aumentos dos valores das cotas, que seriam
pagas mensalmente.
A referida desproporção supra aludida pode facilmente ser comprovada através do
extrato fornecido pela suplicada.
A Requerente após sua desistência do grupo solicitou a devolução das cotas e os
reajustes de caixa pagos ao preço do dia ou equivalente ao percentual pago, sob
pena de ficar o requerido sujeito às medidas judiciais.
Em resposta o Réu negou-se efetuar a dita devolução atualizada, pois se a
fizesse infringiria a cláusula 46º do contrato formulário de adesão firmado
entre as partes contratantes.
A respeito, reza a cláusula 46º do contrato formulário de adesão:
O participante que desistir do consórcio, ou que dele for excluído, inclusive
seus herdeiros ou sucessores, receberão de volta as quantias já pagas, sem juros
ou correção monetária, dentro de 30 (trinta) dias do encerramento das operações
do grupo, deduzida a taxa de administração e acrescida do saldo remanescente no
fundo de reserva, proporcionalmente às contribuições recolhidas.
No caso em tela, trata-se de consorciado não contemplado e o grupo a que
pertence já encerrou a sua operação.
A negativa da devolução devidamente atualizada do total amortizado é que obrigou
a Suplicante a procurar abrigo no Poder Judiciário:
DO DIREITO
Diz o artigo 122 do Código Civil Brasileiro vigente:
"São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública
ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de
todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das
partes."
Por outro lado, é inegável que a condição imposta pela cláusula 46º do contrato
formulário de adesão o foi com intuito puramente potestativo, impedindo a
vontade séria de se obrigar por parte do Autor.
Além do mais, por este motivo, é impossível admitir que alguém se obrigue, em
contrato de adesão, a pagar quantias mensais para adquirir cotas de capital, e
depois fique sujeito a recebê-las, no futuro, sem juros e correção monetária,
neste país onde a correção monetária, na prática, passou a ser norma ou padrão
monetário utilizado em todo tipo de negócio jurídico.
Outrossim, pelo fato de tratar-se de contrato formulário de adesão, a
interpretação do referido contrato deve ser feita a favor dos aderentes, qual
seja, dos Autores, que não puderam ler ou discutir as cláusulas do contrato
formulário de adesão.
O contrato é formulário de adesão, e foi previamente aprovado pela Secretaria da
Receita Federal e o sistema de consórcio foi regulamentado pelo Decreto nº
70.951 de 9 de agosto de 1972.
A Portaria nº 330 de 23 de setembro de 1987, do Ministério da Fazenda, que
atualmente regulamenta as atividades consorciais, estabelece em seu artigo 5:
"O participante que desistir do consórcio, ou que dele for excluído, inclusive
seus herdeiros ou sucessores, receberão de volta as quantias já pagas, dentro de
30 (trinta) dias do encerramento das operações do grupo, deduzidas a taxa de
administração, e acrescidas do saldo remanescente no fundo de reserva,
proporcional às contribuições recolhidas."
Já na cláusula 46º do referido contrato formulário de adesão estipulou-se que: O
participante que desistir do consórcio ou que dele for excluído, inclusive seus
herdeiros ou sucessores, receberão de volta as quantias já pagas, sem juros ou
correção monetária, dentro de 30 (trinta) dias do encerramento das operações do
grupo, deduzidas as taxas de administração.
Desta forma, percebe-se que a cláusula 46º foi criação exclusiva do Requerido,
visando, com isso, o enriquecimento indevido e transformando a Receita Federal
em seu bode expiatório.
Por outro lado, depreende-se que o Requerido administrador de consórcio obtém
lucro através da taxa de administração ou mesmo com aplicação dos recursos no
mercado financeiro. Esta com previsão expressa na cumulação dos itens 41, 31 e
33 da Portaria - MF/23 de setembro de 1987. E os consorciados ativos também
obtém vantagens com a aplicação do fundo de reserva ou dos recursos do grupo no
mercado aberto.
O consórcio retém do consorciado um valor pecuniário por certo período e,
desistindo o consorciado, a quantia pecuniária é defasada pela inflação
astronômica, que girava em torno de 15% ao mês, caracterizando um locupletamento
indevido e sem causa por parte da administradora, que usou a importância
pecuniária paga pelo Suplicante, para a aquisição dos bens do consórcio e, além
do mais, com o fundo de reserva que todos pagam, faz aplicação no mercado
financeiro, percebendo de tais aplicações a correção monetária. Este rendimento
não é repassado aos consorciados.
Vale a pena ressaltar que as quotas dos desistentes são revendidas a terceiros
que continuam pagando as cotas normalmente e as que já foram pagas pelos
desistentes serão pagas no final do plano por quem substituir o desistente, pelo
valor da última quota que automaticamente está corrigida diante do valor
atualizado do bem. Tal fato demonstra que não ocorrerá nenhum prejuízo à
administradora.
Há que se salientar, ainda, que no contrato formulário de adesão dos
consorciados, não se lê em nenhuma de suas cláusulas, linha ou entrelinhas,
qualquer cláusula penal, fato este, só vem a favorecer o direito do consorciado
em receber os valores pagos, descontando a taxa de administração, sem juros e
correção monetária.
Acerca dos abusos existentes dos contratos formulário de adesão, mister é
lembrar a lição de ARNOLDO WALD In Estudo e Pareceres do Direito Comercial, Ed.
RT. 1970:
a) "As peculiaridades do contrato de adesão ensejam uma desigualdade entre os
contratantes, que cabe ao Poder Judiciário, sempre que possível, interpretando o
contrato em favor do aderente nas cláusulas ambíguas e impedindo as distorções
abusivas, oriundas de condições impostas ao aderente."
b) "Assim, em vez de admitir a presumida igualdade das partes contratantes, é
preciso, em relação ao contrato de adesão, atender a situação peculiar do
aderente, ao qual não é oferecido o ensejo de discutir as cláusulas contratuais,
devendo, pois o mesmo contar com a proteção especial do legislador e do Poder
Judiciário.
A doutrina do eminente Magistrado ARNALDO RIZZARDO" (In Contrato de Consórcio,
Seleções Jurídicas ADV/COAD, Março de 1988, p. 07) bem dimensiona o caso em
tela: RT. 675/192 e 670/97.
"Em suma, de uma parte a administradora impõe cláusula autorizando-a a fazer a
devolução só depois de certo tempo, sem qualquer autorização, de outra, ela
efetua a revenda pelo preço faltante e atualizado.
Como ressalta, as partes não são consideradas em igualdade de condições.
Ademais, a forma de agir da patrocinadora, se contrato com tais cláusulas, cria
uma situação totalmente injusta, eis que impõe estipulação favorável unicamente
a ela, infringindo o artigo 115 do Código Civil. Retendo o valor por ela
determinado período, e devolvendo de modo incompleto, pois defasado pela
inflação, está se locupletando indevidamente ou sem causa."
Assim, bem claro, está a potestavidade da cláusula em questão, sendo evidente a
sua nulidade.
Na verdade a atualização do valor pago não importa ônus ao Requerido visto que
objetiva tão somente corrigir os valores pagos;
DOS PEDIDOS
Diante do exposto, decalcado nos dispositivos legais mencionados, bem como nos
demais aplicáveis na espécie a Suplicante REQUER de Vossa Excelência:
a) Que seja designado dia e hora para realização da audiência de instrução e
julgamento;
b) Feita a designação supra, deverá o suplicado ser citado para nela comparecer,
querendo, "ex vi" do disposto no artigo 278 do Código de Processo Civil
Brasileiro, podendo oferecer, na mesma, defesa escrita ou oral e produzir as
provas que tiver, naturalmente que se dentre elas houver depoimento de
testemunhas, o rol desta deverá ser depositada em Cartório 48 horas antes do dia
designado para a audiência de instrução e julgamento;
c) Pede que a citação seja feita por carta do Sr. escrivão, nos termos do artigo
222 do Código de Processo Civil Brasileiro;
d) Seja declarada a nulidade da cláusula nº 46 (quarenta e seis);
e) Seja condenado o Réu ao pagamento de 04 (quatro) quotas e mais os reajustes
de caixa ao preço do dia correspondente a .... % do veículo ....
f) Não sendo este o entendimento de Vossa Excelência, concernente ao pedido
supra, seja condenado o Suplicado na devolução das quantias pagas acrescidas de
juros moratório à taxa legal, desde da data dos pagamentos e correção monetária,
contadas das datas dos pagamentos efetuados;
g) Prova-se o alegado por todos os meios em direito admitidos, notadamente pela
documentação inclusa e depoimento pessoal do Requerido sob pena de confesso, bem
como pelos demais meios que necessários e admitidos no curso da demanda,
inclusive prova pericial.
h) Seja condenado o Suplicado ao pagamento integral das custas processuais e
honorários advocatícios, na base usual de 20% (vinte por cento) do valor da
condenação, e nas demais cominações legais;
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]