Ação civil pública para obstar atividade ilícita de curso perante o consumidor.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
– (PROCESSO Nº .....)
O Ministério Público do Estado de ....., fundamentado no artigo 129, III, da
Constituição; artigo 94, V, da Constituição Estadual; artigo 25, inciso IV, da
Lei Orgânica Federal (Lei 8.625/93); artigo 103, inciso VIII, da Lei Orgânica
Estadual (Lei Complementar 734/93); 1º, inciso II, § 1º, da Lei de Interesses
Difusos (Lei 7.347/85), e 82, inciso I da Lei no 8.078/90, com base nos autos do
Inquérito Civil nº 02/2001, que se processou perante a 3a Promotoria de Justiça
– Defesa do Consumidor -, vem à presença de Vossa Excelência, propor
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR
em face de
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir
aduzidos.
DOS FATOS
Chegou ao conhecimento do Ministério Público, através de representações
encaminhadas por consumidores, que a ré estaria empregando, em suas atividades
de fornecimento de serviços de curso de idiomas, contrato de adesão com
cláusulas abusivas e em total desconformidade com os preceitos do Código de
Defesa do Consumidor (Lei no 8.078/90).
Em razão disso, foi instaurado, através da portaria de fls. ...., inquérito
civil, com intuito de apurar os fatos. Tal procedimento recebeu o número
....junto à .... Promotoria de Justiça de .....
Por inúmeras vezes foi tentado contato com a investigada, de forma a evitar a
propositura da ação, mas a investigada não recebia o funcionário da Promotoria
de Justiça em sua sede e sempre apresentava conduta evasiva, de forma a
dificultar, como se observa no procedimento, a identificação do responsável
legal pela empresa (– fls. .... – ofício que só foi recebido após consulta
demorada por telefone).
Na única vez que compareceu na Promotoria de Justiça, a empresa designou pessoa
sem poder jurídico algum para travar negociação com a Promotoria de Justiça.
Ademais, apresentou-se a ‘gerente’ acompanhada de advogada (fls. .....), mas se
negou, terminantemente, em identificar quem seria o ‘franqueado’.
A escola de .... não tem registro na JUCESP. Não está inscrita na Receita
Estadual. NÃO É FILIAL da escola de idiomas ... – informação da própria
franqueadora a fls. .... – numeração ao pé da página, em decorrência de distrato
por descumprimento de inúmeras condições.
Esta falta de autorização por parte da matriz para o funcionamento da filial de
..... não é objeto desta ação, mas apenas mais uma mera informação que demonstra
a pouca lisura no trato do direito por parte da empresa investigada nesta
cidade. Em resumo, no momento, interessa informar que a investigada – ora ré –
não teve interesse em compor a irregularidade constatada.
Em síntese, avulta-se a necessidade da ação por parte do Ministério Público,
pois, nada mais nada menos que 1746 lides foram criadas pela instituição em
menos de 02 anos. Não é muito recordar que estão sendo omitidas as existentes
após o início do mês de ....
Outrossim, com a presente ação civil pública, estará sendo possível ao
judiciário, com apenas uma ação, evitar milhares de ações pulverizadas e
repetitivas que poderiam, inutilmente, abarrotar o sistema judiciário.
Estes argumentos evidenciam a legitimidade do Ministério Público.
Ainda mais abusiva que as próprias cláusulas do contrato é a forma criminosa de
cobrança encontrada pela empresa . A fls. ....se verifica a existência de
cobrança por meio de um COMUNICADO DO SERASA, o que, com toda obviedade, torna o
consumidor propenso a aceitar qualquer negócio para evitar tal comunicação e
anotação.
No entanto, em contato direto com o próprio SERASA – fls. 59 -, foi obtida a
informação de que aquele COMUNICADO é FALSO, o que já é objeto de inquérito
policial para apuração do âmbito criminal, mas que, mais uma vez, demonstra a
pouca afeição da empresa ré no trato com o sistema legal.
Em razão de já estar sendo apurada em campo próprio – direito penal –
deixar-se-á de tecer maiores considerações a respeito destes fatos.
A maior parte dos casos constantes nas informações prestadas pelo PROCON diz
respeito ao interesse, por parte do consumidor, em cancelar sua matrícula,
encontrando óbices impostos pela ré, em razão de multa e demais cominações ou
obrigações estipuladas em contrato.
A análise, ainda que superficial nas cláusulas do contrato de adesão – fls.
...., no verso – , demonstra a evidente abusividade deste e a colocação, em
risco, da segurança jurídica dos consumidores que, desavisadamente, possam
entabular negócio com a referida empresa.
Importante recordar que essas cláusulas gerais têm os atributos do
preestabelecimento, unilateralidade da estipulação, uniformidade, rigidez e
abstração. São estipulações feitas por um dos futuros contratantes, denominado
predisponente ou estipulante (unilateralidade), antes, portanto, do início das
tratativas contratuais (preestabelecimento), que servirão para reger os negócios
do estipulante relativos àquela área negocial (uniformidade), sendo que o
intento do predisponente é no sentido de que o futuro aderente aceite os termos
das cláusulas sem discutir seu conteúdo e alcance (rigidez), e, ainda, que essa
forma de contratação possa atingir indistintamente o contratante que quiser
aderir às cláusulas gerais (abstração), vale dizer, que possa haver circulação
em massa desses formulários onde estão contidas as cláusulas gerais para que as
contratações se dêem em massa.
DO DIREITO
Estas formas de imposição de cláusulas contratuais são nulas e bem assim obriga
o sistema jurídico do Código de Defesa do Consumidor - Lei 8.078/90.
O C.D.C. adotou um sistema próprio de enumeração e de proteção contra as
cláusulas abusivas. Conferiu-lhes o regime da ‘nulidade de pleno direito’, não
estabelecendo graus de invalidade entre elas, tampouco as tratando como causas
de ineficácia da relação jurídica de consumo.
(...)
No regime jurídico do C.D.C. as cláusulas abusivas são nulas de pleno direito
porque contrariam a ordem pública de proteção ao consumidor. Isso quer dizer que
as nulidades podem ser reconhecidas a qualquer tempo e grau de jurisdição,
devendo o juiz ou tribunal pronunciá-las ex officio, porque normas de ordem
pública insuscetíveis de preclusão.
Nesses termos, com a aplicação do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor,
conjugado com aplicação analógica do artigo 9o do Decreto no 22.626/33 (“Lei de
Usura”) _ , tem a jurisprudência evoluído no sentido de admitir, tão somente, a
incidência do percentual de 10% a título de multa pelo cancelamento de contratos
_ .
“O Código de Defesa do Consumidor não autoriza a cláusula de decaimento
estipulando a perda integral ou quase integral das prestações pagas. Mas, a
nulidade de tal cláusula não impede o magistrado de aplicar a regra do art. 924
do Código Civil e autorizar, de acordo cm as circunstâncias do caso, uma
retenção que, no caso, deve ser de 10% (dez por cento)” (Superior Tribunal de
Justiça – Recurso Especial no 149.399/DF).
“A jurisprudência, acolhendo lição doutrinária, na exegese do artigo 924 do
Código Civil, delineia entendimento no sentido de que, cumprida em parte a
obrigação, em caso de inexecução da restante, não pode receber a pena total,
porque isso importaria em locupletar-se à custa alheia, recebendo ao mesmo
tempo, parte da coisa e o total da indenização na qual está incluída justamente
aquela já recebida, sendo certo que a cláusula penal corresponde aos prejuízos
do inadimplemento integral da obrigação” (Superior Tribunal de Justiça – Recurso
Especial no 39.466-0-RJ).
Em linhas gerais, importa lembrar que “Um dos direitos básicos do consumidor é o
de proteção contra cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos ou
serviços (relações de consumo), conforme disposto no artigo 6o, no IV, do
Código. O CDC enumerou uma série de cláusulas consideradas abusivas, dando-lhes
o regime da nulidade de pleno direito (art. 51). Esse rol não é exaustivo,
podendo o juiz, diante das circunstâncias do caso concreto, entender ser abusiva
e portanto, nula, determinada cláusula contratual. Está para tanto autorizado
pelo caput do art. 51 do CDC, que diz serem nulas, ‘entre outras’, as cláusulas
que menciona”.
Ademais, o inc. XV do referido artigo contém norma de encerramento, que dá
possibilidade ao juiz de considerar abusiva a cláusula que esteja em desacordo
com o sistema de proteção ao consumidor. Em resumo, os casos de cláusulas
abusivas são enunciados pelo art. 51 do CDC em numerus apertus e não em numerus
clausus.
O artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor estabelece, em seu artigo 51, que
são nulas de pleno direito cláusulas que:
“IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a
eqüidade;
XV – estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;
§ 1º – Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a
natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias
peculiares ao caso”.
São consideradas abusivas as condutas, ainda, que estejam em desacordo com o
artigo 39 do mesmo codex.
Esta fundamentação permite concluir pela existência do fumus boni juris (atos
ilícitos mencionados e legislação pertinente), bem como pelo periculum in mora.
Este último requisito está demonstrado pela dificuldade que teve o Ministério
Público e demais órgãos (Receita Estadual, Delegacia de Polícia, JUCESP) em
identificar o responsável pela empresa. Outrossim, a resposta dada pela advogada
da empresa, em somatória à informação dada por ela a fls. 91, item ‘5’, letra
‘b’ e ‘c’, demonstra a ausência de vontade em identificar os responsáveis legais
pela empresa.
DOS PEDIDOS:
1.EM LIMINAR:
1.1. Seja desconsiderada a personalidade jurídica da empresa ré.
1.2. Seja determinado o bloqueio dos bens e da movimentação das contas bancárias
da pessoa física, .....oficiando-se, para tanto, aos órgãos:
- DETRAN.
- Cartório de Registro de Imóveis desta cidade.
- TODOS os bancos desta cidade.
3. Ainda por cautela, seja determinado o bloqueio dos bens da empresa
investigada, bem como o bloqueio da movimentação das contas bancárias,
oficiando-se aos BANCOS desta cidade para este fim.
Ainda em sede de medida liminar, requer-se:
4. QUANTO AOS CONTRATOS JÁ ASSINADOS E COM CUMPRIMENTO EM CURSO seja determinado
à ré que doravante se abstenha de utilizar ou aplicar as cláusulas ora
impugnadas como abusivas, quais sejam:
a) as cláusulas que impõem cobrança de multa superior a 2% (dois por cento) pelo
atraso no pagamento de mensalidades, em infração ao disposto no artigo 52, § 1o
do Código de Defesa do Consumidor e artigo 1.062 do Código Civil;
b) as cláusulas que impliquem em pagamento de multa incidente sobre o valor
total do contrato, em infração ao disposto no artigo 39, inciso V do Código de
Defesa do Consumidor, passando a incidir apenas em 10 % (dez porcento) sobre as
prestações já pagas pelo consumidor desistente;
c) seja suspensa a eficácia de todas as cláusulas do contrato oferecido, à
exceção daquelas de números ‘...... inócuas para o consumidor.
5. QUANTO AOS CONTRATOS FUTUROS seja determinado à ré que doravante se abstenha
de inserir em contratos futuros as cláusulas .....
6. Seja determinado à ré que doravante se abstenha de inserir no Serviço de
Proteção ao Crédito os nomes dos consumidores que deixarem de efetuar o
pagamento relativo a quaisquer das cobranças abusivas ora tratadas, devendo
tomar todas as providências necessárias para que, no prazo de 15 (quinze) dias,
sejam retirados do mesmo Serviço os nomes de alunos que já se encontram ali
noticiados.
7. Para plena obediência às determinações liminares e sem prejuízo das penas do
crime de desobediência (art. 330 do Código Penal), seja determinada a cominação
de multa de ..... por contrato firmado, a ser recolhida ao fundo de que trata o
art. 13 da Lei no 7.347/85, devida por qualquer ato praticado em desacordo à
ordem judicial, a concessão de medida liminar, sem justificação prévia, para
determinar à ré as obrigações acima.
DOS PEDIDOS PRINCIPAIS
Assim, requer-se:
I. Em caráter principal, seja julgado procedente o pedido, para o fim de
reconhecendo-se a abusividade das estipulações contratuais questionadas,
declarar-se sua nulidade e, de conseqüência, condenar-se a ré:
II. Quanto aos contratos já firmados e em curso:
> - condenação em obrigação de não fazer consistente em abster-se de aplicar
cláusulas que impliquem no pagamento de multa superior a 2% (dois por cento) por
atraso no pagamento de mensalidades pelos consumidores, nos termos dos artigos
52, § 1o da Lei no 8.078/90 e 1.062 do Código Civil;
> - condenação em obrigação de não fazer consistente em abster-se de aplicar
cláusulas em impliquem no pagamento de multa incidente sobre o valor total do
contrato pelo cancelamento desse.
> - condenação em obrigação de não fazer consistente em abster-se de aplicar
cláusulas que impliquem em reajuste unilateral do valor do contrato pela ré;
> - condenação em obrigação de não restringir o direito de desistência dos
consumidores, após a celebração do contrato, devendo restituir aos mesmos
eventuais parcelas adiantadas ou pretéritas (nas quais não tenha havido efetiva
prestação de serviços), descontados apenas os gastos com materiais não
devolvidos, sob pena de incidir multa diária no valor de dez salários mínimos;
III. Quanto aos contratos futuros:
> - condenação em obrigação de não fazer consistente em abster-se de inserir em
contratos futuros as cláusulas anteriormente referidas.
> - condenação em obrigação de não restringir o direito de desistência dos
consumidores, após a celebração do contrato, devendo restituir aos mesmos
eventuais parcelas adiantadas, descontados apenas os gastos com materiais não
devolvidos, sob pena de incidir multa diária no valor de dez salários mínimos;
> - condenação para a reparação dos danos causados aos consumidores
contratantes, inclusive repetição de indébito nos casos de cobrança indevida,
por valor igual ao dobro do que foi pago em excesso, acrescido de juros legais e
atualização monetária, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do Código de
Defesa do Consumidor.
Requer-se ainda seja tornada definitiva a medida liminar pleiteada para que se
condene a ré à obrigação de não fazer consistente em excluir de seus contratos
presentes e futuros:
> a) as cláusulas que impõem cobrança de multa superior a 2% (dois por cento)
pelo atraso no pagamento de mensalidades, em infração ao disposto no artigo 52,
§ 1o do Código de Defesa do Consumidor e artigo 1.062 do Código Civil;
> b) as cláusulas que impliquem em pagamento de multa incidente sobre o valor
total do contrato, em infração ao disposto no artigo 39, inciso V do Código de
Defesa do Consumidor, passando a incidir apenas em 10 % (dez porcento) sobre as
prestações já pagas pelo consumidor desistente;
> c) seja tornada definitiva a suspensão da eficácia de todas as cláusulas do
contrato oferecido, à exceção daquelas de números ....., inócuas para o
consumidor.
Tudo sem prejuízo das penas do crime de desobediência (art. 330 do Código
Penal), o não cumprimento das obrigações em questão importará no pagamento de
multa de dez salários mínimos por contrato firmado, a ser recolhida ao fundo de
que trata o art. 13 da Lei no 7.347/85, bem como sem prejuízo da escorreita
aplicação do artigo 462 do Código de Processo Civil para obtenção do resultado
prático da demanda (cessação das abusivas cobranças da ré em face dos alunos).
Requer-se, por derradeiro:
a) A citação da ré para, querendo, responder aos termos da presente, sob pena de
revelia e confissão.
b) A publicação de edital na forma preceituada pelo artigo 94 da Lei no
8.078/90, a fim de que eventuais interessados possam tomar conhecimento do
ajuizamento da presente ação.
Prova o alegado por todos os meios de prova em direito permitidos, especialmente
pela produção de prova documental, pericial e testemunhal.
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]