Ação civil pública para declaração de nulidade de assembléia geral extraordinária de fundação.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE ............, por seu órgão de execução
perante a PROMOTORIA ESPECIALIZADA DE FUNDAÇÕES desta comarca, vem perante Vossa
Excelência ajuizar
AÇÃO CIVIL PÚBLICA DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE DECISÃO DE ASSEMBLÉIA GERAL
EXTRAORDINÁRIA DE FUNDAÇÃO COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA c/c INTERVENÇÃO
JUDICIAL EM FUNDAÇÃO
em face de
FUNDAÇÃO ...., pessoa jurídica de direito privado, com sede à rua ..., ...,
bairro ..., .................., inscrita no CNPJ sob o número ..., com atos
constitutivos arquivados no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas de
.............................. sob o nº de registro nº ... , representada por
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., pelos motivos de
fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Conforme é cediço uma fundação não contém um patrimônio, mas é um patrimônio
personalizado indisponível a serviço de um escopo. São elas pessoas jurídicas
patrimoniais, definidas por Pontes de Miranda como: "uma universalidade de bens
personalizada, em atenção ao fim que lhe dá unidade."
A fundação é instituto jurídico cujo patrimônio é constituído por bens
destinados pelo instituidor em benefício público. Esse interesse benemérito é a
essência da entidade fundacional, motivo condutor de velação pelo Ministério
Público, nos termos do que dispõe o art. 66 do Novo Código Civil, in verbis:
"Art.66. Velará pelas fundações o Ministério Público, onde situadas".
Consoante o artigo 127 da Constituição Federal, o Ministério Público é
instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis.
Ainda nos termos do que dispõe a Carta Magna, é função do Ministério Público,
dentre outras, promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a
proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses
difusos e coletivos (art. 129, III).
Sobre tal disposição explanou o Des. COSTA DE OLIVEIRA:
"A regra jurídica do art. 129, III da CF de 1988, dá ao Ministério Público
legitimidade para ajuizar ação civil pública para a proteção não apenas do
patrimônio público ( = Estatal, ou do Povo) mas também do patrimônio social.
Temos de entender por patrimônio social o que, não sendo público, mas ao
contrário, privado, tem destinação social, comunitária. Eis o sentido de social,
mormente em face das regras gerais (= princípios) consagradas no Prólogo da
Constituição e nos seus arts. 1º - 3º, em que é dada ênfase ao contrário de
social." (EDSON JOSÉ RAFAEL. Fundações e Direito - 3º Setor. São Paulo:
Companhia Melhoramentos, 1997, p. 289 - grifo nosso).
ANTÔNIO CLÁUDIO DA COSTA MACHADO, ( com fulcro no Código Civil de 1916) em
comentários à atribuição do Ministério Público, conclui:
"só se viabiliza um controle administrativo se a lei entregar ao órgão
fiscalizador, concomitantemente, os remédios processuais adequados à realização
judicial de suas pretensões, o que , in casu, é feito pelo próprio art. 26 da
lei civil (...) A legitimação ativa ad causam, portanto, resulta diretamente
desta regra genérica do art. 26 do Código Civil que, do contrário, não teria
nenhuma eficácia concreta. Destarte, no poder-fim de velar pelas fundações
encontra-se implícito, logicamente, o poder-meio de promover todas as medidas
judiciais cabíveis a bem da administração e dos escopos fundacionais... o velar
pelas fundações é sinônimo de atribuição administrativa, de legitimação ativa ad
causam e de legitimação interventiva". (A Intervenção do Ministério Público. 1ª
ed., SP: Saraiva, p. 273/4 - grifo nosso).
A lei, especialmente no já mencionado artigo 66 do Novo Código Civil Brasileiro,
incumbiu o Ministério Público do poder/dever de velar pelas fundações, o que
implica, necessariamente, em verificar, também, se a destinação dada ao
patrimônio das referidas entidades está de acordo com o ordenamento jurídico.
CLÓVIS BEVILÁQUA, ensinando sobre a atuação ministerial decorrente da imposição
do artigo 26 do Código Civil,( hoje art. 66 do Novo Código Civil) disse que o
caráter fiscalizatório consiste fundamentalmente:
"... na aprovação dos estatutos e das suas reformas; em velar para que os bens
não sejam malbaratados por administrações ruinosas, ou desviados dos destinos a
que os aplicou o instituidor..." (Código Civil Comentado, v. 1, p. 234 - grifo
nosso).
Na mesma linha de raciocínio, entendimento do E. STF:
"Ministério Público - Fundação - Fiscalização das Fundações - Afastamento de
diretores - Medida preventiva - Legitimidade ativa - Procedimento adequado.
Velar significa estar atento, estar alerta, estar de sentinela, cuidar,
interessar-se grandemente, proteger, patrocinar, o que inclui promover ação,
evidentemente entre os atos fiscais, tem o Ministério Público a faculdade de
pleitear as medidas mais convenientes para corrigir os erros de uma
administração danosa e malversação do patrimônio, culminando com o afastamento
dos diretores, até que medida definitiva seja instaurada" (STF, 2ª Turma, 1976,
rel. Min. Moreira Alves - Jurisprudência Brasileira, 52/50-4 - grifo nosso).
DOS FATOS
A FUNDAÇÃO (X) foi instituída pelos Drs. (A), (C), (H), (E), (D) e (B), com a
devida aprovação do Ministério Público, por esta Promotoria Especializada de
Fundações, nos idos de 1987.
Seus objetivos encontram-se descritos no artigo 2º de seu Estatuto, nos
seguintes termos:
"Art. 2º - Tem a Fundação por objeto promover a manter, em caráter beneficiente,
serviços assistenciais, culturais e científicos do Hospital Prontocor, sediado
nesta Capital, na rua Sergipe, 1.456, tais como:
a) prestar assistência médica gratuita, dentro das disponibilidades técnicas, a
pessoas carentes de recursos financeiros;
b) incentivar estudos e pesquisas médico-científicas, bem como promover
aperfeiçoamento cultural e profissional do corpo clínico e de enfermagem do
Hospital;
c) promover congressos, reuniões e conferências científicas;
d) manter, dentro das possibilidades, bolsas de estudo para estudantes de
medicina;
e) promover campanhas de saúde pública. (doc. 3 - original sem grifos).
Conforme guias de importação em anexo (doc. 4), dentre os bens que constituem o
patrimônio da Fundação encontra-se um EQUIPAMENTO DE RESSONÂNCIA MAGNÉTICA
SUPERCONDUTIVA MODELO SMT 100, IMPORTADO, composto de: Gamtry (com magneto de
autoproteção), cama de pacientes, unidade de força, amplificador de força RF,
unidade de controle e medida, console para exame, console diagnóstico de imagem,
refrigerador e unidade de força, material de proteção RF, recipiente para gás
hélio - 2.000 litros, camêra multiformato modelo MI-20HR e ACESSÓRIOS: 8 (oito)
bobinas de detecção (corpo inteiro, cabeça, pescoço flexível, circular, circular
flexível, coluna, joelho e órbita, eletrocardiograma, jogo de instrumentos de
regulagem do paciente, jogo de monitor de respiração, cartucho de disco óptico,
disco floppy, jogo de acessórios para transferir gás e espectro de ajuste.
Referidos bens foram avaliados recentemente pela própria diretoria da Fundação
em US$ ....................................................................,
equivalentes a aproximadamente R$ .................. milhões de reais (doc. 5).
Pois bem.
Recentemente, a Fundação protocolou nesta Promotoria Especializada de Fundações
requerimento de visto em ata da 13ª Reunião Extraordinária da Assembléia Geral
da Fundação em questão (doc. 6).
Analisando o teor da citada ata, esta Promotoria Especializada de Fundações
tomou conhecimento que, em ......................, os membros da diretoria e do
Conselho Curador da Fundação, por unanimidade, aprovaram proposta de dar-se em
garantia nos seguintes processos de execução movidos por
............................. (em regime de liquidação extrajudicial) contra as
pessoas físicas que ocupam cargos de direção na Fundação e ........... - pessoa
estranha à Fundação e presumivelmente esposa do presidente da Fundação o bem
pertencente à Fundação, anteriormente discriminado e avaliado em aproximadamente
R$ ....................................:
Nº da Execução Pessoas Físicas Executadas Valor da Execução Vara onde tramita a
Execução
.............
1. (F) (devedora)
2. (A) (avalista) R$ .......... V. Cível .............. 1. (C) (devedor)
2. (B) (avalista)
3. (A) (avalista) R$ ......... 18ª V. ................. 1. (G) (devedor)
2. (C) (avalista)
3. (A) (avalista) R$ ......... Cível .................. 1. (A) (devedor)
2. (D) (avalista)
3. (E) (avalista) R$ .......... V. Cível .
Restou consignado, mais, na citada ata a "relevância da garantia de bens da
Fundação para penhora nos processos acima contra seus sócios fundadores, uma vez
que, sendo esta Fundação sem fins lucrativos, os mesmos sócios contraíram, em
seus nomes estas dívidas para adquirirem bens em prol da própria Fundação, uma
vez que esta não tem cadastro suficiente para contrair empréstimos bancários."
(sic - original sem grifos).
Cumpre salientar que referidos bens foram efetivamente nomeados à penhora,
conforme petições atravessadas nos autos das execuções em questão (doc. 7).
Necessário acrescentar que o próprio exequente, ciente da temeridade e
ilegalidade da referida nomeação, como se verá mais adiante em tópico próprio,
cuidou de recusar referida nomeação em todas as execuções, nos seguintes termos:
"3. Mais além. Impossível aceitar-se que uma fundação, mesmo que privada,
ofereça bens seus para garantir débitos de seu diretor presidente. 4. Sabendo-se
que o patrimônio de uma fundação, pública ou privada, tem natureza pública,
sendo velado por órgão específico do Ministério Público - Curadoria de
Fundações, impossível querer dele dispor qualquer dos membros de sua diretoria
ou de seu conselho, em benefício de qualquer um deles, ou mesmo terceiros. 5.
Isto coloca em risco o próprio objeto da fundação, ou seja, a consecução de um
fim, amparada por seu patrimônio a lhe dar respaldo financeiro. 6. Outro
problema inseparável estaria na evidente evasão fiscal que se pretende
perpetrar. Como as fundações possuem isenções tributárias diversas e não podem
distribuir lucros entre os diretores ou conselheiros, a garantia de dívidas
destes pelo patrimônio daquela poderá representar, ao final, transgressão da
norma tributária, transferindo-se indevidamente patrimônio obtido por receitas
isentas de tributação às pessoas de seus diretores ou conselheiros.." (sic -
doc. 8).
DO DIREITO
1. DA DESVINCULAÇÃO DOS BENS/PATRIMÔNIO DA FUNDAÇÃO DO PATRIMÔNIO DE SEUS
INSTITUIDORES
Quando um patrimônio vem a constituir uma fundação - a dotação inicial, ele se
desvincula do instituidor, adquire personalidade jurídica própria, deixando de
ter qualquer atribuição ou vínculo com aquele.
Significa que, uma vez registrados o estatuto e a escritura de instituição da
fundação no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, o patrimônio, ou
dotação, deixa de pertencer aos instituidores. Será então administrado por
órgãos componentes da fundação, que deverão cumprir a vontade descrita no ato de
instituição.
Nesse sentido, nos ensina VICENTE RÁO:
"... quando a lei fala em dotação de bens livres, não se refere, apenas, a bens
corpóreos móveis ou imóveis, em sentido estrito, mas a todos os valores
patrimoniais, inclusive aos direitos desta natureza que no sentido genérico da
expressão 'bens' se compreendem... os bens das fundações, por afetados a um
destino certo, são, de sua natureza, inalienáveis. Sua inalienabilidade é, sem
dúvida, relativa e comporta a substituição por outros bens, mediante sub-rogação
processada em juízo e fiscalização do Ministério Público. (TOMÁZ DE AQUINO
RESENDE. Novo Manual de Fundações, Ed. Inédita, BH, 1997, p.33 - grifo nosso).
O mesmo se diz em relação aos bens posteriormente adquiridos ou incorporados ao
patrimônio de uma fundação por doação ou qualquer outra forma de aquisição.
II.3 - DA IMPOSSIBILIDADE LEGAL DE ALIENAÇÃO DE BENS DA FUNDAÇÃO OU DE SUA
NOMEAÇÃO À PENHORA PARA RESPONDER POR DÍVIDAS PARTICULARES CONTRAÍDAS POR SEUS
DIRETORES OU CONSELHEIROS
Inexiste nas leis brasileiras qualquer dispositivo que determine a
inalienabilidade de bens pertencentes a fundações. Todavia, vale salientar que
todos os bens que compõem o patrimônio vinculado ao escopo da fundação, a partir
do registro desta, são relativamente indisponíveis e estão vinculados aos
objetivos desejados pelo instituidor.
Segundo ensinamento de CLÓVIS BEVILÁQUA, citada inalienabilidade pode ser
absoluta ou relativa:
"Absolutamente inalienáveis são as coisas que não podem ser objeto de
apropriação individual, tais como o ar, a luz.
Relativamente inalienáveis são as coisas que, embora suscetíveis de apropriação,
por considerações diversas de defesa social e proteção à pessoa a lei proíbe de
alienar." (Ob. cit., p. 35).
Portanto, a inalienabilidade dos bens pertencentes a fundações decorre da
destinação certa e determinada daqueles bens a um fim.
No caso sub judice, a inalienabilidade dos bens em questão decorre de sua
destinação, constante do estatuto da Fundação - prestação de assistência médica
gratuita pessoas carentes (art. 2º, a, do estatuto, alhures transcrito).
A propósito, o seguinte excerto jurisprudencial:
"A fundação é uma entidade cuja natureza não consiste na coletividade dos seus
membros, mas na disposição de coisas em vista de certos e determinados fins. Os
bens que constituem o patrimônio das fundações são inalienáveis; e o são porque
as pessoas que os administram não são seus proprietários e ainda porque a
fundação é patrimônio personificado pela finalidade a que é destinado." (excerto
de ac. da 3ª Câm. do Tribunal de Apelação de São Paulo, Ap. nº 413, São Paulo,
j. em 22/11/1938, rel. Des. João Marcelino Gonzaga, original sem grifo).
Neste mesmo sentido, arguta observação do Em. Procurador de Justiça do Rio
Grande do Sul, Dr. Luiz Carlos Ziomkowski:
"Além disso, observa-se que, uma vez instituída a Fundação, seus bens tornam-se
inalienáveis, independente de qualquer manifestação expressa de seu instituidor.
Com efeito,o Código Civil, dispõe que 'São coisas fora do comércio as
insusceptíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis'. As primeiras (...).
As segundas, por seu turno, são as que o direito subtrai de circulação ou, no
dizer de Clóvis, as que 'por considerações diversas de ordem social e proteção
às pessoas, a lei proíbe de alienar', como: os bens dotais , o bem de família),
as inalienáveis por imposição do testador ou doador e, por fim, as coisas
inalienáveis em razão de seu destino, como nas fundações, o que, embora não
expresso em nenhum texto de lei, decorre, na lição de Vicente Ráo: ' ... lógica
e juridicamente, da permissão legal de vincular bens a um destino certo e
determinado' (RT 138/18-21). (...). Quanto à inalienabilidade, ainda, Washinton
Monteiro de Barros preleciona que: ' ... normalmente, esses bens são
inalienáveis, porque sua existência é que assegura a concretização dos fins
visados pelo instituidor (RT 52/661), Não podem eles, portanto, ser desviados de
seu destino." (Das fundações e dos seus bens, Fundações 5/17-18).
Assim, patente a nulidade do citado ato dos Diretores da Fundação, corroborado
por seu Conselho Curador.
2. DA TEMERIDADE DO ATO PRATICADO PELOS ATUAIS DIRETORES DA FUNDAÇÃO, IMPLICANDO
EM INEQUÍVOCA DEMONSTRAÇÃO DE GESTÃO DISSOCIADA DOS INTERESSES DA FUNDAÇÃO E EM
RISCO AO PATRIMÔNIO E, AFINAL, À PRÓPIRA EXISTÊNCIA DA FUNDAÇÃO
Segundo entendimento jurisprudencial corrente,
"Os simples administradores da fundação não têm a faculdade de livre alienação
de bens que lhes foram confiados para a realização de finalidades determinadas."
(excerto de ac. do TJSP, ap. nº 30.095, 12/06/47, rel. Des. Clóvis de Moraes
Barros, RT 169/127).
Pois bem.
Ao convocarem Assembléia Geral Extraordinária da Fundação para deliberar sobre
autorização para nomeação de bens de seu ativo permanente à penhora em execuções
em que figuravam os réus - pessoas físicas -como executados (doc. 09) e/ou
concordarem tácita ou expressamente com referida convocação de AGE
(posteriormente ratificando tal concordância, na medida em que votaram
favoravelmente à referida nomeação de bens da Fundação à penhora), os réus,
administradores da Fundação, praticaram, além de ato ilegal em função da
indisponibilidade de tais bens - conforme anteriormente salientado, inequívoco
ato de gestão temerária e desvinculada dos interesses da Fundação, visando
apenas e tão somente o seu interesse particular.
Isto porque referidas execuções contra as pessoas físicas dos réus, inclusive
contra pessoa estranha aos quadros administrativos da Fundação - presumivelmente
esposa de seu Presidente, repita-se, têm como supedâneo contratos de abertura de
crédito entre os réus/executados e exequente, firmados em .......... (doc. 10).
Nem mesmo a singela desculpa de que referidos empréstimos teriam sido
contratados para a compra de equipamentos para a Fundação se presta a minimizar
a gravidade e temeridade do questionado ato, na medida em que:
"1. referidos contratos foram firmados em .......... e a compra do aparelho da
Fundação dado bem garantia nas execuções data de anos antes, conforme Guia de
Importação do referido aparelho, datada de .......... (doc. 04).
2. do cotejo de todas as atas de reuniões de Assembléias Gerais da Fundação,
desde sua criação, não se faz menção, em momento algum, à tomada de qualquer
empréstimo da Fundação e muito menos de pessoas físicas diretoras da Fundação
para a aquisição de qualquer bem em nome da Fundação (doc. 11).
Praticaram os réus ato nocivo aos interesses da Fundação e capaz de inviabilizar
seu futuro, na medida em que o bem em questão é o principal e mais caro bem que
compõe seu patrimônio, conforme se infere de prestação de contas da Fundação
anteriormente entregue ao Ministério Público (doc. 12).
Percebe-se claramente, in vero, que o ato em questão teve como motivação única
os inconfessáveis interesses particulares dos réus.
A propósito de tal fato, a análise da questão trazida aos autos das execuções
pelo exequente:
4. Sabendo-se que o patrimônio de uma fundação, pública ou privada, tem natureza
pública, sendo velado por órgão específico do Ministério Público - Curadoria de
Fundações, impossível querer dele dispor qualquer dos membros de sua diretoria
ou de seu conselho, em benefício de qualquer um deles, ou mesmo terceiros.
5. Isto coloca em risco o próprio objeto da fundação, ou seja, a consecução de
um fim, amparada por seu patrimônio a lhe dar respaldo financeiro.
6. Outro problema inseparável estaria na evidente evasão fiscal que se pretende
perpetrar. Como as fundações possuem isenções tributárias diversas e não podem
distribuir lucros entre os diretores ou conselheiros, a garantia de dívidas
destes pelo patrimônio daquela poderá representar, ao final, transgressão da
norma tributária, transferindo-se indevidamente patrimônio obtido por receitas
isentas de tributação às pessoas de seus diretores ou conselheiros.." (original
sem grifo).
3. DA COMPROVAÇÃO DE PLANO DA VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES FEITAS - FUMUS BONI
IURIS E DO PERICULUM IN MORA EM RELAÇÃO À PROVIDÊNCIA MAIS ADIANTE SOLICITADA
É sabido que entre a interposição da demanda e a providência satisfativa do
direito de ação (sentença ou ato executivo) medeia necessariamente um certo
espaço de tempo, que pode ser maior ou menor conforme a natureza do procedimento
e a complexidade do caso concreto.
É indubitável, portanto, que o transcurso do tempo exigido pela tramitação
processual pode acarretar ou ensejar variações irremediáveis não só nas coisas
como nas pessoas e relações jurídicas.
Daí, então, surge a possibilidade da tutela cautelar que, segundo HUMBERTO
THEODORO JÚNIOR:
"Consiste no direito de provocar, o interessado, o órgão judicial a tomar
providências que conservem e assegurem os elementos do processo (pessoas, provas
e bens), eliminando a ameaça de perigo ou prejuízo iminente e irreparável ao
interesse tutelado no processo principal; vale dizer: a ação cautelar consiste
no direito de assegurar que o processo possa conseguir um resultado útil'
(Enrico Tulio Liebman. Manuale di Diritto Processuale Civile. Ed. 1968, v. I, n.
36, p. 92)". (Curso de Direito Processual Civil. Vol. II, RJ: Forense, 16ª ed.,
1996, p. 362 - grifo nosso).
Comprovado documentalmente que: 1) o bem dado em garantia às execuções ajuizadas
contra os réus pertence ao patrimônio da Fundação (X); 2) referido bem é
inalienável por destinação que lhe foi dada, prestando-se à garantia de serviço
de grande abrangência social prestado pela Fundação; 3) o ato de dar tais bens
em garantia implica em inequívoca administração temerária e desvinculada aos
interesses da Fundação, levando em conta apenas os interesses pessoais de seus
administradores.
Assim, encontra-se presente a fumaça do bom direito invocado, traduzida na
verossimilhança das alegações colocadas e provadas de plano, junto à inicial.
Por seu turno, o perigo na demora da obtenção da medida judicial ora postulada é
concreto e real. Decorre ele da possibilidade de que tal nomeação seja aceita
pelo exequente e/ou em função de decisão judicial em 1ª ou 2ª Instâncias nas
execuções mencionadas, com a enorme possibilidade de prejuízo material em caso
de serem improcedentes os embargos a execução a serem aviados pelos
réus/executados, suportando a Fundação prejuízo material de grande monta que
inviabilizaria em parte, não mensurável, a consecução de seus objetivos
estatutários.
4. DA NECESSIDADE DE DEFERIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA, NOS TERMOS DO ART. 273,
DO CPC
O Código de Processo Civil, em seu art. 273, dispõe:
"Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou
parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que,
existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito
protelatório do réu."
Em relação à antecipação da tutela sem a oitiva do réu, doutrina NELSON NERY
JÚNIOR:
"Quando a citação do réu puder tornar ineficaz a medida, ou, também, quando a
urgência indicar a necessidade de concessão imediata da tutela, o juiz poderá
fazê-lo inaudita altera pars, que não constitui ofensa, mas sim limitação
imanente do contraditório, que fica diferido para momento posterior do
procedimento." (Código de Processo Civil Comentado, RT, SP, 3ª ed., 1997, p.
545, original sem grifos).
No que pertine à liminar pleiteada, além da inegável presença dos pressupostos
para a concessão da medida cautelar, quais sejam a verossimilhança das alegações
- fumus boni iuris e a irreparabilidade do prejuízo - periculum in mora, há de
ser considerada a possibilidade de que o simples decurso do prazo, objetivamente
considerado, será, por si mesmo, suficientemente capaz de tornar prejudicado ou
inócuo o resultado da lide. Percebe-se, portanto, que um dos aspectos
fundamentais dessa tutela cautelar initio litis reside num fator temporal
objetivo, pois caso não seja concedida a tutela cautelar antecipadamente, poderá
ocorrer a penhora do bem dado em garantia nas execuções em função de decisão da
instância originária ou recursal.
Segundo recomendação de FREDERICO MARQUES:
"Para conceder liminarmente a medida cautelar inaudita altera pars deve o juiz
proceder com prudência e cuidado; todavia não lhe é dado esquecer que da
antecipação e rapidez depende quase sempre o resultado eficaz da medida
cautelar" (Manual de Direito Processual Civil, Saraiva, 1976, 4ª ed., p. 369 -
grifo nosso).
Em brilhante artigo publicado, nos ensina o i. Prof. ,E1>DARCI GUIMARÃES
RIBEIRO:
DOS PEDIDOS
Ante o exposto, requer o Ministério Público, por seu Curador de Fundações:
1. Seja deferido, LIMINARMENTE e inaudita altera pars, tutela antecipada
declarando nula a decisão dos órgãos de administração e deliberação da Fundação
(X) que deliberaram sobre a nomeação à penhora de bens da Fundação em garantia
de execuções ajuizadas contra seus Diretores/réus, com imediata comunicação aos
r. Juízos desta comarca onde tramitam os processos de execução anteriormente
mencionados;
2. A citação dos réus para eventuais considerações de suas partes;
3. A confirmação posterior e definitiva da tutela antecipada pleiteada;
4. Após regular trâmite processual, o afastamento dos réus/Diretores da Fundação
em face da prática de ato inequívoco de gestão temerária e descompromissada com
os interesses maiores da Fundação, com a conseqüente nomeação de pessoas idôneas
para o exercício de tais cargos.
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]