Ação civil pública interposta para anulação de processo seletivo para professor substituto de universidade federal.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA DA JUSTIÇA FEDERAL DE ..... -
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO .....
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Procuradora da República signatária, com
suporte no art. 129, III, da Constituição Federal; art. 5º, III, alínea "e",
art. 6º, VII, alínea "d, todos da Lei Complementar nº 75/93 (Lei Orgânica do
Ministério Público da União) vem, perante Vossa Excelência para propor
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR
em face de
Universidade Federal do ........, pessoa jurídica de direito público,
representada pelo seu Magnífico Reitor, com endereço para intimações na Rua
....., nº ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., pelos motivos de fato
e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Não remanesce dúvida quanto à legitimidade do Ministério Público Federal para
ajuizar a presente Ação Civil Pública, eis que se cuida de atos praticados pela
Universidade Federal do ....................., Autarquia Federal, assim, à
Justiça Federal cabe o conhecimento e a decisão da questão. A propósito,
trazemos à colação a seguinte decisão jurisprudencial, que bem reflete a certeza
dessas afirmações.
"PROCESSUAL - LEGITIMIDADE - MINISTÉRIO PÚBLICO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONCURSO
PÚBLICO.
O Ministério Público é legitimado a propor ação civil pública, visando à
decretação de nulidade de concurso público que afrontou os princípios de
acessibilidade, legalidade e moralidade. Trata-se de interesses transindividuais
de categoria ou classe de pessoa e de direitos indivísiveis e indisponíveis, de
toda coletividade.
Recurso improvido". (STJ, 1º Turma, julg. em 22.09.1998, Rel. Min. Garcia
Vieira, DJU de 09.11.98)
DO MÉRITO
DOS FATOS
O Ministério Público Federal, a partir de representação formulada pela Sra.
........., que tentou inscrever-se no Processo Seletivo para Professor
Substituto para a cadeira Matemática Financeira, vinculada ao Departamento de
Contabilidade da Faculdade de Economia, Administração, Atuária e Contabilidade
(............) da Universidade Federal do .............., instaurou procedimento
administrativo com o objetivo de apurar a regularidade de tal processo.
Segundo noticia a Representante, no dia ........ de ........... de ........,
encaminhou-se ao Departamento de Contabilidade da ..............,
aproximadamente as .......h.........min, a fim de se inscrever no referido
processo seletivo, mas somente as .....h......min foi aberto o respectivo
Departamento, quando então a chefe daquele setor, Sra. .................,
informou-lhe que as inscrições haviam sido encerradas. Ressalte-se que, segundo
o Edital n.º ........./2004 (em anexo), as inscrições estavam previstas para os
dias ................, de 08(oito) às 11(onze) e das 14(quatorze) às
17(dezessete) horas.
Por conseguinte, a Representante encaminhou-se à Secretaria de Recursos Humanos
da ................., cuja diretora, a Sra. ........., após ouvir os fatos,
tentou contatar a Sra.............., uma vez que ainda havia tempo hábil para
efetuar a inscrição de quem se interessasse. No entanto, infrutífera foi a
tentativa, sendo informada que a chefe do Departamento de Contabilidade da
........... estava em reunião e não atenderia ao telefone. Em conseqüência, a
servidora ........... atestou (fls.06v do proc. adm.) que a interessada, em
tempo hábil segundo o edital específico, não estava conseguindo efetuar sua
inscrição para o processo seletivo em comento. Oportuno salientar que a
interessada retornou à ........., aproximadamente às 16h50min, e, novamente,
teve obstada sua inscrição, uma vez que no Departamento encontrava-se apenas uma
auxiliar de serviços diversos daquele setor, e impedida de receber qualquer
pedido de inscrição.
Em face dos fatos acima referidos solicitou-se informações à ......... acerca
dos mesmos, bem como à Chefe do Departamento de Contabilidade da ........... Em
resposta, obteve-se a declaração da Sra. Jeanne (fls.12/14 do proc. adm.)
reconhecendo que, de fato, a interessada, aproximadamente às 15h30min do dia 31
de março do corrente ano, compareceu ao departamento retro a fim de efetuar sua
inscrição. No entanto, a servidora em epígrafe resumiu-se a explanar apenas que
na ocasião encontrava-se sozinha, tendo em vista a escassez de servidores
daquele setor, sem, contudo, informar por que deixou de efetuar a inscrição da
pretensa candidata, uma vez que esta ali estava tempestivamente. Informou ainda
que por estar em reunião da Diretoria da .......... não atendeu a ligação feita
pela servidora ........., da Secretaria de Recursos Humanos da ..........; e que
a representante, ao retornar ao departamento no final da tarde, foi atendida por
uma "AUXILIAR DE SERVIÇOS DIVERSOS", justificando que era a única servidora
disponível para que o departamento ficasse aberto, argüindo, em conseqüência, já
que a Representante estava interessada em participar da seleção, deveria ter
esperado sua volta da reunião.
Percebe-se, sem qualquer esforço, que de fato a Sra ............. teve sua
participação no presente processo seletivo obstaculizada, e, por conseqüência,
frustrada. Diante dessa constatação vê-se que não apenas a citada reclamante foi
prejudicada, mas possíveis outros candidatos podem ter tido suas inscrições
inviabilizadas durante o período previsto no edital, razões que ensejaram a
atuação do Parquet Federal, através da Recomendação nº17, de 04 de maio de 2004,
encaminhada ao Magnífico Reitor da ............, bem como à chefe do
Departamento de Contabilidade da .............., no intuito de que fosse anulado
o certame em apreço e realizado um novo, desta feita obedecendo às regras
constitucionais e administrativas.
Contudo, nenhuma providência foi tomada pela Universidade ou pelo Departamento
específico, alegando, a responsável por este, que não poderia acatar a citada
Recomendação em face da precária investigação e falta de diligências por parte
do Ministério Público Federal, e, principalmente, por não haver prova do
argüido, como também pela não comprovação do pagamento da taxa de inscrição por
parte da Representante.
Ressalte-se, todavia, que a Representante havia efetuado o pagamento da
mencionada taxa e isso era do conhecimento da Servidora ..........., conforme
demonstram as declarações prestadas, assim como o documento acostado a este
Procedimento Administrativo - cf. fl.71 do P.A. anexo.
Portanto, qualquer restrição à inscrição de candidato, por motivos alheios às
regras legais, vicia todo o processo seletivo, pois nenhuma forma de
discriminação ou favorecimento a qualquer pessoa encontra amparo na sistemática
jurídica vigente, motivo pelo qual o Ministério Público Federal propõe a
presente Ação Civil Pública, buscando no Poder Judiciário a correção dos atos
administrativos flagrantemente desviados dos princípios da legalidade, da
moralidade e do amplo acesso aos cargos, funções e empregos públicos.
DO DIREITO
A Constituição Federal, em seu art. 37, caput, estabelece os princípios da
Administração pública, e, no inciso I, prevê o amplo acesso aos cargos, empregos
e funções públicas:
"Art. 5º. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte:
I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que
preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na
forma da lei;"
Os objetivos das normas constitucionais supracitadas visam possibilitar a todos,
em igualdade de condições, disputar os cargos e empregos públicos, motivo pelo
qual compete a Administração tratar a todos os candidatos com impessoalidade e
isonomia, dispensando o mesmo tratamento sem qualquer privilégio e/ou
discriminação.
Os concursos não têm forma preestabelecida, contudo, é cediço que regras devem
ser postas para que a disputa se processe de forma a atingir o resultado que é,
sem sombra de dúvida, escolher o mais capacitado, e, a maneira que se adota, sem
qualquer questionamento, por ser a melhor que temos, é a definição de regras
através de Edital, o qual será amplamente divulgado, a fim de que os
interessados as conheçam e se conduzam de acordo com elas. Por essa razão, o
Edital é o instrumento para realizar qualquer certame, vinculando à
Administração Pública, assim também os particulares envolvidos, razão pela qual
é vedado a qualquer das partes agir em descompasso com as regras nele insertas,
posto que ali estão contidos os direitos e deveres dos participantes, os quais
deverão ser rigorosamente observados, sob pena de nulidade.
Com efeito, não se compadece com as normas legais de regência, muito menos com
os princípios constitucionais, a conduta da Administração que impede um
candidato de se inscrever a um concurso seletivo aberto, em pleno prazo e
horário destinados à inscrição, inexistindo razões que possam justificar esse
atuar. É dizer, se motivo houvesse que de algum modo impedisse e/ou dificultasse
aos candidatos realizar a pretendida inscrição no último dia do prazo do edital,
obrigatoriamente a Administração teria de estender esse prazo, a fim de que
ninguém ficasse prejudicado e o edital restasse plenamente observado.
Consoante se infere dos fatos acima relatados, a Administração descumpriu as
regras do Edital por ela mesma estabelecidas, causando prejuízos a terceiros,
pelo que, o certame realizado em descompasso com suas próprias normas não pode
prevalecer, porquanto a Legalidade e a Moralidade Administrativa, bem como o
Amplo Acesso aos concursos públicos não toleram que atos desse jaez subsistam e
venham a produzir efeitos legítimos.
A Constituição Federal, no art. 5°, caput, preceitua que:
" Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:"
O princípio da igualdade, que tem assento no Estado Social e Democrático de
Direito e nos postulados da dignidade da pessoa humana, irradia-se para todo o
ordenamento jurídico e vincula toda atividade pública e mesmo a privada,
estendendo-se tal concepção igualitária da criação até a aplicação do direito.
Pelo princípio da moralidade administrativa, tem-se que o processo seletivo deve
vedar favorecimentos e/ou perseguições pessoais, bem como situações de
nepotismo, uma vez que o intuito real da Administração é o de selecionar os
melhores candidatos.
Faz-se necessário lembrar o importante papel que os princípios desempenham no
Direito, sendo, a um só tempo, o suporte de validade das regras jurídicas e da
própria interpretação destas, no que toca ao seu alcance e significado. Por isso
é que se diz, com inteira propriedade, que violar um princípio é algo muito mais
grave que o descumprimento de uma regra, consoante a abalizada lição de Celso
Antônio Bandeira de Mello:
" Princípio - já averbamos alhures é, por definição, mandamento nuclear de um
sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre
diferentes normas compondo-lhes o espírito e sentido e servindo de critério para
sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a
racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere tônica e lhe dá sentido
harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das
diferentes partes componentes de todo unitário que há por nome sistema jurídico
positivo." (Elementos de Direito Administrativo, 3ª edição, p. 299)
Por tais postulados - o da igualdade, o da legalidade e, por conseguinte, o do
amplo acesso aos cargos e empregos públicos -, há de se entender que não é
lícito à Administração oferecer tratamento desigual para aqueles que se
encontram na mesma situação, posto que tratamento diferenciado somente poderá
acontecer nos casos excepcionais previstos em lei.
Resta por demais evidenciado, pelos fatos acima relatados, que o princípio do
amplo acesso aos cargos públicos, o qual obriga a Administração a garantir
condições equânimes para a inscrição de todos os que pretenderem concorrer, sob
pena de inviabilizar a regular competição, e, assim, frustrar os objetivos
constitucionais, foi malferido, razão porque não pode prosperar o resultados da
seleção efetuada com violação às regras editalícias.
O bom direito perseguido em juízo é de fácil percepção, decorrendo dos
princípios da legalidade, da isonomia e do amplo acesso aos cargos públicos,
inserido no art. 37, da Carta Constitucional. Já o periculum in mora mostra-se
evidenciado, em razão da ofensa aos direitos dos candidatos que, em razão da
desorganização do Departamento da ............ responsável pelo certame não
puderam efetuar suas inscrições no referido processo seletivo, muito embora
estivessem dentro do prazo hábil para tanto, o que, seguramente, acarretou-lhes
prejuízos significativos, que se tornarão irreversíveis com a posse dos que
lograram concorrer.
Assim, demonstradas a pertinência e a oportunidade da presente ação civil
pública, requer o Ministério Público Federal de V. Exa., a concessão da medida
liminar, para o fim de determinar à Universidade Federal do ............, que se
abstenha, imediatamente, de praticar qualquer ato tendente a realizar os efeitos
do processo seletivo para Professor Substituto da Disciplina Matemática
Financeira, realizado a partir do Edital de Seleção n.º ............/2004, cuja
cópia repousa às fls. 59/61, sob pena de multa diária, a qual será estabelecida
ao prudente descortino de V. Exa..
DOS PEDIDOS
No mérito, e pelas razões exaustivamente demonstradas, requeremos a nulidade do
processo seletivo realizado, confirmando-se a liminar, caso deferida, impondo-se
à Universidade Federal do ..........., a obrigação de realizar novo processo de
seleção, com a publicação de um novo instrumento convocatório, o qual deverá ser
rigorosamente observado, em absoluta observância aos princípios e normas
constitucionais.
Pede-se a citação da......... para, querendo e no prazo legal, apresentar a
defesa que tiver e acompanhar o processo até final julgamento, sob pena de
revelia, quando deverá ser julgada inteiramente procedente esta Ação, condenando
a Demandada nos ônus da sucumbência.
Conquanto o procedimento administrativo anexo contenha todas as provas
preconstituídas referente à matéria alegada, protesta o Ministério Público
Federal por todos os meios de prova em direito permitidos, especialmente juntada
posterior de documentos, prova testemunhal e pericial, tudo, enfim, que se fizer
necessário ao pleno esclarecimento dos fatos.
Dá-se à causa o valor de R$ .......
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]