Contestação à ação de cobrança, na qual a
administradora de consórcios alega a impossibilidade de devolução de valores
monetariamente corrigidos a consorciado desistente, o que prejudicaria o
grupo.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
AUTOS Nº .....
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., por intermédio de seu advogado (a) e bastante
procurador (a) (procuração em anexo - doc. 01), com escritório profissional sito
à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe
notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa
Excelência apresentar
CONTESTAÇÃO
à ação de cobrança interposta por ....., brasileiro (a), (estado civil),
profissional da área de ....., portador (a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º
....., residente e domiciliado (a) na Rua ....., n.º ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM
Não preenche o autor outra das condições fundamentais da ação. É que, com
efeito, e para o fim pretendido, não tem ação contra a contestante, que na
hipótese dos autos é parte manifestamente ilegítima para atuar no polo passivo
da relação processual.
Na verdade, a Portaria 190/89, faz clara distinção entre a administradora ....,
para que, em momento algum, haja confusão entre essas duas figuras.
Dispõe o citado diploma legal em seus itens 10 e 11, verbis:
"Grupo é um conjunto de participantes, na forma prevista no item 1.1, em
conjunto determinado, reunidos pela administradora para a aquisição de bens,
durante prazo previamente estipulados e modalidades contratuais específicas."
"Após constituído, cada grupo terá identificação própria e será autônomo em
relação aos demais que a administradora organizar."
Portanto, cada grupo de consórcio, a exemplo de outras entidades como o
condomínio ou o espólio é capaz de se tornar sujeito da relação jurídica
processual em tela, tendo para tanto, personalidade jurídica para responder em
ação proposta.
É verdade, que a lei, para caracterizar a atribuição de personalidade jurídica,
obedece o princípio dos numerus clausus, porém, também é verdade, conforme
afirma o saudoso professor Lamartine Correa de Oliveira, que esse princípio não
destrói, porém, os princípios da liberdade de autodeterminação e da autonomia
(in, A Dupla Crise da Pessoa Jurídica, p. 194).
Pacífico na doutrina e na jurisprudência o reconhecimento da personalidade
jurídica das chamadas "sociedades de fato", que embora não estejam elencadas na
lei, são tratadas como verdadeiras pessoas jurídicas, vez que têm direitos e
obrigações autônomas e independentes.
O grupo do qual faz parte o autor, é capaz de direitos e obrigações, tendo
individualidade própria, pois os consorciados que o constitui, com ele não se
confundem, e, finalmente, tem o grupo plena autonomia patrimonial. Todas estas
características, portanto, evidenciam a personalidade jurídica do grupo, sendo a
ré, a rigor, mera gestora de seus interesses e daí seu nome e objeto social de
Administradora de Consórcios.
Outro não é o entendimento do ilustre professor Cândido Rangel Dinamarco, que em
parecer sobre o assunto afirmou:
"... O consórcio tem capacidade de ser titular de alguns direitos e algumas
obrigações o suficiente para distingui-lo da Administradora e permitir que a uma
e a outra se imputem responsabilidades distintas."
Em face disso, na verdade, em sendo a ré-contestante mera mandatária e
administradora do grupo de que participa o autor, não é ela tecnicamente, parte
legítima para responder aos termos da ação, legítimo sim, é o próprio grupo.
Tanto é assim, que, na pouco provável hipótese de não ser dado provimento ao
recurso, não será a apelante quem devolverá as quantias já pagas pelo autor, mas
o próprio grupo, porquanto dele é que sairão os recursos para esse fim.
DO MÉRITO
DOS FATOS
Pretende o autor na exordial qualificar a contestante como devedora e
responsável, inclusive, pelos ônus decorrentes da mora, dado que, no seu
entendimento, não cumpriu com sua obrigação oportuno tempore.
Está equivocado o autor, data vênia.
É que, além do fato, com flagrante e fortes conseqüências jurídicas, de não se
constituir a administradora em devedora propriamente dita (circunstância que só
ocorreria após detectada a má gestão da ré na condução dos negócios do grupo), a
obrigação, se existente, notadamente nos termos pretendidos pelo autor, ainda
não seria exigível.
Ocorre que, na realidade, e com base nos exatos termos da inicial, que ensejam
obrigação positiva e líquida já descumprida, tanto pelo tempo, quanto pela
forma, a constituição em mora da contestante ainda não ocorreu, porquanto, se
obrigação existisse, seria indispensável, para o efeito pretendido na inicial, a
notificação, a interpelação ou o protesto da ré, só após o que estaria a
constituída em mora, uma vez que inexiste assinatura de prazo para o cumprimento
da obrigação.
Incide na espécie, pois, a regra da última parte do art. 397 do Código Civil
Brasileiro, que impõe a notificação, ou a interpelação, ou mesmo o protesto,
para a constituição em mora do devedor, verbis:
"Art. 397 - O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo
constitui de pleno direito em mora o devedor.
Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação
judicial ou extrajudicial".
A hipótese dos autos portanto, se for entendida como a de descumprimento da
obrigação (embora na verdade não seja), deixa caracterizada a espécie de mora ex
persona, porquanto, conforme já notificado, não existe, como exige a lei, a
absoluta determinação de dia certo para o seu cumprimento.
Porém, se esse não for o entendimento, o que se admite apenas por argumentação,
e que se conclua que a hipótese é de mora ex re, em decorrência de que a
obrigação de devolver operar-se-ia 30 (trinta) dias após o encerramento não
teria incidência. É que, na realidade dos autos, tanto o contrato que celebrado,
quanto a própria norma que disciplina o sistema de consórcio, que permanece com
vigor e eficácia plenos, porquanto ainda não revogada, estabelecem que a
devolução se fará, naquele prazo de 30 dias após o encerramento do grupo, mas
sem juros e correção monetária. E, em sendo outra a obrigação, porque distinta
da original, a constituição em mora não poderá dispensar a notificação,
interpelação ou protesto, ainda que livres de forma.
Por qualquer ótica, portanto, a questão envolve a mora ex persona, que
condiciona sua constituição a quaisquer dos modos de cientificação do suposto
devedor, circunstância que, uma vez inexistindo, macula o desenvolvimento válido
e regular do processo, levando o autor a carecer da ação proposta.
Também, por isso, a extinção do feito é imperiosa.
É o que requer, também em preliminar, a ré.
DO DIREITO
1. A DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS, SEM JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA, COMO
CONSEQÜÊNCIA DO INADIMPLEMENTO: SUA NATUREZA DE CLÁUSULA PENAL
Na pouco provável hipótese de não serem acolhidas as preliminares argüidas, no
mérito sustenta a ré que, na verdade, funcionam a aludida cláusula 29 do
Regulamento do Consórcio, bem como o art. 51 da também mencionada Portaria
330/87, do Ministério da Fazenda, como verdadeira cláusula penal, insertas nos
contratos como os da espécie dos autos exatamente para desestimular o
afastamento de integrantes dos grupos que, como inadimplentes, além de
contrariarem os interesses e objetivos do sistema, causam prejuízo ao grupo do
qual participam.
O princípio que rege o sistema de consórcio é o mesmo do cooperativismo, onde
todos os cooperados e os consorciados contribuem para um objetivo comum,
enquanto, todavia, não atingido esse fim comum, o consorciado permanece
vinculado ao grupo, ou mais propriamente, à sorte deste, ao qual espontaneamente
aderiu. Sua desvinculação só ocorre, no entanto, quando quitar todas as
parcelas, que corresponderão então, a 100% (cem por cento) do valor do bem, e
quando o tiver recebido.
Nestas condições, notadamente em épocas de alto índice de inflação, a
inadimplência ou a desistência de participantes causa prejuízos aos demais
integrantes do grupo. É que o montante arrecadado num determinado mês poderá ser
insuficiente para a aquisição do bem. Não podendo adquiri-lo de imediato, e
tendo que aguardar uma nova entrada de recursos no mês seguinte, é muito
provável que o bem tenha sofrido aumento de preço. Aí ocorre o que se chama de
"reajuste de saldo de caixa", que será pago pelos consorciados ativos e
adimplentes. Para minimizar esse tipo de prejuízo, que é causado pelos
desistentes ou inadimplentes, a legislação estabeleceu que as restituições, no
caso de exclusão por falta de pagamento das operações do grupo, sejam isentas de
juros e correção monetária.
Trata-se, por isso, de verdadeira sanção, no objetivo de evitar que a
desistência ou a inadimplência de um participante crie embaraços financeiros aos
demais.
Sobre o tema, aliás, em jurídico e bem lançado parecer, pronunciou-se o
professor Sylvio Capanema de Souza, verbis:
"É preciso ainda lembrar que ao aderir ao contrato nasce para o consorciado
obrigação positiva de contribuir, na proporção da sua cota, para a aquisição do
bem, e na obrigação correlata, já agora negativa de não se desligar, uma vez que
a filosofia do negócio repousa no esforço comum.
Ao desistir o consorciado descumpre o compromisso de contribuir, colocando em
perigo o resultado final. Como não, em todo o resto do contrato, qualquer outra
cominação, chega-se à inabalável convicção de que a cláusula em exame é a
cominação que se instituiu, aliás branda, para a hipótese de arrependimento."
E conclui, não sem antes observar a necessidade do respeito ao princípio da
pacta sunt servanda e que o fato de se constituir o contrato em de adesão não
lhe retira a natureza contratual, nem enfraquece o vínculo que une as partes,
que:
"A cláusula é lícita, já que impregnada do caráter penal.
A pena tem conteúdo econômico, e não ultrapassa o valor da própria obrigação,
nada impedindo sua aplicação.
Diante do prejuízo causado ao grupo, e o risco que se cria para a consecução dos
finais comuns, com a saída prematura do integrante, consideramos até benevolente
a cláusula penal ...
De todo o exposto, nosso parecer é no sentido da validade da cláusula, cuja
natureza é de cláusula penal."
2. A TEORIA DA IMPREVISÃO - PRINCÍPIO INAPLICÁVEL NA ESPÉCIE DOS AUTOS: O
CONTRATO AINDA QUE DE ADESÃO, E SEUS PRESSUPOSTOS REGULADORES
Pelo conteúdo da inicial, a inadimplência do autor fez pouso e procurou
abrigar-se nos efeitos da imprevisão.
Ocorre, data vênia, que não se aplicam em especial na hipótese dos autos, os
efeitos da antiga cláusula rebus sic stantibus, porquanto ausentes, à toda
evidência, seus pressupostos indicativos.
Ora, justifica-se a inadimplência contratual, sob o fundamento da imprevisão,
quando a onerosidade excessiva da prestação é resultante de fatores
absolutamente anormais extraordinários e imprevisíveis.
Esses fatores, todavia, não se fizeram presentes no caso dos autos, pois, não é
crível, nem razoável, em especial no Brasil, que se contrate acreditando que as
obrigações assumidas, notadamente se daquelas que se protraem no tempo, não
venham a sofrer constantes e periódicos reajustes, máxime num país que convive
com altos índices inflacionários já há mais de 20 anos consecutivos.
Desse entendimento também, não se afasta Ives Gandra Silva Martins, em seu
parecer, ao afirmar:
"... A evidência, nos contratos referentes aos consórcios não há que se falar em
teoria da imprevisão, posto que o Brasil viveu durante toda a década de 1980 com
a inflação elevada, não se podendo alegar desconhecimento de sua existência
entre as partes, que assinaram o contrato de consórcio ...
Não vejo pois ..., como afastar o princípio da autonomia de vontade em relação a
dívidas conscientemente acordadas como de dinheiro, para transformá-la em dívida
indexada em benefício do descumpridor do contrato. Um prêmio à violência
contratual ao prejuízo ofertada ao grupo, à palavra não cumprida, uma homenagem
à torpeza, que se auto beneficia a Justiça."
Por isso o aumento das parcelas, ocasionada pela elevação nos preços do bem
objeto do plano do consórcio, considerando que esse sistema impõe que a parcela
represente um percentual sobre o preço do bem novo, que não pode ser usado como
fato de caráter extraordinário, anormal e imprevisível, mormente para que tais
circunstâncias autorizem a revisão contratual e tornem lícita a ofensa aos
princípios da força obrigatória e da autonomia da vontade, norteadores de
qualquer avença ainda que esta se revista de características de adesão,
porquanto, mesmo assim, a liberdade de contratar existe.
Lembra-se nesse passo, a lição do professor Orlando Gomes, na mais tradicional
de suas obras:
"... Exige-se que a alteração das circunstâncias seja de tal ordem que a
excessiva onerosidade da prestação não pudesse ser prevista. Por outras
palavras, a imprevisão há de decorrer do fato ser a alteração determinada por
circunstâncias extraordinárias. As modificações por assim dizer normais do
estado de fato existente ao tempo da formação do contrato devem ser previstas,
pois, constituem, na justa observação de RIPERT, uma das razões que movem o
indivíduo a contratar, garantindo-se contra as variações que traziam insegurança
à suas relações jurídicas."
É a configuração exata da espécie dos autos, que merece a conclusão do ilustre
professor, verbis:
"Quando, por conseguinte, ocorre agravação da responsabilidade econômica, ainda
a ponto de trazer para o contratante muito mais onerosidade, mas que podia ser
razoavelmente prevista, não há que se pretender a resolução do contrato ou a
alteração de seu conteúdo. Nesses casos princípios da força obrigatória dos
contratos conserva-se intacto. Para ser afastado previsto é que o acontecimento
seja extraordinário e imprevisível."
A imprevisão, por outro lado, admitindo-se a presença de todos os seus
pressupostos essenciais, também exige, especialmente para autorizar o
tangenciamento à força obrigatória e à autonomia de vontades já manifestada,
tornando o contrato, quanto aos seus efeitos, a partir daí, simplesmente
relativos, à excessiva onerosidade da prestação tenha exata correspondência,
inversamente ao lucro obtido pela outra parte por isso não se admitir sua
incidência em favor daquele que, por falta de cautela ou por outra causa
qualquer, previsível ao tempo da avença, não logrou obter o benefício esperado.
Daí a lição da doutrina, de que os efeitos da imprevisão só tem eficácia quando
o acontecimento, anormal e imprevisível, torne para uma das partes
excessivamente onerosa a prestação, enquanto beneficia a outra com excessivo
lucro.
"Não o justifica uma apreciação subjetiva do desequilíbrio das prestações, porém
a ocorrência de um acontecimento extraordinário, que tenha operado a mutação do
ambiente objetivo, em tais termos que o cumprimento do contrato implique em si
mesmo e por si só, no enriquecimento de um e o empobrecimento do outro."
Por isso, acrescente-se a indagação de onde estaria o lucro excessivo da ré?
Pois ora, ainda o autor continuasse contribuindo para o grupo, a remuneração da
contestante é fixada em lei, no máximo 10% (dez por cento) a título de taxa de
administração.
Em conclusão, há outra restrição ao comportamento do autor. É que, conforme
antes noticiado, o autor sponte propria, simplesmente deixara de contribuir para
com o grupo, provocando, também unilateralmente, uma alteração no conteúdo
econômico do contrato, para, só depois, e já configurada a inadimplência,
insurgir-se contra os termos deste e recusar a prestação, quando se tem
conhecimento, porque princípio doutrinário comezinho, que:
"É igualmente necessário que o postulante não esteja incurso nas sanções por
inexecução. Mesmo em caso de extrema onerosidade, é vedado ao queixoso cessar
pagamento e proclamar diretamente a resolução." (in CAIO MAIOR, loc. ob. cit.).
3. A PORTARIA 190/89 A TRADUZIR LEGALIDADE E LICITUDE NO COMPORTAMENTO DA
CONTESTANTE, AFASTANDO A IDÉIA DE DEVEDORA
A portaria 190, de 27 de outubro de 1989 consolidou as normas pertinentes ao
sistema de consórcio, no seu item XIII, dispõe sobre a desistência, exclusão e
substituição do consorciado, a saber:
53.2 - "Os participantes que desistirem do consórcio ou que dele forem
excluídos, inclusive seus herdeiros ou sucessores, receberão de volta as
quantias já pagas, sem juros e sem correção monetária, dentro de 30 (trinta)
dias do encerramento das operações do grupo e acrescidas do saldo remanescente
no fundo comum e de reserva, proporcionalmente as contribuições recolhidas".
A legislação é clara ao dizer que aos desistentes cabe o recebimento das
quantias já pagas sem juros e sem correção monetária, mas não de forma
congelada, porque vêm acrescidas dos saldos existentes no fundo de reserva na
proporção das contribuições recolhidas.
A expressão, portanto, "sem juros e correção monetária", deriva não só do
contrato de adesão, como também das normas do Poder Público, e não também como
querem fazer crer o autor de simples vontade da administradora/ré.
Em conseqüência disso, portanto, não há como qualificar a ré como devedora,
porquanto seu comportamento não se afasta do que lhe determina a legislação,
seja no que respeita a sua sujeição passiva (porque a devolução é feita pelo
grupo), seja no que respeita a oportunidade para se operar a devolução (30 dias
após o encerramento das operações do grupo).
4. O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. SUA AUSÊNCIA NA HIPÓTESE DOS AUTOS
A afirmação de que a devolução das parcelas já pagas sem juros e correção
monetária geraria um enriquecimento sem causa por parte da ré, não merece
prosperar.
É que, em verdade, conforme determina a legislação, todos os recursos gerados
pelo grupo, através das contribuições mensais a cargo dos consorciados,
inclusive aquelas oriundas das aplicações no mercado aberto, quando então passam
a integrar o fundo de reserva, revertem em favor dele próprio, e não em
benefício da administradora, que, tem como remuneração, apenas a taxa de 10%
(dez por cento), calculada sobre a parcela mensal, nada mais.
Ora, se tanto as contribuições como os frutos por elas gerados, havidos em
decorrência das aplicações no mercado aberto, revertem em favor do próprio
grupo, posto que passam a integrar o respectivo fundo de reserva, não vê a
contestante como possa, ela, por seu ato, estar enriquecendo as custas do
empobrecimento do autor, uma vez que, dele, a exceção da taxa de administração,
nada recebeu em proveito próprio, pelo contrário, abatida tal taxa, tudo mais é
aproveitado pelo grupo.
Ademais, para a existência do enriquecimento sem causa e ilícito é preciso que o
prejudicado não tenha agido com culpa no transcorrer do contrato, quando se
sabe, que na espécie dos autos, a inadimplência partiu por vontade do autor.
5. A APURAÇÃO DOS PREJUÍZOS CAUSADOS PELO DESISTENTE NO CÁLCULO GERAL
Dispõe o parágrafo 2º, do artigo 53, do Código do Consumidor:
"§ 2º - Nos contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a
compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terá
descontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que
o desistente ou inadimplente causar ao grupo."
Em comentário ao artigo citado, Rita Vera Martins Fridman, in "O Consórcio e o
Código do Consumidor" 1ª Edição, Hermes Editora, p. 78, afirma que, verbis:
"... Ademais se preocupa com o consorciado desistente, permitindo que a
compensação pecuniária que a ele se faça seja abatida dos prejuízos que o mesmo
causar ao grupo. Isso equivale dizer que o legislador do CDC está atento à
proteção do interesse coletivo (grupo de consórcio) e de sua prevalência sobre o
interesse individual do consorciado. Sobejamente por todos conhecido o prejuízo
que a retirada de um consorciado desistente causa à coletividade de consumidores
integrantes do grupo de consórcio. A ruptura abrupta do contrato pelo desistente
rompe o elo que levou cada um a se unir, para formar poupança comunitária,
mediante autofinanciamento. A quebra desse elo indubitavelmente vem em
detrimento dos que permanecem no grupo, fiéis aos objetivos iniciais."
Não bastasse:
"Cabe salientar que tanto na análise gramatical quanto do espírito do art. 53 e
de seus parágrafos, hoje em vigor, se conclui que em lugar algum consta a
expressão correção monetária. Destarte, singela será a devolução a consorciado."
(Op. cit. p. 79).
Nesse sentido já se pronunciou o E. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, ao
decidir, verbis:
"CONSÓRCIO DE VEÍCULO - DESISTÊNCIA OU EXCLUSÃO DO CONSORCIADO - DEVOLUÇÃO COM
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA DAS QUANTIAS PAGAS - COM O ADVENTO DO CÓDIGO DE
PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR (LEI Nº 8.078, DE 11.09.90) O CONSORCIADO QUE
POR QUALQUER MOTIVO DESISTIR OU FOR EXCLUÍDO DO CONSÓRCIO TERÁ DIREITO À
DEVOLUÇÃO DAS QUANTIAS PAGAS COM JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA, DESCONTADOS TÃO
SOMENTE OS EVENTUAIS PREJUÍZOS QUE TIVER CAUSADO COM A SAÍDA DO GRUPO." (In,
Embargos Infringentes, nº 6.183-8/01, Rel. Des. Nunes do Nascimento, ac. 1713,
TJ/PR, 20.06.91).
Portanto quando da devolução das parcelas pagas pelo autor, deve-se, em primeiro
lugar, apurar o montante do prejuízo que este causou ao grupo face a sua
desistência.
6. A CIRCULAR 2196 DO BACEN
Entretanto, na pouco provável procedência do pedido, o que se admite apenas ad
argumentandum, não se pode olvidar da circular 2196 do BACEN, dispõe que a
devolução das quantias pagas pelos desistentes, no caso de participantes de
grupos vinculado ao preço do bem, deve ser feita aplicando-se o fator de
redução, inversamente proporcional ao percentual amortizado, ou seja:
PERCENTUAL AMORTIZADO REDUTOR
Até 40% 15%
Acima de 40% até 60% 10%
Acima de 60% até 80% 05%
Acima de 80% zero
7. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. MOMENTOS DA INCIDÊNCIA
Improcedente, também, a pretensão do autor, em receber as prestações já pagas,
corrigidas na proporção do valor do bem. Porquanto assim não dispõe a Súmula 35.
Por outro lado, ainda que fosse devida a correção monetária, na espécie dos
autos, essa deve ser aplicada sobre os valores já pagos, somente a partir do
ajuizamento da ação, conforme dispõe o parágrafo 2º, do artigo 1º, da Lei nº
6.899, de 08.04.81, que trata da aplicação da correção monetária nos débitos
oriundos de decisões judiciais, verbis:
"Art. 1º - A correção monetária incide sobre qualquer débito resultante de
decisão judicial, inclusive sobre custas e honorários advocatícios.
(...)
§ 2º - Nos demais casos, o cálculo far-se-á a partir do ajuizamento da ação."
Outro não é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ao decidir, verbis:
"CIVIL. CONSÓRCIOS. RETIRADA. DEVOLUÇÕES DAS PRESTAÇÕES PAGAS.
O consorciado que se retira do respectivo grupo, tem direito à restituição das
prestações pagas, com correção monetária, desde o ajuizamento da ação e juros a
partir da citação." (in, Recurso Especial, STJ, Rel. Ministro Dias Trindade,
Brasília - DF, 12.08.91).
Por outro lado, o cômputo dos juros da mora, nas obrigações ilíquidas, se faz a
partir da citação inicial, consoante dispõe o artigo 405 do Código Civil
Brasileiro:
"Art. 405. Contam-se os juros da mora desde a citação inicial."
Pacífico é, neste sentido, o entendimento jurisprudencial, ao decidir:
"Em se tratando de obrigação ilíquida, os juros da mora somente são devidos da
citação inicial para a liquidação e não da inicialmente feita para a causa."
(Ac. da Corte de Apelação de São Paulo, em 22 de novembro de 1935, na Rev. dos
Tribunais, vol. 100, pag. 202).
Assim, na pouco provável hipótese de procedência da ação, o que se admite apenas
para argumentar, há que se levar em conta que, para a espécie dos autos, os
juros haverão de ser computados apenas e tão somente a partir da citação, sob
pena de ofensa à lei, à doutrina e à jurisprudência dominantes. Ademais, deve
ser descontada, também, a quantia já recebida pelo autor, conforme confessado
nos autos.
8. DEDUÇÃO DA TAXA DE ADMINISTRAÇÃO
Finalmente, não se pode olvidar do desconto da taxa de administração devida à ré
pelo autor.
Ora, conforme entendimento unânime da jurisprudência, a taxa de administração
deve ser descontada do valor das parcelas, por se tratar de remuneração devida
ao administrador, que geriu os recursos do grupo, trabalhando em favor do autor.
Não pode obrigar a administradora a prestar seus serviços de forma graciosa sob
pena de, nessa hipótese, ficar caracterizado um enriquecimento ilícito por parte
do autor, que durante vários meses usufruiu dos serviços por ela prestados.
DOS PEDIDOS
Nestas condições, considerando todo o exposto, requer-se a Vossa Excelência, que
preliminarmente, se digne declarar extinto o processo sem julgamento do mérito,
seja pela falta de constituição em mora da ré, seja pela sua ilegitimidade
passiva, porquanto não se constitui em parte legítima para figurar no polo
passivo da ação, uma vez que contratou com o autor simples mandato, exercendo,
em face disso, funções de mera mandatária, em razão do que não pode ser
condenada a restituir aquilo que absolutamente não recebeu, já que todas as
verbas componentes da parcela, exceção feita à taxa de administração, revertem
em favor e a benefício do grupo, incluindo aí, também, os recursos advindos das
aplicações financeiras.
Na pouco provável hipótese de assim não entender Vossa Excelência, requer-se,
que, no mérito seja julgada improcedente a ação, condenando-se o autor aos ônus
da sucumbência e demais disposições legais aplicáveis à espécie.
Finalmente, para a instrução do feito, requer-se o depoimento pessoal do autor,
sob pena de confesso, e a juntada de novos documentos.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]