Ação cautelar inominada, com pedido liminar de depósito em juízo de valores referentes à empréstimo para aquisição de veículo, ante a variação da cotação do dólar, pugnando-se pela teoria da imprevisão.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
AÇÃO CAUTELAR INOMINADA COM PEDIDO LIMINAR
em face de
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., pelos motivos de fato e de direito a seguir
aduzidos.
DOS FATOS
Pretende o autor, pela presente ação, ver reconhecido o fato de que a recente
alteração na política de câmbio adotada pelo governo, liberando a flutuação do
Dólar, isto é, abandonando o chamado "sistema de baudas cambiais" significou,
como de fato significa, uma transformação nas bases do contrato firmado com a
requerida, .........., justificando, desta forma, a concessão de liminar para
que se autorize o depósito da parcela n. ... do contrato de financiamento,
vencida hoje, dia .... de ................. de ..............., para o fim de,
evitando os efeitos da mora, possibilitar o ingresso de ação ordinária onde se
revise as cláusulas do contrato, mormente a indenização do contrato em Dólar
norte-americano, conforme se demonstrará.
Com efeito, o autor firmou em ..../..../...., contrato de financiamento para
aquisição de veículo .......... ano de fabricação ......., modelo ......
Tendo-o adquirido pelo valor de R$ ................., pagou uma entrada de R$
............., e pactuou mútuo, junto ao agente financeiro da ........, .....
FACTORING, no valor de R$ ..........
Prefixados os juros, no valor de R$ .........., o empréstimo deveria ser
saldado, pelo pagamento do valor de R$ ................., ao final de ......
prestações fixas de R$ ...............
Ocorre que, firmado em ........., estipulou-se, como já de praxe em todos os
contratos firmados em nossa contumaz inflacionária economia, cláusula de escala
móvel, ou, cláusula de indexação.
Assim definido o valor do financiamento (R$ .................. = R$
............... + R$ ...............) e acordado o seu pagamento em .......
parcelas iguais, tais parcelas seriam, a título de acompanhamento real de
eventual oscilação do valor da moeda nacional, indexadas com base na variação de
cotação do Dólar norte-americano apurado no dia anterior ao do vencimento das
prestações.
Desta forma, dividiu-se o valor da prestação em reais - R$ ............., pela
cotação do Dólar na data do contrato - R$ ..........., fixou-se o valor da
prestação em dólares: US$ ................... ou US$ ..................... -
vide campo ... do contrato ou para que fique claro o sistema de indexação
utilizado, reproduzimos a cláusula de escala móvel pactuada:
"... - DA DETERMINAÇÃO DO VALOR DAS PARCELAS EM MOEDA CORRENTE NACIONAL O
CONTRATADO efetuará o pagamento do "Valor da Prestação em US$", discriminado no
quadro do campo ... diretamente a CONTRATANTE, pelo seu contravalor em moeda
corrente nacional, apurado de acordo com a taxa de venda do Dólar
norte-americano, informada pelo Banco Central do Brasil, através do ..... -
OPÇÃO .... - MOEDA ......., MERCADO LIVRE, para as operações efetuadas no dia
util imediatamente anterior às datas de vencimento das parcelas (a primeira e a
última delas lançadas nos quadros " ...' vencimento" e "último vencimento" do
campo ... e as demais com vencimento nos mesmos dias dos meses intermediários)
ou, em caso de atraso, para as operações efetuadas no dia útil imediatamente
anterior à data do efetivo vencimento.
0 contrato manteve-se razoavelmente eqüitativo durante o período compreendido
entre a primeira parcela cujo valor do principal foi de R$ ..............., e a
............... parcela no valor de R$ ....................., sofrendo,
portanto, um aumento de ...%, o que, muito embora já superior à inflação do
período, que foi de ...%, não chegou a assustar, (vide planilha de comparação da
variação do índice de inflação medido pela FGV e DIEESE e o Dólar.)"
Ocorre que, como cediço e amplamente noticiado, o executivo federal, no uso de
suas atribuições, e pelas razões econômicas por todos nós conhecidas, deliberou
por liberar a cotação do Dólar americano, deixando de intervir quando a cotação
superasse o teto do chamada "banda cambial". Com isso o Dólar disparou
alcançando, como se sabe, a cotação de R$ ............... para US$ ............
Resultado: o valor da prestação do mutuo, alcançou o valor de R$ ............,
(considerando-se a cotação de R$ ............- dia ..... de ...........) aumento
de .......%, muito superior à inflação verificada e mesmo maior que a mais
pessimista projeção de inflação para todo o ano de .........., que é de ....%.
Desta forma, a manutenção de sobredito sistema de indexação não resguarda o
valor da moeda de forma a manter o equilíbrio do contrato, mas sim, onera de
forma desproporcional o autor, uma vez que no lapso de trinta dias do vencimento
da ...... para o vencimento da ....... parcela verificou-se, em virtude da
cláusula em Dólar, um aumento de .......% (que ainda poderá ser maior) no valor
da prestação, ao passo que nossa inflação está longe deste patamar. Ademais,
conforme planilha elaborada pela própria requerida - doc. ...., projetando-se o
valor atual R$ ............, para as próximas ...... parcelas, tem-se que, ao
final das ...... parcelas, 0 AUTOR TERÁ PAGO UM TOTAL APROXIMADO DE R$
..............., que é quase o dobro do valor tomado de empréstimo R$
............
DO DIREITO
Como já exposto, a cláusula cuja revisão se pretende, teria por finalidade fazer
acompanhar qualquer oscilação nos índices de inflação de nossa economia. Ocorre
que, devido a nova conjuntura econômica mundial, em que a especulação financeira
toma conta de todos os mercados, a cotação do Dólar, mais do que parâmetro de
variação do índice de inflação, está no centro de uma batalha financeira entre
mercados, oscilando segundo os interesses e estratégias do setor privado e
políticas econômicas governamentais, indo, pois, além do simplório objetivo com
que foi concebida no contrato ora em análise, isto é, de servir de índice de
atualização monetária.
Assim, sendo claro e evidente que a cotação do Dólar, diante dos acontecimentos
econômicos recentes, não está a refletir a inflação de nossa economia, mas sim,
flutuando como nunca segundo interesses financeiros privados e públicos,
nacionais e estrangeiros, resta patente que em face destas novas circunstâncias
a cláusula de escala móvel pactuada não está em consonância com sua finalidade.
Discorrendo sobre o tema o eminente GUSTAVO TEPEDINO acentua que " O Estado, com
as vestes de interventor direto e constante nos negócios interprivados, não pode
se eximir das responsabilidades de seus atos sobre os resultados dos negócios.
Daí a necessidade, em contrapartida, de um entendimento da teoria dos contratos
que não coloque o Poder judiciário a mercê de estreito ditame dos acordos
negociais desestabilisados como são, a todo instante, por leis, decreto,
resoluções indexações e desindexações que transformam a cada momento as
circunstancias e a finalidade inicial almejada pelas artes. ",
De fato a conjuntura econômica levou ao Estado/executivo a modificar a política
econômica, liberando a cotação do Dólar, transformando, portanto, as
circunstâncias em que fora estipulada a cláusula em análise. Como supra-apontado
- e demonstrado pela planilha fornecida pela requerida, tal atuação do executivo
repercutiu no contrato firmado entre autor e requerido, desestabilizando-o uma
vez que houve um acréscimo no valor da prestação que ultrapassa os fins da
cláusula de indexação, haja visto superar em muito a inflação ocorrida. A
contrapartida que espera o cidadão, em respeito de o seu direito a uma ordem
econômica justa - art.180 da CF. 88, é a atuação do estado/judiciário,
intervindo na relação privada para realinhá-la à "finalidade inicial almejada
pela partes". No caso espera-se, pois, seja revista sobredita cláusula,
substituindo o sistema de indexação em Dólar norte-americano, por outro que não
represente para uma das partes - requerida - enriquecimento sem causa, e para
outra - autor - um ônus desproporcional.
Quanto à teoria da imprevisão:
"RESP - COMERCIAL - CONTRATO - A prestação contratual, em havendo expressão
econômica, deve mantê-la durante a avença, caso contrário, haverá enriquecimento
ilícito para uma das partes. Leis subseqüentes à avença, visando a conservar o
valor, devem ser levadas em consideração. O "pacta sunt servanda" deve ser
compatibilizado com a cláusula "rebus sic stantibus". (RESP 12S307/MG, Ministro
LU1Z VlCENTE CERNICCHIARO, 23/03/98)
0 Código de Consumidor em seu artigo 6,V, sensível a nova realidade dos
contratos de massa, prevê o direito à "modificação das cláusulas contratuais que
estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos
supervenientes que as tornem excessivamente onerosas".
Valemo-nos mais uma vez da lição do Doutor Gustavo Tepedino, in Temas de Direito
Civil - Efeitos da Crise Econômica na Execução dos Contratos, Renovar, p.107.:
"A reintrodução da Teoria da Imprevisão e a revisão dos contratos, princípio
derivado da cláusula rebus sic standibus e sepultado no liberalismo, torna-se
essencial diante da escalada inflacionária, dos sucessivos planos econômicos e
da contínua intervenção estatal nos contratos.
A revisão contratual torna-se assim, no âmbito das relações de consumo,
instrumento importante de intervenção do juiz na realidade contratual, evitando
que as situações de crise econômica inesperadas possa levar o devedor ao
inadimplemento, quando não à insolvência.
Para tanto, deve-se fazer uso dos princípios gerais do ordenamento, coibindo o
enriquecimento sem causa, o abuso do direito, a má-fé dos contratantes, a
excessiva onerosidade das prestações, como forma de temperar o dano normativo,
revisitando-o na medida em que se transforma o cenário econômico e a realidade
social."
O direito que sustenta o presente pedido cautelar, está, como já exposto, no
fato de que a cláusula cuja finalidade seria só e simplesmente manter o valor
real das prestações, prevenindo os efeitos maléficos, para o credor, de uma
desvalorização da moeda decorrente de processo inflacionário, acabou por
transformar-se em fonte de enriquecimento sem causa, haja vista que, do momento
da contratação até o presente momento, pagas ... prestações, já apurou-se um
acréscimo na proporção de .......%, ao passo que a inflação do período não
alcança ...%. Assim, deturpada a cláusula ...a, em virtude de resultado diverso
daquele para o qual foi concebida, faz-se presente e premente o direito do
consumidor/autor à sua revisão.
0 risco de dano iminente, se faz presente na medida em que, mesmo que se
considere baixo o valor, correspondente à diferença entre o que se pagaria sem a
concessão da presente medida e aquele que se vai depositar, se deferida, a
liminar, tal diferença (R$ .............. por mês) repercute negativamente no
orçamento familiar do autor, de tal forma que causa-lhe, efetivamente, um dano.
Ademais, estando claro o direito posto em questão, é de aplicar-se a clássica
fórmula segundo a qual a necessidade de servir-se do processo para obter a
satisfação de um direito não deve reverter a dano de quem não pode ter seu
direito satisfeito senão mediante o processo (Chiovenda).
in A Reforma do Código de Processo Civil, Candido R. Dinamarco, p. 145, 2º ed.,
Malheiros.
Presente a necessidade de evitar-se os efeitos da mora, ante a concorrência. do
"fumus boni juris" e do "periculum in mora", cabe ao final, apenas demonstrar a
licitude e pertinência do depósito das prestações contratuais via cautelar
inominada para aquele fim.
Nesse sentido, já decidiu o E. Tribunal de Alçada do Paraná, bem como o Superior
Tribunal de Justiça:
" Medida Cautelar - Depósito - Admite-se a ação cautelar para depósito em Juízo
de tributo questionado pelo contribuinte. Afinal, basta a possibilidade de
execução fiscal ou o complexo e demorado processo de repetição de indébito para
ficarem caracterizados o periculum in mora. Além disso, o fumus boni juris se
satisfaz com a razoabilidade e plausibilidade da tese jurídica esposada pelo
requerente" ( STJ - Resp.19.679-0/SP - 1' Turma - Rel. Min. Demócrito Reinaldo -
j.18.5.9Z)
DOS PEDIDOS
Em face do exposto, pede, respeitosamente, a Vossa Excelência:
Receba a presente como medida cautelar preparatória de ação ordinária cujo
objeto será a revisão da cláusula ... do contrato de financiamento firmado entre
autor e requerida.
Reconheça, em face do artigo 6º, inciso VII, do CDC a competência deste juízo
para o conhecimento da ação principal a ser proposta - art. 800 do CPC.
Conceda liminar, inaudita altera pars, para o fim de permitir o depósito
judicial da ....... prestação, vencida hoje dia ..... de ......... de ........,
bem como das vincendas, nos mesmos valores de ......... de .......... (R$
......... - cotação ........), acrescendo-se apenas a correção monetária pela
média do IGP/INPC, e demais encargos contratuais; evitando-se, assim, os efeitos
da. mora e ressalvando que este valor será objeto de revisão na ação ordinária.
A citação da requerida, por via postal, no endereço indicado, para, contestar,
julgue ao final procedente o presente pedido, condenando a requerida ao
pagamento da custas e honorários de sucumbência.
Requer, ainda, a produção de todos os meios de prova em direito admitidos.
Dá-se à causa o valor de R$ ......
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]