MEIO AMBIENTE - ÁGUA - RECURSOS HÍDRICOS - ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL -
IMPUGNAÇÃO À CONTESTAÇÃO
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ........ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE
...................... - ...........
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA ............., por seu agente signatário,
nos autos da AÇÃO CIVIL PÚBLICA que move contra o
..................................., tombado sob nº.............., em vista da
manifestação do demandado (fls. 202 a 207), documentos acostados (fls. 208 usque
217), vem ante V. Exa. para dizer e requerer o quanto segue:
Que improcedem as alegações lançadas pelo demandado, em sua manifestação, que,
antes de contestar, buscou mesmo a regularização da exploração das águas
interiores continentais, circunscritas na APA das Lagoas e Dunas do
.............
Embora tenha conseguido a outorga do SRH, esta, é condicionada a licença prévia
do CEPRAM em consonância com art. 99, inciso XIII, parágrafo 2º e 3º, c/c
art.100 do Regulamento da Lei nº3.858 de 3 de novembro de 1980, que instituiu O
Sistema Estadual de Administração de Recursos Ambientais. É conclusivo no
sentido de que a licença está apenas parcialmente regular, deixando entrever,
ainda, irregularidades, mormente documentos que comprovem que a outorga foi
precedida dos estudos adredes, definidos na legislação.
Evidencia-se, pois, não ser suficiente a apresentação da outorga e argumentos
apresentados a guisa de defesa. Impõe-se que se efetive laudo técnico,
referentemente a todo o complexo subsumido a APA das Lagoas e Dunas do ........,
para fins de resguardar-se o meio ambiente de danos que venham eventualmente
abalar a estrutura do ecossistemas, apresentando projeto de conservação e
melhoria do ambiente. Ademais o SRH não adotou o princípio que a doutrina
costuma chamar de princípio do usuário-pagador fixando o valor a ser cobrado
pelo uso da água, e que visa a atender três objetivos: 1) reconhecer o valor
econômico da água e dar ao usuário indicação de seu valor real; 2) incentivar a
racionalização de seu uso e 3) obter recursos para financiamento de programas
ligados ao setor.
A dinâmica desses estudos faz-se necessária, pois decorre de imperativo legal
que declara: a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico,
submetido, por isso, ao gerenciamento quanto ao seu uso. É justa, pois a ré
beneficia-se gratuitamente, há mais de 20 anos, de mananciais protegidos e de
tênue capacidade de recuperação, sem envidar uma política racional de uso e
compensação aos eventuais danos causados ao ecossistema.
DA CAUSA DE PEDIR E SEUS CONSECTÁRIOS:
O demandante afirma que "o pedido do Ministério Público se refere apenas a
falta de outorga para retirada e uso a água, e que este em momento algum buscou
priorizar a defesa do meio ambiente... com a outorga superveniente esvaziou-se a
razão de ser de qualquer ato de poder, pois perecido a causa da ação..."
Porém, do cotejo das peças de instrução do inquérito civil público que também
acompanham a inicial desta ação, e do próprio pedido, infere-se que a busca
maior é obstaculizar o impacto degradante sobre a Lagoa do Abaeté, Lagoa de
Pesquila, e todo ecossistema contido na Área de Preservação Ambiental, que vem
sendo devastada constantemente, pelas ações danosas, conforme foi mensurado em
estudo concludente, afirmando que a captação de água do lençol freático da lagoa
Pesquila, pelos poços da demandante, ocasionou grave lesão ao meio ambiente.
Neste sentido, o Laudo de Inspeção fornecido pelo CRA acostado às fls. 33 a 37
constata que:
" O nível da lagoa do Abaeté está baixando continuamente nos últimos anos, que
este sintoma é sentido com maior nitidez nas épocas de pouca ou nenhuma
chuva..."
"A extração de água dos poços tubulares e cisternas do Hotel ............,
Loteamento ..........., ................., entre outros, podem estar rebaixando
lentamente o nível hidrostático das áreas circunvizinhas."
"As evidências demonstradas no trabalho de Avanzo, Paulo E, 1988, nos leva a
crer que TANTO AS ÁGUAS DA LAGOA DO ........., COMO A CAPTADA PELOS POÇOS DO
HOTEL ................ PERTENCEM A UM MESMO LENÇOL FREÁTICO."
O Relatório dos Estudos de Revisão do Zoneamento da APA das Lagoas e Dunas de
......., elaborado pela ................. e pelo .............. conclui, em
relação ao Hotel ..............:
" Localizado na porção sudeste da área, caracteriza um empreendimento hoteleiro
5 estrelas, incluso nos limites da APA. Apresente índices de ocupação baixos,
porém possui um campo de golfe sobre a área das dunas, que promoveu uma intensa
descaracterização do ambiente, com aterro de área úmidas (brejos e alagadiços),
além de alterar a permeabilidade natural de um campo de dunas, principal recarga
de mananciais hídricos subterrâneos.
O Laudo do CRA traz a constatação inexorável : Em fls. 14/16, o Gerente de
Avaliação e Controle do CRA, MIGUEL ANGEL LOBO AZCONA, afirma que:
" .... o nível da lagoa do ......... está baixando continuamente nos últimos
anos... que a extração de água dos poços tubulares e cisternas do Hotel
.................., Loteamento Jardim ............, ............, entre outros,
podem estar rebaixando lentamente o nível hidrostático das áreas
circunvizinhas... tanto as águas da lagoa do .........., como a captada pelos
poços do Hotel ............... pertencem a um mesmo lençol freático... Em
contato com o Sr. ............ Gerente de Manutenção do Hotel ............ foi
certificado que o referido hotel utiliza consumo mínimo de água fornecida pela
Embasa, o que nos leva a crer que a maior parte da água consumida pelo hotel
provem dos poços tubulares... Em contato com o Dr. ................, Coordenador
adjunto do CRH, nos foi certificado que o referido hotel não tem outorga de água
para os poços tubulares, estando desta forma captando água ilegalmente.
O relatório síntese dos Estudos de Revisão do Zoneamento da APA das Lagoas e
Dunas de ............, promovido pela CONDER às fls. 57/95, informa que:
" ... c) Hotel .......... - Localizado na poção Sudeste da área, caracteriza um
empreendimento hoteleiro 5 estrelas, incluso nos limites da APA. Apresenta
índices de ocupação (Io) baixos, porém possui um campo de golfe sobre área de
dunas, que promoveu uma intensa descaracterização do ambiente, com aterro de
áreas úmidas (brejos/ alagadiços), além de alterar a permeabilidade natural de
um campo de dunas, principal recarga de mananciais hídricos subterrâneos."
O Decreto n. 6.295/97:
art. 6o - As outorgas serão dispensadas quando o uso da água se destinar às
primeiras necessidades da vida ou as derivações de água forem feitas de pequenos
reservatórios, cisternas, poços rasos, cravados ou tipo "Amazonas", desde que
atendam às seguintes condições:
I - vazões máximas de 0,5l/s (zero vírgula cinco litros por segundo);
II - volumes máximos acumulados em reservatórios de 200.000m3 (duzentos mil
metros cúbicos).
Assim restou evidenciado que o Hotel ............... construiu 6 poços que
utilizam recursos hídricos, e que embora com a superveniente outorga de direito
de uso, este se apresenta dissociado do licenciamento ambiental competente, que
o isente de ser causador de dano indireto a Unidade de Conservação do Sistema de
Lagoas e Dunas do ..............., com a descaracterização do ambiente, aterro
de áreas úmidas (brejos/ alagadiços), além de alterar a permeabilidade natural
de um campo de dunas, principal recarga de mananciais hídricos subterrâneos.
A IMPORTÂNCIA DA MANUTENÇÃO DA LIMINAR
In casu, é irrecusável o fumus boni iuris, vez que a prática imputada ao réu é
flagrantemente ilegal por afrontar dispositivos legais e constitucionais
configuradores de especial proteção ao Meio Ambiente.
Quanto ao periculum in mora, tem-se a dizer que há o risco de lesões
irreparáveis ao meio ambiente, aqui representado pela possibilidade de, em sendo
suspensa a medida liminar concedida, a lesão ambiental atinja proporções
tamanhas que não se torne possível sua tutela por ocasião da prolação da
sentença.
Com efeito, no caso presente, há violação de determinação legal de ordem
pública, com grave lesão ao meio ambiente, bem de uso comum do povo e essencial
à sadia qualidade de vida, provada e demonstrada nos autos, a merecer a devida
apreciação pelo Poder Judiciário, sob pena de premiação ao infrator e estímulo à
impunidade, vez que se o réu voltar a captar água do lençol subterrâneo contido
na APA, o que certamente acarretará dano ambiental a todo Sistema de Lagoas e
Dunas do .............., vez que as multi-citadas lagoas integram este sistema,
e está correndo o risco de total secamento.
A respeito, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, em Código de Processo
Civil Comentado, RT, SP, 1997:
" Obra autorizada por prefeitura. As normas de proteção ambiental da lei nº
69381/81 podem chocar-se com as posturas municipais. Mesmo que a obra tenha sido
autorizada pelo poder público, se houver ameaça de dano ambiental, justifica-se
a concessão de medida liminar, para suspender a realização da obra (RT 618/68)."
Com relação a tutela cautelar prevista no art. 12 da Lei 7347/85, assim
posiciona-se Rodolfo de Camargo Mancuso:
" É preciso não esquecer que estamos em sede de proteção a interesses difusos,
não inter-subjetivos, sendo assim, o que interessa é evitar o dano, até porque o
sucedâneo da reparação pecuniária não tem o condão de restituir o status quo
anterior.... Não precisa de explicações, o dano é muitas vezes irreparável,
principalmente no meio ambiente e no patrimônio cultural".
E continua:
" Ora, os interesses difusos, por isso que são referíveis a um conjunto
indeterminado ou dificilmente determinável de sujeitos, contrapõem-se
fundamentalmente a esse esquema tradicional, visto que a tutela não pode mais
ter por base a titularidade, mas a relevância, em si, do interesse, isto é, o
fato de sua relevância social. (...) Altera-se, assim, fundamentalmente, o
esquema tradicional: a relevância jurídica do interesse não mais advém de sua
afetação a um titular determinado, mas, ao contrário, do fato de que esse
interesse concerne a uma pluralidade de sujeitos."
Além disso, os elementos que integram a causa de pedir, quais sejam, os fatos e
os fundamentos jurídicos do pedido, estão plenamente evidenciados na petição de
fls. 03 a 17.
Diante desta consideração, concessa venia, não há como - por ora - revogar a
medida liminar outrora concedida. Porque não é a regularização formal que vai
garantir a segurança do Ecossistema, compreendido pelas Lagoas e Dunas do
Abaeté, mas a construção de estudo sistematizando a utilização ordenada dos
recursos naturais, através de critérios que assegurem a sua renovabilidade ou
seu uso continuado, até então não efetivado. E, relativamente a este, ainda não
há qualquer dado, de vez que - como salientado - houve omissão das condições
adredes no processo de regularização.
Ex positis, requer o MINISTÉRIO PÚBLICO, por seu agente signatário:
Seja indeferido o pedido de sustação da medida liminar, mantendo-se-a em vigor
até que seja realizada perícia sobre as condições especificadas na norma legal;
b) Seja deferida a realização de prova pericial, consistente em exame, de todo o
complexo que compõe a APA das Lagoas ..........., ex vi do disposto nos arts.
420 e seguintes, do CPC;
c) Seja determinado que o SRH, junte os estudos realizados e utilizados como
substrato à outorga, documento de fls. 209.
Nestes Termos,
Pede Deferimento.
..............., .......... de ......... de ..........
...........................................................................
Promotoria de Justiça do Meio Ambiente