Contra-razões de apelação em ação civil pública decorrente de poluição sonora.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CÍVEL DA COMARCA DE ....., ESTADO
DO .....
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA ................... , com o endereço na Rua
..................., nº ......., ..................., ..................., pelo
Promotor de Justiça que a esta subscreve, nos autos nº ............. movida por
este Parquet contra a ..................., vem mui respeitosamente, perante
Vossa Excelência apresentar.
CONTRA-RAZÕES DE APELAÇÃO
e, após o cumprimento das formalidades legais, sejam os autos remetidos ao
Egrégio Tribunal de Justiça, para o devido exame da matéria.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ....
ORIGEM: Autos sob n.º .... - ....ª Vara Cível da Comarca de ....
Apelante: ....
Apelados: .... e outros
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA ................... , com o endereço na Rua
..................., nº ......., ..................., ..................., pelo
Promotor de Justiça que a esta subscreve, nos autos nº ............. movida por
este Parquet contra a ..................., vem mui respeitosamente, perante
Vossa Excelência apresentar
CONTRA-RAZÕES DE APELAÇÃO
pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
CONTRA-RAZÕES
Colenda Corte
Eméritos julgadores
PRELIMINARMENTE
1.DA LEGITIMIDADE
Alega inicialmente a ré a ilegitimidade ativa do Ministério Público, vez que não
é toda a comunidade que está incomodada com os níveis sonoros emitidos nos seus
cultos religiosos.
Inobstante, a presente ação civil pública foi proposta após veementes protestos
encaminhados ao Ministério Público pelos moradores das adjacências da Igreja,
conforme depoimentos no inquérito civil nº ........, por estar realizando cultos
com produção de ruídos acima dos limites legais e suportáveis pelo ser humano,
sem dispor do necessário tratamento acústico, causando poluição sonora e
colocando em risco a saúde física e psíquica de indeterminado número de famílias
que ali residem.
Acontece que ao Ministério Público, na condição de Curador do Meio Ambiente,
incumbe o dever de garantir o direito "ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida",
pugnando, para sua efetividade, pelo controle da produção, comercialização e o
emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a
qualidade de vida e o meio ambiente (artigo 225, caput e parágrafo 1º, inciso V,
da Constituição Federal).
É que enquanto instituição permanente, essencial à função jurisdicional do
Estado, incumbida da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis (artigo 127, caput, da Carta
Magna), ao Ministério Público cabe a função institucional, na condição de
substituto processual da coletividade e da sociedade, de promover o inquérito
civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do
meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (artigo 129, caput,
inciso III, da Lei Maior).
Atualmente, a Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, que institui a Lei
Orgânica Nacional do Ministério Público, dispondo sobre normas gerais para a
organização do Ministério Público dos Estados, em seu artigo 25, inciso IV,
alínea "a", amplia a legitimidade do Ministério Público, acrescentando a defesa
dos interesses individuais indisponíveis e homogêneos, in verbis:
"Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na
Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:
"IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:
"a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente,
ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico,
turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais
indisponíveis e homogêneos."
O eminente Hugo Nigro Mazzilli, cuidando distinção conceitual entre os
interesses coletivos e difusos, analisa uma das características marcantes destes
últimos, qual seja, a indeterminalidade relativa dos sujeitos destes direitos:
"Contudo, mesmo dentro desta categoria intermediária, foi possível estabelecer
uma distinção entre entre os interesses que atingem uma categoria determinada de
pessoas (ou, pelo menos, determinável) os que atingem um grupo indeterminado de
pessoas (ou de difícil determinação). Assim, os condôminos, os sócios, os
atletas e os empregados que acima foram mencionados, todos eles sõa determinados
ou possíveis de determinar, à vista da certidão imobiliária, dos estatutos, dos
registros cabíveis. Interesses há, entretanto, que são comuns a toda uma
categoria de pessoas; não obstante não se pode determinar com precisão quais
indivíduos que se encontram concretamente por eles unidos. É o que ocorre com a
situação variável dos moradores de uma região, dos consumidores de um produto,
dos turistas que frequentam periodicamente um local de veraneio. Convencionou-se
chamar estes últimos de interesses difusos, porque, além de transindividuais,
dizem respeito a titulares dispersos na coletividade.
Por difuso se quer, portanto, entender o interesse de um grupo, ou de grupos de
pessoas, entre as quais não há um vínculo jurídico ou fático muito preciso,
constituindo-se um grupo de certa forma menos determinado de pessoas. Aliás, os
mais autênticos interesses difusos - o exemplo, por excelência, é do MEIO
AMBIENTE - não podem deixar de ser incluídos como pertencentes, lato sensu, à
categoria do interesse público." (Mazzilli, Hugo Nigro, em A Defesa dos
Interesses Difusos em Juízo, RT, 2ª Edição, p.18)
Por sua vez, Nelson Nery Junior, citado por Celso Fiorillo, em sua obra Direito
Ambiental e Patrimônio Genético, p. 48, afirma:
"Qualquer pretensão que se deduza em juízo buscando reparação por dano causado
ao meio ambiente será difusa, pois se trata de direito cujo objeto é
indivisível, sendo que os titulares deste direito são indetermináveis e ligados
por circunstâncias de fato."
Também o voto do Ministro Ruy Rosado de Aguiar, no Recurso Especial nº 97.684 -
SP, publicado pela Revista do Superior Tribunal de Justiça, Brasília, junho de
1997, pg. 67, é salutar:
" .. Trata-se de interesse difuso, assim como definido no art 81, inciso I da
Lei 8.078/90 (interesse transindividual, de natureza indivisível, de que sejam
titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato), onde
estão presentes as características acentuadas por Kazo Watanabe: indeterminação
dos titulares, inexistência entre eles de relação jurídica-base, no aspecto
subjetivo, e indivisibilidade do bem jurídico, no aspecto objetivo. Por isso ,
não interessa para o deslinde da questão a quantidade de pessoas que tenham
reclamado do dano (pode ser que nenhum manifeste sua contrariedade, por um
motivo ou outro), pois o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é
bem de uso comum que se impõe ao Estado defender e preservar (art. 225 CF). No
âmbito do Judiciário, a lei outorgou também ao Ministério Público, entre outras
entidades e instituições, o exercício desse dever, e a Constituição consagrou
como uma de suas funções promover a ação civil pública para a proteção do meio
ambiente... Limitar o espaço do Ministério Público na defesa de interesses
difusos e coletivos, - e mesmo individuais, quando homogêneos ou de pessoas
desprotegidas, como das crianças e adolescentes, - desatende às normas
constitucionais e legais que expressaram claramente essa tendência e
significaria - na grande maioria dos casos - praticamente deixar no abandono a
proteção judicial desses interesses."
Conforme acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, o Ministério Público tem
legitimidade para atuar, na hipótese de poluição sonora:
"A regra do art. 129, III, da CF, impõe ao Ministério Público o dever de
atuação, outorgando-lhe legitimidade ativa para promover a proteção do interesse
difuso, do interesse coletivo e demais interesses apontados na norma, referentes
ao patrimônio público e social. A poluição sonora é agressão ao meio ambiente, o
agressor atinge direito difuso e, igualmente, a interesse coletivo dos
vizinhos." (TJSP - Ap. 162.628-1/3 (reexame) - 6ª C. - j. 2.4.92 - rel. Des.
Melo Colombi).
E, explicitando:
"Conforme bem ponderou o ilustre Procurador de Justiça oficiante, a poluição
sonora ofende o meio ambiente, afetando o interesse difuso e coletivo, à medida
em que os níveis excessivos de sons e ruídos causem deterioração na qualidade de
vida, com malefícios à saúde, quando acima dos limites suportáveis pelo ouvido
humano ou prejudiciais ao repouso noturno e ao sossego público, em especial, nos
grandes centros urbanos." (grifos nossos)
Assim, nos perece não restar dúvidas quanto à legitimidade do Ministério Público
para funcionar como substituto processual no feito.
2. DA NULIDADE DO PROCESSO
Alega ainda a apelante a nulidade do processo por falta de comunicação prévia da
perícia realizada pela Fundação José Silveira, conforme ficou estabelecido em
audiência.
Acontece que os laudos apresentados pela Fundação José Silveira tratam de prova
documental colhida durante o inquérito civil, e não de prova pericial, com
quesitos, assistentes técnicos etc.
No caso, uma perícia judicial poderia no máximo tratar sobre a verificação do
condicionamento acústico do local, para informar se o local permite ou não o uso
de instrumentos elétricos.
Seria absurdo, Eminentes Desembargadores, comunicar com antecedência ao poluidor
sonoro dia e hora da perícia, simplesmente porque este evitaria provocar ruídos
excessivos naquele momento. Isto equivaleria, guardadas as devidas proporções, a
avisar a um assaltante de banco que no dia x e hora y o policiamento vai ser
ostensivo no local, evidente que ele escolheria outra data para praticar o
ilícito.
Além do mais, o Nobre Magistrado, em fls.112, fundamenta a sua decisão não
apenas no laudo de fls. 69, mas nos vários laudos elaborados pela respeitável
Fundação José Silveira, bem como nos depoimentos testemunhais colhidos em juízo
e no inquérito civil.
Nos cumpre salientar que durante a vigência da decisão liminar que determinou à
apelante a obrigação de não poderia utilizar instrumentos elétricos capazes de
provocar ruídos acima do permitido em lei, a apelante continuou a produzir
ruídos em desacordo com a decisão liminar.
No caso do laudo colhido na fase inquisitorial não se pode falar em o princípio
do contraditório e da ampla defesa, pois o inquérito é um procedimento
administrativo destinado à colheita de elementos para eventual e futura
propositura responsável da ACP, evitando-se o ajuizamento de ação temerária (Milaré,
ACP, 18). Como não é processo administrativo, não há contraditório no IC ( cf.
Nery, Princ.:20,127/128; Mazzilli, Int.Dif : 377).
DO MÉRITO
A Constituição Federal em seu artigo 225 dispõe que todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
A Lei Federal nº 6.938, que dispõe sobre a política nacional do meio ambiente,
determina que:
Art. 6º...
§ 1º .Os Estados, na esfera de suas competências e nas áreas de sua jurisdição,
elaborarão normas supletivas e complementares e padrões relacionados com o meio
ambiente, observados os que forem estabelecidos pelo CONAMA.
§ 2º - Os Municípios, observadas as normas e os padrões federais e estaduais,
também poderão elaborar as normas mencionadas no parágrafo anterior.
O CONAMA, por sua vez, através da Resolução nº 001, de 08 de março de 1990
dispõe:
O CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE - CONAMA , no uso das atribuições que lhe
confere o inciso I, do § 2º, do art. 8º, do seu Regimento Interno, o art. 10 da
Lei 7.804 de 18 de julho de 1989 e, Considerando que os problemas dos níveis
excessivos de ruído estão incluídos entre os sujeitos ao Controle da Poluição de
Meio Ambiente;
Considerando que a deterioração da qualidade de vida, causada pela poluição,
está sendo continuamente agravada nos grandes centros urbanos;
Considerando que os critérios e padrões deverão ser abrangentes e de forma a
permitir fácil aplicação em todo o território Nacional, RESOLVE:
I - A emissão de ruídos, em decorrência de quaisquer atividades industriais,
comerciais, sociais ou recreativas, inclusive as de propaganda política,
obedecerá, no interesse da saúde, do sossego público, aos padrões, critérios e
diretrizes estabelecidos nesta Resolução.
II - São prejudiciais à saúde e ao sossego público, para fins do item anterior
os ruídos com níveis superiores aos considerados aceitáveis pela norma NBR 10152
- Avaliação do Ruído em áreas Habitadas visando o conforto da comunidade, da
Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT.
VI - Para efeitos desta Resolução, as medições deverão ser efetuadas de acordo
com a NBR 10151 - Avaliação do Ruído em Áreas Habitadas visando o conforto da
comunidade, da ABTN.
A Tabela 1 da NBR 10152 /87, por sua vez, estabelece:
Locais dB(A)
Hospitais Apartamentos, Enfermarias, Berçários, Centro Cirúrgicos Laboratórios,
Áreas para uso do público Serviços 35-4540-5045-55
Escolas Bibliotecas, Sala de música, Salas de desenho Salas de aula,
Laboratórios Circulação 35-4540-5045-55
Hotéis Apartamentos Restaurantes, Salas de Estar Portaria, Recepção, Circulação
35-4540-5045-55
Auditórios Salas de concertos, Teatros Salas de conferências, Cinemas, Salas de
uso múltiplo 30-4035-45
Restaurantes 40-50
Escritórios Salas de reunião Salas de gerência, Salas de projetos e de
administração Salas de computadores Salas de mecanografia 30-4035-4545-6550-60
Igrejas e Templos 40-50
Locais para esporte- pavilhões para espetáculos e atividades esportivas 40-55
Por outro lado, nos termos do art. 60 da Lei Federal nº 9.605 de 12 de fevereiro
de 1998 (Código Penal Ambiental) constitui crime ambiental fazer funcionar
estabelecimentos potencialmente poluidores contrariando as normas legais e
regulamentares pertinentes.
As conseqüências do ruído exagerado estão ligadas a dois fatores: ao volume de
som, que tem nos decibéis a unidade de medida, e ao tempo de exposição aos seus
efeitos, por exemplo: uma exposição de 6 a 8 horas a até 65 dB é moderadamente
incômoda; entre 66 a 75 dB o ruído é desconfortável, ocasionando já
indisposições e diminuição temporária da audição; de 76 a 85 dB o barulho é
considerado neurotizante, provocando disfunções orgânicas; acima de 85 dB grande
é o perigo, com efeitos irreversíveis, podendo causar surdez gradual, fadiga,
agressividade, stress, dificuldade de concentração, graves distúrbios funcionais
e até mesmo neurose. Um ruído acima de 130 dB provoca dor, e pode ocasionar a
destruição do tímpano e a surdez imediata.
Assim, a poluição sonora, seja ela proveniente de música popular ou religiosa,
produz conseqüências danosas à saúde, submetendo suas vítimas a problemas de
saúde tais como taquicardia, contração dos vasos sangüíneos, elevação da pressão
e aumento do fluxo cerebral.
Se o som for perturbador, o incômodo pode ser evitado com o devido tratamento
acústico, através da utilização de revestimentos e aparelhos de isolação sônica,
ou mesmo como a ré já vem fazendo, não utilizando instrumentos elétricos. Seja
lá qual for a natureza dos incômodos, sempre existirão meios técnicos para
evitá-los.
DOS PEDIDOS
Ex positis, esta promotoria espera pelo improvimento do presente recurso de
apelo, para manter a r. sentença de 1ª instância.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura]