Impetração de mandado de segurança com pedido de
concessão de liminar, objetivando a isenção de recolhimento antecipado de
ICMS.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA .... VARA DA FAZENDA PÚBLICA, FALÊNCIAS E
CONCORDATAS DA COMARCA DE ....
....., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ....., com
sede na Rua ....., n.º ....., Bairro ......, Cidade ....., Estado ....., CEP
....., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). .....,
brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador (a) do
CIRG nº ..... e do CPF n.º ....., por intermédio de seu advogado (a) e bastante
procurador (a) (procuração em anexo - doc. 01), com escritório profissional sito
à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe
notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa
Excelência propor
MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE CONCESSÃO DE LIMINAR
em face de
ato iminente a ser praticado pelos Senhores .... e .... - ....ª Delegacia da
Receita, ou pelas pessoas que suas vezes estiveram fazendo, podendo a primeira
Autoridade ser encontrada na Rua .... nº ...., na Comarca de ....; e a segunda
Autoridade na Rua .... nº ...., na Comarca de ...., com suporte no artigo 5º,
inciso LXIX da Constituição Federal de 1988 e na Lei nº 1.533 de 31.12.51, pelos
motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
1. DA LEGITIMAÇÃO PARA O "WRIT"
A Impetrante tem interesse processual e é parte legítima para invocar a tutela
jurisdicional do Estado porque, sendo sujeito passivo da relação obrigacional
tributária que existe, entre o fisco e ela, o ato coator incidirá sobre a pessoa
jurídica e sobre ela produzirá efeitos nefastos.
Com efeito, ao fazer a Impetrante pedido dos veículos automotores à montadora
.... no Estado de ...., é exigido dela Impetrante, não só o pagamento da parcela
relativa ao tributo incidente nessa operação, como a antecipação do imposto que
somente iria incidir na operação seguinte, de revenda ao consumidor final, ainda
que esta não venha efetivamente a se realizar.
Na medida em que a Impetrante pleiteia o direito de não ter que desembolsar
antecipadamente o valor do tributo correspondente à operação subseqüente, de
revenda dos veículos, evidencia-se a existência da legitimidade ativa para a
impetração do presente "mandamus".
Ora, a antecipação do imposto que somente será ressarcido quando e se os
veículos automotores vierem a ser vendidos no Estado do ...., causará à
Impetrante sérios prejuízos financeiros, uma vez que receberá do consumidor
final um valor corroído pela inflação, implicando assim, um aumento de sua carga
tributária.
Registre-se que, a matéria relativa à legitimidade do contribuinte de fato
contestar a legalidade de uma exigência tributária, já se encontra pacificada
nos nossos tribunais superiores, como pode-se compulsar do seguinte excerto de
acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº
97.749-0, confirmado acórdão proferido pelo extinto Tribunal Federal de
Recursos, nestes termos lançado:
"2. Em relação ao imposto em comento, a relação jurídico-tributária instala-se
entre contribuinte de jure e o Estado, é certo. Essa relação, porém, que opera
no campo do direito material, não inibe pretensão e o direito de ação - de ordem
pública e decorrente da relação entre o administrador e o Estado, detentor do
monopólio jurisdicional - que invoca a impetrante, posto que ela, como
contribuinte de fato, suporta a carga tributária e é legítimo e moral que se
rebele contra uma exigência que se lhe pareça injusta. Caracterização do
legítimo interesse de agir."
Fica simplesmente demonstrado o legítimo interesse da Impetrante em ingressar
com o presente "mandamus", a fim de assegurar o direito líquido e certo,
violado, com sérias conseqüências para a própria Impetrante, tais como oneração
desproporcional do seu patrimônio e aumento da carga tributária, como para o
próprio ordenamento legal e constitucional, conforme será demonstrado adiante.
2. DA TEMPESTIVIDADE DO "WRIT"
Os atos das autoridades coatoras estão embasados no Convênio ICMS 107/89 e no
Decreto Estadual nº 6.465/89. Como não se trata de impetração de segurança
contra a lei em tese, mas contra atos decorrentes desta legislação, é a partir
de cada saída de veículo automotor da Montadora para a Concessionária Impetrante
que o ato de exigência tributária, via substituição, se torna ilegal.
Assim, a cada remessa, renova-se o prazo decadencial de .... dias da impetração
do "Writ of Mandamus". Trata-se, pois, de uma relação jurídica continuada, em
que a ilegalidade da exigência renova-se a cada ato mercantil. Nesse sentido é
tranqüilo a jurisprudência sobre decadência em mandado de segurança:
"... o prazo somente começa a fluir quando o ato se torna apto a produzir
efeito." (RTFR - p. 316 e 126)
Mandado de segurança não se impetra contra a lei em tese (Súmula 266 do STF) mas
contra ato de autoridade em decorrência da lei. Veja-se, a propósito, que a
Impetrante fazendo realizar aquisição de veículos novos, a cada aquisição,
tem-se nova exigência tributária. Em matéria de relação jurídica continuada
(prestações sucessivas), renova-se (Tribunal Federal de Recursos, AMS
107.461-RJ, Rel. Ministro Sebastião Reis, DJU de 10.10.85 - p. 17.779). Em igual
sentido "Revista do Tribunal Federa de Recursos", volume 121, pág. 370.
Necessidade de Concessão da Medida Liminar - Inexistência de Prejuízo ao Estado
do ....
Sabe-se que, ao contrário do que acontece com os atos civis e processuais civis,
onde vige o princípio "nulla executive sine título", os atos administrativos
fiscais tem vigência imediata, dado o princípio do "privilege du préalable".
Quando a autoridade coatora dá origem a ato administrativo inconstitucional, de
imediato este ato, devido ao princípio da auto-executoriedade, fere direito
individual líquido e certo.
Necessário então que o "mandamus" antes de ser apreciado em seu mérito, seja
precedido de medida liminar que faça de imediato cessar a auto-executoriedade do
ato administrativo para que não atinja um direito individual líquido e certo,
garantido pela norma constitucional.
A denegação da medida liminar pode implicar em violação ao direito assegurado
pela norma constitucional. Porém, a "contrário sensu", concedido o remédio
jurídico provisório, o Poder Público nada sofre porque seu direito já está
garantido pela Lei Maior.
O que se visa, em última análise, com o coatora paute sua conduta em consonância
com os escritos legais. O fim da Impetrante, ao utilizar-se da segurança como
direito subjetivo público, não é escusar-se, elidir-se de uma obrigação
tributária, mas fazer valer a "Lex Legum" - que deve ser a carta orientadora do
Estado e daqueles que exercem suas funções por meio de delegação de poderes.
Mister, pois, é a concessão da medida liminar porque ela é o remédio eficaz para
impedir a auto-execução do ato administrativo, que já nasceu eivado do vício da
ilegalidade e que, "ipso facto" fulmina direito líquido e certo.
A concessão da liminar não trará qualquer prejuízo para o Estado do ...., que
continuará recebendo o imposto que lhe é devido, quando da efetiva operação de
revenda do veículo automotor entre a Impetrante e o consumidor final, podendo,
para tanto usar de todos os meios legais de fiscalização para o pronto
acompanhamento desta conduta tributária que será imprimida pela Impetrante.
Prejuízo ou perda de privilégio atentatório da isonomia terá, por certo, a
Montadora, que deixará de receber o imposto da Impetrante à vista, deixando de
aplicar no mercado financeiro, pois possui prazo até o dia .... do mês
subsequente ao da saída para recolhê-lo (art. 6º do Decreto nº 6.465/89 -
Cláusula Sexta do Convênio 107/89). Isto vale afirmar, por exemplo, que um
automóvel vendido pela .... a Impetrante no dia .... do mês de ...., esta pagará
o imposto à vista para aquela, que aplicará no mercado financeiro e só repassará
para o Estado do .... sem qualquer atualização no dia .... do mês seguinte, ou
seja, .... dias após.
Acresça-se a isto, que se a Impetrante demorar para vender este mesmo automóvel
para o consumidor final, só receberá de volta o imposto antecipado vários meses
depois.
DO MÉRITO
DOS FATOS
A Impetrante é empresa que atua no ramo de comércio varejista de veículo
automotores da linha ...., conforme prova pelo "contrato padrão" celebrado entre
a .... e a Revendedora, concessionária ora impetrante (doc. ....), atuando nas
áreas demarcadas dos municípios de .... e ...., no Estado do ...., observada a
Lei nº 6.729 de 28.11.79 e Convenção da Marca ...., e como tal está sujeita à
tributação pelo "Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e
Sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação - ICMS", no referido Estado, como provado pelo documento anexo (doc.
....).
Todavia, por força das disposições do art. 3º do Decreto nº 6.465 de 29 de
dezembro de 1989, no Estado do ...., editado com base no Convênio - ICMS nº 107,
de 24 de outubro de 1989, firmado também pelo Estado do .... e Estado de .... na
....ª Reunião Extraordinária do Conselho de Política Fazendária, realizada em
.... em .../.../..., que dispõe sobre a tributação tributária nas operações com
veículos automotores, passou a Impetrante a ser constrangida ao recolhimento
antecipado do tributo, via montadora, eleita, no caso como substituta
tributária, conforme consta da cláusula primeira do referido convênio (docs.
.... e ....).
"Cláusula Primeira - Nas operações interestaduais com veículos classificados nas
posições .... a .... da Nomenclatura Brasileira de Mercadorias - Sistema
harmonizado - fica atribuída ao estabelecimento industrial fabricante a
responsabilidade pela retenção e recolhimento do Imposto de Circulação de
Mercadorias devido na subseqüência saída ou na entrada com destino ao ativo
imobilizado.
§ 1º - O disposto nesta Cláusula aplica-se aos acessórios colocados no veículo
pelo estabelecimento responsável pelo pagamento do imposto."
Com base de cálculo do ICMS nas operações com veículos automotores na referida
substituição tributária, ficou firmado no Convênio acima referido:
"Cláusula Terceira - A base de cálculo do imposto para fins de substituição
tributária será o valor correspondente ao preço de venda ao consumidor constante
na tabela estabelecida por órgão competente ou, na falta desta, pelo fabricante,
acrescido do valor do frete e do IPI." (Docs. .... e ....)
Com efeito para que possa continuar a desenvolver sua atividade fim de revenda
de veículos automotores, a Impetrante deve desembolsar quando da aquisição das
mercadorias o imposto que sempre seria devido a partir da revenda das mesmas
(doc. .... oposição ao doc. ....).
E ressalta-se ainda que, diante da situação econômica pela qual passa o País, as
revendas, como é notório, tem enfrentado muitas dificuldades para vender
automóveis, que permanecem em média .... dias em seus pátios, estocados,
aguardando compradores, e só são comercializados por força de promoções, nas
quais se praticam preços inferiores aos estabelecidos nas tabelas das
montadoras, que é base de cálculo do tributo de saída da fábrica, conforme o
convênio e se prova pelo documento anexo (doc. ....).
Afora isso, a Lei nº 8.1323 de 26 de dezembro de 1990, que alterou dispositivos
da Lei nº 6.729 de 28.11.79, em seu artigo 13, dispôs que: "... é livre o preço
de venda do concessionário ao consumidor, ..." relativamente aos veículos
automotores e seus acessórios, objeto da concessão do fabricante. Isto vale
dizer que a Impetrante é conduzida a vender suas mercadorias por preço abaixo da
tabela do fabricante, com evidente prejuízo se considerado o fato apenas do ICMS
pago a mais, por força da retenção e recolhimento quando da saída da montadora.
Eivada de inconstitucionalidade, portanto, a exigência em causa, diante da forma
abusiva e inadequada com que pretendem os Estados Signatários do referido
Convênio, estabelecendo dita substituição tributária e exigência de recolhimento
antecipado do ICMS (antes mesmo da ocorrência do fato gerador da obrigação
tributária).
Assim, diante dos fatos e inegáveis reflexos financeiros e econômicos
acarretados à Impetrante, que terá sua carga tributária evidentemente aumentada,
com o agravante do momento, de acentuado aperto monetário e recessão por que
atravessa o País, outra alternativa não lhe resta senão albergar-se no sempre
independente e competente Poder Judiciário.
O Sujeito passivo da obrigação tributária, como está assente no Direito Pátrio,
é a pessoa que, por força de disposição constitucional, quando da instituição
das competências tributárias, de forma explicita ou implícita, é posta como
destinatária da carga tributária.
Na própria designação constitucional do tributo já consta, portanto, ainda que
implicitamente, quem será o sujeito passivo, ou seja, a pessoa que, por
imperativo constitucional, terá seu patrimônio diminuído como conseqüência da
tributação, conforme leciona Geraldo Ataliba e Aires F. Barreto, v. g.:
" ... É óbvio, assim, que só pode ser sujeito passivo da relação obrigacional
tributária de imposto de renda aquele que recebe a renda. Do imposto de
exportação quem importa. Do de importação, quem importa. Como só pode ser
sujeito passivo do imposto predial o dono do prédio. E assim por diante.
No caso do ICMS, os que realizam operações relativas à circulação de
mercadorias, é dizer, os que promovem negócios jurídicos mercantis. E, assim
mesmo, em relação a cada operação concretamente considerada." (in Revista de
Direito Tributário, vol. 49, págs. 73/74). (Doc. ....)
Conclui-se, dessa forma, que o legislador ordinário não remanesce qualquer
competência para, arbitrária ou aleatoriamente, eleger sujeitos passivos de
obrigações tributárias, mas, ao contrário, ao fazê-lo, deverá ater-se
estritamente aos termos da Lei Suprema.
É, portanto, o legislador ordinário, ao escolher o sujeito passivo, obrigado a
colher como tal somente aquela pessoa que efetivamente corresponda às exigências
do aspecto pessoal da hipótese de incidência, tal como determinada
(pressuposta), em seus contornos essenciais, pelo próprio Texto Constitucional
(Revista do Direito Tributário, vol. 49, pg. 74).
Ademais disso, antes do evento de saída de cada um dos veículos automotores (a
circulação da mercadoria), no caso, do estabelecimento da Impetrante, não há que
falar-se em fato imponível relativamente a tais operações, mas quando muito de
mera suposição, ou simples expectativa da ocorrência do fato tributário futuro,
o que não autoriza a exigência do tributo, conforme anotam os autores
supra-referidos, que assim concluem:
"Essa exigência - é crucial - somente pode ser legitimamente feita após a
incidência da norma tributária - que, por sua vez, só tem possibilidade jurídica
de realizar-se no momento em que coexistem: (a) fato tributário suficiente,
íntegro, já ocorrido (e não a suposição ou expectativa de fato futuro) e (b)
norma jurídica (também suficiente), que o tenha suposto."
(Doc. ....)
Várias vezes inconstitucional, portanto, a pretensão em causa dos Estados
signatários do referido convênio, como a seguir se demonstrará.
DO DIREITO
1. DO PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
A Constituição Federal de 1988 adota, de forma expressa, o princípio da
capacidade contributiva, não obstante esteja o mesmo já implícito no princípio
da isonomia (CF/88, artigo 145, § 1º).
Impõe o dispositivo em referência que os impostos terão caráter pessoal e serão
graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte.
O núcleo da hipótese de incidência deve ser, então, em acato ao referido
preceito constitucional, um fato signo presuntivo de riqueza, no dizer de
Alfredo Augusto Becker, do contribuinte, e não de terceiro. O destinatário da
carga tributária, que terá seu patrimônio reduzido em face da ocorrência de tal
fato, haverá de ser a pessoa que provoca, desencadeia ou produz a materialidade
da hipótese de incidência do tributo, tal como delineada na Constituição.
Ressalta à evidência, pois, a inconstitucionalidade da pretensão do Estado do
.... em arrecadar antecipadamente o ICMS relativo à operação de circulação de
mercadoria havia entre a montadora e a Impetrante, cujo imposto somente seria
devido a operação subsequente de revenda entre a Impetrante e o Consumidor
Final.
Restam, portanto, frontalmente feridos os princípios da igualdade e da
capacidade contributiva. Com efeito, sendo a Impetrante a destinatária legal
tributária, sua substituição, por terceiro, não poderia importar oneração de seu
patrimônio em medida desproporcionada à do fato tributário que realiza, tal como
ocorre no caso vertente, onde, a par da referida substituição, lhe é exigida
exação tributária correspondente à operação futura, sequer ocorrida.
Bastante oportuna nesse sentido as palavras do Prof. Paulo de Barros Carvalho,
ao demonstrar como o princípio da igualdade, abordado pelo critério da
capacidade contributiva, pressupõe que os participantes do acontecimento
contribuam de acordo com o tamanho econômico do evento:
"Podemos resumir o que dissemos em duas proposições afirmativas bem sintéticas:
realizar o princípio pré-jurídico da capacidade contributiva absoluta ou
objetiva, retrata a eleição, pela autoridade legislativa competente, de fatos
que ostentam signos de riqueza; por outro lado, tornar efetivo o princípio da
capacidade contributiva relativa ou subjetiva quer expressar a repartição do
impacto tributário, de tal modo que os participantes do acontecimento contribuam
de acordo com o tamanho econômico do evento." (in Curso de Direito Tributário,
Saraiva, pág. 208)
A seguir, conclui o ilustre Professor que:
"No terreno do Direito Tributário, a igualdade impositiva está irremediavelmente
ligado ao conteúdo econômico dos fatos escolhidos pela Lei, que são cometidos
pela entidade que conhecemos por base de cálculo." (ob. cit., pág. 209)
Assim, a efetividade do princípio da capacidade contributiva, verifica-se não
apenas quando a lei preveja expressamente a base de cálculo do tributo, mas que
a hipótese tributária prevista seja reveladora de riqueza do contribuinte.
Ora, o montante do imposto de circulação de mercadorias exigido da Impetrante,
no caso, corresponde a fato de terceiro, a ser realizado quando da revenda do
veículo, e não ao fato correspondente à operação com a montadora.
Assim, como falar-se em base de cálculo, como técnica de medição da intensidade
com que a capacidade contributiva é revelada, quando o fato medido é fato de
terceiro e não o fato daquele sujeito passivo considerado?
O princípio constitucional da capacidade contributiva, conforme Geraldo Ataliba
e Aires F. Barreto:
"Impõe que o legislador defina hipótese de incidência dos impostos de modo a que
a 'repartição do impacto tributário' se faça de tal modo que os participantes
dos fatos tributários contribuam de acordo com o tamanho econômico do evento que
eles - e não terceiros - realizem." (in Revista de Direito Tributário, vol. 49,
pág. 95). (Doc. ....)
Uma vez mais inconstitucional, portanto, a hipótese de substituição tributária
examinada, por importar oneração do patrimônio da Impetrante em medida diversa
daquela correspondente ao fato tributário de que participa.
2. DO PRINCÍPIO DA TIPICIDADE TRIBUTÁRIA
Como é cediço em Direito Tributário, não basta a existência de lei para que se
dê o nascimento da obrigação tributária. Para tanto, necessário se faz a
ocorrência do fato previsto abstratamente na hipótese legal (artigo 114 do CTN).
Conforme o inexcedível legado de Pontes de Miranda:
"A regra jurídica de tributação incide sobre o suporte fático, como todas as
regras jurídicas. Se ainda não existe o suporte fático, a regra jurídica de
tributação não incide; se não se pode compor tal suporte fático, nunca incidirá.
O crédito do tributo (imposto ou taxa) nasce do fato jurídico, que se produz com
a entrada do suporte fático no mundo jurídico. Assim, nascem o débito, a
pretensão e a obrigação de pagar o tributo, a ação e as exceções. O Direito
Tributário é apenas ramo do direito público; integra-se como os outros, na
Teoria Geral do Direito." (Comentários à Constituição de 1967, com Emenda 1/69,
Ed. RT, T. II, pág. 366)
A integridade da hipótese de incidência, de outra parte, implica,
necessariamente, a ocorrência concomitante de todos os seus aspectos (material,
espacial, temporal, pessoal e quantitativo).
Todos são, pois, indispensáveis à composição do denominado fato tributário. À
falta, portanto, de qualquer de seus aspectos, não há falar-se em tributo
devido, porquanto não haverá exata subsunção do conceito do fato ao conceito da
norma.
Alberto Xavier expõe magistralmente o tema da tipicidade, como se verifica do
excerto que se transcreve:
"O fato tributário é necessariamente um fato típico: e para que revista esta
natureza é indispensável que ele se ajuste, em todos os seus elementos, ao tipo
abstrato descrito na Lei.
A tipicidade do fato tributário pressupõe, por conseguinte, uma descrição
rigorosa dos seus elementos constitutivos, cuja integral verificação é
indispensável para a produção de efeitos. Basta a não verificação de um deles
para que não haja, pela ausência de tipicidade, lugar à tributação. O fato
tributário, com o ser fator típico, só existe como tal, desde que na realidade
se verifiquem todos os pressupostos legalmente previsto que, por esta nova
óptica, se convertem em elementos os aspectos do próprio fato." (in Os
Princípios da Legalidade e da Tipicidade da Tributação, Ed. Rev. dos Tribunais,
pág. 87)
Portanto, antes do evento, tal seja, da saída de cada um dos veículos
automotores, do estabelecimento da Impetrante, não há falar-se em fato imponível
relativamente a tais operações, mas quando muito de mera suposição, ou simples
expectativa da ocorrência do fato tributário, o que não autoriza a exigência
antecipada do tributo.
Lapidar nesse sentido, igualmente, a conclusão do Geraldo Ataliba e Aires F.
Barreto, que de forma peremptório afirmam ser:
"Absolutamente inaceitável 'presumir' a ocorrência de fatos futuros, no campo
estrito do Direito Tributário. Se o fato tributável ainda não sucedeu, a
exigência do tributo, sob fundamento de mera probalidade do seu acontecimento,
importa violação da Constituição." (Doc. ...., pág. 93)
Oportuno que se transcreva, também, porquanto aplicam-se "in literis" à hipótese
vertente, as seguintes conclusões dos conceituados autores exarados sobre
questão semelhante (inconstitucionalidade da substituição tributária criada pelo
artigo 18 do Decreto nº 27.778/89), relativamente a tributação das operações
realizadas com petróleo e seus derivados, v.g.:
"Assim, se embora presente o aspecto material - a reavaliação de negócio
mercantil - ainda nãos e verificou o aspecto temporal eleito pela Lei, não há se
falar em obrigação tributária, por inocorrência de situação necessária de
situação necessária e suficiente à ocorrência do fato tributário.
Preconizar substituição - antes mesmo de verificar-se o momento escolhido pela
norma para considerar acontecido o fato tributário - é criar tributo sem o
suporte fático que lhe dá causa. E isso, definitivamente, o sistema não
autoriza. Só diante da ocorrência de fato que se subsuma a todos os aspectos da
hipótese de incidência cabe cogitar de substituição tributária; antes desse
tempo, haverá confisco, apropriação indevida da propriedade particular, o que
não pode ser aceito, sob hipótese alguma. É impossível, logicamente, a subsunção
de fato futuro a hipótese legal presente. Na verdade, somente pode haver
obrigação tributária após ocorrido - no tempo previsto pela Lei - um fato que,
mediante o lançamento, se constata ter realizado concretamente a imagem abstrata
contida na hipótese de incidência legal tributária (fattispecie, tatbestand).
Mesmo por isso que o artigo 142 do CTN dispõe ter, o lançamento, a função
declaratória da obrigação tributária, na medida em que 'tende a verificar a
ocorrência do fato gerador' correspondente. Ora, é absolutamente impossível a
subsunção de um fato futuro - porque ainda não acontecido no tempo - a um
preceito legal, atual. Se o fato não ocorreu - o momento não se verificou - como
é possível contrastar suas notas àquelas descritas abstratamente na lei?
Por isso é inconstitucional estabelecer presunção no sentido de que haverá
(fatalmente) essa subsunção. Admiti-la é subverter integralmente toda a doutrina
do Direito Tributário, patrimônio comum do mundo ocidental. Esta foi construída
exatamente à luz das exigências do princípio da tipicidade, tal como consagrados
pela Constituição Brasileira, na linha de propostas constitucionais universais,
a quem o Brasil, de modo decidido, se filiou. É isso, aliás, o que
tranqüilamente vem reconhecendo o nosso Poder Judiciário, especialmente pelo
mais alto órgão, que é o STF." (in op. cit., págs. 93/94) (Doc. ....)
3. DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA
Não suficientes as inconstitucionalidades apontadas, identifica-se ainda, na
exigência em causa, flagrante ofensa ao princípio da legalidade tributária.
Com efeito, a ninguém é dado desconhecer, no Direito Brasileiro, que a indicação
do contribuinte e do responsável tributário há de ser efetuada por lei.
Somente a lei pode criara ou aumentar tributos, estatui a Constituição Federal
em seu artigo 150, inciso I.
O próprio Código Tributário Nacional, de forma bastante didática, melhor
explicita o conteúdo do referido preceito, v.g.:
"Art. 97 - Somente a lei onde pode estabelecer:
I - a instituição de tributos, ou a sua extinção;
II - a majoração de tributos, ou a sua redução, ressalvando o disposto nos arts.
21, 26, 39, 57 e 65;
III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvando
o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo;
IV - a fixação da alíquota do tributo e de sua base de cálculo;
V - ... omissis ...;"
"Art. 128 - Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo
expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada
ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do
contribuinte ou atribuindo-se a este em caráter supletivo do cumprimento total
ou parcial da referida obrigação."
Convém que se traga à lume, nesse passo, para melhor demonstrar o alcance do
referido princípio, a conhecida e multimencionada lição de Alberto Xavier:
"Se o princípio da reserva da lei formal contém em si a exigência da 'lex
escripta', o princípio da reserva absoluta coloca-nos perante a necessidade de
uma 'lex stricta': a lei deve conter em si mesma todos os elementos da decisão
no caso concreto, de tal modo que não apenas o fim, mas também o conteúdo
daquela decisão sejam por ela diretamente fornecidos. A decisão do caso concreto
obtém-se, assim, por mera dedução da própria lei, limitando-se o órgão de
aplicação e subsumir o fato na norma, independentemente de qualquer livre
valorização pessoal." (op. cit., pág. 37)
Não paira nenhuma dúvida, portanto, no sentido de que somente a lei pode dispor
sobre o sujeito passivo da obrigação tributária ou seu substituto.
Semelhante lei, todavia, não foi editada, na hipótese vertente. E, como visto,
nenhum ato, convênio ou decreto, senão a lei, poderá validamente criar,
modificar ou deslocar a responsabilidade tributária.
Totalmente ineficazes são, portanto, o Decreto Estadual nº 6.465/89 e respectivo
Convênio nº 107/89 no que permite a hipótese de substituição tributária, à
mingua de lei ordinária estadual introduzindo dita alteração.
Com efeito, os convênios devem ser ratificados pelos Estados. Os Estados, por
sua vez os têm ratificado por simples decretos do Executivo (A exceção única do
Estado do ...., que os tem ratificado pelo Legislativo). Porém, a ratificação só
é válida quando feita pelo Legislativo, com o imperativo do princípio maior da
legalidade tributária.
Sobre o assunto, o festejado tributarista Geraldo Ataliba assim disserta:
"O Executivo negocia os convênios e os submete à aprovação do Legislativo. Este,
se e quando lhe dá aprovação, expede o decreto legislativo dela (aprovação)
expressivo. É nítida a concordância de Souto Maior Borges com esta inteligência:
O art. 23, § 6º da EC 1/69, não autoriza a concessão ou revogação da isenção do
ICM senão pela via dos convênios. Essa afirmação todavia não exclui, na
hipótese, a eficácia do princípio da legalidade, porque o convênio está sujeito
a ratificação." (Lei Complementar Tributária, p. 168). Idêntica é a opinião
autorizada de Sacha Calmon (RDT 6/61). (Autor citado in Revista de Direito
Mercantil, vol. 53, p. 8)
Em seu artigo doutrinário, Geraldo Ataliba invocando as doutrinas de Souto Maior
Borges e Sacha Calmon Navarro Coelho, sobre a ineficácia do "Convênio" não
ratificado pelo Legislativo, leciona:
"Nosso modo de ver, juntamente com Souto Borges, não é isolado. Com vigosos
argumentos, Sacha Calmon demonstrou excelentemente - rigoroso jurista que é -
ineficácia dos convênios não ratificados pelas Assembléias Legislativas."
Escreve esse arguto jurista:
"A espécie, no entanto, exige um teste jurídico absolutamente necessário, capaz
de aferir a legalidade da sistemática do leite. Consiste em perguntar se o
convênio Autorizativo 07/77 foi devidamente homologado pelo Legislativo
Estadual, ganhando com isto o caráter de Lei. É que embora a Lei Complementar 24
dispense a homologação dos convênios pelo Poder Legislativo dos Estados, em
insanável divergência com o Texto Constitucional que lhe está acima (art. 23,
96), a doutrina e jurisprudência têm entendido que os convênios não ratificados
pelas Assembléias estaduais são juridicamente ineficazes por falta de requisito
intrínseco de validade."
O argumento tem fulcro no fato de que a obrigação tributária, todos os elementos
estruturais constituem matéria sob reserva de Lei (art. 97 CTN e art. 153, e, da
CF). A reserva de convênio não exclui a reserva de Lei. Os Estados não perderam
competência tributária em favor dos convênios. Estes são resultantes das
reuniões de Estados que, colegiadamente, exercem cada qual, uma competência
tributária própria e indelegável.
Convênio é acordo, ajuste, combinação e promona de reunião de Estados-membros. A
esta comparecem representantes de cada Estado, indicados pelo chefe do Executivo
das Unidades Federadas. Não é, assim o representante do povo do Estado que se
faz presente na Assembléia, mas o preposto do Executivo, via de regra um
Secretário de Estado usualmente o da 'Fazenda' ou das 'Finanças'. Nestas
assembléias são gestados os convênios, ou melhor, as 'propostas' de convênios.
Em verdade, o conteúdo dos convênios só passa a valer depois que as Assembléias
Legislativas casas onde se faz representar o povo dos Estados - ratificam os
convênios prefirmados nas assembléias. Com efeito, não poderia um mero preposto
do chefe do Executivo Estadual exercer competência tributária exonerativa. Esta
é do ente Político, não é do Executivo nem do seu chefe, muito menos do
preposto, destituível 'ad nutum'. O princípio da legalidade da tributação e da
exoneração, vimos já neste trabalho, abarca por inteiro o disciplinado tributo e
dos seus elementos estruturais. Sendo a isenção, a fixação das bases de cálculo
e das alíquotas, a não-cumulatividade, a remissão, a concessão de créditos
fiscais e sua manutenção, materiais sob reserva de lei, como admitir que um mero
secretário de governo, agente do Poder Executivo, capaz só de praticar atos
administrativos, possa pôr e tirar, restabelecer, graduar, reduzir ou aumentar
tributação?
Caso isto fosse possível, derrogado estaria o princípio de legalidade da
tributação e vulnerado o arquiprincípio da separação dos poderes, pressupostos
da República e do Estado de Direito. Não, o Secretário do Estado, e seus
assessores, tecnocratas, são meros funcionários subalternos, posto que
especializados. A primeira rodada dos convênios - em assembléia dos Estados - é
com eles que se realiza. Juridicamente, o principal vem depois, com a
ratificação do que eles combinarem. A jurisdicidade sobrevêm quando a decisão
tomada em convênio é aprovada pelas Assembléias Legislativas Estaduais,
pressuposto indeclinável de eficácia.
A Assembléia de Estados-membros não detém nenhuma parcela de competência
tributária. Não é ente autônomo a ombrear ou a dividir faixas de competência com
a União (competência exonerativa heterônona) e com o Estado-membro (competência
exonerativa autonômica). Ao contrário, é mera fórmula de exercício de
competência tributária. Através dos convênios tirados em assembléias de Estados
estes exercem uma competência que lhes é própria e derivada da Carta. Os
convênios resultam de fórmula plural de exercício de competência tributária
pelos Estados. É errôneo supor que os 'convênios' surrupiaram aos Estados
parcelas de competência. Os Estados não a perderam. Simplesmente o seu exercício
se faz colegiadamente. O produto desse exercício colegiado da competência
exonerativa é justamente o convênio.
A competência para exonerar é dos Estados, pela Assembléia, e não da Assembléia
dos Estados. (RDT 7/71). (Autor e local citados, pp 12/14)
Junto ao texto do artigo doutrinário acima transcrito, Geraldo Ataliba traz à
colocação Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, dispondo sobre a
necessidade de Decreto Legislativo, para ratificar Convênio.
Vejamos:
"Esta tese tem o abono da jurisprudência do STF, já em 1976, apreciando o RE
83.310 (RTJ 77/978), elaborou a seguinte ementa 'ICM-Convênio celebrado pelos
Estados para outorga de isenção. Necessidade ratificação por Lei Estadual."
No seu voto, o ínclito Min. Bilac Pinto abona o Acórdão do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul, que afirma:
"Os convênios realizados pelo Estado, em reuniões de Secretários de Fazenda
necessitam, para sua incorporação à legislação interna, de aprovação por via de
decreto legislativo."
E também:
"... é da competência exclusiva da Assembléia aprovar os convênios em que o
Estado for parte (...) os convênios devem sempre ser submetidos a homologação da
Assembléia Legislativa do Estado."
Anteriormente, o ínclito Min. Luiz Gallotti, tratando de tema de igual teor,
assinalara:
"Note-se, ainda, que o invocado art. 6º do Ato Complementar 35 concedia a
questionada autorização (para reduzir o ICM) ao Estado, e não ao Poder Executivo
Estadual." (RTJ 59/97)
Nesse Acórdão - como que antecipando a superveniência da Lei Complementar 24,
que tanto perturbou a colocação da questão dos convênios - disse:
"Note-se, ainda, que o invocado art. 6º do Ato Complementar 35 concedia a
questionada autorização ao Estado, não ao Poder Executivo estadual; e a
concedia, para ser utilizada no exercício de 1967 (aqui se cuida do exercício de
1968)."
Na linha desse acórdão, foi decidido o RE 70.979 de 08.09.71 bem como o 68.661
(RTJ 59/94). Ulteriormente, também o RE 83.310 (RTJ 77/978).
Ademais disso, ainda que se desse por superadas todas as inconstitucionalidades
até aqui apontadas, "ad argumentandum tantum", verifica-se que a hipótese de
substituição tributária em referência, desatende à determinação do art. 128 do
CTN, no sentido de que a terceira pessoa, a quem se atribuir a responsabilidade
pelo rédito tributário esteja vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação,
tal seja, no caso, o consumidor final na operação da revenda, o que não ocorre
com a montadora.
Mansa e pacífica a esse respeito é a jurisprudência emanada do Egrégio S.
Tribunal Federal, v. g.:
"ICM. Atribuição a terceiro da condição de responsável pelo crédito tributário.
O art. 128 do CTN, ainda vigente, só permite se houver vinculação do terceiro ao
fato gerador, pelo que já não é possível, em conseqüência da revogação do art.
58, § 2º, II do mesmo Código, pelo Decreto-lei nº 406/68, atribuir ao industrial
ou comerciante atacadista a responsabilidade pelo tributo devido pelo
comerciante varejista." (RE nº 77.462-MG - Tribunal Pleno - RTJ 75/507)
No mesmo sentido a decisão proferida no Recurso Extraordinário nº 77.885 - MG,
da qual se extraem os seguintes excertos constantes do voto do Sr. Ministro
Rodrigues Alckmin (Relator):
"Como se verifica, o art. 128 só permite a substituição tributária, quando o
substituído está vinculado ao fato gerador da obrigação tributária. Ora, no caso
sub judice tal não ocorre. São duas vendas perfeitas e acabadas; uma do
atacadista para o varejista e outra do varejista para o consumidor.
(...)
Portanto, quando o atacadista entregou a mercadoria ao varejista seu contrato de
venda ficou perfeito, e acabado e, dele, se desvinculou inteiramente. Se o
comprador revendeu a mercadoria praticou outra separação da qual o primitivo
vendedor esta desvinculado." (RTJ 73/531)
Mas o Decreto Estadual nº 6.465 de 23.11.89, editado com base no Convênio ICMS
nº 107/89, que criou essa nova e estranha espécie de substituição tributária,
instituindo tributação antecipada no Estado de origem (....) sobre futuras e
incertas hipóteses de incidência que poderão ocorrer ou não no Estado de destino
(....) incorre em vício ainda mais grave, ao determinar o cálculo do ICMS sobre
base de cálculo absolutamente diverso do próprio valor correspondente as
operações interestaduais.
Com efeito, conforme determina o art. 7º da Lei nº 8.933 de 26.01.89, que
instituiu o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e
sobre prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de
comunicação (ICMS) regulamentada pelo Decreto Estadual do Paraná 5.012 de
09.05.89:
"A base de cálculo do imposto é:
... omissis ...
III - Na saída de mercadoria prevista nos incisos V e VI do artigo 3º, o valor
da operação;"
O artigo 3º do citado diploma diz:
"Art. 3º - Ocorre o fato gerador do imposto:
... omissis ...
V - Na saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para
outro estabelecimento do mesmo titular ..."
Ora, a base de cálculo do ICMS, tal como a estabelece o artigo 2º, inciso I, do
Decreto-lei nº 406/68:
"... é o valor da operação de que decorre a saída da mercadoria."
O Egrégio Supremo Tribunal Federal, reafirmando que o ICMS somente pode ser
exigido em razão do valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria, em
reiteradas oportunidades julgou ilegais as chamadas "pautas de valores mínimos",
"ex vi" dos seguintes excertos do voto do Ministro Aldir Passarinho, ao atuar
como Relator no RE nº 79.381-0/83:
"A base de cálculo do ICM é o valor da operação de que decorrer a saída da
mercadoria (art. 2º, I do Decreto-lei nº 406/68). A fixação de valores
tributáveis diversos em função de destinação do produto venda a distribuidores
ou varejistas - colide frontalmente com essa disposição, inconciliável, por
igual, com a sistemática legal do ICM (art. 1º, I, do Decreto-lei citado)."
"... a pré determinação de valor para as operações aliás, pode também significar
elevação da base de cálculo do imposto, vedada pelo art. 97, § 1º do CTN." (RDT
32-262/263)
Observe-se que a Impetrante, ao revender em seu Estado de domicílio (....), os
veículos automotores em prazos que não raro se contam em meses, desde a
aquisição, arca ilegal e coersitivamente com um enorme custo financeiro ao
antecipar o recolhimento do ICMS, sem qualquer compensação por parte do Estado e
sem possibilidade de reaver este custo financeiro do adquirente final, o que
corresponde evidentemente a um aumento real de sua carga tributária, aliás
vedado pelo § 1º do artigo 97 do CTN. Acrescente-se o fato de que o preço
efetivamente praticado na venda final, em face dos descontos, apresenta-se
bastante inferior àquela sobre o qual é calculado o tributo na saída da
montadora.
Ainda que superada a questão da inexistência de lei, verifica-se que não há
sequer ato administrativo que autorize a exigência em causa.
Para aclarar quaisquer dúvidas que ainda possam restar quanto a impossibilidade
de incidir antecipadamente o ICMS sobre aquisições de veículos pela Impetrante
no Estado de São Paulo, ressalta-se o que dispõe o artigo 1º do Decreto nº
6.465/89:
"Art. 1º - Ao estabelecimento industrial fabricante, desta ou de outra unidade
federada, que promover a saída de veículos classificados nas posições 87.2 a
87.6 e 87.09 da Nomenclatura Brasileira de Mercadorias - Sistema Harmonizado
fica atribuída a responsabilidade pela retenção e recolhimento do ICMS devido na
subseqüente saída ou na entrada com destino ao ativo imobilizado.
§ 1º - O disposto neste artigo aplica-se aos acessórios colocados no veículo
pelo estabelecimento responsável pelo pagamento do Imposto."
Com efeito, o artigo 150, I, da Constituição Federal dispõe que:
"Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é
vedado à união aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributos sem Lei que o estabeleça."
É, o artigo 155, XII, letra "b" da Constituição Federal, taxativamente declara
que:
"XII - cabe à lei complementar:
... omissis ...
b) dispor sobre a substituição tributária;"
Impondo a Constituição Federal que a substituição tributária será regulamentada
formalmente por "Lei Complementar", a conclusão a que se chega é de total
invalidade do "Convênio nº 107/89" para dispor sobre a matéria, e por igual ao
Decreto Estadual do Paraná nº 6.465/89 que o ratificou.
4. DA OFENSA AO PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE
Cabe referenciar, ainda, a cumulatividade decorrente da introdução da
sistemática da substituição tributária adotada, uma vez que a legislação ....
(Decreto nº 6.465/89) não estabeleceu mecanismo para garantir o direito do
concessionário adquirente dos veículos automotores, no caso a Impetrante, de
compensar no valor do imposto incidente sobre a revenda o crédito relativo às
duas primeiras parcelas do imposto cobradas na primeira operação.
E refira-se que o direito a esse abatimento está assegurado à Impetrante pela
própria Constituição Federal (art. 155, § 2º, inc. I), bem como pelo Decreto-lei
nº 406/88 (art. 3º), que determina sua aplicação geral e uniforme para todo o
sujeito passivo do ICMS.
Assim, não havendo mecanismos legais que assegurem o direito à utilização dos
créditos referentes às operações anteriores, fica evidenciada a ofensa ao
princípio constitucional da "não cumulatividade", e ainda, manifesta cobrança de
execrável "imposto em cascata".
Merecem destaque as palavras dos eminentes tributaristas Geraldo Ataliba e Aires
F. Barreto, no artigo intitulado "Substituição e Responsabilidade Tributária",
quando, ao tratar da questão sob o prisma constitucional da não-cumulatividade,
assim se manifestaram:
"b) A substituição é o princípio constitucional da não-cumulatividade.
Não mais, porém, quando de ICMS se trata. Não basta, diante desse imposto, a
satisfação das quatro exigências constitucionais antes arroladas (igualdade,
capacidade econômica, não confisco e sujeição passiva adequada). É de mister
observar, ainda, o princípio da não cumulatividade. Sem a satisfação dessa
quarta exigência constitucional nenhuma substituição do ICM pode ser válida.
Regime de substituição que desconsidere esse princípio é manifestamente
inconstitucional.
E a ofensa à Constituição persistirá enquanto não haja mecanismos legais que
assegurem o direito à utilização dos créditos referentes às operações
anteriores, sob a pena de flagrante afronta ao princípio da não-cumulatividade."
(in Revista de Direito Tributário nº 49, pág. 77). (Doc. ....)
5. DA LEGALIDADE DA AUTORIDADE COATORA
A legitimidade "ad causam" das autoridades coatoras, em princípio, seria o
Delegado da Receita Federal com jurisdição na sede da Impetrante. Entretanto, e
para que não pairem dúvidas, mister faz-se demonstrar, nos termos adiante, a
legitimidade do pretendido.
Não se trata de simples ato de exigência tributária, mas também de livre
trânsito de mercadoria, vez que os veículos automotores adquiridos com a
apontada substituição tributária serão oriundos do Estado de ...., com passagem
por vários postos fiscais dentro do Estado do ...., sob os quais o Delegado
Regional da Receita Estadual (....ª Delegacia em .../...ª Delegacia em ....) da
localidade da Impetrante não possui jurisdição para fazer cumprir a ordem
judicial, só resta a derradeira posição de aglutinar o polo passivo da relação
processual a autoridade coatora propriamente dita o Senhor Coordenador da
Arrecadação e Fiscalização da Receita Estadual, que é autorizada que coordena
todas as Delegacias Regionais da Receita no Estado do ....
Uma simples ordem judicial para a autoridade coatora com jurisdição territorial
na sede da Impetrante, inibiria a livre circulação dos veículos automotores
originários do Estado de .... até o estabelecimento sede da empresa. Além disso,
é competência outorgada, por lei, para a coordenação na Receita do Estado, a
execução das leis tributárias (art. 63 da Lei Orgânica do ICMS-....). Decorre
daí, em última análise, que é a Coordenação da Receita do Estado do ...., que
orienta e coordena os demais órgãos da máquina administrativa/tributária do
Estado na exigência de qualquer imposto.
Muito embora o ICMS seja retido pela montadora (....) em outro Estado da
Federação, a exigência tributária para essa retenção é das autoridades fiscais
do Estado do ...., consoante cláusula 13ª do Convênio ICM 107/89, cujo imposto
retido deverá ser recolhido por meio de guia Nacional de Recolhimento de
Tributos Estaduais, na agência do Banco do Estado do ...., a crédito do Governo
do Estado do ...., na conta nº ...., Agência .... do .... (art. 6º do Decreto nº
6.465/89).
6. PRECEDENTES
Consoante notícia jornal "Gazeta Mercantil" dia .... de .... de ...., às fls.
...., o juiz da ....ª Vara da Fazenda Pública do Estado de ...., Dr. Pedro
Aurélio Pires Maringolo, ao despachar Mandado de Segurança requerido por empresa
concessionária de veículos automotores do Estado do ...., para não recolher o
ICMS na compra de veículos de montadora localizada em ...., concedeu a liminar e
suspendeu a empresa dos efeitos do artigo 3º do Decreto Paulista nº 29.948, que
obriga as revendedoras localizadas em outros Estados a recolher antecipadamente
às montadoras o tributo que seria devido apenas a partir da venda ao consumidor
final (doc. ....).
Já em data de .... de .... de ...., ainda como a notícia o citado jornal, aquela
Autoridade Judiciária concedeu em definitivo a segurança, confirmando a liminar
anteriormente concedida, isentando a concessionária de antecipar o recolhimento
do ICMS via montadora. Ao conceder a segurança, o juiz declarou,
"incidentemente", a inconstitucionalidade e ilegalidade do Convênio ICMS nº 107,
de 24 de outubro de 1989 (que dispõe sobre o recolhimento antecipado), além do
artigo inserto no RICM Paulista e Decretos daquele estado conforme se verifica
do expediente anexo (doc. ....).
Por seu turno, e como precedente em nosso Estado, a Doutora Juíza da ....ª Vara
da Fazenda Pública de ...., concedeu liminar em mandato de segurança impetrado
contra ato iminente a ser praticado pelo Sr. Coordenador de Arrecadação e
Fiscalização da Receita do Estado do ...., como notícia nos dá o Jornal
"Indústria & Comércio" do dia .... de .... de .... (doc. ....).
7. CONCLUSÕES
Assim, a exigência da antecipação do ICMS corresponde a operação de revenda de
veículos automotores, fere direito líquido e certo da Impetrante, pelos
fundamentos já expostos e que podem ser assim sintetizados:
A incidência do ICMS antes do evento de saída de cada um dos veículos
automotores, carece de possibilidade jurídica, uma vez que não há fato imponível
relativamente a essa operação, mas mera suposição, ofendendo expressamente o
art. 114 do Código Tributário Nacional e o artigo 1º, inciso I, do Decreto-lei
nº 406/68;
Ao ser onerada com o imposto que só seria devido na operação subsequente, a
Impetrante, destinatária legal tributária, tem o patrimônio gravado
desproporcionalmente, ofendendo diretamente o princípio constitucional da
capacidade contributiva, abrigado pelo art. 145, § 1º da Constituição Federal;
A indicação do sujeito passivo da obrigação tributária e do seu substituto foi
veiculada através de Decreto Estadual (Decreto nº 6.465 de 22.11.89), em
completa afronta ao princípio constitucional da legalidade, regulado pelo art.
150, inciso I, da Constituição Federal, e pelos artigos 97, II e IV e128, do
Código Tributário Nacional, já que o Convênio nº 107/89 foi ratificado por
decreto do Executivo e não pelo Legislativo.
Ao criar a figura da substituição tributária para a presente hipótese, o Decreto
Estadual nº 6.465/89 determinou o cálculo do ICMS sobre base de cálculo
absolutamente diversa do próprio valor correspondente às operações de vendas
interestaduais, em flagrante dissociação do disposto no art. 2º, inciso I, do
Decreto-lei nº 406/68;
Não havendo mecanismos legais que assegurem o direito à utilização dos créditos
referentes às operações anteriores fica evidenciada a ofensa ao princípio
constitucional da "não-cumulatividade" obrigado na Constituição Federal (art.
155, § 2º, I), bem como pelo Decreto-lei nº 406/68 (art. 3º).
DOS PEDIDOS
Face ao exposto, e revestindo-se de liquidez e certeza o direito que tem a
Impetrante de não ter que desembolsar antecipadamente no Estado de .... o valor
do tributo correspondente à operação de revenda de veículos automotores novos
constantes do pedido de veículos anexo (doc. nº ....), que ocorrerá no Estado do
...., requer digne-se Vossa Excelência conceder a segurança pleiteada.
Requer, ainda a concessão de Medida Liminar porque presentes os pressupostos que
autorizam, uma vez que é relevante o fundamento jurídico do pedido e, do seu
recolhimento somente a final, poderá resultar na ineficácia da segurança.
Requer, também, seja oficiada a ...., empresa cedente estabelecida na Av. ....
nº ...., na Comarca de ...., Estado de ...., cientificando-a da concessão da
Medida Liminar, a fim de que deixe de reter na fonte o valor correspondente ao
ICMS incidente sobre o valor da revenda de veículos a serem adquiridos pela
Impetrante.
Requer, finalmente, a intimação das autoridades coatoras para o oferecimento das
informações de praxe, devidamente qualificadas e nos endereços indicados no
preâmbulo, cientificando-as da concessão da Medida Liminar, caso julgue Vossa
Excelência satisfeitos os requisitos necessários para tanto, no sentido de que
se abstenham de exigir da Impetrante, antecipadamente, o ICMS questionado até a
apreciação definitiva do presente "mandamus", que afinal, pede seja declarado
pela sentença que, confirmando a liminar, concederá a segurança impetrada.
Dá-se à causa o valor de R$ .....
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]