RECURSO E RAZÕES - NEGATIVA DE AUTORIA - PENA-BASE ALTA
EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA ____ª VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE _________
Processo-crime nº _________
Objeto: apelação de sentença condenatória e oferecimento de razões
_________, brasileiro, casado, dos serviços residente e domiciliado nesta
cidade de ____________, pelo Defensor subfirmado, vem, respeitosamente, a
presença de Vossa Excelência, nos autos do processo crime em epígrafe, ciente da
sentença condenatória de folha ____ até ____, interpor, no prazo legal, o
presente recurso de apelação, por força do artigo 593, inciso I, do Código de
Processo Penal, eis encontrar-se desavindo, irresignado e inconformado com
apontado decisum, que lhe foi prejudicial e sumamente adverso.
ISTO POSTO, REQUER:
I.- Recebimento da presente peça, com as razões que lhe emprestam lastro,
franqueando-se a contradita a ilustrada integrante do parquet, remetendo-o,
após, ao Tribunal Superior, para a devida e necessária reapreciação da matéria
alvo de férreo litígio.
Nesses Termos
Pede Deferimento
_________, ____ de _________ de _____.
DEFENSOR
OAB/
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO _________
COLENDA CÂMARA JULGADORA
ÍNCLITO RELATOR
"No processo criminal, máxime para condenar, tudo deve ser claro como a luz,
certo com a evidência, positivo como qualquer expressão algébrica. Condenação
exige certeza... não bastando a alta probabilidade..., sob pena de se
transformar o princípio do livre convencimento em arbítrio" (RT 619/267)
RAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO FORMULADAS POR: _________
Volve-se o presente recurso contra sentença condenatória editada pela notável
e operosa Julgadora monocrática titular da ____ª Vara Criminal da Comarca de
_________, DOUTORA _________, a qual em oferecendo respaldo de agnição à
denúncia, condenou o apelante a expiar, pela pena de (03) três anos e (02) dois
meses e (20) vinte dias de reclusão, acrescida da reprimenda pecuniária cifrada
em (16) dezesseis dias-multa, dando-o como incurso nas sanções do artigo 155,
parágrafo 4º, incisos I, e IV, conjugado com o artigo 14, inciso II, e artigo
61, inciso I, todos do Código Penal, sob a clausura do regime fechado.
A irresignação do apelante, subdivide-se em três tópicos. Num primeiro
momento repisará a tese da negativa da autoria proclamada pelo réu em seu termo
desde na natividade da lide, a qual, contristadoramente, não encontrou eco na
sentença repreendida; para, num segundo momento, discorrer sobre a ausência de
provas robustas, sadias e convincentes, para outorgar-se um veredicto adverso,
em que pese tenha sido este emitido, de forma equivocada pela sentença, ora
respeitosamente reprovada, e por último sublevar-se-á contra a pena-base
outorgada, acima do mínimo legal.
Passa-se, pois, a análise em seqüencial da matéria alvo de debate, fracionada
em dois tópicos.
I.- NEGATIVA DA AUTORIA & DEFECTIBILIDADE PROBATÓRIA
Consoante sinalado pelo réu desde a primeira hora que lhe coube falar nos
autos (vide termo de declarações junto ao orbe inquisitorial de folha ____), o
mesmo foi categórico e peremptório em negar ter perpetrado o delito que lhe é
irrogado pela peça portal coativa.
Em juízo reiterou e sedimentou a tese de negativa da autoria, como se
depreende da leitura do termo de interrogatório de folha ____.
Obtempere-se, que a versão dos fatos esposada pelo recorrente, - a única fiel
e verdadeira - não foi ilidida e ou rechaçada com a instrução criminal, e
deveria, por conseguinte, ter sido acolhida, totalmente, pela sentença aqui
fustigada.
A bem da verdade, a prova judicializada, é completamente estéril e infecunda,
no sentido de roborar a denúncia, haja vista, que o Senhor da ação penal, não
conseguiu arregimentar um única voz, isenta e confiável, que depusesse contra o
réu, no intuito de incriminá-lo, do delito que lhe é graciosamente tributado.
Assim, ante a manifesta anemia probatória hospedada pela demanda, impossível
é sazonar-se reprimenda penal contra o réu, o qual proclamou-se inocente da
imputação, desde o princípio.
Outrossim, em perscrutando-se com acuidade e independência, a prova de índole
inculpatória, produzida com a instrução, tem-se que a mesma resume-se a palavra
da vítima do tipo penal, e àquela de origem policial, ambas comprometidas em sua
credibilidade, visto não possuírem a isenção e a imparcialidade necessárias para
arrimar um juízo de censura, como propugnado, e forma nitidamente equivocada,
pelo denodado integrante do parquet, o qual, para espanto e perplexidade da
defesa, logrou persuadir o altivo Sentenciante, quando ao delito em tela.
Gize-se, por fundamental, que a palavra da vítima do fato deve ser recebida
com extrema reserva, haja vista, que possui em mira, incriminar o réu, agindo
por vindita(1) e não por caridade(2) - a qual segundo apregoado pelo Apóstolo e
Doutor do gentios, São Paulo(3), é a maior das virtudes - mesmo que para tanto
deva criar uma realidade fictícia, logo inexistente.
Neste norte é a mais lúcida jurisprudência, coligida junto as cortes de
justiça:
"As declarações da vítima devem ser recebidas com cuidado, considerando-se
que sua atenção expectante pode ser transformadora da realidade, viciando-se
pelo desejo de reconhecer e ocasionando erros judiciários" (JUTACRIM, 71:306)
No mesmo quadrante é o magistério de HÉLIO TORNAGHI, citado pelo
Desembargador ÁLVARO MAYRINK DA COSTA, no acórdão derivado da apelação criminal
nº 1.151/94, 2ª Câmara Criminal do TJRJ, julgada em 24.4.1995, cuja transcrição
parcial afigura-se obrigatória, no sentido de colorir e emprestar consistência
as presentes razões: "Tornaghi bem ressalta que o ofendido mede o fato por um
padrão puramente subjetivo, distorcido pela emoção e paixão. Nessa direção,
poder-se-ia afirmar que ainda que pretendesse ser isento e honesto, estaria
psicologicamente diante do drama que processualmente o envolve, propenso a
falsear a verdade, embora de boa-fé..." (*) in, JURISPRUDÊNCIA CRIMINAL: PRÁTICA
FORENSE: ACÓRDÃOS E VOTOS, Rio de Janeiro, 1999, Lumen Juris, página 19.
De resto, os depoimentos prestados pelos policiais militares, não poderão, de
igual forma, operar validamente contra o apelante, haja vista, constituírem-se
(ditos milicianos) em algozes do réus possuindo interesse direto do êxito da
ação penal - da qual foi seu principais menores - máxime, considerado, que
participaram, ativamente, das diligências que culminaram com a prisão arbitrária
do recorrente, o que reluz do frontispício do auto de prisão em flagrante de
folha ____.
Assim, os informes de clave castrense, não detêm a menor serventia para
servirem de âncora ao decisum, eis despidos da neutralidade necessária e
imprescindível para tal desiderato, atuando, no feito, como verdadeiros
coadjuvantes do MINISTÉRIO PÚBLICO, tendo por meta, salvaguardarem o inquérito
policial, que serve de substrato a denúncia.
Em rota de colisão, com a posição adotada pela nobre Julgadora singular,
assoma indeclinável o traslado da mais abalizada jurisprudência, que fere com
acuidade o tema sub judice:
"Por mais idôneo que seja o policial, por mais honesto e correto, se
participou da diligência, servindo de testemunha, no fundo está procurando
legitimar a sua própria conduta, o que juridicamente não é admissível. A
legitimidade de tais depoimentos surge, pois, com a corroboração por testemunhas
estranhas aos quadros policiais" (Apelação nº 135.747, TACrim-SP Rel. CHIARADIA
NETTO)
Na seara doutrinária, outra não é a lição do renomado penalista, FERNANDO DE
ALMEIDA PEDROSO, in, PROVA PENAL, Rio de Janeiro, 1.994, Aide Editora, 1ª
edição, onde à folha 117/ 118, assiná-la: "Não obstante, julgados há que,
entendem serem os policiais interessados diretos no êxito da diligência
repressiva e em justificar eventual prisão efetuada, neles reconhecendo provável
parcialidade, taxando seus depoimento de suspeitos. (RT 164/520, 358/98,
390/208, 429/370, 432/310-312, 445/373, 447/353, 466/369, 490/342, 492/355,
495/349 e 508/381)"
Porquanto, em sondando-se a prova reunida à demanda, com a devida sobriedade
e comedimento, tem-se que inexiste uma única voz isenta e incriminar o
recorrente.
Efetivamente, se for expurgada a palavra de da vítima bem como a vertida
pelos milicianos, ambas manifestamente parciais e tendenciosas, em suas
claudicantes e inverossímeis assertivas, nada mais resta a delatar a autoria do
fato, imputado, aleatoriamente, ao apelante.
Sinale-se, ademais, que para referendar-se uma condenação no orbe penal,
mister que a autoria e a culpabilidade resultem incontroversas. Contrário senso,
a absolvição se impõe por critério de justiça, visto que, o ônus da acusação
recai sobre o artífice da peça portal. Não se desincumbindo, a contento, de tal
tarefa, marcha, de forma inexorável, a peça parida pelo integrante do parquet à
morte.
Nesta alheta e diapasão, veicula-se irresistível a compilação de
jurisprudência autorizada:
"A prova para a condenação deve ser robusta e estreme de dúvidas, visto o
Direito Penal não operar com conjecturas" (TACrimSP, ap. 205.507, Rel. GOULART
SOBRINHO)
"Sem que exista no processo um prova esclarecedora da responsabilidade do
réu, sua absolvição se impõe, eis que a dúvida autoriza a declaração do non
liquet, nos termos do artigo 386, VI, do Código de Processo Penal" (TACrimSP,
ap. 160.097, Rel. GONÇALVES SOBRINHO).
"O Direito Penal não opera com conjecturas ou probabilidades. Sem certeza
total e plena da autoria e da culpabilidade, não pode o Juiz criminal proferir
condenação" (Ap. 162.055. TACrimSP, Rel. GOULART SOBRINHO)
"Sentença absolutória. Para a condenação do réu a prova há de ser plena e
convincente, ao passo que para a absolvição basta a dúvida, consagrando-se o
princípio do 'in dubio pro reo', contido no art. 386, VI, do C.P.P" (JUTACRIM,
72:26, Rel. ÁLVARO CURY)
Donde, inexistindo prova segura, correta e idônea a referendar e sedimentar a
sentença, impossível resulta sua manutenção, assomando inarredável sua
ab-rogação, sob pena de perpetrar-se gritante injustiça.
Registre-se, que somente a prova judicializada, ou seja àquela depurada na
pira do contraditório é factível de crédito para confortar um juízo de
reprovação. Na medida em que a mesma revela-se frágil e impotente para secundar
a denúncia, percute impreterível a absolvição do réu, visto que a incriminação
de ordem ministerial, remanesceu defendida em prova falsa, sendo inoperante para
sedimentar uma condenação, não obstante tenha esta vingado, contrariando todas
as expectativas!
Destarte, todos os caminhos conduzem, a absolvição do réu, frente ao conjunto
probatório domiciliado à demanda, em si sofrível e altamente defectível, para
operar e autorizar um juízo epitímio contra o apelante.
Conseqüentemente, a sentença estigmatizada, por se encontrar lastreada em
premissas inverossímeis, estéreis e claudicantes, clama e implora por sua
reforma, missão, esta, reservada aos Preeminentes e Preclaros Desembargadores,
que compõem essa Augusta Câmara Secular de Justiça.
II.- DA PENA-BASE
Como se afere pela sentença prolatada pela honorável Magistrada a quo, a
mesma fixou ao réu a pena-base de (04) quatro anos e (03) três meses de
reclusão.
Entrementes, se forem sopesadas as circunstâncias judiciais elencadas no
artigo 59 do Código Penal, com a devida isonomia, sobriedade e equanimidade,
tem-se, que assoma injustificável e despropositada a fixação da pena-base, acima
do mínimo legal, haja vista, que o recorrente embora registre uma provável
condenação - no rol de folha ___, a de nº ______ - inexiste certidão da data de
trânsito em julgado desta, com o que o réu é tido, reputado e havido como
tecnicamente primário.
Neste rumo é mais lúcida jurisprudência, parida pela mais alta Corte de
justiça gaúcha:
TJRS: "Reincidência. Impõe-se ao seu reconhecimento prova inequívoca da
condenação anterior, com a data do respectivo trânsito em julgado, não suprindo,
a falta de certidão cartorária específica, ofício do juízo das execuções que não
contém essas informações, assim como também não a supre as declarações do
próprio réu, leigo em Direito" RJTJERGS: 161/35
Frente a tal quadro, afigura-se descabido, para não dizer-se extravagante, o
quantum da pena-base arbitrada pela sentença, aqui acerbamente censurada.
Portanto, postula o réu seja retificada a pena-base para o grau mínimo, eis
que lhe são favoráveis as circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do
Código Penal, como acima explicitado, sendo, manifestamente incabível e
inadmissível a permanência do quantum cifrado pela altiva Sentenciante, o qual
agravou de forma imoderada e descomedida a pena-base, o fazendo sob premissas
que contravêm de forma visceral e figadal a realidade fática que jaz albergada
ao feito, afrontando, assim a própria lei regente da matéria, perpetrando, nesse
momento, gritante injustiça, no que concerne a pena aplicada, fixada que foi em
infração aos parâmetros de razoabilidade e bom senso.
ANTE AO EXPOSTO, REQUER:
I.- Seja cassada a sentença judiciosamente buscada desconstituir,
expungindo-se da sentença o veredicto condenatório, uma vez o réu negou de forma
imperativa a autoria, desde o rebento da lide, cumprindo ser absolvido, forte no
artigo 386, IV, do Código de Processo Penal; e ou na remota hipótese de soçobrar
a tese mor (negativa da autora), seja, de igual sorte, absolvido, forte no
artigo 386, VI, do Código de Processo Penal, frente a manifesta e notória
deficiência probatória que jaz reunida à demanda, impotente em si e por si, para
gerar qualquer juízo adverso.
II.- Por derradeiro, na longínqua e remotíssima hipótese de não vingar a
postulação mor, elencada no item supra, seja revista a pena-base, aplicada ao
recorrente, fixando-a no mínimo legal, ou seja em (02) dois anos de reclusão,
bem como elegendo-se a fração de 2/3 (um terço), quanto a diminuição a ser
gerada pela tentativa, suprimindo-se, ainda, a circunstância agravante da
reincidência.
Certos estejam Vossas Excelências, mormente o Insigne e Culto Doutor
Desembargador Relator do feito, que em assim decidindo, estarão julgando de
acordo com o direito, e, sobretudo, restabelecendo, perfazendo e restaurando, na
gênese do verbo, o primado da JUSTIÇA!
_________, ____ de _________ de _____.
DEFENSOR
OAB/
NOTAS
(1) "O inverso da caridade é a vingança" Camilo Castelo Branco.
(2) "A caridade cristã não se limita a socorrer o necessitado de bens
econômicos; leva-nos, antes de mais nada, a respeitar e a defender cada
indivíduo enquanto tal, na sua intrínseca dignidade de homem e de filho do
Criador" J. ESCRIVÁ DE BALAGUER (Cristo que passa, nº 72)
(3) 1º Coríntios 13,1-13