Alegações finais em processo-crime, nas quais o réu alega que a prisão em flagrante foi forjada pelas autoridades, além de não ter sido atribuída oportunidade de defesa durante o trâmite processual.
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..... VARA CRIMINAL DA COMARCA DE .....,
ESTADO DO .....
PROCESSO-CRIME Nº .....
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., recluso na cadeia de ....., por
intermédio de seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em
anexo - doc. 01), com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro
....., Cidade ....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem
mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência apresentar
ALEGAÇÕES FINAIS
pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
Tendo-se em vista os fatos ocorridos nos presentes autos, durante a instrução
processual, emerge de forma cristalina a existência de vícios que levam a
nulidade do processo.
1. NULIDADE DA AUDIÊNCIA - FALTA DE FORMALIDADE ESSENCIAL
A inobservância de formalidade essencial para o ato praticado na instrução
processual, acarreta a nulidade desse ato, bem como dos demais que dele
decorrerem.
A intimação pessoal do réu para audiência é formalidade processual prevista no
CPP, que deve ser observada sob pena de infrigência ao art. 5º, incisos LIV e LV
da Constituição Federal.
Em decorrência da inexistência de intimação do réu para a audiência de instrução
e julgamento realizada no dia .... de .... de ...., aquele ato deve ser
declarado nulo de pleno Direito, pois foi realizado sem a regular intimação do
réu, que deveria ter sido intimado na forma da lei.
Cabente a observação do posicionamento da doutrina sobre tal matéria, como
segue:
"A efetividade dos diversos atos de comunicação processual representa condição
indispensável ao pleno exercício dos direitos e faculdades conferidos às partes;
sua falta ou imperfeição implica sempre prejuízo ao contraditório, comprometendo
toda atividade subsequente.
O Código de Processo Penal, no Título X do Livro I, prevê como formas de
comunicação processual as citações e intimações, embora também faça referência,
em outras disposições, às notificações (arts. 514, 570, etc.)." (As Nulidades no
Processo Penal, 4ª Edição, 1995, Ada Pellegrini Grinover, Antonio Scaranse
Fernandes e Antonio Magalhães Gomes Filho, Editora Malheiros, pág. 91).
"A validade da audiência depende, assim, de providências prévias consistentes na
intimação pessoal das partes: MP, réu e seu defensor e, se for o caso, advogado
do querelante (v., sobre intimações, Cap. VIII, nº 13)." (In ob. cit., pág.
137).
Quanto à certidão de que o réu estava em local incerto e não sabido e, ainda, o
fato do Oficial retornar ao local e proceder a intimação do réu de outro ato, a
jurisprudência tem uma só ótica:
"Apelação Criminal 0063425-7 - Maringá - 1ª Vara Criminal - Ac. 2671 - Juiz Conv.
Olivar Conegian - Primeira Câmara Criminal - Revisor: Juiz Nério Fea - Unânime -
Julg.: 24.03.94 - DJ: 15.04.94.
Por unanimidade de votos, deram provimento ao recurso para, preliminarmente,
anular o processo, a partir da falta da citação do réu.
FURTO SIMPLES - CONDENAÇÃO - CITAÇÃO - NULIDADE - ENDEREÇO CERTO - CERTIDÃO QUE
NÃO RESIDE NO ENDEREÇO - POSTERIOR INTIMAÇÃO DA SENTENÇA NO MESMO LOCAL - VÍCIO
DE CITAÇÃO - NULIDADE DO PROCESSO. CONSTITUI VÍCIO DE CITAÇÃO E INDUZ NULIDADE
PROCESSUAL O FATO DO RÉU NÃO TER SIDO CITADO PESSOALMENTE, INDO A REVELIA, POR
NÃO MAIS RESIDIR NO ENDEREÇO QUE DECLINOU - CONFORME CERTIFICOU O MEIRINHO - E
DEPOIS, SER INTIMADO DA SENTENÇA NO MESMO LOCAL."
Preceitua o art. 370, "caput", do Código de Processo Penal o seguinte:
"Art. 370. Nas intimações dos acusados, das testemunhas e demais pessoas que
devam tomar conhecimento de qualquer ato, será observado, no que for aplicável,
o disposto no Capítulo anterior."
O Capítulo anterior referido na disposição supra transcrita, diz respeito às
citações, que devem ser procedidas por mandado e ser pessoal, ou ainda, não
tendo sido encontrado o réu, far-se-á por edital com prazo de 15 dias (art. 361
CPP).
É conveniente observar as lições doutrinárias e a jurisprudência sobre o tema
relativo à intimação do réu para os atos do processo:
"O Réu solto sem defensor constituído, i. e., com defensor dativo.
A intimação deve ser pessoal; não encontrado o réu, por edital, nos termos do
inc. VI do art. 392." (In Código de Processo Penal Anotado, Damásio E. de Jesus,
10ª Edição, 1993, pág. 249, Editora Saraiva).
2. NULIDADE DA REVOGAÇÃO DA LIBERDADE PROVISÓRIA
No processo penal rege o princípio de que todos os atos processuais praticados,
após a ocorrência de nulidade processual e que dependam do ato nulo para sua
validade, também são nulos. O ato acessório segue a sorte do principal.
Por isso, frente à falta de intimação do réu para a audiência, que torna nulo
tal ato realizado em .../.../..., a decisão que revogou a liberdade provisória,
também não pode subsistir.
3. NULIDADE DO PROCESSO - INEXISTÊNCIA DE DEFESA DO RÉU
Analisando-se o conteúdo dos autos, vislumbra-se que a defesa do réu, em
verdade, é nenhuma, com exceção da peça prévia de defesa, a qual não exige
maiores enfrentamentos naquela fase processual. Porém, durante os trâmites
processuais que se efetivaram após o oferecimento da defesa-prévia, o réu ficou
adstrito à sua própria sorte, vez que não se vê nenhum ato por parte da sua
defensora que demonstrasse a efetiva defesa do denunciado.
A falta de defesa, que pode ser configurada pela inobservância, pela defensora
dativa, do mínimo de cautela em relação aos direitos do réu e diligência na
instrução processual, acarreta a nulidade do processo, por ferir o direito
constitucional da Ampla defesa. Configurada a inexistência de defesa, nulo é o
processo.
Nesse rumo é a jurisprudência:
DEFESA - NEGLIGÊNCIA EXTREMA - NULIDADE - EQUIVALE À FALTA DE DEFESA A ATUAÇÃO
EXAGERADAMENTE NEGLIGENTE DO DEFENSOR.
Ementa Oficial: Evidente a falta de defesa a atuação exageradamente negligente e
desinteressada, meramente formal do defensor dativo que, à face de várias e
importantes questões, limita-se a reconhecer a procedência da imputação e a
pedir clemência. Depois de ter figurado na instrução sem produzir prova ou fazer
reperguntas às testemunhas de acusação. (Apel. Crime nº 633/87 - Faxinal - Apte.:
Hélio Moreira César - Apdo.: Ministério Público - Rel. Juiz Luiz Viel - Acórdão
nº 12492 - Publicado no DJ/PR 15.12.87).
(...)
3. Segunda, porque o advogado nomeado pelo Juiz não atuou, figurando apenas
formalmente nos autos, com desinteresse e negligência, conforme aponta o ilustre
Dr. Promotor de Justiça, nas contra-razões. Admite-se que a defesa dativa tem
limitações, pela falta de entendimento com o acusado, na revelia, de meios etc..
Mas os temas de direito, as perguntas, o empenho, as alegações finais, devem
merecer atenção, exame e manifestação.
4. A combinação de vários e relevantes valores (ampla defesa, prestação pelo
poder público ao réu sem advogado, dificuldades do caso, falta de recursos e
informações para o trabalho do defensor dativo) conduziu a uma fórmula que
acabou escrita como CÚMULA da jurisprudência do Eg. STF, com o número 523:
"A deficiência da atuação da defesa constitui nulidade relativa (convalescível,
a reclamar argüição oportuna e demonstração do prejuízo); a falta de defesa
forma nulidade absoluta; a deficiência grave, acentuada, equivale à ausência, e
portanto também é causa de nulidade absoluta (mesmo porque a 'falta' no sentido
de inexistência física é rara)."
5. Muitos são os precedentes com que o Eg. STF enriquece a jurisprudência
brasileira com a proferição da nulidade pela atuação extremamente negligente do
advogado, geralmente dativo.
Cobra importância, para isso o exame da qualidade da defesa prestada com estejo
com o fato concreto e a existência de lances a salientar, detalhes a destacar,
temas a discutir.
Colhem-se alguns, meramente exemplificativos:
a) ...
g) DJU de 22.04.83, p. 4998, RHC nº 60.596, 1ª Turma, unânime, sendo a ementa
deste teor:
"Processo Penal - 1 - Determinava vista às partes para os fins dos arts. 499 e
500 do CPP, a defesa não fez qualquer manifestação, limitando-se a pedir o
relaxamento do flagrante. 2 - Requerer diligência e produzir alegações finais
são atos de alta relevância. A omissão de qualquer deles acarreta nulidade de
ordem pública, que deve ser decretada de ofício, nos termos do art. 193, II do
Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal."
4. DA NULIDADE DO FLAGRANTE
Auto de prisão em flagrante deve ser lavrado por escrivão habilitado, o qual
deve estar bem identificado naquele termo, para se verificar a sua capacidade
para tal mister. Porém no termo de fls. .... a .... não se tem o nome do aludido
"Escrivão" o qual não foi nominado e identificado no auto. Diante de tal
circunstância é de se perguntar: Qual escrivão redigiu o termo? Qual o seu nome?
Assim, tem-se que um dos requisitos para elaboração dos autos de prisão em
flagrante não foi satisfeito, devendo ser decretada a sua nulidade de plano.
Analisando o conteúdo do termo de prisão em flagrante, denota-se que em nenhum
momento os policiais, que foram qualificados como Condutor (....) e Segunda
Testemunha (....), mencionaram a presença dos policiais militares da .... na
diligência que culminou na prisão do denunciado. Esses policiais da ...., foram
nominados no depoimento de fls. .... pela testemunha .... Corroborando as
afirmações de ...., a testemunha .... (fls. ....) afirma que os policiais da
.... estavam fazendo parte da diligência a pedido do Delegado ....
As testemunhas ouvidas às fls. .... e .... afirmaram desconhecer o motivo da
omissão quanto à colheita dos depoimentos daqueles policiais (.... - ....,
Soldado Júnior e Soldado ....), quando da elaboração do flagrante.
Observando-se o auto de prisão em flagrante, constata-se que essas mesmas
testemunhas omitiram a presença da Polícia chamada .... na diligência.
O Escrivão que lavrou o auto de prisão em flagrante afirmou o seguinte:
"Às .... horas do dia vinte do mês de novembro do ano de mil, novecentos e
noventa e cinco, nesta cidade de ...., Estado do ...., na Delegacia de Polícia
Civil, onde presente se fazia o Sr. ...., Assistente de Segurança em exercício
neste Município comigo, Escrivão de seu cargo no final nomeado e assinado, e
sendo aí, compareceu o Sr. .... ..."
Assistente de Segurança à época do flagrante, ao prestar seu testemunho perante
esse douto Juízo, declarou que:
"... em virtude dos comentários a testemunha então Delegado de .... pediu ao
Juiz mandado e tendo sido atendido juntamente com dois policiais militares -
.... e .... dirigiram-se à residência do denunciado; que foram mais dois
policiais da .... que deixaram de ser ouvidas em virtude de não terem efetuado a
prisão, que foi efetuada por .... e ....;
O denunciado não se encontrava na residência, mas num bar próximo; então a
testemunha pediu ao acusado que acompanhasse os dois policiais até a residência;
que a droga foi encontrada atrás de um sofá na sala e que senão se engana a
prisão foi feita por ....; que a esposa do denunciado se encontrava na
residência;"
Ora, o Sr. .... não poderia estar na Delegacia de Polícia como consta do auto de
prisão em flagrante, pois participava da diligência que culminou na prisão do
denunciado. Por isso, inverdadeira a afirmação do Sr. Escrivão, no sentido de
que o Agente de Segurança .... estava na Delegacia e que ali lhe foi apresentado
o denunciado conduzido pelo policial ...., que estava acompanhado do outro
policial.
O Delegado estava junto com os policiais .... e ...., pois testemunhou isso em
Juízo.
Além disso, o Delegado ....afirma que o denunciado não estava em casa no momento
em que foram até a casa do mesmo e que a droga foi apreendida atrás de um sofá.
Não se tem com isso, uma clara descrição da situação ocorrida, pois no auto de
prisão em flagrante os policiais afirmam que primeiro encontraram o réu, que foi
convidado a acompanhar a diligência em sua residência. Já o Delegado .... afirma
que primeiro se dirigiram à casa do denunciado e depois é que esse Delegado
pediu para que o denunciado acompanhasse os policiais até a residência.
Como se vê, não há consonância entre o contido no auto de prisão em flagrante e
os testemunhos dos próprios policiais que participaram da busca na residência do
réu e da sua prisão.
Porém, o fato mais importante, e que revela o ânimo dos policiais que efetuaram
a prisão e firmaram o auto do flagrante, é relativo à omissão da participação
dos policiais da .... na diligência de busca e que resultou na prisão do ora
acusado. Ademais, o Delegado afirmou em juízo que eram 2 (dois) policiais da
...., enquanto que a testemunha .... (fls. ....) revelou que eram 3 (três) tendo
inclusive nominado os mesmos.
A divergência das versões das testemunhas e a omissão da participação dos
policiais Sargento ...., Soldado Júnior e Soldado ...., levam a concluir que o
auto de prisão em flagrante é nulo de pleno Direito, pois não contém todos os
fatos relevantes ocorridos durante a prisão do ora réu.
Como ensina o Mestre José Frederico Marques, descumpriu-se a regra de que tudo
será reduzido a termo em um só auto. (A. cit. Elementos, IV/73, ed. 1965).
A nulidade do auto se revela pelas omissões nele contidas, pois a presença da
esposa do denunciado e dos policiais da .... não constou do termo, o que acaba
por prejudicar a defesa do réu, haja vista que pessoas que presenciaram o
flagrante não foram ouvidas e essa oitiva poderá trazer outros elementos aos
presentes autos que indiquem a veracidade das afirmações do réu em seu
depoimento. O prejuízo causado ao réu é cristalino.
Por isso deve ser decretada a nulidade do auto de prisão em flagrante, por ser
de direito e de justiça.
5. RECONSIDERAÇÃO DA REVOGAÇÃO DA LIBERDADE PROVISÓRIA
Acaso superadas as preliminares retro sustentadas, o que resta pouco provável,
cumpre ao réu abordar todos os temas nessa oportunidade, para resguardar afastar
a preclusão.
No que tange à decisão que revogou a liberdade provisória, verifica-se que tal
foi exarada com fundamento único da ausência do réu à audiência de instrução e
julgamento realizada na data de .../.../...
Entretanto, ocorre que o réu, como já ficou bem demonstrado, não foi intimado
para aquele ato. Por isso a sua ausência não pode ser considerada como
descumprimento à condição assumida por ocasião da concessão do benefício.
Não tendo sido descumprida tal condição, a manutenção da revogação está ferindo
o direito de liberdade do réu que já havia sido contemplado com a liberdade
provisória.
Oportuno salientar que pelos fatos ocorridos, tem-se que o réu não pode suportar
o ônus por erro que não deu causa. O fato do Sr. Oficial não tê-lo encontrado
para proceder a intimação da audiência, não pode levar à revogação do benefício,
até porque esse mesmo Meirinho intimou o réu no mesmo endereço, da renúncia do
defensor, isso após a diligência negativa para intimar o acusado da designação
da audiência.
Por isso, ante as nulidades apontadas, é de ser reconsiderada a decisão que
revogou a liberdade provisória em favor do réu, restabelecendo-se o benefício
por ser questão de Justiça.
DO MÉRITO
DOS FATOS
1. QUANTO A INTIMAÇÃO DO RÉU PARA A AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO
O denunciado, após o seu interrogatório, teve concedida por esse douto Juízo a
Liberdade Provisória (fls. ....), condicionada ao comparecimento a todos os atos
do processo, posteriores, sob pena de revogação.
Depois disso, às fls. .... o réu firmou o termo de liberdade provisória,
comprometendo-se a cumprir a determinação do juízo, no sentido de comparecer a
todos os atos do processo, sempre que for intimado, sob pena de ser revogado o
benefício. Expedido o alvará de soltura, o réu foi posto em liberdade, conforme
certidão de fls. .../verso.
O denunciado ofereceu sua defesa-prévia (fls. ....), arrolando .... testemunhas
e pedindo a oitiva das mesmas.
Às fls. .... foi exarado despacho designando audiência de instrução e julgamento
para o dia .../.../... às .... horas, determinando a intimação das testemunhas.
Expedida a carta de intimação do réu para audiência de instrução e julgamento,
esta foi remetida via postal, tendo o comprovante de entrega sido juntada aos
autos, sem a assinatura do destinatário (fls. ....). Decorrência disso, foi
expedido mandado para intimação pessoal do réu (certidão de fls. ....), tendo
sido entregue ao Sr. Oficial de Justiça, o qual desenvolveu o mandado que foi
juntado às fls. ...., com a seguinte certidão exarada no seu verso:
"CERTIFICO que, em cumprimento ao respeitável mandado, dirigi-me ao(s) local(is)
indicado(s) e deixei de intimar ...., face não ter encontrado, fui informado que
mudou-se para ...., mas como não deixou endereço correto, para mim está em lugar
incerto e não conhecido.
Dou fé,
Em, 02 de agosto de 1996."
A digna escrivania, como sempre diligente, certifica (fls. ....) que, além do
mandado de intimação retro citado, teria expedido carta precatória para o
endereço declinado às fls. .... (final).
Tal carta precatória, em verdade foi expedida para a Comarca de .../..., para
que fosse o réu intimado naquela cidade, sendo certo que o endereço declinado
pelo réu é da cidade de .../..., que é município distinto de .../... Evidente o
equívoco da escrivania, que acabou por determinar a falta de intimação do réu
pelo desconhecimento do endereço na cidade de .../... Ora, o endereço apontado
pelo réu é claro e indica a cidade .../... e não .../..., que são cidades e
municípios diversos.
Na data de .... de .... de ...., o antigo defensor do réu protocolizou
expediente junto a esse douto Juízo (fls. ....), comunicando a sua renúncia ao
mandato tácito que lhe havia sido outorgado pelo acusado, requerendo a intimação
desse valor sobre a renúncia e para constituir novo patrono na causa.
Ante a renúncia manifestada, esse Juízo às fls. .... determinou a intimação do
réu para que constituísse novo defensor no prazo de 3 (três) dias. O mandado de
intimação foi expedido e entregue ao mesmo Oficial de Justiça (Sr. ....) que,
após cumpri-lo, devolveu-o ao cartório. Tal mandado foi juntado às fls. ....,
constatando a seguinte certidão em seu verso:
"CERTIFICO que, em cumprimento ao respeitável mandado, dirigi-me ao(s)
endereço(s) mencionado(s) e aí intimei, de todo conteúdo, a(s) testemunha(s)
...., que bem ciente(s) ficou(aram).
Dou fé,
Em, 23 de agosto de 1996."
Como se vê, o mesmo Oficial de Justiça que havia certificado às fls. .../verso
que em .../.../... não havia encontrado o réu, que estaria em local incerto e
desconhecido, voltou ao endereço da residência do réu em .../... no dia
.../.../... (fls. .../verso) e procedeu a intimação pessoa do réu quanto à
renúncia do defensor.
Como poderia o réu estar em local incerto e desconhecido se o próprio oficial
que isso certificou, voltou ao local e encontrou o réu, intimando-o do conteúdo
do mandado de fls. ....?
Por outro lado, porque o Sr. Oficial não intimou o denunciado quanto à
designação da audiência que ocorreria em .../.../..., para instrução e
julgamento do processo?
Ademais, a escrivania desse r. Juízo certificou às fls. .... o seguinte:
"CERTIFICO, que o denunciado ...., intimado, nos termos da certidão de fls.
.../verso, do Sr. Oficial de Justiça, não constituiu novo Defensor no prazo
assinalado (fls. ....). Dou fé.
Cidade Gaúcha, 06 de setembro de 1996.
Valmir Ivan Enumo
Escrivão do Crime"
Em virtude da inércia do denunciado em constituir novo patrono, foi nomeado como
sua defensora dativa a Dra. .... (fls. ....), a qual foi intimada do despacho
que a nomeou e ainda do despacho de fls. ...., referente à audiência de
instrução e julgamento.
Aberta a audiência na data de .../.../..., foram apregoadas as partes, tendo
sido constatada a ausência do réu para aquele ato. Tal ausência ficou consignada
no termo de audiência de fls. ...., sem que se fizesse qualquer menção ao fato
da falta de intimação do mesmo para o desiderato. O douto representante do
Ministério Público, protestou pela revogação da liberdade provisória concedida
ao réu, por entender que o mesmo descumpriu a condição legal de comparecer a
todos os atos do processo.
Aberta nova vista dos autos para o Ministério Público, esse reiterou o pedido de
revogação da prisão preventiva (fls. .../verso).
Analisando o pleito do "parquet" esse digno juízo proferiu a decisão de fls.
.... e verso, revogando o benefício da liberdade provisória, sob o fundamento de
que:
"o denunciado - sem justificativa - deixou de cumprir a condição de
comparecimento aos termos do processo (não comparecendo à audiência fls. .... e
v.). 2. Portanto (...), ante o flagrante descumprimento da condição, como dito,
revogo o benefício da liberdade provisória." (grifos no original)
Em que pese o notório saber jurídico do ilustre Magistrado que exarou a decisão
de fls. .... e verso, revogando a liberdade provisória do réu, emerge claro que
não se houve com o costumeiro acerto, pois como já demonstrado acima e pelo que
consta dos autos, o denunciado não foi intimado para comparecer à audiência da
qual teria se ausentado. POR ISSO INEXISTE DESCUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES IMPOSTAS
PARA A LIBERDADE PROVISÓRIA.
Evidente que o réu não poderia comparecer para a audiência para a qual não foi
intimado. Cumpre salientar que o Oficial de Justiça, certificou que não
encontrou o réu, quando do cumprimento do mandado de intimação para a audiência
de instrução e julgamento, porém, após exatos 21 (vinte e um) dias, o mesmo
Oficial de Justiça voltou ao endereço do denunciado e ali procedeu a intimação
do mesmo quanto ao prazo para constituir novo defensor (fls. .../verso). Esse
.... já havia certificado nos autos que, para ele (Oficial de Justiça) o réu se
encontrava em local incerto e não conhecido (fls. .../verso). Ora, mesmo sendo
presumida a fé-pública das certidões dos Oficiais de Justiça, observa-se que há
indício de má-fé na certidão aposta pelo meirinho às fls. .../verso, pois soa
claro que o Oficial sequer deve ter ido ao endereço do denunciado para intimá-lo
para a audiência, haja vista que mesmo tendo afirmado que o réu se encontrava em
local incerto e desconhecido, o Sr. .... (Oficial de Justiça) retornou à
residência do denunciado, depois de 21 dias, e ali o encontrou, procedendo a
intimação de fls. ....
Pergunta-se: Por que o Sr. Oficial não intimou o denunciado para comparecer a
audiência do dia .../.../..., quando o encontrou e o intimou da renúncia do seu
defensor? Por que o Sr. Oficial não solicitou o desentranhamento do mandado de
intimação do réu para a audiência, após tê-lo encontrado no mesmo endereço?
Resta claro que houve omissão do Sr. ....
2. DA FALTA DE INFRIGÊNCIA À CONDIÇÃO ASSUMIDA PELO RÉU, QUANTO AO
COMPARECIMENTO AOS ATOS DO PROCESSO
Como se denota pelos acontecimentos processuais, emerge claro que houve equívoco
na apreciação da situação pelo douto representante do Ministério Público, ao
protestar pela revogação da liberdade provisória, calcado no fato do não
comparecimento do réu a audiência de instrução e julgamento, bem como, desse
douto Juízo ao deferir o pleito do "parquet", haja vista que o réu não deixou de
comparecer à audiência, vez que NÃO FOI REGULARMENTE INTIMADO PARA AQUELE ATO,
como pode ser comprovado pelas certidões exaradas pelo Sr. Oficial de Justiça
dessa Comarca às fls. .../verso e, ainda, pela certidão passada pelo Meirinho da
Comarca de .../... às fls. .../verso.
Ora, a infrigência à condição imposta para a concessão da liberdade provisória
só teria ocorrido se o denunciado tivesse sido intimado para a audiência. Isso
"data vênia" não ocorreu.
Não é redundante esclarecer que a Cidade de ...., não é a Cidade de ...., sendo
municípios diversos. Em virtude disso o fato do Sr. Oficial não ter encontrado o
endereço declinado pelo réu às fls. ....
Vale ressaltar que não tendo sido realizada a intimação pessoal, deveria essa
ter sido feita por edital, o que não foi feito.
3. QUANTO À INEXISTÊNCIA DE DEFESA DO RÉU
No interrogatório do acusado, esse afirmou que não tinha defensor constituído,
mas que iria providenciar (fls. ....).
No trídio seguinte ao interrogatório, o Dr. .... ofertou a defesa-prévia do
denunciado, conforme já noticiado acima.
Em .../..., aquele defensor do réu, manifestou sua renúncia ao mandato tácito a
ele outorgado, não tendo praticado nenhum ato nos autos em nome do seu
constituído, com exceção da defesa preambular.
Não tendo o réu constituído novo patrono, após ser intimado da renúncia, foi
nomeada a Dr. .... como defensora dativa, a qual tomou ciência da sua nomeação
em data de .../.../... (fls. .../verso).
Depois de sua nomeação, a defensora dativa praticou os seguintes atos em nome do
réu:
a) .../.../... - Desistiu das testemunhas de defesa, não encontradas (fls.
..../verso).
b) .../.../... - Participou da audiência de instrução.
Na audiência realizada, a defesa participou elaborando uma única pergunta à
testemunha de acusação .... Não fez nenhuma pergunta à testemunha ...., arrolada
pela acusação. Durante a oitiva da testemunha ...., também arrolada pelo
Ministério Público, a Defensora fez apenas uma indagação, relativa à residência
da testemunha e o conhecimento do réu. A Defensora fez algumas indagações
genéricas à testemunha arrolada pela defesa. Ao final da audiência a defesa
insistiu no depoimento das testemunhas ausentes, tendo sido concedido o prazo de
3 (três) dias para que fosse indicado pela defesa o endereço atual e/ou correto
das testemunhas.
Decorrido o prazo concedido pelo Juízo, a Defensora não se pronunciou em nome do
réu, transcorrendo o prazo "in albis".
Proferida a decisão que revogou a Liberdade Provisória concedida ao denunciado,
a Defensora foi intimada em .../.../... (fls. ....), retirando os autos em carga
na data de .../.../..., os quais foram devolvidos em .../.../..., sem qualquer
manifestação em nome do réu, tendo sido certificado o trânsito em julgado da
decisão de fls. .... e verso.
Verificando os atos praticados pela Dra. Defensora Dativa, chegou-se a conclusão
de que o réu, efetivamente, não foi defendido no curso da ação penal, pois fatos
importantes ocorridos e noticiados nos autos não foram objeto de apreciação pelo
douto Juízo, sendo obrigação da defesa protestar pela apuração desses fatos.
Além disso, a falta de intimação do réu para a audiência de instrução e
julgamento gerou nulidades processuais insuperáveis, inclusive quanto à decisão
que revogou o benefício da liberdade provisória, que foi proferida fundamentada
na ausência do réu na audiência, mesmo restando claro que o mesmo não foi
intimado para o ato.
Quanto aos fatos noticiados nos autos e que deveriam ser explorados pela defesa,
vale citas os seguintes:
1. No seu interrogatório o denunciado afirmou, categoricamente, que o flagrante
foi forjado, em represália do Delegado .... que segundo o denunciado, havia
planejado o furto de .... caminhões e .... trator, e que efetivamente foi
furtado .... caminhão e .... trator. Afirmou o réu, ainda, que o Delegado havia
convidado o ora réu para perpetrar furtos e que esse denunciava aos
proprietários dos bens, com antecedência, o que iria ocorrer. A quadrilha era do
Delegado.
2. Durante a audiência de instrução, a testemunha .... (de acusação) - fls. ....
- declinou que a diligência efetuada na casa do denunciado, quando do flagrante,
foi acompanhada por policiais da ...., Sargento ...., Soldado e ..... A
testemunha informou que não sabia porque os policiais da .... não foram ouvidos
por ocasião da lavratura do flagrante. Disse a testemunha que ouviu o denunciado
dizer que o flagrante era forjado.
3. Já a testemunha .... - fls. .... -, também afirma que os policiais da ....
acompanharam as diligências de que decorreu o flagrante, porém, não soube
esclarecer o fato daqueles policiais não terem sido ouvidos por ocasião da
lavratura do flagrante. Relatou, ainda, que era possível que a droga fosse
colocada pela janela, estando do lado de fora.
4. O Delegado, relatou que os policiais da .... não foram ouvidos por não terem
efetuado a prisão.
Com base nesses testemunhos, cumpria à defesa com o mínimo de diligência,
requerer a oitiva dos nominados policiais da ...., que pertencem à Polícia
Militar do ...., para que aqueles policiais prestassem esclarecimentos sobre os
fatos ocorridos, por ocasião do flagrante, pois evidente que houve omissão na
colheita dos testemunhos daqueles policiais, quando da confecção do flagrante.
Causa maior espanto a afirmação do Delegado ...., quando diz que os policiais da
.... não participaram da prisão. Ora, se os policiais não participaram da
prisão, onde estavam eles? Como poderiam ter participado da diligência junto à
residência do acusado e não da prisão que, pelo que consta do auto de prisão em
flagrante, foi efetivada durante essa mesma diligência?
Vale frisar que os policiais da chamada ...., são elementos de alto preparo que
tem como função investigar os atos praticados pelos próprios policiais
militares. É de suma importância a tomada dos depoimentos daqueles policiais.
Soa claro que há fatos relevantes que emergiram na instrução processual e que
deverão ser objeto de maior apreciação pelo Juízo, sendo ofício da defesa buscar
a produção das provas para elucidar tais fatos. Porém, a Defensora nada fez,
trazendo enorme prejuízo ao réu, que poderá ter a sua versão da farsa do
flagrante comprovada. Ademais, pelo contido no interrogatório do acusado,
cumpria a defesa requerer a expedição de ofício à Delegacia de .../... de
.../..., para requerer informações sobre as últimas ocorrências de furto nessas
cidades, para observar se houve o furto de .... caminhão e trator, como afirmado
pelo réu.
Aqui cabe observar a cópia do Boletim de Ocorrência ora juntado, dando conta de
um furto ocorrido em .../.../... na Cidade de ...., de um caminhão e um trator,
ou seja, há cunho de verdade no depoimento do réu.
Ora, se houve o furto, evidente que a afirmação do réu quanto ao flagrante
forjado deve ser apurada com maior cautela.
Mas não é só. A defesa do réu deveria ter protestado pela substituição das
testemunhas ausentes à audiência, requerendo a oitiva dos policiais da ....,
tendo-se em vista que o Juízo não se dignou a intimar aqueles policiais para
serem ouvidos, diante dos depoimentos das testemunhas de acusação que atestaram
a presença dos policiais na diligência que resultou no flagrante.
Demais disso, competia à defesa do réu protestar pelo adiamento da audiência,
pois o denunciado estava ausente ao ato, por não ter sido intimado para tanto.
Não tendo feito isso, cumpria à defesa recorrer da decisão que revogou o
benefício da liberdade provisória, pois não ocorreu descumprimento das condições
impostas pelo Juízo, diante da falta de intimação do acusado.
Ultrapassada audiência, nada foi requerido pela Dra. Defensora, que à luz do
art. 499, poderia ter pedido as diligências acima indicadas, buscando trazer aos
autos provas dos fatos sustentados pelo réu em seu depoimento. Nada fez a
defesa.
Destarte, a título de ilustração, o denunciado foi informado, recentemente, que
o Sr. .... estaria sendo procurado pela Justiça, estando com prisão decretada
pela prática de delitos penais, o que revela a índole do antigo Delegado de ....
que efetuou a prisão do denunciado. Tal fato de relevância inestimável deverá
ser objeto de apreciação por esse Juízo, a fim de obter a verdade dos fatos
ocorridos no dia do aludido flagrante.
4. DOS PREJUÍZOS CAUSADOS AO RÉU
Cabe ao réu demonstrar o prejuízo que os atos eivados de nulidade lhes trouxe.
No caso em exame, tal prejuízo é notório, pois a falta de intimação para a
audiência de instrução do processo, acarretou na revogação da Liberdade
Provisória de que era beneficiário o réu. Ora, se o réu tivesse sido intimado
para o ato, ele estaria ciente de que iria ocorrer a realização do ato e poderia
ter comparecido, evitando o pleito do Ministério Público e a Revogação exarada
desse douto Juízo. O prejuízo é claro e escandaloso.
Já a revogação da liberdade provisória foi baseada no suposto descumprimento de
condição assumida pelo réu, retirando assim, o benefício concedido ao réu de
responder aos termos da ação penal em liberdade. Porém a condição de comparecer
aos atos do processo não foi descumprida pelo denunciado, sendo notória a falta
de intimação desse da designação da aludida audiência. No termo de liberdade
provisória entregue ao réu, ficou consignado que esse deveria comparecer aos
atos da Ação Penal, sempre que for intimado, sob pena de ser revogado o
benefício (fls. ....).
Se o réu não foi intimado, a decisão que revogou o benefício é nula, pois foi
calcada no suposto descumprimento da condição para manutenção da liberdade já
concedida, sem observar a falta da intimação. Mais uma vez, notório o prejuízo
do réu, ante a inobservância pelo MM. Juiz da falta de intimação para o ato,
haja vista que o denunciado teve o benefício revogado, devendo responder aos
termos do processo na prisão, vendo cerceado o seu direito à liberdade de que
era beneficiário.
Quanto à negligência da defensora pública, o prejuízo resta configurado no fato
de que o réu teve condições de provar ao Juízo as suas alegações contidas no
interrogatório, em relação ao furto dos veículos, inimizade com o Delegado, o
flagrante forjado, etc. Bastava à defesa protestar pela oitiva dos policiais
NOMINADOS da ...., que participaram da diligência e que estranhamente não foram
ouvidos na elaboração do auto de prisão em flagrante e no curso da ação penal.
Por outro lado, na oportunidade do art. 499, deveria a defesa protestar pela
expedição de ofício às delegacias de .... e Cidade .... requisitando informações
sobre o furto de um caminhão e de um trator nos últimos meses, antes do
flagrante que deu azo à presente ação.
O Tribunal de Justiça do Paraná já se pronunciou em diversas oportunidades, em
casos similares, pela absolvição do réu, quando havendo várias testemunhas do
fato e tendo sido mencionadas as mesmas no decorrer do processo, não tenham sido
elas ouvidas. É o que se denota pelo julgado a seguir transcrito:
"TÓXICO - PORTE SENTENÇA CONDENATÓRIA APOIADA EM ELEMENTOS FRÁGEIS - DADOS
OBTIDOS DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS QUE PARTICIPARAM DA DILIGÊNCIA E
CONFLITANTES ENTRE SI - FATO OCORRIDO EM DISCOTECA E QUE, PORTANTO, PROPICIAVA A
CONVOCAÇÃO DE OUTRAS PESSOAS PARA DEPOR - CASO DE ABSOLVIÇÃO." Ap. Crime 28/87 -
Maringá - Apte.: Juliano Bertin - Apda.: A Justiça Pública - Rel. Des. Henrique
César. (in Paraná Judiciário 23/226).
Ultrapassada a fase do art. 499, sem que a defensora dativa protestasse por
diligências, o réu teve prejudicada toda a sua defesa, culminando por não poder
provar nada do que alegou em seu depoimento, e, cuja possibilidade de prová-las,
emergiu no próprio curso da ação penal, pelas evidências contidas nos
depoimentos dos policiais que serviram como testemunhas de acusação.
O prejuízo é evidente, não havendo necessidade de maiores considerações.
A única notícia que se tem nos autos, decorrentes dos testemunhos só de
policiais que efetuaram a prisão, é de que se ouviram boatos de que o réu
comerciava substâncias entorpecentes na Cidade de .... e que o mesmo não possui
dificuldades econômicas e não exerce atividade profissional. Esses policiais
asseveraram no auto de prisão que há muitos indícios de que o réu era, na época
da prisão, traficante.
No bojo dos autos não se vê qualquer indício de que o réu traficava drogas na
Cidade de .... Os tais indícios jamais foram trazidos aos autos, sendo meras
alegações dos policiais que efetuaram a prisão.
Nesse prisma, não se pode olvidar que a quantidade de tóxico apreendida e as
condições de acondicionamento do produto, revelam que a substância não estava
embalada para o comércio, mas sim para o consumo próprio.
Não há qualquer prova nos autos que o réu tenha vendido tóxico na Cidade de ....
ou região.
Quanto ao fato do réu não exercer profissão àquela época, isso ocorreu porque o
mesmo é proprietário de alguns imóveis na Cidade de ...., e aufere rendimentos
em decorrência da locação desses bens. A única testemunha da defesa ouvida,
comprova isso, quando afirma:
"O denunciado além da residência própria tem uma outra e aluga para pontos
comerciais;"
O denunciado possui esses imóveis até a presente data, sendo que a administração
dos bens está a cargo do seu pai. Com o rendimento auferido das locações, o ora
réu tinha condições de manter sua subsistência.
Mesmo em situação desvantajosa na presente ação, o réu declarou em juízo que o
flagrante foi forjado e que o Delegado .... era o chefe de quadrilha que age na
região de .... e que essa quadrilha havia furtado um caminhão e um trator, o que
resta evidenciado pela cópia anexa da ocorrência lavrada na Delegacia de ....
Haviam mais policiais na diligência que culminou na prisão do denunciado. Tais
policiais não foram ouvidos por ocasião da elaboração do auto de prisão em
flagrante e em Juízo, porém esse fato torna inverossímil a versão dos policiais
que efetuaram a prisão, haja vista que naquele auto de prisão, fatos relevantes
foram omitidos.
DO DIREITO
Relevante, também, o fato de que durante a instrução criminal nenhuma prova veio
aos autos que pudesse imputar ao réu a prática de delito previsto no art. 12 da
Lei nº 6.368/76.
A pequena quantidade de droga apreendida não revela por si só a comercialização
de tóxicos.
Esse é o posicionamento uníssono da jurisprudência, como se observa:
"Sem juízo de certeza em relação à finalidade e à habitualidade, prevalece o
reconhecimento do fim para uso em grupo." (TJRS - Ac. 685042657 - Rel. Cristovan
Daniello Moreira - RJTJRS 116/87).
"Certa a materialidade mas incerta a finalidade, impõe-se desclassificar o fato
de tráfico para uso de entorpecentes." (TJRS - Ac. 684055015 - Rel. Cristovan
Daniello Moreira - RT 611/399).
"TRÁFICO DE ENTORPECENTE - INEXISTÊNCIA DE PROVA SUFICIENTE À CARACTERIZAÇÃO DA
TRAFICÂNCIA - CASO EM QUE SE IMPÕE A DESCLASSIFICAÇÃO PARA AO FIGURA DA POSSE
PARA USO PRÓPRIO (ART. 16 DA LEI 6.368/76).
Ementa Oficial: A preliminar invocada. Ausência de prova Técnica, com a devida
licença, não tem consistência, já que existe nos autos a indispensável prova
pericial que concluiu ser maconha a substância apreendida. No entanto, não
restou demonstrado que o apelante estaria praticando traficância; ilações,
presunções, não podem resultar em condenação por ilícito penal mais grave;
impõe-se, por isso, a desclassificação pleiteada nas razões de irresignação.
Recurso parcialmente provido." Ap. Crime 399/87 - Antonina - Apte.: Dirceu
Pereira - Apda.: A Justiça Pública - Rel. Des. Plínio Cachuba. (In Paraná
Judiciário 25/228).
Não se tem notícia de que qualquer pessoa tenha comprado entorpecente do réu.
Não há nenhum fato anterior cometido pelo réu na cidade de .... que revele a sua
propensão para o tráfico de tóxicos.
Todas as provas produzidas pela acusação devem ser valoradas com restrições, eis
que são testemunhos dos policiais, tão somente.
Não se pode perder de vista as declarações do réu que diz ser usuário esporádico
de "cannabis sativa", o que pode levar a conclusão de que se o tóxico estava em
sua residência era para o consumo próprio e não para o tráfico, o que resultaria
na desclassificação do tipo legal para o art. 16 da Lei nº 6.368/76.
O réu é primário na concepção técnico/jurídica, devendo ser desconsiderada as
certidões de fls. ...., .... e .... para fins de reincidência.
A certidão expedida pelo Poder Judiciário de ...., não pode ser considerada para
os efeitos e reincidência, tendo-se em vista que a pena cumprida pelo réu foi
extinta em .../.../... Ou seja, tal condenação não afasta a condição primária do
réu, pois houve o transcurso de mais de .... anos entre a extinção da pena e a
infração noticiada no auto de prisão em flagrante que embasa a presente ação
penal.
Já a certidão de fls. .../verso dá conta de que o réu foi condenado na ação
penal de nº .../..., sendo que lhe havia sido concedido o "sursis". Em virtude
da suspensão do cumprimento da pena, foi realizada a audiência admonitória na
data de .../.../..., tendo a pena sido extinta em .../.../... Nesse caso a data
do termo inicial para o cálculo do quinquênio prescritivo dos efeitos da
condenação é aquela da audiência admonitória.
Vale atentar para o conteúdo da ementa que segue:
"Concedido o 'sursis' na condenação anterior, o prazo fixado no art. 64, I do
Código Penal tem como termo inicial a data da audiência admonitória. A data da
impetração do 'habeas corpus'; não pode, à falta de previsão legal, constituir
termo final do prazo prescricional." (STF - HC 70164-7 - Rel. Ilmar Galvão -
DJU, de 16.04.93, p. 6437).
Assim, a primariedade do réu é evidente, pois, entra a audiência admonitória e a
data da infração noticiada no auto de prisão em flagrante, transcorreram-se mais
de 5 (cinco) anos, o que expurga aquela condenação para efeitos de rescindência.
As referências contidas nas certidões referentes aos inquéritos policiais
instaurados contra o denunciado, dão conta que jamais ele foi indiciado por
porte ou tráfico de entorpecentes após o cumprimento da pena no Estado de ....,
isso há mais de 10 anos. Ora, o réu não pode ser sacrificado por fato ocorrido
quanto tinha apenas .... anos de idade (imaturidade), sendo certo que cumpriu a
pena que lhe foi imposta naquela ocasião. Não se pode sequer ser considerado
antecedente criminal, pois ultrapassado tão longo período não se pode atribuir
conexão àquela conduta anterior ao fato que originou a presente ação. A
primariedade do réu é incontestável.
DOS PEDIDOS
À vista do exposto, da jurisprudência e do direito, requer a defesa seja
declarada a nulidade do auto de prisão em flagrante e, em conseqüência, de todo
o processo por ser esse decorrente daquele; acaso superada essa preliminar,
requer sejam decretadas as demais nulidades argüidas acima, renovando-se todos
os atos processuais a partir da designação da audiência de instrução e
julgamento, deferindo-se a oitiva dos policiais ...., Soldado Júnior e Soldado
...., bem como seja reconsiderada a decisão que revogou a liberdade provisória
do réu, restabelecendo-se o benefício injustamente revogado, até o final da
ação.
Outrossim, eventualmente, sendo superadas as preliminares, requer seja o réu
absolvido da imputação que lhe foi feita (art. 12 da Lei nº 6.368/76 tendo-se em
conta que não restou aprovada a prática de tal delito. Por outro lado, requer,
caso esse douto Juízo entenda que o tóxico foi efetivamente encontrado na casa
do réu, seja desclassificada a tipificação atribuída ao fato, para o art. 16 da
mesma lei, atribuindo-lhe a pena mínima legal, isso porque não restou comprovado
qualquer das figuras previstas no art. 12.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]