Contestação à ação rescisória sob alegação de inépcia da inicial, porque não se poderia pedir a rescisão da sentença e acórdão, concomitantemente e, inexistência de documento novo.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO COLENDO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DE .....
AUTOS Nº .....
Estado do ...., pessoa jurídica de direito público interno, através de seu
Procurador abaixo subscrito, vem mui respeitosamente à presença de Vossa
Excelência apresentar
CONTESTAÇÃO
à ação rescisória de nº ....., interposta por massa falida ......, pelos motivos
de fato e de direito a seguir aduzidos.
PRELIMINARMENTE
A presente ação objetiva rescindir as decisões consubstanciadas na sentença de
primeiro grau proferida pela ....ª Vara Cível da Comarca de ...., e no acórdão
nº ...., da ....ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal.
Uma primeira observação a ser feita diz respeito à impropriedade de se voltar a
ação rescisória também contra o acórdão nº ...., da ....ª Câmara Cível. Como
verdade, o arresto apenas veicula decisão no sentido de não se conhecer o
recurso de apelação interposto contra a sentença que, essa sim, traz a matéria
de mérito cuja rescisão é pedida.
Por outro lado, a autora pede a rescisão de sentença de primeiro grau e de
acórdão. Somente é cabível a rescisão de um ou outro. Não há como se pretender a
rescisão de ambos, mesmo porque, a competência para julgar seria diversa: para a
rescisão da sentença, a competência é de uma das Câmaras do Tribunal, enquanto
para a rescisão do acórdão a competência é de um dos Grupos de Câmaras Cíveis.
Porém, o mais grave é que a rescisória também deve ser considerada inepta porque
seu pedido não está compatível com algum dos aspectos previstos no artigo 485 do
Código de Processo Civil.
Com efeito, a sentença do Juízo de .... está juridicamente perfeita. Com tal
decisão manteve-se a incidência da multa fiscal porque o estado de concordata,
então experimentado pela contribuinte (ora autora) não autorizava a exclusão dos
encargos. E o advento da falência, evidentemente, não compromete o que havia
sido julgado. Dai porque totalmente infundado o argumento trazido pela ação
rescisória no sentido de que a decisão rescindenda contrariou disposição literal
de lei. A jurisprudência era, e ainda é, pacifica acerca da incidência da multa
administrativa sobre a concordatária. Portanto, a decisão ora impugnada esteve
correta.
Sucedeu, sim, um fato novo (a falência) que, à luz das Súmulas nº 192 e 565 do
STF, afastaria a multa e outros encargos. Todavia, é a decisão que negou
aplicação a essas súmulas diante da decretação da quebra, que teria de ser
atacada com algum recurso ou talvez com a própria rescisória; jamais as decisões
indicadas na inicial. Contra elas não há amparo legal para a ação rescisória,
dai sua flagrante inépcia (art. 295, parágrafo único, III e 485, do CPC).
Outrossim, o fundamento que trata do aparecimento de documento novo é também
incompatível com o pedido rescisório. Na ocasião, o juiz da Comarca de ....
deixou de aplicar as Súmulas 192 e 565 do STF porque não havia falência.
Documento novo, para fins de pedido rescisório, é aquele que já existia ao tempo
do trânsito em julgado da decisão ou, no máximo, caso confeccionado depois,
documento relativo a fato anterior e que foi, inclusive, objeto da decisão. Em
suma, não é possível na ação rescisória se articular causa petendi estranha à
lide anterior.
A interpretação que a autora pretende dar ao "documento novo" não tem amparo na
doutrina, assim como não se confirma pelas decisões dos Tribunais, conforme
abaixo se exemplifica:
Não tendo sido o fato, referido no documento novo, alegado no processo onde foi
proferida a sentença rescidenda, inadmissível é a rescisão do julgado por
diversa a causa petendi. A rescisória com invocação do inc. VII, do art. 485 do
CPC, funda-se em documento novo e não em fato novo.
(TARJ, AC. un. 3º, Gr. Cs., j. 23.5.84, AR 1.039, Rel. Juiz Astrogildo de
Freitas). Oliveira, Francisco Antônio de. in "Ação Rescisória", Revista dos
Tribunais, 2ª ed., 1996, p. 227.
Cartas ou declarações confeccionadas em data posterior à decisão rescidenda não
constituem documentos novos que autorizam a Ação Rescisória. Documento novo é o
que já existia à época da prolação da decisão que se visa rescindir, mas não
pode ser usado pela parte por desconhecê-lo ou dele não pode aproveitar-se.
(TJSP, 2ª Gr. Cs., AR 263.385, Rel. Des. Barros Monteiro Filho, j. 7.2.80) in
Oliveira, Francisco Antônio de. ob. cit., p. 226.
Não cabe Ação Rescisória fundada em documento novo, se o fato que o documento
objetiva provar não foi alegado na ação ordinária.
(2ª TACivSP, 8ª C., AR 140.992, Rel. Juiz Camargo Viana; j. 24.6.82, p. 226).
Julga-se procedente a Ação Rescisória quando, após a sentença, o autor obtém
documento novo de que não pôde fazer uso antes e é capaz de, por si só,
assegurar-lhe pronunciamento favorável - CPC, art. 485, VII. A expressão
documento novo significa o mesmo que documento preexistente, levando-se em conta
a linguagem do texto, quando se refere ao documento cuja existência ignorava, ou
de que não pôde fazer uso.
(TFR, Ac. 1ª. Sec., j. 4.11.81, AR 694-BA, Rel. Mim. Evandro Geiros Leite;
Adcoas. 1982/84.652, apud Alexandre de Paula, ob. cit., vol. III/712, p. 226).
Documento novo, para fins de rescisão de sentença de mérito transitada em
julgado, não é o que foi produzido após a sentença, mas sim o que foi obtido
depois dela, ignorando-o o autor ou não tendo podido usá-lo a tempo de vê-lo
considerado pelo julgador de primeiro grau. E improcedente a Ação Rescisória que
se fundamenta em pronunciamento médico - no qual consiste o pretendido documento
novo - expedido quando já havia trânsito em julgado a decisão impugnada.
(TSC, Ac. un., Cs. Rs., j. 12.9.84, AR 455, Rel. Des. Norberto Ungaretti;
Jurispr. Catarinense 46/349, apud Alexandre de Paula, ob. cit., vol. II/714. p.
226).
E do Superior Tribunal de Justiça:
Novo, para fins de rescisória, não é o documento e, sim a sua obtenção, por isso
que deve ele ser preexistente ao deslinde da causa, mas só obtido a posteriori.
(STJ, 1ª Sec., AR 195-DF, Rel. Mim. Geraldo Sobrai, j. 19.3.91, DJU 10.6.91).
Face esses aspectos, requer seja o processo julgado sem julgamento do mérito.
DO MÉRITO
Apenas para argumentar, a não incidência de penas pecuniárias por infração das
leis penais e administrativas não pode ser estendida ao caso da autora.
Os débitos fiscais não se sujeitam ao regime falimentar, pois a proibição da Lei
de Falências se refere à cobrança na falência. Uma vez considerando-se que o
débito fiscal não está sujeito ao regime falimentar por força do art. 29 da Lei
nº 6.830/80 e art. 187 do CTN, a execução fiscal já iniciada deverá prosseguir
nos moldes em que foi apresentada. Como ilustração, tem-se:
A Fazenda Pública na cobrança de sua dívida ativa, não está sujeita ao concurso
de credores, nem à habilitação de crédito em falência, concordata, ou
inventário, tal como consta no art. 187 do CTN...
Não há razão legal, portanto, para que a execução fiscal se desloque para o
juízo da falência, sustando-se seus efeitos e sujeitando a Fazenda à habilitação
de crédito. Há que distinguir execução iniciada contra devedor, que
posteriormente teve decretada sua falência, e execução contra a massa falida, ou
seja, para cobrar crédito de devedor já falido. Na primeira hipótese, a execução
prosseguirá, subsistente a penhora dos bens certos e individuados...
(Silva Pacheco, na obra "Processo de Falência e Concordata", 6ª ed., Forense, p.
265).
Prosseguindo-se a execução, de forma autônoma, conforme determinado na sentença
que apreciou os embargos, o valor a ser cobrado é o indicado na certidão de
dívida ativa com os devidos acréscimos.
Quanto aos juros moratórios, estes não serão cobrados na falência apenas a
partir da decretação, havendo, por conseqüência, a inclusão do pagamento dos
juros da data de seu vencimento até a decretação da quebra. Todavia, tal
determinação legal não poderá incidir neste caso porque a decretação da falência
foi posterior ao trânsito em julgado da decisão que apreciou os embargos.
Os honorários e as custas determinados pela condenação anterior à decretação
também devem ser considerados cabíveis, já que a não incidência de custas e
honorários se dá contra a "massa falida". Antes da decretação da falência não há
massa falida e a condenação aos honorários e custas foi anterior à sentença
constitutiva do estado falimentar.
Quanto à correção monetária, esta incide na falência de modo pleno, conforme
orientação já pacificada perante os Tribunais Superiores:
Falência Crédito admitido como quirográfico. Correção monetária. A lei nº
6899/81 aplica-se aos processos regidos pela Lei Falencial, propiciando uma
relação isonômica entre o ativo da massa, cujos bens são valorizados
nominalmente pela inflação, e seu passivo, que não pode permanecer nos valores
nominais originários, sob pena de os créditos contra a massa, pela permanente
inflação, terminarem com o correr do tempo reduzidos a valores meramente
simbólicos, resultando no enriquecimento sem causa do falido. Recurso especial
conhecido e provido.
(STJ, Resp. nº 20898-5 MS, 4ª turma, Rel. Min. Athos Carneiro, DJU 29.03.93, p.
5259) in Ementário Cível do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de
Justiça, ed. Juruá, 1994, p. 43.
Finalmente, quanto ao direito da Fazenda Pública em relação ao prosseguimento
autônomo das execuções já iniciadas antes da decretação, nada se altera, sendo
devidos os juros na íntegra, bem como os honorários advocatícios.
Obs: Apesar das citações estarem ainda sob a égide da antiga Lei de Falências,
todas elas são consonantes à nova legislação - LEI 11.101/05.
DOS PEDIDOS
Diante o exposto, requer seja extinto o processo em razão da inépcia da inicial
ou, caso analisado o mérito, seja o pedido improvido, mantendo-se inalteradas as
decisões rescindendas em todos os seus termos.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]