MEDICAMENTO - SUS - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - AGRAVO DE INSTRUMENTO
EXMO. SR. DR. DESEMBARGADOR-PRESIDENTE DO EGRÉGIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO _________
Objeto: Agravo de Instrumento
MUNICÍPIO DE ____________, pessoa jurídica de direito público interno, com
sede nesta cidade, na Rua _________, nº ____, Bairro _________, inscrito no
CGC-MF sob nº _________, por seus procuradores judiciais infra-assinados, nos
termos da procuração anexa (doc. 01), que recebem intimações no endereço acima,
vem, mui respeitosamente, perante Vossa Excelência, nos termos do artigo 522 e
seguintes, combinados com o artigo 188, todos do Código de Processo Civil
Brasileiro, interpor o presente recurso de
AGRAVO DE INSTRUMENTO com pedido de efeito suspensivo contra decisão que
concedeu antecipação de tutela, prolatada pelo MMª. Juíza de Direito da ___ª
Vara Cível desta Comarca, Dra. _________, folha 19 dos autos, processo nº
1000000000, em ação proposta por ____________, com suporte nas razões seguintes:
AGRAVO DE INSTRUMENTO
AGRAVANTE: Município de ____________
ADVOGADOS: Centro Administrativo Municipal, ____________, UF, fone-fax:
______
AGRAVADO: ____________
ADVOGADA: _____, com endereço profissional no Fórum de ____________, Rua Dr.
_____, ____, Centro, ____________, UF.
DOS FATOS
1 - A agravada ingressou com ação de rito ordinário com pedido de antecipação
de tutela contra o Município de ____________, por ser esta esfera de poder a
gerenciadora do Sistema Único de Saúde no território desta cidade. Alegou que é
portadora de HEPATITE TIPO C e, para o tratamento, necessita da medicação
denominada Interferon e Ribavirina.
2 - Alega não possuir recursos financeiros para custear o tratamento e, que
em razão disso, necessita do auxílio do Município, por meio do Sistema Único de
Saúde.
3 - Requereu antecipação de tutela, afirmando que sem o uso da medicação
corre risco de vida.
4 - A tutela antecipada foi deferida, nos termos do despacho das folha 19, no
qual a MM. Juíza de Direito entendeu estarem presentes os elementos necessários
à concessão do pedido.
5 - Com a devida vênia, o Município discorda e insurge-se, portanto, da
decisão proferida, pois, como será demonstrado a seguir, inexistem os requisitos
para concessão da tutela antecipada, merecendo ser reformada por esse Egrégio
Tribunal.
DA NULIDADE DA DECISÃO QUE CONCEDEU A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
6 - A MM. Juíza de Direito, ao deferir o pedido de antecipação de tutela, o
fez nos seguintes termos:
____________ ajuíza ação ordinária, com pedido de tutela antecipada, contra o
Município de ____________ visando receber a medicação necessária para tratamento
da doença de Hepatite C que é portadora, conforme atestado médico juntado,
alegando que é pessoa sem recursos financeiros para adquiri-la com recursos
próprios.
Com base no expendido na inicial e documentação juntada e sendo a saúde um
direito de todos e obrigação do Estado, nos termos da CF., defiro a tutela
antecipada para determinar que o demandado forneça a autora 30 comprimidos de
Ribavirina e 120 ampolas de Interferon, medicação necessária para 30 dias, visto
que presentes os requisitos do art. 273, I, do CPC.
Após, cite-se.
Diligências legais.
____________, ____/____/____.
_________
Juíza de Direito
7 - Verifica-se que a decisão retrocitada, que determinou ao Município de
____________ o fornecimento de 30 comprimidos de Ribavirina e 120 ampolas de
Interferon, medicação para 30 dias, à autora, em caráter de antecipação de
tutela, não atendeu ao disposto no artigo 93, IX, da Constituição Federal, bem
como às disposições do artigo 273, § 1º, do CPC, ou seja, não fundamentou de
modo claro e preciso, as razões do seu convencimento na verossimilhança das
alegações do autor e do fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação.
8 - Conquanto possam parecer verossímeis as alegações da autora, não há prova
de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. É que o laudo
médico e exames laboratoriais juntados não indicam o risco de vida que a autora
alega existir. Sua doença - hepatite crônica C em atividade leve, não evolui de
forma rápida, conforme se verifica na literatura médica juntada (doc. 11), o que
retira o requisito acima mencionado, indispensável à concessão da tutela
antecipada.
9 - Em razão da falta de fundamentação da decisão da MM. Juíza de Direito, a
qual se limitou a dizer que estão presentes os requisitos da concessão da tutela
antecipada, sem os indicar expressamente, é de ser declarada nula a citada
decisão.
DA INEXISTÊNCIA DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
10 - O artigo 273 do CPC, para concessão da antecipação da tutela, requer a
satisfação de dois requisitos; quais sejam: a) prova inequívoca da
verossimilhança das alegações e b) haja fundado receio de dano irreparável ou de
difícil reparação.
11 - Conforme já dito, a autora, na inicial, não logrou provar que corre
risco de vida, caso a medicação não lhe seja administrada de imediato. A
evolução da doença da qual a autora é portadora, não ocorre de forma rápida,
havendo possibilidade de a ação ser processada, ao menos até o recebimento da
contestação, sem que tal fato implique em qualquer agravamento de sua situação
de saúde.
12 - Veja-se que não consta no laudo médico da folha 05 que a autora corre
risco de vida ou necessita urgente do medicamento. A urgência alegada pela
autora é dada ao fato de que a evolução da doença pode chegar à cirrose
hepática. Todavia, até a doença atingir esse estágio transcorrem-se anos,
considerando-se que o paciente leve uma vida saudável, de hábitos moderados.
Tanto é verdade, que a Secretaria Estadual da Saúde e do Meio Ambiente, na
manifestação em que indefere pedido de fornecimento do medicamento, confirma que
a urgência se revela para os casos de hepatite crônica com atividade moderada à
severa e/ou fibrose, o que não é o caso da autora, portadora de hepatite crônica
em atividade leve.
13 - Nada justifica, portanto, a concessão de tutela antecipada em razão do
risco de vida que a autora alega correr. No mínimo, haveria possibilidade de
aguardar a apresentação da contestação do Município, sem que a autora sofra
qualquer prejuízo em sua saúde.
14 - Diz-se isso porque a ação foi endereçada à esfera não- competente para o
fornecimento do medicamento indicado no tratamento da autora. Tanto o Interferon
quanto a Ribavirina são medicamentos classificados, respectivamente, de
excepcional e especial, cuja distribuição à população compete exclusivamente ao
gestor estadual da saúde. E a autora disso sabia, uma vez que consta na folha 18
a negativa do Estado do ____________ em fornecer o medicamento. Fosse atribuição
do Gestor Municipal, haveria a negativa desse e não do órgão estadual, o que
demonstra, também, não haver prova inequívoca de seu direito à saúde contra o
Município de ____________
15 - Na Lei Orgânica da Saúde, Lei nº 8080/90, consta como campo de atuação
do Sistema Único de Saúde -SUS, a formulação da política de medicamentos, (art.
6º, VI), cujo cumprimento a essa imposição legal, foi efetivado pelo Governo
Federal, por meio do Ministério da Saúde, pela Portaria nº 3.916, de 30.10.98
(doc. 04), a qual estabeleceu a competência das três esferas de Governo, na
implementação da Política de Medicamentos, em seu item 5.
16 - Pela Portaria, ficou definido que ao Governo Federal compete, dentre
outras responsabilidades, a de estabelecer normas e promover a assistência
farmacêutica nas três esferas de Governo; adquirir e distribuir produtos em
situações especiais, identificados por ocasião das programações tendo por base
critérios técnicos e administrativos referidos no Capítulo 3, "Diretrizes",
tópico 3.3. deste documento. Ao Governo Estadual compete promover a formulação
da política estadual de medicamentos; definir elenco de medicamentos que serão
adquiridos diretamente pelo estado, inclusive os de dispensação em caráter
excepcional, tendo por base critérios técnicos e administrativos referidos no
Capítulo 3, "Diretrizes", tópico 3.3, deste documento e destinando orçamento
adequado à sua aquisição; orientar e assessorar os municípios em seus processos
de aquisição de medicamentos essenciais, contribuindo para que esta aquisição
esteja consoante à realidade epidemiológica e para que seja assegurado o
abastecimento de forma oportuna, regular e com menor custo. Ao Gestor Municipal,
por sua vez, compete, definir a relação municipal de medicamentos essenciais,
com base na RENAME, a partir das necessidades decorrentes do perfil nosológico
da população; assegurar o suprimento dos medicamentos destinados à atenção à
saúde de sua população, integrando sua programação à do estado, visando garantir
o abastecimento de forma permanente e oportuna; adquirir além dos produtos
destinados à atenção básica, outros medicamentos essenciais que estejam
definidos no Plano Municipal de Saúde como responsabilidade concorrente do
município.
17 - Conforme se depreende do texto que disciplinou a política nacional de
medicamentos, o fornecimento de medicamentos excepcionais e especiais é de
atribuição dos estados-membros, competindo aos municípios o fornecimento de
medicamentos classificados como essenciais (vide também os planos estadual e
municipal de assistência farmacêutica em anexo - docs. 05 e 06).
18 - Por oportuno, colacionamos a conceituação dada pelo Ministério da Saúde,
por meio da supracitada Portaria, às terminologias "medicação de dispensação em
caráter excepcional", "medicação essencial" e "medicação para atenção básica":
- Medicação de dispensação em caráter excepcional: medicamentos utilizados em
doenças raras, geralmente de custo elevado, cuja dispensação atende a casos
específicos;
- Medicação essencial - medicamentos considerados básicos e indispensáveis
para atender à maioria dos problemas de saúde da população;
- Medicação para a atenção básica - produtos necessários à prestação do
elenco de ações e procedimentos compreendidos na atenção básica de saúde.
19 - Regrando sua competência no fornecimento de medicação excepcional à
população, o Estado do _________ editou a Lei nº 9908, de __.__.__ (doc. 07), na
qual consta o procedimento a ser adotado na distribuição de medicamentos
classificados de excepcional, assim entendidos àqueles que devem ser usados com
freqüência e de forma permanente, sendo indispensáveis à vida do paciente (art.
1º). O Decreto Estadual nº 35.056, de __.__.__ (doc. 08), que regulamenta a
retrorreferida lei estadual, arrola os medicamentos a serem fornecidos de forma
gratuita, pelo estado, pelo nome genérico, constando, no parágrafo único do
artigo 2º:
Art. 2º - [...]
Parágrafo único: Outros medicamentos que não integram a relação, mas que
venham a ser classificados como excepcionais, poderão ser acrescidos à listagem
através de Portaria do Secretário de Estado da Saúde e Meio Ambiente, mediante
parecer técnico do órgão oficial competente.
20 - Veja-se que consta na lista de medicamentos excepcionais e especiais
elaborada pela Assessoria de Medicamentos Especiais da Secretaria da Saúde e
Meio Ambiente do Estado do ____________ (doc. 09), em conformidade com a
Portaria nº 204, de 6 de novembro de 1996 (doc. 10), do Ministério da Saúde, o
medicamento excepcional denominado Interferon, e o medicamento especial
denominado Ribavirina, dos quais a autora necessita.
21 - Pelo exposto, verifica-se que o Município de ____________, não se exime
do cumprimento de suas obrigações constitucionalmente instituídas, colocando à
disposição da população ____________ os medicamentos essenciais que é de sua
competência a distribuição.
22 - O fornecimento de medicação não-enquadrável no conceito de medicação
essencial, de atribuição dos municípios, conforme a política nacional de
medicamentos, implantada pelo Governo Federal, é de competência do Gestor
Estadual, no caso, o Estado do ____________, devendo a presente demanda ser a
esse órgão gestor - Governo Estadual, direcionada.
23 - Em face da comprovada ilegitimidade passiva do Município de ____________
nesta demanda, a concessão da tutela antecipada traz prejuízo ao Gestor
Municipal da Saúde, porque terá de efetivar gastos (altos, já que o tratamento
custará o montante aproximado de R$ ______), não previstos, posto que não são de
sua competência.
DO PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO AO PRESENTE RECURSO
24 - Em que pese as alegações da autora quanto ao seu estado de saúde, não há
provas de que essa corre risco de vida, não podendo esperar a tramitação da
ação, máxime até o Município apresentar sua contestação ou realizar-se perícia
para comprovar a indicada urgência. Ainda, em face da ilegitimidade passiva do
Município na presente demanda, já que não lhe compete o fornecimento de
medicamentos enquadrados como excepcionais e especiais, não pode a
Municipalidade-agravante, e por via de conseqüência, a comunidade ____________,
arcar com o ônus do tratamento pleiteado pela autora, de custo altíssimo, sob
pena de onerar-se o erário municipal com obrigações que não lhe são devidas.
25 - Não estando comprovada a necessidade da administração imediata do
medicamento, e por se tratar de dinheiro público, cuja quantia despendida pode
ser de difícil retorno ao erário, em caso da lide ser julgada improcedente, ao
final, contra o Município de ____________, é de ser concedido efeito suspensivo
ao presente recurso.
Pelas razões acima expostas, a decisão que concedeu a tutela antecipada não
se sustenta, pela nulidade por falta de fundamentação, bem como pela
inexistência dos requisitos para sua concessão - verossimilhança e fundado
receio de dano irreparável ou de difícil reparação, devendo ser reformada, por
conseguinte.
Isso posto, o Município de ____________ requer:
a) seja, esta petição de agravo de instrumento, recebida e distribuída
incontinenti, independentemente de preparo, forte no parágrafo único do artigo
511 do CPC ;
b) seja concedido o efeito suspensivo ao presente recurso, desobrigando o
Município ao fornecimento do medicamento requerido pela autora, até decisão
final deste agravo de instrumento;
c) sejam requisitadas informações à MM Juíza de Direito da 1ª Vara Cível da
Comarca de ____________, no prazo de 10 (dez) dias;
d) a oitiva do Ministério Público, em 10 (dez) dias, nos termos do artigo
527, IV, do CPC;
e) em sendo o caso da MM Juíza de Direito reformar inteiramente a decisão,
seja considerado prejudicado este recurso, consoante permite o artigo 529 do
CPC;
f) requer-se a decretação de nulidade da decisão que deferiu a tutela
antecipada, por falta de fundamentação clara e precisa das razões de decidir;
g) não sendo admitido o pedido anterior, seja reformada a decisão que
concedeu a antecipação da tutela, por falta dos requisitos determinados pelo
art. 273 do CPC;
h) em caso de não-acolhimento das razões do presente agravo de instrumento,
requer-se o prequestionamento do direito federal e constitucional incidente,
para fins de recurso à superior instância.
Termos em que pede deferimento.
____________, ___ de ____________ de 20__.
____________
OAB/
ROL DE DOCUMENTOS
01 - Cópia da procuração dos Advogados do Município
02 - Cópia completa dos autos que tramita na 1ª Instância
03 - Cópia da citação do Município em razão do recebimento da inicial e
despacho que concedeu antecipação de tutela
04 - Portaria do Ministério da Saúde nº 3.916, de 30.10.98
05 - Plano Estadual de Assistência Farmacêutica Básica do ____________
06 - Plano Municipal de Assistência Farmacêutica Básica
07 - Lei Estadual nº 9.908/93
08 - Decreto Estadual nº 35.056/94
09 - Lista de medicamentos importados, excepcionais e especiais fornecidos
pelo Gestor Estadual da Saúde
10 - Portaria do Ministério da Saúde nº 204/96, que especifica os
medicamentos classificados como excepcionais para distribuição pelo Gestor
Estadual
11 - Literatura médica especializada
12 - Demonstrativo do custo dos medicamentos