Interposição de agravo de instrumento contra decisão
que determinou a emenda à inicial sob o fundamento de que não é possível a
reintegração direta sem a prévia rescisão contratual.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO .......
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
AGRAVO DE INSTRUMENTO
da decisão do Exmo. Sr. Dr. ...., DD. Juiz de Direito em exercício na ....ª Vara
Cível da Comarca de ...., que ordenou a emenda à inicial sob a fundamentação de
impossibilidade de reintegração de posse sem a prévia rescisão contratual, nos
autos ..... em que litiga com....., brasileiro (a), (estado civil), profissional
da área de ....., portador (a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e
domiciliado (a) na Rua ....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado
....., o que faz pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
A Agravante ajuizou contra os Agravados AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE C/C PERDAS
E DANOS, pelo rito sumário das ações possessórias, com vistas a reintegrar-se na
posse do imóvel urbano, constituído pela Data de Terras n.º ...., da Quadra n.º
...., do loteamento ...., Matrícula n.º ...., do 1º CRI da Comarca de ....
(....), tendo em vista que os Agravados, do preço pelo qual lhes foi vendido o
imóvel, R$ ...., pagaram apenas uma parte do sinal, no valor de R$ ...., estando
em débito todo o saldo, ajustado para pagamento em .... parcelas mensais.
Tratando-se de imóvel loteado, procedeu a Agravante rigorosamente de acordo com
as disposições do artigo 32 da Lei n.º 6.766/79, culminando com o cancelamento
do registro da promessa, pelo Oficial do Registro de Imóveis, como prevê o § 3º,
do mencionado dispositivo legal.
Nessa conformidade, entende a Agravante que o contrato preliminar está
rescindido de pleno direito, em decorrência do inadimplemento, independentemente
de manifestação do Judiciário, daí estar correto o seu procedimento de propor a
reintegração direta, cumulada com o pedido de indenização pelas perdas e danos.
Não pensa assim o digno Juízo a quo, que exarou o despacho de fls. ....,
determinando a emenda da inicial em .... dias, nos termos do artigo 284 do CPC,
ao fundamento de que não é possível a reintegração direta, sem a prévia rescisão
judicial do contrato. Escora o seu posicionamento da doutrina de José Osório de
Azevedo Júnior e Mário de Aguiar Moura. Data vênia, a Agravante não se conforma
com essa decisão, manifestamente contra legem, e que espera será revista por
essa Corte Recursal.
Já houve tempo em que se afirmou que uma só penada do legislador seria
suficiente para por abaixo toda uma biblioteca jurídica. É curioso, mas no
momento parece que estamos vivendo a conhecida apóstrofe de KIRCHMANN invertida.
A letra expressa da lei está sendo posta em plano secundário, por conta de
construções doutrinárias não raro à base de mero argumento de autoridade.
DO DIREITO
O artigo 32, caput, da Lei n.º 6.766/79, expressamente dispõe que vencida e não
paga a prestação:
"... o contrato será considerado rescindido 30 dias depois de constituído em
mora o devedor."
Será considerado ..., diz a Lei. Logo a rescisão se opera ipso jure,
independentemente de pronunciamento judicial. Resolvido, por essa forma, o
contrato, o vendedor requererá ao Oficial do Registro de Imóveis o cancelamento
do registro, consumando-se a rescisão, de acordo com as disposições do § 3º,
desse mesmo artigo de Lei.
Combinando-se esses já citados dispositivos legais, com o artigo 36, III, da
mesma Lei n.º 6.766/79, conclui-se, com toda a segurança, que nessa hipótese de
não pagamento a rescisão do contrato dispensa a manifestação do judiciário,
operando-se ex vi legis.
Considerando a natureza da atividade, quis o legislador fornecer ao loteador um
mecanismo ágil para rescindir a contratação inadimplida pelo comprador, a fim de
que o imóvel seja reposto no mercado o mais breve possível. Imagina-se que se o
loteador tivesse que enfrentar a rescisão da promessa na via judicial, pelo
procedimento ordinário, com certeza não conseguiria reaver a posse do bem em
menos do que quatro a cinco anos, tempo em que o compromitente usufruiria dele
tranqüilamente, enquanto lhe fosse possível, sabendo-se que na maioria dos casos
não teria meios para indenizar ao vendedor as perdas e danos.
Aqueles que criticam a solução adotada pela Lei sobre loteamentos urbanos para a
resolução do contrato cometem um erro de perspectiva, considera Segadas Viana,
acrescentando:
"O que se pretende com o processo instituído administrativamente é alcançar
aquelas situações que se instalam de ordinário: o devedor não paga sem motivo.
Reclamar a intervenção do Judiciário será retardar de maneira sensível a solução
do problema.
Estabeleceu-se, assim um sistema que torna pronta a liberação das partes,
ensejando ao vendedor promover nova venda do imóvel sem maiores delongas, o que
se torna ainda mais importante naqueles casos em que tenha havido o pagamento de
mais de um terço do preço, em tais hipóteses o vendedor se vê obrigado a
devolver as importâncias pagas.
Agiliza-se, portanto, as relações, tendo-se em vista a natureza especial do
negócio." (S. Viana, Marco Aurélio. Comentários à Lei sobre Parcelamento do Solo
Urbano. Saraiva, 1980, pág. 102).
Ponto importante é destacado em seguida, pelo monografista citado:
"Não se impede a defesa do devedor. O que se faz é simplesmente tornar mais
pronta e eficaz a resolução do negócio.
Se o promitente comprador recebe a notificação do oficial do registro
imobiliário e tem razões para não pagar, basta que deposite a importância em
juízo para discussão. A Constituição assegura a apreciação pelo Poder Judiciário
de qualquer lesão de direito individual. A interpretação do art. 32 em estudo
deve ser feita em consonância com a Carta Magna. Não se investe contra o texto
constitucional, mas se coaduna com ele, mantém-se em sintonia perfeita.
O devedor que tem fundados motivos para fugir ao pagamento não está inibido de
defender seu direito. Reclamará prestação judiciária, cabendo ao juiz determinar
ao oficial do registro imobiliário que suspenda o curso do processo que se
instalou perante ele. Apreciado o pedido, o magistrado decidirá." (Ib. págs.
102/103).
As judiciosas ponderações do civilista mineiro respondem, com absoluta
procedência, a crítica de Arnaldo Rizzardo, em sua monografia versando o tema,
sob a epígrafe: Injustiça de tratamento referente a imóveis loteados. Embora
criticando, o ilustre desembargador reconhece, implicitamente, que esse é o
sistema: a rescisão administrativa do contrato, dispensando o pronunciamento do
judiciário.
Encontrando-se o Poder Judiciário extremamente assoberbado por uma carga de
trabalho, crescente dia a dia, deveriam ser tidas como bem vindas as soluções
legislativas que resultam em alívio dessa sobrecarga, deixando à incumbência de
outros órgãos, administrativos ou particulares, a composição de certos litígios,
não se fechando, evidentemente, às portas do judiciário àqueles que se sentirem
lesados em seu direito.
Seja a solução prevista no artigo 32, da Lei n.º 6.766/79; seja a do artigo 63
da Lei n.º 4.591/64, aplicadas às incorporações imobiliárias; seja a recém
promulgada Lei n.º 9.307, de 23/09/96 (Lei da Arbitragem), nenhuma inibe que
aquele que se sentir lesado, ou mesmo ameaçado em seu direito, recorra ao
judiciário, o que é uma garantia constitucional. Mas é preciso que a parte tome
a iniciativa de recorrer. O que não pode, e não deve ser feito, é, nesses casos,
o Judiciário tomar a iniciativa pela parte, trazendo a juízo, o que pode até não
ser de interesse dela.
No entanto, percebe-se que alguns órgãos do Judiciário não pensam dessa forma.
Insistem em que tudo deve passar, obrigatoriamente, pelo crivo desse Poder, à
margem do qual, parece, nada se faz com sentido de justiça. No geral, os
operadores do direito sabem da bem intencionada motivação desse comportamento,
para recusar a malévola interpretação do cidadão comum que possa ver, aí, uma
velada preocupação com reserva de mercado.
Realmente, ante o texto expresso da lei, não se justifica exigir do loteador que
enfrente a via crucis do procedimento ordinário para obter a rescisão do
contrato se o comprador deixa de pagar o preço, uma vez cumpridas determinadas
formalidades administrativas.
Resolvido o contrato, de pleno direito, torna-se injusta a posse do comprador,
abrindo-se ao vendedor a via possessória, contra o esbulhador, para
reintegrar-se na posse direta do imóvel. Assim ensina o mestre Darcy Besonne:
"Em conseqüência da rescisão, a posse do contratante inadimplente perde o título
que legitimava, devendo a coisa, por isso mesmo, ser restituída imediatamente ao
outro contratante. A partir do momento em que se verificar a supressão do título
possessório, a posse se tornará injusta. O caso assemelha-se ao do precário (CC.
artigo 489), em que a posse, antes justa, torna-se injusta, quando o possuidor,
devendo demitir-se dela, insiste, não obstante, em conservá-la. A injustiça,
neste caso, não é contemporânea da instalação da posse, mas sim superveniente,
pois é certo que, resolvido o contrato em que se fundava a posse direta do
compromitente-comprador, elimina-se o seu direito de possuir. Cabe, então, a
ação de reintegração de posse, não se devendo cogitar da reivindicatória, de
natureza petitória, porque o fundamento da ação não é, aqui, o domínio do autor,
do qual deriva o respectivo 'jus possidendi', mas sim o desaparecimento do
título da posse do comprador." (Da Compra e Venda. Saraiva, 3ª Ed., 1988, págs.
193/194).
DOS PEDIDOS
Face a todo o exposto, e mais os doutos suplementos que com certeza serão
produzidos por esse Egrégio Colegiado, a Agravante requer que se digne:
a) imprimir, o digno Juiz Relator, efeito suspensivo ao presente agravo, de
acordo com a previsão do artigo 527, II, e artigo 558, parágr. único, ambos do
CPC, mediante comunicação ao digno Juízo monocrático, requisitando deste as
informações de praxe, considerando os relevantes fundamentos do recurso,
conduzindo ao indeferimento liminar da inicial.
b) determinar a intimação dos Agravados, por carta com AR, em seu endereço
residencial, Lote n.º ...., Quadra n.º ...., na Comarca de .... (....), para que
constituam advogado a fim de acompanhar o recurso.
c) ao final, devidamente processado o recurso, lhe seja dado provimento pela
Egrégia Câmara Julgadora, para o fim de cassar definitivamente a decisão
recorrida, declarando a adequação do procedimento possessório sumário imprimido
à ação pela Agravante, com ação de reintegração direta, para que seja processada
na forma legal.
Em cumprimento da norma do art. 525 do CPC, o presente agravo é instruído com os
seguintes documentos:
a) cópia autenticada da decisão agravada;
b) certidão da intimação da decisão agravada, passada pelo Cartório que oficia
no feito;
c) cópias autenticadas das procurações dos advogados das partes;
d) cópias autenticadas das peças constantes dos autos, às fls. ....;
e) comprovante do recolhimento das custas do recurso, inclusive parte de
retorno.
Outrossim, informa o nome, endereço de seu advogado:
.... (OAB/.... n.º ....), com escritório profissional na Av. .... n.º ...., na
Comarca de .... (....), CEP ...., indicado para intimações.
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]