MEIO AMBIENTE - RESERVA LEGAL - IMÓVEL RURAL - RISCO AMBIENTAL - AUSÊNCIA
DE REFLORESTAMENTO - OBRIGATORIEDADE DE REFLORESTAR 20% DA ÁREA
EXMO. SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ª VARA DE .............
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE ............ por seu Promotor de Justiça do
Meio Ambiente de ..................... ao final firmado, vem propor perante esse
egrégio Juízo de Direito a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA, de procedimento
ordinário (CPC, art. 282 e seguintes), com base na Constituição Federal e na Lei
Federal 7347/85, em face de ...............................................
(qualificação) e ..............................(qualificação), tudo consoante os
seguintes fatos e fundamentos:
OS FATOS
1 - Os requeridos são proprietários de dois imóveis rurais, a saber: a)
........................, nesta comarca e com área de ............ ha., imóvel
esse objeto da matrícula n. ...............do CRI local; b)
..................... com ............ ha., denominada ..............., objeto
da transcrição n. ...................., do CRI local;
2 - É certo que os requeridos, em total desacordo com a legislação em vigor, não
possuem nas propriedades a reserva legal de 20% - excluídas do percentual as
áreas de preservação permanente - de vegetação sem exploração (ficando
impossibilitada a regeneração natural), muito menos devidamente averbada em
cartório;
3 - Outrossim, os requeridos não estão efetuando reflorestamento artificial em
área de reserva legal, devidamente averbada como tal, a partir de 1992
inclusive, na razão de 1/30 (um trigésimo) ao ano. Ainda que possuam alguns
trechos de vegetação natural na propriedade, passíveis de averbação como reserva
legal, os réus não o fizeram. Assim, há risco ambiental devido a ausência da
proteção jurídica da perpetuidade, nos trechos de vegetação natural existentes
no local;
4 - Destarte, exploram as propriedades com desrespeito às normas ambientais,
causando manifesto prejuízo ao meio ambiente e, portanto,__ ao interesse de toda
a população. Prejudicam a fauna e a diversidade da flora, reduzem os mananciais
e propiciam erosão, entre outras conseqüências danosas ao ecossistema;
5 - Finalmente, anoto que todos esses fatos estão bem demonstrados em vistoria
pericial no local (fls. 80/90) , cuja elaboração ensejou custo de R$____.
O DIREITO
Dispõe a Constituição da República que "todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações".
Objetivando a efetividade desse direito incumbiu ao Poder Público, dentre outras
tarefas, "definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e
seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a
supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção" e "proteger
a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco
sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a
crueldade".
A Constituição da República prevê, também, a sujeição dos degradadores do meio
ambiente à imposição de sanções penais e administrativas, além da obrigação de
reparar os danos causados.
É a Constituição da República, ainda, que consagra a função social da
propriedade como princípio informador da ordem econômica, determinando que
quanto ao imóvel rural, a função social é cumprida quando atende, dentre outros
requisitos, a "utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e
preservação do meio ambiente" (art. 186, II, da Constituição Federal.).
Nesse aspecto, é seguida pela Lei da Reforma Agrária (LRA) e pela Lei da
Política Agrícola (LPA).
Por sua vez, o Código Florestal declara que "as florestas existentes no
território nacional e demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às
terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País,
exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações estabelecidas em lei".
(art. 1o.)
Diz também que a utilização e exploração dos imóveis rurais contrárias às
disposições legais são consideradas uso nocivo da propriedade.
Veja-se que o artigo 194, par. único, da Constituição do Estado de São Paulo,
determina: "é obrigatória, na forma da lei, a recuperação, pelo responsável, da
vegetação adequada nas áreas protegidas, sem prejuízo das demais sanções
cabíveis".
É que o princípio da função sócio-ambiental da propriedade rural impõe, ao
proprietário, o exercício do direito de propriedade em conformidade com as
diretrizes de proteção do meio ambiente vigentes, notadamente a existência da
vegetação natural nos espaços territoriais protegidos. E isso como pressuposto
do reconhecimento jurídico, pela Constituição, da existência do direito de
propriedade.
Tudo isso se aplica quanto a questão da reserva legal, prevista no art. 16, §
2º, do Código Florestal:
"A reserva legal, assim entendida a área de, no mínimo, 20% (vinte por cento) de
cada propriedade, onde não é permitido o corte raso, deverá ser averbada à
margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente,
sendo vedada a alteração de sua destinação..."
Todavia, tal norma nunca foi observada pelos requeridos. Isso é evidente causa
de prejuízo ambiental.
E mais, não só deveria ter sido feita tal demarcação de reserva,
possibilitando-se a regeneração natural (que hoje, passados mais de trinta anos,
certamente já estaria completa) como também já deveria ter se iniciado cinco
anos atrás o trabalho de reflorestamento artificial de tais reservas.
É o que diz o art. 99 da Lei Federal 8171/91__:
"A partir do ano seguinte ao de promulgação desta Lei, obriga-se o proprietário
rural, quando for o caso, a recompor em sua propriedade a Reserva Florestal
Legal, prevista na Lei n. 4771/65, com a nova redação dada pela Lei 7803/89,
mediante o plantio, em cada ano, de pelo menos um trinta avos da área total para
complementar referida Reserva Florestal Legal (RFL)".
Segundo a doutrina, assim, o proprietário que não possui reserva legal tem a
obrigação de demarcar e registrá-la, cessando exploração em sua área e
possibilitando, assim a regeneração natural. Além disso,_ tem a obrigação da
regeneração artificial, à razão de 1/30 por ano, a contar de 1992 inclusive.
"O fato de inexistir cobertura arbórea na propriedade não elimina o dever do
proprietário de instaurar a reserva florestal ... Pondere-se que, ao se dar
prazo para a recomposição, não se está retirando a obrigação do proprietário de,
desde já, manter a área reservada na proporção estabelecida - 20% ou 50% -
conforme o caso. Se nessa área inexistir floresta, nem por isso poderá o
proprietário exercer atividade agropecuária ou de exploração mineral. A área de
reserva florestal, desmatada anteriormente ou não, terá cobertura arbórea pela
regeneração natural ou pela ação humana ..."
"A ação civil pública, pedindo o cumprimento da obrigação de fazer, procurará
que o Poder Judiciário obrigue o proprietário do imóvel rural, pessoa física ou
jurídica, a instituir a reserva florestal legal, medi-la, demarcá-la e averbá-la
no registro de imóveis, como também, faça o proprietário introduzir e recompor a
cobertura arbórea da reserva" (MACHADO, Paulo Affonso Leme - DIREITO AMBIENTAL
BRASILEIRO, Malheiros, 1995, ps. 504/508).
As áreas de reserva legal cumprem a função ecológica de proteção das águas, do
solo, da fauna, da flora, e, por isso, não podem ser exploradas.
A exploração dessas áreas contribui decisivamente para a diminuição da
diversidade da flora e da fauna e para a redução dos mananciais, propiciando
ademais a erosão, o assoreamento dos cursos d'água, a alteração negativa das
condições climáticas e do regime de chuvas, dentre outras formas de degradação
ambiental.
Tais institutos relativos ao uso do imóvel rural devem ser compreendidos à luz
do princípio da função social da propriedade, hoje,__ constitucionalmente
definido. Concorrem para o conteúdo do direito de propriedade pelo menos três
elementos: o individual, que possibilita uso, gozo e lucro para o proprietário;
o social, de natureza distributiva; e o ambiental, ligado à utilização adequada
dos recursos naturais e preservação do meio ambiente.
Ainda,__ no que diz respeito ao problema agrícola e fundiário,__ deve-se partir
da premissa ecológica da compatibilização da exploração econômica da terra com a
preservação do meio ambiente.
Há de se ver que o próprio Código Florestal é expresso em reconhecer como bens
de interesse comum as florestas e demais formas de vegetação úteis às terras que
revestem, considerando a utilização e a exploração ilegal dessas áreas como uso
nocivo da propriedade.
Portanto, aquele que promove e/ou permite, de qualquer modo, atividade agrícola
em áreas de preservação permanente, bem como não destina, ao menos, 20% do
imóvel rural para reserva florestal obrigatória, está impedindo e dificultando a
regeneração dessas áreas. Enfim, está degradando o meio ambiente.
Tal conduta caracteriza-se como uso nocivo do imóvel rural e exercício
anti-social da propriedade, a qual de tal modo não cumpre sua função social,
pois seus recursos naturais são utilizados inadequadamente e em prejuízo da
preservação ambiental.
Há de se compreender também que, no médio e longo prazos, a não restauração das
áreas de preservação permanente e de reserva legal afeta a qualidade e a
produtividade das terras, causando prejuízo para a coletividade, como também
para seus proprietários.
Nesse passo,__ cabe ressaltar a importância dos ecossistemas florestais, que não
estão restritos às espécies vegetais que compõem as florestas e as matas, visto
que englobam sistemas nos quais interagem as plantas, os animais, os
microorganismos, o solo, dentre outros elementos. Os ecossistemas florestais
representam verdadeira base de sustentação de várias formas de vida e de
elementos inanimados, como o solo e as águas. Merecem proteção especial para a
garantia de reprodução da espécie humana.
Cumpre, pois, ao Poder Público e à coletividade o dever de defender os
ecossistemas florestais e preservá-los, não somente para as presentes, mas
sobretudo, para as futuras gerações. A conduta dos réus, ora denunciada, não se
explica logicamente. Consiste em ato de rebeldia, que além de representar
violação das normas ambientais, implica violação do direito de vizinhança e
concorrência desleal.
Existe a obrigação constitucional de não se degradar o meio ambiente e dessa
obrigação decorre o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
Ressalte-se que o responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora
de degradação ambiental está obrigado, independentemente da existência de culpa,
a indenizar e reparar os danos causados ao meio ambiente.
A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, ao consagrar a responsabilidade
objetiva daquele que causa dano ao ambiente, adotou a teoria do risco integral.
O dever de reparar o dano surge independentemente da culpa do agente, da
licitude da sua conduta, do caso fortuito ou da força maior, bastando a
demonstração da existência do dano (o nexo entre atividade e dano).
Há de se ver, também, que o eventual fato da aquisição do domínio e posse do
imóvel rural ter-se dado, pelos réus, quando não mais havia parte da cobertura
vegetal nas áreas em questão, não afasta a responsabilidade deles. Esta além de
ser objetiva e solidária, consubstancia uma obrigação real - propter rem - ou
seja, uma obrigação que se prende ao titular do direito real seja ele quem for,
em virtude tão-somente de sua condição de proprietário ou possuidor.
Em suma,__ os réus, ao não destinarem ao menos 20% do imóvel para reserva
florestal obrigatória, estão impedindo e dificultando a regeneração dessas áreas
e degradando o meio ambiente.
A título subsidiário,__ ressalte-se que é objetiva a responsabilidade dos réus
pelos danos ambientais em questão, uma vez que a esse respeito é expresso o art.
14, par. 1º, da Lei Federal 6938/81.
Tal norma, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (LPNMA),_ prevê a
imposição a todo e qualquer degradador do meio ambiente, da obrigação de
recuperar e indenizar os danos causados, independentemente de existência de
culpa. E,__ em especial, às pessoas físicas ou jurídicas que, de qualquer modo,
degradarem as florestas e demais formas de vegetação natural de preservação
permanente, transformadas em reservas ecológicas pela referida lei (art. 18).
"Mas, quais as conseqüências advindas da adoção, pelo legislador, da
responsabilidade objetiva pelo dano causado ao meio ambiente? Em suma são as
seguintes: a) prescindibilidade da culpa para o dever de reparar; b)
irrelevância da licitude da atividade; c) irrelevância do caso fortuito e da
força maior como causas excludentes da responsabilidade." (NERY Júnior, Nelson -
A RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO ECOLÓGICO E A AÇÃO CIVIL PÚBLICA, Justitia
126/170.)
Patentes o exercício anti-social do direito de propriedade, o uso nocivo do
imóvel rural e o descumprimento de sua função social.
Diante disso tudo,__ evidenciam-se as manifestas ilegalidades cometidas pelos
réus, que causam prejuízo ao meio ambiente local e necessitam ser rapidamente
obstadas.
OS REQUERIMENTOS
Ante o exposto requer-se:
A) A procedência do pedido para o fim de serem os réus condenados:
I - ao cumprimento da obrigação de fazer e não fazer,__ no sentido de ser
instituída, medida, demarcada e averbada na área de cada propriedade a reserva
florestal legal de 20% (vinte por cento) - excluídas do percentual as APP -
matrícula n. ........... do CRI local e transcrição n. ..........., livro
........., fls. ........., do CRI local - cessando-se exploração agropecuária ou
mineral em tais áreas e possibilitando-se o imediato início de seu processo de
regeneração natural;
II - ao cumprimento de obrigação de fazer,__ consistente na efetivação de
reflorestamento artificial dentro das áreas das referidas reservas legais,
devidamente averbadas e demarcadas, tudo com espécies nativas da região,_ e na
quantia de 1/30 (um trigésimo) a cada ano,__ a contar de ....... inclusive, até
ser atingida a totalidade da reserva em .......;
III - à imposição de multa diária equivalente a 100 (cem) salários mínimos,
multa essa a ser recolhida ao Fundo Estadual de Reparação dos Interesses Difusos
e Coletivos em caráter exclusivamente cominatório, em caso de descumprimento
total ou parcial de qualquer das obrigações de fazer e não fazer, acima
discriminadas;
IV - ao pagamento das custas e demais despesas processuais, inclusive a
remuneração de assistente técnico do Ministério Público e as despesas com a
efetivação da vistoria pericial de fls. 80/90, estas no importe de 04 salários
mínimos e a título de indenização;
B) A citação dos réus por mandado, conforme art. 222 do CPC, para que querendo
respondam a presente no prazo de quinze dias, sob pena de revelia;
C) Que seja admitido ao autor fazer prova dos fatos alegados via da juntada do
procedimento em anexo (Inquérito Civil ..........) e se necessário for, através
do depoimento pessoal dos requeridos, sob pena de confissão; oitiva de
testemunhas a serem oportunamente arroladas; perícias; juntada de documentos
novos e todas as demais provas em direito admitidas;
D) Dá-se à causa o valor de R$............ - por arbitramento.
local e data
assinatura ... (incluindo o período do aviso prévio);
f) ao pagamento do aviso prévio e os trinta dias integrados ao tempo de
serviço, da Recte, bem como, reflexos de ..../.... avos sobre férias, seu abono
e décimo terceiros salários;
g) indenização do seguro-desemprego, no valor correspondente a .... vezes o
salário mensal, assim não entendendo esse Juízo, requer a indenização.