Habeas corpus em face de prisão por crime fiscal.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL
FEDERAL DA ..... REGIÃO
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., residente e domiciliado (a) na Rua
....., n.º ....., Bairro ....., Cidade ....., Estado ....., por intermédio de
seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo - doc. 01),
com escritório profissional sito à Rua ....., nº ....., Bairro ....., Cidade
....., Estado ....., onde recebe notificações e intimações, vem mui
respeitosamente à presença de Vossa Excelência impetrar
HABEAS CORPUS COM PEDIDO DE LIMINAR
em favor de
....., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ....., portador
(a) do CIRG n.º ..... e do CPF n.º ....., recluso em ...., por ordem do Exmo Sr.
Dr. juiz federal, capitulado no artigo 1º, inciso I, da Lei 8.137/90, c/c artigo
69 (por três vezes, ante a ocorrência de três supressões, correspondentes a cada
ano calendário), c/c 71 (por vinte e quatro vezes em cada ano calendário), ambos
do Código Penal pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
A paciente foi presa em .... de .... de ....., e recolhida na Cadeia Pública de
......., Estado de ....., por ordem judicial emanada da Eg. .... Vara Federal de
...., em cumprimento à prisão preventiva decretada em ..... de ..... de ......,
sob o argumento de que sua custódia assegurará a ordem pública, "uma vez que há
fortes indícios de que, solta, a acusada continue cometendo o mesmo crime fiscal
que praticou nos exercícios de 1998, 1999 e 2000, causando enorme dano ao
erário, impedindo, por exemplo, que o Governo Federal aplique o tributo sonegado
ao atendimento de programas sociais" (fl. ......).
Na mesma data, recebeu-se a r. denúncia oferecida pela Procuradoria da
República, pedindo a sua condenação nas penas do artigo 1º, inciso I, da Lei
8.137/90, c/c artigo 69 (por três vezes, ante a ocorrência de três supressões,
correspondentes a cada ano calendário), c/c 71 (por vinte e quatro vezes em cada
ano calendário), ambos do Código Penal.
Presa, foi interrogada e onde contraria os termos da r. denúncia, afirmando que:
"afirma que na verdade não omitiu rendimentos tributários, e, sim, vendeu
recibos por intermédio de um contador, de nome X. Y, podendo informar que o seu
telefone é ......, não tendo noção do que poderia acontecer, tomando
conhecimento apenas quando da conversa com o seu advogado nesta oportunidade.
Esclarece que a intermediação era feita por esse contador, embora a acusada
conhecesse alguns dos beneficiários dos recibos, sendo que era paciente de
alguns deles, que eram médicos. A acusada cobrava 5% do valor dos recibos, sendo
que o referido contador também recebia alguma quantia pela intermediação, não
sabendo o quanto. Afirma que, embora conhece alguns dos beneficiários dos
recibos, não tratava desse assunto com os mesmos, ficando exclusivamente a cargo
co contador. Não tinha noção de que a sua prática é considerada crime, também
alegando não saber que isso é ilegal, tanto é verdade que não declarou ao
Imposto de Renda. Esclarece que foi sua colega de profissão Y.Z. (que mudou-se
para Pernambuco) quem apresentou esse contador à acusada, dizendo-lhe que
poderia vender recibos para que pudesse sair do aperto".
"Dada a oportunidade, a acusada acrescentou em sua defesa que está muito
arrependida do que fez e que não fará novamente, sendo que até venderia lanches
em um carrinho se preciso for para sua sobrevivência. Afirma que assim procedeu
apenas para garantir sua sobrevivência, pois não tinha clientes à época".
A paciente ainda foi reinterrogada para ratificar suas afirmações anteriores,
mas dizendo que em 2000 e 2001 também emitira esses recibos, não faltando com a
verdade, contudo, deixando claro que não suprimiu impostos como consta da r.
denúncia.
Em seguida requereu-se a revogação da prisão preventiva, que lhe foi negada pelo
MM. Juiz a quo, mediante o argumento de que a ordem pública deve ser mantida e
para que a paciente não volte à mesma prática delitiva, indo de encontro a
entendimento jurisprudencial no sentido de que:
"PENAL - Habeas corpus - Prisão preventiva - Necessidade - Inocorrência. A
prisão preventiva decretada com base no clamor público que a prática do crime
teria despertado revela, na espécie, uma abstração incompatível com a medida, já
que tem por fundamento apenas a circunstância de os acusados pertencerem a uma
determinada classe social, sem que exista qualquer outra indicação que
consubstancie a necessidade desta constrição. Se a persecução penal, por seus
próprios efeitos, já é suficiente para atuar na prevenção de novos delitos, como
ocorre no caso concreto, não se justifica a prisão preventiva, a fim de
resguardar a ordem pública, que pressupõe risco atual e concreto a valores, não
demonstrado nos autos. Por outro lado, não é tão-somente o poder de mobilidade
ou de trânsito pelos territórios nacional ou internacional que justifica a
medida constritiva, mas sim a demonstração de que o acusado intenta promover sua
fuga do distrito da culpa. Habeas corpus deferido para anular o acórdão que
decretou a prisão preventiva dos pacientes, ressalvada a possibilidade de exame
da necessidade da cautelar diante de novos fatos" (STF - 1ª T.; HC nº
71.289-4-RS; Rel. Min. Ilmar Galvão; j. 09.08.1994; v.u.) STF 224/300.
Ocorre Excelências, que a paciente é pessoa idônea, tem domicilio e residência
em ....(cidade)...., onde nasceu, é primária e certamente que não voltará à
mesma prática, depois que tomou conhecimento da seriedade dos fatos, mormente a
partir de março de 2002, quando na Receita Federal foi cientificada de que
deveria regularizar seu Imposto de Renda, tendo então cumprido essa sua
obrigação e dever.
Os seus direitos constitucionalmente assegurados, de aguardar o devido processo
legal em liberdade estão sendo sufragados pelo MM. Juiz a quo, pois é natural
que uma profissional da área de ortodontia, com curso superior, não irá voltar à
mesma prática de emitir recibos, depois de tomar conhecimento das conseqüências
desse ato.
Os benefícios pleiteados pela paciente de aguardar o seu julgamento em
liberdade, até o presente momento, foram indeferidos pelo MM. Juiz a quo,
descaracterizando-se o sagrado direito constitucional da sua liberdade.
A prova deverá ser robusta, neste caso, não apenas com a oitiva dos Auditores
Fiscais, mas com provas indiciárias e instrumentais, como perícia técnica, caso
contrário, estará se afrontando a amplitude da defesa. As provas documentais até
o instante do oferecimento da denúncia são unilaterais e sem o necessário
contraditório. A liberdade é um direito sagrado e a paciente não é marginal nem
contumaz nessa prática como quer dar a entender o parquet.
Haja vista que contumaz na prática delitiva é aquele que, condenado ou mesmo
citado em processo criminal, por diversas vezes, continua com a sua prática,
reiteradas vezes, não sendo o caso da paciente que, em março abril desde ano de
2002 é que tomou conhecimento dessas irregularidades.
Não se trata de qualquer marginal, sem família e desqualificada. Na verdade, ao
ser interrogada, demonstrou a necessidade de ser medicada e tratada, pois, em
que pese ter afirmado que recebia porcentagem de recibos emitidos, não possui
qualquer bem móvel ou imóvel, residindo com sua genitora, viúva, a quem ajuda na
manutenção do lar.
Sem querer se aprofundar no conteúdo axiológico do crime de sonegação - o que
apenas se argumenta - , este é considerado um delito de menor potencial
ofensivo, ao contrário dos crimes de corrupção, tráfico de entorpecentes,
estupros, sendo a rigidez aplicada ao presente caso, deveras demasiada,
resultando em total prejuízo da paciente, duplamente penalizada.
DO DIREITO
Sobre o direito do imputado à pronta finalização da persecutio criminis, ensina
o eminente jurista Rogério Lauria Tucci:
"(...) Ora, nosso País é um dos signatários da Convenção americana sobre
direitos humanos, assinada em San José, Costa Rica, no dia 22 de novembro de
1969, e cujo artigo 8° , 1, tem a seguinte redação: "Toda pessoa tem direito de
ser ouvida com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz ou
tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei anterior, na
defesa de qualquer acusação penal contra ela formulada, ou para determinação de
seus direitos e obrigações de ordem civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer
outra natureza..."
Por via de conseqüência, dúvida não pode haver acerca da determinação, implícita
na Carta Magna brasileira em vigor, do término da necessidade de aguardar o
julgamento em liberdade, não havendo motivos plausíveis para que seja mantida em
custódia, pois tem profissão definida, residência e domicilio fixos.
Realmente, tendo-se na devida conta as graves conseqüências psicológicas (no
plano subjetivo), sociais (no objetivo), processuais, e até mesmo pecuniárias,
resultantes da persecução penal para o indivíduo nela envolvido, imperiosa
torna-se a sua soltura, pois não oferece perigo à sociedade, nem mesmo estará
novamente envolvendo-se em fatos como tais, pois só a sua prisão é suficiente
para que reflita e possa defender-se amplamente, sem causar temor a terceiros ou
prejudicial a instrução processual.
Em seu interrogatório demonstrou a fidelidade e a seriedade com que enfrenta o
problema. Disse que emitiu os recibos a terceira pessoa, mas não suprimiu as
quantias mencionadas na inicial. E há necessidade de prova pericial técnica,
para apurar-se realmente quem declarou valores que seriam indevidos,
confrontando-se todas as declarações do Imposto de Renda.
De outra banda, a paciente não possui bens, nem os oculta como alega a DD.
Procuradoria da República, não havendo porque mantê-la em custódia.
Data vênia, Excelências, mas o tratamento dado ao presente caso, foi e é mais
rigoroso do que o dado a um preso em flagrante por crime hediondo, sendo até
falta de humanidade no aspecto em que a paciente não é delinqüente, tem curso
superior, é primária e pessoa que compõe família tradicional em
......(cidade).....
Na verdade, vem servindo de "cobaia", com incessantes matérias jornalísticas num
determinado jornal de .............., procurando inculcar um juízo de valor
frente à sociedade, mas onde o entrevistado, DD. Procurador da República e que
opinou contrariamente ao pedido de revogação da prisão preventiva, com o intuito
de causar temor nos contribuintes identificados nas relações apresentadas pela
Receita Federal. O próprio parquet está colocando informações inverídicas quanto
à hipotética dilação de contribuintes, em entrevistas à imprensa, o que leva à
ilação, inexorável, que a custódia da paciente nada mais é servir de "cobaia"
para que todos recolham de imediato os valores declarados em suas respectivas
declarações do Imposto de Renda.
Não pode o Judiciário fechar os olhos para a realidade, fugir dos objetivos de
sua existência, qual seja, a prestação jurisdicional, a realização da justiça,
deve julgar segundo o direito e a consciência de seus ilibados magistrados.
O princípio da busca da verdade real rege a persecução penal que deve obedecer à
estrita legalidade, mas dentro da amplitude da defesa e do contraditório.
Assim, constitucionalmente assegura-se o direito da liberdade à paciente,
enquanto aguardar a instrução do seu processo, que teve robustecer-se também
perícias técnicas e contábeis e não apenas em testemunhos de Auditores Fiscais,
ou seja:
"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a
ela inerentes;
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença
penal condenatória;
LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a
liberdade provisória, com ou sem fiança;
LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a
liberdade provisória, com ou sem fiança;
LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por
ilegalidade ou abuso de poder;
1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação
imediata.
16. De outro lado, a paciente reconhece, espontaneamente, que cometeu as
irregularidades por necessidade, vez que reside em ........., socorrendo sua
genitora que é viúva.
Em verdade, o r. despacho que denegou a revogação da prisão preventiva,
mantendo-a sob custódia causa-lhe constrangimento e coação, sendo em face de as
razões em que funda o seu temor:
PRISÃO PREVENTIVA - Manutenção da custódia a réu pronunciado - Inadmissibilidade
se o acusado é primário, com bons antecedentes, ocupação lícita e residência no
distrito da culpa - Gravidade do crime, sua repercussão social e o temor
subjetivo do Magistrado, sem base na prova, de que o agente possa influenciar
testemunhas em razão de seu poder econômico não são circunstâncias suficientes
para recomendar a segregação - Inteligência do artigo 408, § 2º, do CPP.
Ementa oficial:
"A permanência do acusado pronunciado na prisão (artigo 408, § 1º, CPP) deve ser
fundamentada, visto como a prisão provisória, em qualquer hipótese, deve estar
sempre evidenciada, nas provas dos autos, como uma necessidade para o processo.
Tratando-se de acusado primário, com bons antecedentes, ocupação lícita e
residência no distrito da culpa, assiste-lhe o direito de aguardar o julgamento
em liberdade (artigo 408, § 2º, idem). A gravidade do crime, sua repercussão
social e o temor subjetivo do Magistrado, sem base na prova, de que, em razão do
seu poder econômico, possa influenciar testemunhas, não constituem razões
suficientes para a sua recomendação na prisão" (TRF - 1ª Reg. - 3ª T.; HC nº
1999.01.00.000086-4-RR; Rel. Juiz Olindo Menezes; j. 09.03.1999; v.u.) RT
769/708.
"PRISÃO PREVENTIVA - Constrangimento ilegal - Caracterização - Ausência de
demonstração da necessidade da custódia - Acusado, ademais, possuidor de
residência fixa, empresa própria, e que é primário - Interpretação do artigo 5º,
LVII, da CF e artigos 311 e 312 do CPP. Quando não resta demonstrada a
necessidade do encarceramento do paciente, seja para garantir a ordem pública,
seja para assegurar a aplicação da lei penal ou por conveniência da instrução
criminal, a prisão preventiva demonstra-se desnecessária e caracterizadora de
constrangimento ilegal, principalmente se o acusado tem residência fixa, empresa
própria e é primário, conforme se depreende do artigo 5º, LVII, da CF e artigos
311 e 312 do CPP" (TJSE - Câm. Crim.; HC nº 165/98; Rel. Des. Manuel Pascoal
Nabuco D'Avila; j. 19.11.1998; v.u.) RT 765/701.
"PRISÃO PREVENTIVA - Inexistência de ameaça à ordem pública ou de embaraços à
instrução criminal. Não serve a prisão preventiva à punição sem processo, mesmo
considerada a extrema gravidade do crime imputado, porque terminaria pondo em
sacrifício desmedido o princípio constitucional da presunção de inocência,
segundo o qual "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentença penal condenatória" (artigo 5º, LVII, da Carta Magna), além daquele
outro princípio que garante ao acusado o devido processo legal. A prisão
preventiva há de ser adotada com parcimônia, para que não se termine por impor
ao paciente, desde logo, uma sentença apenadora. Por outro prisma, a ordem
pública não se encontra seriamente ameaçada, tampouco a liberdade do paciente
irá desservir a instrução criminal. Tanto que, para apurar a responsabilidade
criminal do paciente, foi instaurado IP, não havendo notícia de que tenha criado
embaraços à apuração dos fatos. Ademais, também entendo que, mesmo considerada a
magnitude da infração, isto não bastaria, por si só, para legitimar prisão
preventiva, uma vez que já transcorreu a instrução criminal, não podendo mais
interferir na apuração dos fatos" (TRF - 2ª Reg. - 2ª T.; HC nº
98.02.42263-0-RJ; Rel. Des. Castro Aguiar; DJU 20.04.1999) RJ 262/141
"PRISÃO PREVENTIVA - Nulidade - Ocorrência - Decreto de custódia em que o
Julgador não demonstra suficientemente a razão do convencimento acerca da
necessidade do recolhimento dos acusados - Inobservância do disposto nos artigos
5º, LXI, 93, IX, da CF e 315 do CPP."
Ementa oficial: "Não demonstrada suficientemente a razão do convencimento do
Julgador acerca da necessidade de recolhimento dos acusados, é de se reconhecer
a nulidade do decreto de prisão preventiva, ante a inobservância do disposto nos
artigos 5º, LXI, 93, IX, ambos da CF/88, bem como do artigo 315 do CPP" (TJCE -
1ª Câm. Criminal; HC nº 99.001893-3; Rel. Des. Fernando Luiz Ximenes Rocha; j.
27.04.1999; v.u.) RT 767/628.
ACÓRDÃO
21 de 369 Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: HC - HABEAS CORPUS - 11456
Processo: 2001.03.00.017992-0 UF: SP Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA
Data da Decisão: 06/08/2002 Documento: TRF300060583
Fonte DJU DATA:23/08/2002 PÁGINA: 771
Relator JUIZ CARLOS LOVERRA
Decisão A Turma, após a manifestação do Ministério Público Federal modificando o
parecer e opinando pela concessão da ordem, por unanimidade de votos, concedeu a
ordem , nos termos do voto do(a) Relator(a).
Ementa "PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA EM RAZÃO DA
REVELIA DO ACUSADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS
QUE MOTIVEM A IMPOSIÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR AO PACIENTE. ORDEM CONCEDIDA".
1- A PRISÃO PREVENTIVA é medida privativa de liberdade, de natureza tipicamente
cautelar, razão pela qual os motivos ensejadores de seu decreto devem ser bem
sopesados, a fim de não causar constrangimento ilegal ao agente.
2- O simples fato de ter sido caracterizada a revelia do acusado, ora paciente,
por si só, não é motivo suficiente a autorizar a decretação da sua custódia
cautelar.
3- Ademais, também não restou configurada nos autos a presença de quaisquer
elementos que, de fato, pudessem apontar a responsabilidade do paciente no crime
que lhe está sendo imputado, bem como, não há, ainda, prova da materialidade
delitiva, o que impede, nesta fase, a aplicação do artigo 312, do Código de
Processo Penal.
4- Ordem concedida.
Indexação "HABEAS CORPUS, PRISÃO PREVENTIVA, REVELIA, ACUSADO, IMPOSSIBILIDADE,
AUTORIZAÇÃO, PRISÃO, INEXISTÊNCIA, AUTOS, INDÍCIO, RESPONSABILIDADE, CRIME,
PROVA, MATERIALIDADE, CRIME".
Referência
Legislativa LEG-FED LEI-7492 ANO-1986 ART-17
CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-312
Veja Também HC 93.03.042398-4, TRF3, REL SOUZA PIRES, DOE 18/10/93, P.124
17. Que espécie de ressocialização de um ser humano poderemos esperar quando lhe
são sonegados os mínimos direitos constitucionalmente assegurados, quando o
Código de Processo Penal assegura à paciente:
"Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na
iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir,
salvo nos casos de punição disciplinar".
"Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:
I - quando não houver justa causa;
II - quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;
III - quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;
IV - quando houver cessado o motivo que autorizou a coação;
V - quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a
autoriza;
VI - quando o processo for manifestamente nulo;
VII - quando extinta a punibilidade".
"Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem
pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para
assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e
indício suficiente de autoria". (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)
"Art. 315. O despacho que decretar ou denegar a prisão preventiva será sempre
fundamentado". (Redação dada pela Lei nº 5.349, de 3.11.1967)
"Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo,
verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se
sobrevierem razões que a justifiquem". (Redação dada pela Lei nº 5.349, de
3.11.1967)
Diante da flagrante ilegalidade da manutenção do paciente sob custódia e do
profundo e indisfarçável desrespeito ao disciplinamento normativo a que se
subordina tal medida, é que a paciente impetra a presente ordem, esperando que
nesta oportunidade, seja a ilegalidade, sanada por completo, sob pena da
injustiça ser admitida e conseqüentemente patrocinada pelos órgãos judicantes.
De outra, é certo que a ordem pública não será burlada e nem afetada com a
soltura da paciente, pois não se justifica o argumento de que solta voltará à
prática delitiva.
Assim, o r. despacho que decretou a prisão preventiva não é suficientemente
fundamentado, assim como aquele que negou a revogação dessa prisão, pois falta
justa causa para a custódia determinada em Primeira Instância, pelo que a
paciente sofre coação ilegal e o fundamento do MM. Juiz a quo é meramente de
ordem subjetiva.
Ora, é certo que o juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do
processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo
decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem (artigo 316, do CPP) e nem
uma primeira oportunidade lhe foi concedida para que demonstre preencher os
requisitos para acompanhar a instrução do processo em liberdade.
É preciso que se leve em conta, o fato de que os crimes imputados à paciente
datam de três a cinco anos antes do oferecimento da denúncia, estando ela em
liberdade durante todo esse tempo. Assim, forçoso é reconhecer não ser mais
necessária a sua custódia cautelar.
É certo que os anos de 2001 e 2002 informados no r. despacho que negou o
relaxamento da prisão preventiva serão pertinentes a outros procedimentos,
contudo, é certo que os contribuintes que verdadeiramente, em tese, lesaram o
Erário Público terão agora a cautela de recolherem seus tributos, vez que
tomaram conhecimento dos fatos através das notícias estampadas em jornais.
É certo assim que, tendo o MM. Juiz a quo mantido a custódia, sob a alegação de
que a paciente poderá praticar o mesmo delito, se solta, devendo assim ser
mantida a ordem pública, na verdade, trata-se de argumento subjetivo e, em
respaldo à esta pretensão, de soltura, assim decidiu recentemente o Egrégio
Superior Tribunal de Justiça:
12/12/2002
STJ: Prisão preventiva deve ser fundamentada em razões objetivas
A prisão preventiva é uma medida extrema, foi concebida com cautela à luz do
princípio constitucional da inocência presumida e deve basear-se em razões
objetivas, que demonstrem a existência de motivos concretos suscetíveis de
autorizar sua imposição. Com estes fundamentos, os ministros da Sexta Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) concederam habeas-corpus a Daniel dos Santos
Reis e Valdir Firmino, acusados de receber e ocultar veículos roubados
A defesa dos acusados alegou que a prisão decretada pela Justiça paulista se
fundamentou no fato de se tratarem de crimes de inegável gravidade porque
estimulariam a prática de crimes violentos de roubo. Para a defesa, a afirmação
do tribunal estadual é desprovida de vitalidade para justificar a prisão. "A
jurisprudência é pacífica no sentido de que a gravidade do delito não pode ser
concebida como fundamento bastante para a imposição da prisão preventiva". Além
disso, não estariam presentes provas da autoria dos crimes suficientes para
justificar a custódia.
Segundo esclareceu o relator do habeas-corpus, ministro Vicente Leal, em
inúmeros julgamentos tem-se afirmado que a prisão preventiva, por ser uma medida
extrema que implica em sacrifício à liberdade individual, deve ser concebida com
cautela. "Principalmente agora, quando a nossa Carta Magna inscreveu o princípio
da inocência presumida".
O instituto da prisão preventiva subsiste no atual sistema constitucional,
conforme o artigo 5º da Constituição Federal, e funda-se em razões de interesse
social. Assim, continua o ministro Vicente Leal, "impõe-se sempre a sua
decretação quando provada a existência do crime e constatados indícios
suficientes da autoria e quando ocorrer a presença de qualquer dos pressupostos
inscritos no artigo 312 do Código de Processo Penal, quais sejam, garantia da
ordem pública; conveniência da instrução criminal e segurança na aplicação da
lei penal". No entanto, o decreto de prisão preventiva deve ser adequadamente
fundamentado, não bastando meras referências às circunstâncias do crime. "È
mister que o juiz demonstre com elementos condensados no processo a presença de,
pelo menos, uma daquelas circunstâncias arroladas no artigo 312, do CPP".
Neste caso, o juiz, ao proferir a prisão preventiva de Daniel e Valdir, indicou
como fundamento a necessidade da medida para garantia da ordem pública, em face
da gravidade do crime. Porém, conforme afirmou o relator no STJ, não houve
indicação de qualquer fato ou circunstância que demonstrasse, de modo objetivo,
a necessidade da cautela. A questão foi situada "apenas no campo de conjecturas,
sem demonstração objetiva de fatos ou circunstâncias autorizadoras da medida
constritiva. Assim, reconheço que o decreto judicial não atende aos pressupostos
inscritos no artigo 312 do CPP"
O habeas-corpus concedido a Daniel e Valdir foi estendido ao co-réu Evandro dos
Santos Gomes.
Idhelene Macedo
(61) 319 - 6545
FONTE: SITE DO STJ - Processo: HC 23879
20. Ao analisar a prisão preventiva em crimes tributários, sendo contrário a ela
e com firme entendimento doutrinário, robustecendo o writ ora interposto, assim
se manifesta o Prof. Ives Gandra da Silva Martins:
Para a última questão do primeiro bloco, a resposta é de que o Poder Judiciário
não pode exercer seu poder de cautela nos crimes tributários, em face da
natureza jurídica desta relação.
Apenas se justifica o poder de cautela em relação aos criminosos de alta
periculosidade, fora das expressas exceções constitucionais.
No crime tributário não, em face de ser a tributação uma norma de rejeição
social. O Estado cobra mais do que deve para prestar serviços públicos e atender
a toda espécie de desperdícios e vantagens dos detentores do poder. A repulsa
pública aos autobeneficiários que os legisladores federais se outorgaram (como,
por exemplo, os 15 altos salários por ano) demonstra a revolta do contribuinte
que lutou para ganhar aqueles recursos que o Estado lhe tira a fim de poder, num
país de miseráveis, outorgar os referidos benefícios aos legisladores em causa
própria.
Ora, o contribuinte é apenas um produtor de tributos. Trabalha para sustentar-se
e sustentar o Estado, assim como os detentores do poder. Sempre que é tentado a
não pagar impostos - e isto sempre ocorre quando a carga tributária devedora
ultrapassa os limites do razoável - tem o Estado o mecanismo de repressão
suficiente. Ao Estado, todavia, interesse muito mais que o contribuinte continue
a produzir tributos do que a permanecer enjaulado. De certa forma, os detentores
do poder têm sempre a vocação de senhores feudais, tratando os contribuintes
como singelos escravos da gleba, sobre os quais têm direito de vida e de morte.
Basta dizer que quando o Estado não paga os cidadãos - os governantes e suas
empresas são os maiores devedores da Previdência Social e da Economia, embora
nunca deixem de pagar seus próprios vencimentos - não se autopune. Quando o
contribuinte deixa de contribuir, o atraso do contribuinte poder ser apenado com
a prisão, visto que a mentalidade feudalística dos governantes ainda não foi
afastada. O princípio da moralidade pública, que proíbe o "calote" oficial, é
apenas uma reminiscência léxica na Constituição, para nunca ser aplicado, como
não foi de aplicação efetiva o artigo 107 do velho texto constitucional nem o
artigo 37, § 6º do atual, em relação aos servidores.
É de se lembrar que a União é uma notória produtora de leis tributárias
inconstitucionais e parte permanentemente vencida nos Tribunais.
Ora, outorgar o poder de cautela de prender alguém antes de encerrado o processo
judicial em decisão transitada em julgado é admitir que o contribuinte deva
pagar, mesmo o indevido, para evitar a prisão, nada obstante a clareza dos incs.
LIV, LV, LVII do artigo 5º da Constituição Federal.
"Se ninguém pode perder a liberdade e os bens, se todos têm o direito à ampla
defesa, se ninguém pode ser considerado culpado sem trânsito em julgado de
decisão condenatória, se o crime tributário não oferta periculosidade à
sociedade, na medida em que o Estado apenas pune por não ter o contribuinte
destinado uma parte do que ganhou com seu trabalho para o Estado, que colhe em
seara alheia, não há porque pretender ofertar um poder de cautela, à semelhança
daquele aplicado aos criminosos (assassinato, seqüestradores, traficantes, etc),
cuja alta periculosidade não justifica sejam mantidos em liberdade, mas
hipóteses legais." (CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA, págs. 31/33, "Pesquisas
Tributárias, Nova Série - 1 "- 4ª edição, atualizada 2002 - EDITORA REVISTA DOS
TRIBUNAIS).
DOS PEDIDOS
Desta forma, espera a paciente que num gesto de estrita JUSTIÇA, considerando-se
a Lei e o Direito, que esta Augusta Corte, conhecendo do pedido, defira
liminarmente o presente writ, uma vez que encontram-se presentes os pressupostos
do fumus boni iuris (elementos da impetração que indiquem a existência de
ilegalidade no constrangimento) e periculum in mora (probabilidade de dano
irreparável).
Considerando o que consta das peças ora inclusas, extraídas da referida ação
penal em sua totalidade, aguarda-se o recebimento deste writ, sendo ele recebido
nos seus efeitos suspensivos e processado e, liminarmente, para que seja
concedida a ordem para a soltura da paciente, aguardando solto o julgamento
deste writ e do processo em curso, oficiando-se ao MM. Juiz a quo, na forma do
artigo 649, do CPP - com isso evitando-se o constrangimento ilegal e falta de
justa causa para manter-se em custódia provisória.
Concedida liminarmente a ordem de soltura, seja essa remetida por fac simile ou
telegrama, para imediato cumprimento pela autoridade policial de .... - .....,
sob a jurisdição da Comarca de ...., prosseguindo-se então o presente, até final
concessão definitiva deste writ.
Na hipótese de Vossas Excelências julgarem necessário, requer a paciente a
expedição de ordem para que o MM. Juiz a quo, preste as informações de estilo e
após o recebimento destas e do respeitável parecer da douta Procuradoria da
República, conceda este Egrégio Tribunal, a ordem de habeas corpus para colocar
a paciente em liberdade, para que aguarde a instrução e o desenrolar de todo o
processamento, em busca da verdade real, como única e melhor forma no caso
concreto de fazer triunfar a máxima efetivação de JUSTIÇA!
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]