HOMICÍDIO - JÚRI - RAZÕES DE RECURSO - DESCLASSIFICAÇÃO
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO _________
COLENDA CÂMARA JULGADORA
ÍNCLITO RELATOR
RAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO FORMULADAS POR: _________
Volve-se o presente recurso contra sentença exarada pela notável julgadora
monocrática da Vara da Comarca de _________, DOUTORA _________, a qual em
agasalhando o veredicto proferido de forma majoritária pelo Conselho de
Sentença, outorgou, contra o recorrente, pena igual a (4) anos de reclusão,
dando-o como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, inciso IV, combinado com o
artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, sob a franquia do regime aberto.
A irresignação do apelante, ponto nevrálgico do presente recurso, centra-se e
circunscreve-se a dois tópicos, assim delineados: num primeiro momento pugna
pelo banimento da qualificadora contemplada no inciso IV, do § 2º, do artigo
121, eis impassível de agnição, cotejada e aquilatada a prova coligida no
deambular do feito, o que redundou na exasperação indevida e injusta da pena
cominada; e, num segundo momento, postulará pela insubsistência do veredicto
emitido pelo Conselho de Sentença, haja vista, que a decisão dos juízes laicos,
foi visceralmente contrária a prova hospedada à demanda.
Passa-se, pois, a análise ainda que sucinta dos pontos alvos de
inconformidade.
I.- ERRO E INJUSTIÇA NO CONCERNENTE A APLICAÇÃO DA PENA.
Segundo se afere pela pronúncia, pesava contra o réu as qualificadas do
motivo fútil e a do recurso que dificultou e ou impossibilitou a defesa do
ofendido.
Por ocasião da quesitação, o Conselho de Sentença, afastou a qualificadora do
motivo fútil, e emprestou foros de cognosibilidade a qualificadora do recurso
que dificultou e ou impossibilitou a defesa do ofendido.
Entrementes, tal reconhecimento, não é passível de sustentação racional.
Consoante consignado data maxia venia, de forma nitidamente equivocada pela
denúncia, diz-se que a vítima foi atingida pelo réu "pelas costas".
De idêntico estigma, padece o quesito alusivo a qualificadora, em tela, o
qual foi formulado tendo por premissa o fato de que o réu teria atingido a
vítima pelas costas.
Contudo, em examinando-se o auto de exame de corpo de delito de folha ____,
tem-se, que o ferimento provocado pelo réu na vítima, teve por sede o flanco
esquerdo da última, com o que resta infirmado pela via científica, que tivesse o
réu sido agredido pelas costas, com ferimento alojado em tal parte do corpo.
Aliás, segundo sustentado pela própria vítima em sede policial, quando foi
lastimada pelo réu, havia um tumulto generalizado na portaria, haja vista, que
várias pessoas pretendiam ingressar no salão, enquanto a vítima, procurava manu
militari impedi-los. Ad literam:
"Que todos estavam correndo em direção a porta e começaram inclusive empurrar
o declarante para dentro do salão, forçando a entrada; Que, empurraram o
declarante uns dois metros para dentro do salão e neste momento o declarante
sentiu um golpe, que parecia um soco nas costas; Que, depois o declarante
virou-se e quando estava tentando se virar recebeu outro golpe na barriga..."
(vide folha 30).
Donde, assoma cristalino e evidente, que a vítima não foi colhida de
supressa, e ou teve sua defesa dificultada e ou impossibilitada, uma vez que
encontra-se realizando desforço pessoal, (vias de fato), contra o réu, no
sentido de impedir de forma truculenta e arbitrária a passagem do último ao
salão de festas.
Observe-se, por relevantíssimo, que por ocasião das lesões provocadas pelo
réu na vítima, esta, encontrava-se livre e safa de qualquer vencilho, e
desfrutava de plena liberdade de ação. Em nenhum momento, a vítima, foi
manietada e ou imobilizada pelo réu.
Assim, assoma claro e transparente que dita qualificadora, não poderá ser
mantida, eis que complemente estéril a prova a respeito de sua existência, a
qual soçobra ante a manifesta deficiência de suporte fáctico a emprestar-se fé e
credibilidade.
Em respaldo a tese aqui sustentada veicula-se a mais lúcida e abalizada
jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, digna de
decalque face sua extrema pertinência ao caso submetido a desate:
"Para que se caracterize a qualificadora do inc. IV do § 2º do art. 121, em
qualquer de suas nuanças, é indispensável que o ofendido tenha sido surpreendido
por um ataque súbito ou sorrateiro, quando estava descuidado ou confiante ('RT',
492/312; 537/301), o que, a toda evidência, não ocorreu na espécie. (Acórdão
unânime da 4ª Câmara Criminal, no recurso em sentido estrito nº 696044114, de 17
de abril de 1.996, sendo Relator o Desembargador FERNANDO MOTTOLA) in REVISTA DE
JURISPRUDÊNCIA DO T.J.R.G.S. nº 177, de agosto de 1.996, páginas 101/103.
HOMICÍDIO QUALIFICADO. RECURSO QUE DIFICULTA OU IMPOSSIBILITA A DEFESA DA
VÍTIMA.
"A qualificadora de recurso que dificulta ou impossibilita a defesa da vítima
(art. 121, § 2º, IV, do C.P) somente se caracteriza quando este recurso for, no
mínimo equivalente àquelas situações descritas no início do inciso, ou seja,
este recurso tem que ser revestido de características insidiosas, traiçoeiras,
totalmente inesperadas, não existindo, conseqüentemente, esta situação quando o
desentendimento já se havia instaurado, já tendo, inclusive, ocorrido agressão à
vítima após ela própria haver iniciado a agressão verbal" (Acórdão unânime da 3ª
Câmara Criminal, no recurso crime nº 695147207, de 16 de novembro de 1.995,
sendo Relator o Desembargador EGON WILDE) in, REVISTA DE JURISPRUDÊNCIA DO
T.J.R.G.S. nº 175 (tomo I), de abril de 1.966, página 95 e seguintes.
Comungando de idêntico entendimento é a manifestação do Tribunal de Justiça
de São Paulo, inserta na RT nº 643/274, cuja compilação afigura-se obrigatória,
por abordar situação análoga, embora diversa, da presente:
"A qualificadora do homicídio consistente no emprego de recurso que dificulte
ou impossibilite a defesa do ofendido não resta demonstrada se não se pode falar
em ataque sorrateiro, insidioso, inesperado, a tanto não correspondendo a
circunstância de o acusado ter segurado a vítima enquanto o co-réu a esfaqueava
uma vez verificados os fatos no curso de uma briga, traduzindo mero
desdobramento do entrevero".
Ante pois, a tal contexto, impossível é manter-se a qualificadora, nos termos
em que agasalhada pelo venerando Conselho de Sentença, devendo, por norma de
justiça, obrar-se o expurgo da referida qualificadora satélite do tipo,
respondendo o réu, por tentativa de homicídio em sua forma simples.
Quanto a possibilidade de proscrever-se a qualificadora em grau de apelação,
sem que para tanto, tenha-se que submeter-se o réu ao suplício de novo júri,
perfilha-se a melhor jurisprudência, parida pelo Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul, inserta na REVISTA DE JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, volume nº 176, tomo I, página 162/163,
na apelação crime nº 695124784, originária da 4ª Câmara Criminal, sendo Relator
o Desembargador ÉRICO BARONE PIRES, de 04 de outubro de 1.995, cuja ementa é do
seguinte teor:
JÚRI. QUALIFICADORAS.
"Sendo as qualificadoras mal reconhecidas pelo Tribunal do Júri e havendo
apelo com base no art. 593, III, letra c, do C.PP, podem ser expungidas pelo
Tribunal de Justiça por serem elas mesmas circunstâncias da pena. Precedentes.
Apelação provida em parte. Rejeitada a preliminar de nulidade".
Perfilhando de idêntico entendimento, qual seja da prescindibilidade da
realização de novo júri, para obrar o expurgo de qualificadoras satélites do
tipo, é a posição do Supremo Tribunal Federal, in, (RT 635/423) e do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, in, (RT 629/310), segundo noticiado por,
HERÁCLITO ANTÔNIO MOSSIN, em sua obra, RECURSOS EM MATÉRIA CRIMINAL, São Paulo,
1.997, Atlas, 2ª edição, página 105.
II.- DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS.
Pulula aos olhos, em compulsando-se os autos, que a decisão do Egrégio
Conselho de Sentença, é manifestamente, contrária à prova que reside à demanda
criminal, coligada no deambular da instrução probatória.
A tese da DESCLASSIFIÇÃO (PARA LESÕES CORPORAIS) sustentada pelo apelante, e
que foi lastimosamente inacolhida pelo Colendo Conselho de Sentença, por cinco
votos a dois, deveria ter sido prestigiada pelo juízo colegiado, porquanto, a
prova é uníssona em proclamar encontrar-se o réu, por ocasião dos fatos, despido
do animus necandi, com o que inexistente o dolo na conduta, impossível era,
reconhecer-se, a tentativa de homicídio.
A ausência de dolo por parte do réu, vem evidenciada e sedimentada na
circunstância de que o mesmo não foi armado para o baile. A faca que encontrou
ao relento, e empregou contra a vítima, pertencia a _________.
Nesse sentido coligem-se os seguintes depoimentos:
_________ à folha ____: "Que _________ o envolveu-se também na briga e acabou
perdendo uma faca que estava na cintura; Que, provavelmente tenha sido a faca
que _________ tenha usado para esfaquear o porteiro do baile..."
_________, à folha ____ dos autos: "... Que quando o depoente estava entrando
_________ estava saindo com uma faca e um revólver na mão desferindo um tiro..."
_________ à folha ____, via mais longe ao afirmar que: "Que para o depoente o
culpado disto tudo é _________".
_________ à folha ____: "Que quando estava saindo viu _________ saindo do
salão com uma faca e um revólver na mão".
_________ à folha ____: "Que mais ou menos no mesmo momento viu _________
saindo com revólver e um punhal na mão. Que o depoente viu o barulho de um
tiro".
Tem-se, pois, por inquestionável que o réu não foi para a baile com intenção
belicosa, armado e ou predisposto a brigar.
Vislumbra-se, pois, com uma clareza a doer os olhos, que o réu não pretendia
matar, e ou possuía qualquer outro desiderato hostil a pessoa da vítima, com a
qual se envolveu, de forma circunstancial, em refrega na entrada do salão.
Donde, o réu em nenhum momento desejou e ou investiu contra a vítima com
propósito homicida. Jamais concebeu, em seu íntimo, tal e nefando desiderato.
Assente-se, por oportuno que o réu não atingiu a vítima em órgão vital, e
muito embora tenha esta corrido risco de vida.
Hodiernamente, a vítima encontra-se totalmente restabelecida das lesões nos
termos do auto de exame complementar de folha ____.
Em roborando a tese aqui esposada, transcreve-se, a melhor jurisprudência
extraída dos tribunais pátrios:
"A TENTATIVA DE MORTE EXIGE PARA O SEU RECONHECIMENTO ATOS INEQUÍVOCOS DA
INTENÇÃO HOMICIDA DO AGENTE. NÃO BASTA, POIS, PARA CONFIGURÁ-LA, O DISPARO DE
ARMA DE FOGO E A OCORRÊNCIA DE LESÕES CORPORAIS, NO OFENDIDO, PRINCIPALMENTE,
QUANDO O RÉU NÃO FOI IMPEDIDO E PROSSEGUIR NA AGRESSÃO E DELA DESISTIU" (RT
458/344 - REL. DESEMBARGADOR CARVALHO FILHO).
"INEXISTINDO A CERTEZA DE QUE QUISESSE O RÉU MATAR E NÃO APENAS FERIR, NÃO DE
CONFIGURA A TENTATIVA DE MORTE. É QUE ESTA EXIGE ATOS INEQUÍVOCOS DA INTENÇÃO DO
AGENTE (RT 434/357).
"SE AS PROVAS DOS AUTOS NÃO AUTORIZAM O CONVENCIMENTO CABAL DE QUE O RÉU
QUERIA O RESULTADO LETAL EM RELAÇÃO À VÍTIMA OU ASSUMIU O RISCO DE PRODUZI-LO,
DEMONSTRANDO, AO REVÉS, QUE PRETENDIA APENAS AGREDI-LA, É DE RIGOR A
DESCLASSIFICAÇÃO DA TENTATIVA DE HOMICÍDIO PARA LESÕES CORPORAIS ( RT nº
385/95).
Por derradeiro, cumpre assinalar-se, que a vítima em nenhum momento, foi
prostrada ao solo, com a pretensa investida do réu. Ao solicitar ajuda, o fez
deambulando!
Destarte, sopesada, com imparcialidade e serenidade a prova reunida à
demanda, tem-se, que a decisão dos jurados leigos em não emprestarem transito a
tese defensiva, alusiva a "desclassificação por ausência de dolo", redundou, em
ato de arbítrio, verdadeiro error in judicando, o que deflagra a anulação do
julgamento, e a subseqüente realização de novo júri popular.
ANTE AO EXPOSTO, REQUER:
1º - Seja revista, em conformidade com o artigo 593 inciso IIII, letra "c" do
Código de Processo Penal, a pena aplicada ao réu, atinente a tentativa de
homicídio, suprimindo-se a qualificadora do recurso que dificultou e ou
impossibilitou a defesa do ofendido, passando de tentativa de homicídio
qualificado, para tentativa de homicídio simples.
2º - Desconstituição do veredicto parido pelo Conselho de Sentença, uma vez
que o mesmo é manifestamente contrário a prova existente nos autos (por força do
artigo 593, inciso III, letra "d" do Código de Processo Penal) em si unânime e
côngrua em proclamar, a ausência de animus necandi, por parte do réu, o qual
jamais concebeu e ou tentou legar a morte a vítima, na forma tentada, com o que
resta excluída a tipicidade do fato.
Certos estejam Vossas Excelências, sobretudo o Insigne e Preclaro Doutor
Desembargador Relator do feito, que em assim decidindo (acolhendo-se qualquer
dos pedidos aqui deduzidos), estarão, julgando de acordo com o direito, e
mormente, restaurando, restabelecendo e perfazendo, na gênese do verbo, a mais
lídima e genuína JUSTIÇA!
_________, ____ de _________ de _____.
Defensor
OAB/UF
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA COMARCA DE _________
Processo crime nº _________
Objeto: oferecimento de razões
_________, brasileiro, solteiro, operário, residente e domiciliado na Rua
_________, nº _________, Bairro _________, nesta cidade de _________, pelo
Defensor subfirmado, vem, respeitosamente, a presença de Vossa Excelência, nos
autos do processo crime em epígrafe, em atenção ao despacho de folha ____, o
qual recebeu o recurso de apelação deduzido, oferecer, em anexo, as razões que
serem de lastro e esteio a irresignação aviada.
ISTO POSTO, REQUER:
I.- Recebimento das presente razões, abrindo-se vista a parte contrária,
para, querendo, oferecer sua contradita, remetendo-se, após o recurso ao
Tribunal ad quem, para a devida e necessária reapreciação da matéria alvo de
férreo litígio.
Nesses Termos
Pede Deferimento
_________, ____ de _________ de _____.
Defensor
OAB/UF