Introdução
A dengue é uma doença infecciosa viral que afeta mais de 100 países no mundo.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram mais de 50 milhões de
indivíduos infectados por ano, com 500.000 casos de dengue hemorrágica e 20.000
mortos a cada ano.
Cada vez se ouve falar mais sobre dengue. Por que isso?
O motivo é que a dengue vem se espalhando por vários países, com grande
dificuldade para o controle da doença. E, se o aquecimento global for mesmo uma
realidade como as evidências científicas mostram, o aumento da temperatura fará
com que o mosquito que transmite a dengue, o Aedes aegypti, se espalhe por novas
regiões, levando a doença a novas áreas no planeta.
Imagem cedida por:
CDC " Nat.
Cntr. For Infectious Diseases; Div. of Vector-Borne Infectious Dieases; Dengue
Fever
Fêmea
do mosquito Aedes aegypti no momento exato de uma picada
Como é o vírus da dengue?
Há quatro tipos de vírus da dengue, numerados de DEN1 a DEN4. Eles pertencem à
família Flaviridae e são vírus que só contêm RNA. Eles são da mesma família do
vírus que causa a febre amarela, e tanto a dengue quanto a febre amarela são
transmitidas pelo mesmo mosquito, o Aedes aegypti. A figura acima mostra o
mosquito que transmite a dengue e a febre amarela, o Aedes aegypti. A dengue é
transmitida pela picada da fêmea desse mosquito, que tem hábitos diurnos. A
infecção por um dos tipos de virus dá proteção permanente para o mesmo sorotipo
e imunidade parcial e temporária contra os outros três tipos de virus.
Os vírus da dengue costumavam causar doença nas regiões mais quentes entre os
trópicos de Câncer e Capricórnio. Com a disseminação do mosquito além dessas
latitudes, o vírus está se espalhando e causando a doença em regiões mais perto
dos pólos. O aquecimento global, com o aumento da temperatura em regiões mais
distantes do Equador, pode levar à disseminação do mosquito e da dengue para
áreas mais perto dos pólos. A dengue no Brasil costumava ocorrer durante o
verão, reduzindo-se quase a zero no inverno. Desde 2005, os níveis de infestação
têm se elevado mesmo nos meses de inverno, agravando o risco de uma nova
epidemia. Os invernos atípicos dos últimos anos, com temperaturas elevadas e
umidade do ar acima da média, pelas chuvas freqüentes nas regiões Sul e Sudeste,
contribuem para um risco maior de epidemia nos próximos anos.
Histórico da dengue no Brasil
As primeiras referências à dengue no Brasil remontam ao período colonial. Em
1865 foi descrito o primeiro caso de dengue no Brasil, na cidade de Recife. Sete
anos depois, em Salvador uma epidemia de dengue levou a 2.000 mortes. Em 1846, a
dengue é considerada como epidêmica, atingindo vários Estados, como Rio de
Janeiro e São Paulo. Até 1916, São Paulo foi atingido por várias epidemias de
dengue.
O transmissor da dengue, o mosquito Aedes aegypti, tem origem africana, tendo
sido reconhecido pela primeira vez no Egito - daí o seu nome. Ele chegou ao
Brasil nos navios negreiros - ele se reproduzia nos depósitos de água dos barcos
nas viagens da África para cá.
No início do século 20, em 1903, Oswaldo Cruz, implantou um programa de
combate ao mosquito que se prolongou por anos. O medo, na época, eram as
epidemias de febre amarela. O Aedes chegou a ser erradicado no Brasil na década
de 50, mas retornou, e na década de 80 houve uma epidemia de dengue em Roraima.
Até 1957 achava-se que a dengue era uma doença benigna, mas nesse ano, pela
primeira vez ocorreu uma epidemia de dengue hemorrágica nas Filipinas. No
continente americano, a primeira epidemia de dengue hemorrágica aconteceu em
Cuba, em 1981.
Epidemia de dengue no continente americano
A primeira epidemia de dengue no Brasil nos tempos atuais foi em 1981, em
Roraima. Lá foram isolados os vírus DEN1 e DEN4. Em 1986 houve uma epidemia de
dengue no Rio de Janeiro e algumas áreas urbanas do Nordeste com disseminação do
vírus DEN1 e mais de 50.000 casos. Em 1990, houve a introdução do vírus 2 no Rio
de Janeiro, atingindo várias áreas do Sudeste. Em 1998, houve uma pandemia com
mais de 500.000 casos no país. O vírus se espalhou por todo o país, com o
Nordeste atingindo o maior número de casos. Em 2000, o vírus 3 foi isolado no
Rio de Janeiro, e uma nova epidemia de dengue aconteceu entre 2001 e 2003.
Vários Estados do Sul foram atingidos pela primeira vez. A maior parte dos casos
ocorreu em pessoas com mais de 15 anos (a doença costuma acometer adultos jovens
pela maior exposição, mas também pode ocorrer em crianças). O quadro abaixo
mostra o número de casos confirmados de dengue desde 1998 até 2005.
Região |
1998 |
1999 |
2000 |
2001 |
2002 |
2003 |
2004 |
2005 |
Norte |
27.018 |
15.118 |
30.848 |
63.400 |
30.672 |
46.672 |
31.573 |
41.487 |
Nordeste |
224.833 |
111.327 |
121.920 |
188.963 |
312.519 |
214.705 |
42.219 |
118.257 |
Sudeste |
229.630 |
41.111 |
53.657 |
173.691 |
384.999 |
83.594 |
31.001 |
35.452 |
Sul |
2.994 |
1.416 |
4.503 |
3.731 |
16.224 |
22.507 |
3.554 |
5.020 |
Centro-Oeste |
20.552 |
14.115 |
17.197 |
34.529 |
68.690 |
36.164 |
15.528 |
41.800 |
Total |
505.027 |
183.087 |
228.125 |
464.314 |
813.104 |
403.642 |
123.875 |
241.796 |
Dengue hemorrágica no Brasil
Até o ano 2000, eram muito raros os casos de dengue hemorrágica no país.
Embora muitos indivíduos tenham sido contaminados por mais de um tipo de
vírus ao mesmo tempo, a freqüência de dengue hemorrágica era mais baixa
que o esperado. Com a chegada do vírus 3, aumentou muito o número de
casos de dengue hemorrágica, com aproximadamente 6% de mortes. Desde
2005 é esperado o reaparecimento do vírus 4 no Brasil. A reintrodução do
vírus 4 no Brasil pode levar a um aumento de casos de dengue hemorrágica
em pessoas que já tiveram a infecção pelos vírus DEN1, DEN2 e DEN3.
|
Prevenção da dengue
A prevenção da dengue é difícil pela falta de uma vacina e devido à
presença do Aedes aegypti nas áreas urbanas. A melhor forma de prevenir
é combater o mosquito - que se adapta muito bem em vários ambientes, o
que dificulta a sua erradicação. O Aedes desapareceu do Brasil em
conseqüência das campanhas contra a febre amarela na primeira metade do
século 20, mas em 1976 voltou a ser encontrado no país. Várias
iniciativas de controle do mosquito falharam nas duas últimas décadas.
O Aedes já teve um papel político importante na determinação da principal cidade
do Estado de São Paulo. A febre amarela foi introduzida pelo Porto de Santos em
1850, assolando os centros urbanos da baixada litorânea. No verão de 1889, a
febre amarela invadiu a cidade de Campinas (a porta da cafeicultura do planalto)
e também provocou uma grande epidemia na cidade de Santos. Admite-se que esta
epidemia tenha contribuído para um decréscimo real das populações atingidas.
Adolfo Lutz, em suas reminiscências sobre a febre amarela, calculou em três
quartos a população que deixou Campinas em direção a outras cidades, fugindo da
febre amarela. Esse fato foi fundamental para colocar a cidade de São Paulo como
principal cidade do Estado em contraposição a Campinas. Entretanto, o Aedes se
adapta bem a ambientes hostis e hoje em dia é bastante comum na cidade de São
Paulo.
Vacina para a dengue
Devido a essa grande dificuldade no controle da dengue, a OMS priorizou
o desenvolvimento de uma vacina. A grande dificuldade é criar uma vacina
efetiva contra os quatro tipos de vírus. Houve pouco progresso nos
últimos anos em relação à produção de uma vacina, embora vários países
tenham participado desse esforço. Portanto, o único modo de combater a
dengue é pelo controle do mosquito transmissor da doença. O Aedes se
adapta muito bem a ambientes adversos. Além disso, alguns estudos
mostram que o uso de inseticidas não melhora o controle ambiental do
mosquito. Por outro lado, sabe-se que medidas relacionadas ao controle
do mosquito nas residências são muito mais efetivas. Isso inclui a
retirada de recipientes que podem servir de criadouro para o mosquito,
como vasos e pneus, garrafas e outros objetos. |
A dificuldade de controle da dengue acontece em quase todo o mundo, mesmo em
países que fizeram campanhas de erradicação do mosquito. As ações dos governos
no controle da epidemia de modo geral são pouco efetivas, baseando-se somente no
controle do mosquito e esquecendo as condições de vida inadequadas em muitas
comunidades. O controle da epidemia deve incluir outras medidas, como
mobilização da sociedade, obtenção de recursos humanos e financeiros, além de
minimização dos efeitos do uso continuado de inseticidas. O isolamento do
portador do vírus é uma estratégia não efetiva, já que a maioria dos casos é
assintomática.
Ciclo de transmissão da doença
A dengue não é transmitida de uma pessoa a outra. Ela é transmitida para o
homem pelo mosquito Aedes aegypti, que pode carregar o vírus por 10 a 14 dias
depois que pica alguém com a doença. O ciclo de transmissão ocorre do seguinte
modo: a fêmea do mosquito deposita seus ovos na água parada em vasos, garrafas e pneus, por exemplo,
deixados no quintal das casas. Os ovos se transformam em larvas que podem viver
na água durante uma semana.
Imagem cedida por Ministério da SaúdeLarvas do mosquito
Depois disso, se transformam em mosquitos adultos. Quem pica os adultos são
as fêmeas do mosquito, que vivem em média 45 dias. A transmissão da doença é
rara quando a temperatura cai abaixo de 16oC. A temperatura ideal para o
mosquito é acima de 30oC, por isso a doença acontece com maior freqüência no
verão. As fêmeas precisam colocar seus ovos em um local quente e úmido. Os ovos
do mosquito são resistentes e podem sobreviver até um ano em condições adversas,
como uma seca prolongada, grudados na parte externa de um recipiente, por
exemplo. O transporte desses recipientes contaminados faz com que os ovos se
espalhem por uma grande área.
Como é o mosquito da dengue?
Segundo informações do Ministério da Saúde, o mosquito Aedes Aegypti
mede menos de um centímetro, tem aparência inofensiva, cor café ou preta
e listras brancas no corpo e nas pernas. Costuma picar nas primeiras
horas da manhã e nas últimas da tarde, evitando o sol forte, mas, mesmo
nas horas quentes, ele pode atacar à sombra, dentro ou fora de casa. Há
suspeitas de que alguns ataquem durante a noite. O indivíduo não percebe
a picada, pois no momento não dói e nem coça. Segundo algumas pesquisas
recentes, a fêmea do Aedes voa até mil metros de distância de seus ovos,
capacidade muito maior do que se acreditava. |
Aedes aegypt
Quadro clínico
Existem duas formas de dengue: a clássica e a hemorrágica. Depois de contaminado
pelo vírus, demora de 2 a 7 dias para a pessoa contaminada desenvolver a doença.
Os quatro vírus da dengue apresentam um quadro clínico muito semelhante. A forma
clássica da dengue se caracteriza por um início abrupto de febre, mal-estar, dor
de cabeça, dor atrás dos olhos ou irritação nos olhos, dor nas juntas e dores
musculares e nas costas. Além disso, pode aparecer uma vermelhidão na pele (rash
cutâneo) acompanhado de aumento de gânglios. Os sintomas duram em torno de uma
semana. Podem aparecer nesse período outros sintomas como náuseas, vômitos e
lesões de pele. Sintomas de resfriado como nariz entupido ou coriza nunca
aparecem. Por isso, a presença desses sintomas afasta o diagnóstico de dengue.
O diagnóstico é feito por um exame de sangue que identifica a presença de
anticorpos IgM (um tipo de anticorpo que se forma nas doenças agudas) contra o
vírus da dengue. O exame de sangue (hemograma) também pode mostrar diminuição
dos glóbulos brancos (leucócitos) e das plaquetas, que são células do sangue que
ajudam no processo da coagulação. Isso explica a presença de sangramentos em
pessoas com dengue.
O que é a dengue hemorrágica?
Quando alguém se contamina com o vírus da dengue, desenvolve a doença,
que dura uma semana sem outras complicações. Mas, se a pessoa se contaminar
outra vez com um outro tipo de vírus da dengue, ela pode desenvolver a forma
hemorrágica da doença. Por exemplo, uma pessoa pode se contaminar com o
vírus da dengue tipo 1 e depois de um tempo se contaminar pelo vírus tipo 2.
Nesse caso, ela pode desenvolver uma forma grave da doença - é a chamada
dengue hemorrágica, em que a pessoa doente pode ter sangramentos com choque
e morte.
Na dengue hemorrágica, as plaquetas caem muito e a pessoa pode morrer em
conseqüência dos sangramentos. Com a disseminação do mosquito, há um risco
maior da pessoa se infectar por mais de um vírus e desenvolver a dengue
hemorrágica.
Imagem cedida pelo Ministério da Saúde
Larvas do
mosquito
O tratamento da dengue é somente de suporte, ou seja, não há um
medicamento específico para tratar a doença. O tratamento consiste em deixar
o paciente em repouso, hidratado, sem febre e sem dor. Se o paciente
apresenta um sangramento grave, ele deve receber tratamento específico em um
hospital. Não se deve usar
aspirina
para diminuir a febre ou a dor em pacientes com suspeita de dengue. A
aspirina age sobre as plaquetas, diminuindo a capacidade do corpo de formar
coágulos. Por isso, ela deve ser evitada na suspeita de dengue. O Ministério
da Saúde recomenda o uso de acetaminofen para o controle da febre e da dor
na suspeita de dengue, nunca ultrapassando o limite de 3 g por dia.
Se você acha que pode estar com dengue, procure logo um serviço de saúde.
O diagnóstico é feito por exame de sangue. É importante que se confirme que
foi realmente um caso de dengue, pois isso serve como um termômetro que vai
nos dizer como está o controle da doença no país.
Campanhas do Ministério da Saúde
O
Ministério da Saúde lançou sua última campanha contra a dengue em
novembro de 2006 com o slogan: NÃO ESQUEÇA: A DENGUE SE COMBATE TODO O
DIA. O objetivo da campanha é mobilizar a população para ações de
prevenção e combate à dengue durante o ano inteiro. Essa campanha do
ministério foi baseada em um estudo que mostrou que a maior parte das
pessoas não sabe o que é a dengue e a importância de preveni-la durante
o ano inteiro. Isso é muito importante principalmente agora com as
mudanças do clima, com invernos mais úmidos e mais quentes. A
participação da população no combate aos criadouros do mosquito da
dengue é o ponto vital para o controle da epidemia.A figura abaixo
mostra o boné e a camiseta da campanha.
Imagem cedida pelo Ministério da Saúde
Camiseta e boné da campanha contra a dengue
A campanha do ministério pede a colaboração de toda a população no controle
da dengue. A fêmea pode depositar seus ovos em caixas d'água sem tampa,
recipientes sem tampa largados no quintal, vidros, potes, pratos de vasos de
plantas, vasos, folhas de plantas como as bromélias e bambus, buracos de árvores
e muitos outros locais onde a água da chuva é coletada ou armazenada. Por isso,
é muito complicado controlar a doença se não houver colaboração de todos. Toda a
comunidade tem que ser estimulada a colaborar para que se bloqueie a cadeia de
transmissão, eliminando o mosquito dos locais onde eles se reproduzem.
Quando há uma epidemia de dengue além dessas medidas, torna-se necessário
utilizar inseticidas aplicados em carros-fumacê ou nebulização. As pessoas devem
deixar as portas e janelas das casas abertas para que o inseticida possa
penetrar nessas ocasiões.
Evite que o mosquito pique você
Imagem cedida por Ministério da SaúdeInseticida
Outro modo de prevenir a doença é não deixar que o mosquito pique. Como
a fêmea pica no início da manhã ou no final da tarde, esses são os
horários de maior perigo. Para evitar as picadas devem ser usados
espirais ou vaporizadores elétricos nesses horários, uso de mosquiteiros
nas casas de dia e à noite principalmente para as crianças; além disso,
podem-se usar repelentes, tomando cuidado com crianças ou adultos porque
podem desencadear quadros alérgicos. As telas em portas e janelas também
podem evitar a entrada dos mosquitos nas casas. |
Controle dos focos de proliferação do mosquito
Para evitar que a fêmea deposite seus ovos, evite deixar destampados recipientes
que possam conter água. Assim, se cair uma chuva, a água não vai se acumular
dentro dos vasos e pneus. Também não deixe lixo espalhado no seu quintal. Há
produtos que matam as larvas do mosquito e que podem ser usados am casa. Não
basta somente trocar a água dos vasos com freqüência. Os ovos do mosquito podem
se grudar na superfície externa do vaso e resistir por um ano. Por isso, é
necessário limpar a superfície externa dos vasos e de todos os outros
recipientes de água.