É inegável que a crise mudou tudo, tanto nos mercados quanto na economia.
Para o investidor, alterar suas decisões de investimento de acordo parece o
mínimo; é preciso dançar conforme a música. Olhando um pouco mais à frente, além
dos problemas de crédito e redução no consumo, não se pode ignorar as
consequências políticas e econômicas que tornam esta crise responsável por uma
verdadeira metamorfose do mercado.
As economias apresentam caráter cíclico. Este último parece ter acabado com o
estouro da bolha no ano passado. Um release do Bank of America/Merrill Lynch
chama atenção para a resposta natural aos efeitos verificados atualmente. Em
parte ignoradas, duas palavras devem resumir bem o futuro do mercado:
consolidação e protecionismo.
Para enxugar os mercados
Consolidação é a consequência econômica natural dos excedentes criados por este
ciclo de expansão. "As bolhas geram capacidade que a consolidação reduz",
definem os analistas. De outro lado, a reação política natural a esta
consolidação é o protecionismo.
Não precisa ir muito longe para entender esta questão. Basta avaliar o atual
retrato da economia norte-americana. A capacidade criada pela fase de esplendor
- para os bancos, inclui forte expansão na capacidade de empréstimos - precisa
se ajustar à nova realidade da demanda. Consolidação remete inicialmente a
fusões e aquisições, mas relaciona também a possibilidade de falências. De uma
forma ou de outra, "enxuga" determinado mercado.
O lado bom
O número de competidores cai, as indústrias se tornam menos fragmentadas. Outro
caso atual que cabe bem nesta explicação é da produção de aço chinesa. A
capacidade gerada tende a ser racionalizada. A primeira impressão é negativa,
mas abre oportunidades. Aí que entra a habilidade do investidor. Se o setor irá
se enxugar, a tendência é que os potenciais lucros aumentem para quem
sobreviver.
Mas este processo todo tem seus impactos. Como visto hoje em dia, enxugar
mercados inevitavelmente pesa sobre os níveis de emprego, sobre os indicadores
sociais. Daí surge o protecionismo. As autoridades governamentais precisam
responder a estes impactos. Nas nações mais estáveis, a tendência destes
períodos é de mudança nas lideranças, segundo a Merrill Lynch. Nas mais
instáveis, pode acarretar até alterações de regime.
Olhar ainda mais à frente
Olhar para frente necessariamente passa por uma expectativa de recuperação dos
mercados no segundo semestre e esperança de que o consumo retome sua força. No
entanto, é visível que a mutação do mercado já começou há tempo. Nos Estados
Unidos, os bancos são prova disto.
Se consolidação pode abrir a janela para maiores ganhos a quem conseguir
sobreviver, empresas com crescimento estável e fundamentos de qualidade devem
entrar na lista das oportunidades. Os analistas chamam atenção aos bancos fortes
de países emergentes, instituições que podem se tornar alternativa à
consolidação do setor nas nações mais maduras.
Do outro lado, protecionismo tende a gerar instabilidade política. Sugere
posições mais defensivas, receitas menos dependentes de relações internacionais.
A transformação do mercado é indiscutível, mas muitas vezes passa despercebida.