Lucros das instituições, impostos, inadimplência - são muitos os fatores que
pesam no custo final do dinheiro. O custo da intermediação bancária no Brasil
está entre os mais altos do mundo: conforme estatísticas do Banco Central.
Situa-se em 41%, enquanto a média internacional oscila em torno de 10%. É
verdade que o "spread" brasileiro - a diferença entre o que os bancos pagam para
os aplicadores e o que cobram dos tomadores de empréstimos - embute uma série de
despesas que acabam elevando a taxa de intermediação. Por exemplo, a cunha
fiscal (impostos diretos e indiretos), que equivale a 28,5%, as despesas
administrativas, representando 14,1%, e o risco com a inadimplência, que
participa com 17,3% na composição do "spread".
Mas não é só isso. O maior componente está no lucro dos bancos. É esse lucro
- a margem líquida - que corresponde a 40% do total do "spread" bancário. Ou
seja, equivale à maior parte do spread cobrado nas operações de crédito. Nos
Estados Unidos, o lucro dos bancos embutido nos "spreads" é de apenas 10%. A
cunha fiscal também é inferior: 15%. Lá, o "spread" médio fica em torno de 3%.
No Brasil, em cerca de 40%, segundo o Banco Central.
A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) questiona as estatítiscas do BC
com relação à composição dos "spreads". "Há uma distorção nessa pesquisa, porque
só abrange os recursos livres, que são 57% do crédito, e não cobre os
empréstimos direcionados", diz Roberto Luis Troster, economista chefe da
Febraban.
Os créditos direcionados que o Banco Central exclui da pesquisa são aqueles
concedidos a taxas subsidiadas, como o crédito habitacional e rural. A segunda
grande distorção, segundo Troster, reside na denominação dos 41% de margem
líquida. "Margem não é lucro, porque inclui serviços e outros custos bancário".
Já o vice-presidente da Associação Nacional das Instituições do Mercado
Financeiro (Andima), Alfredo Neves Penteado Morais, é mais direto. Segundo ele,
os "spreads" no Brasil não são mais baixos por motivos técnicos (taxas de juros
elevadas e as incertezas econômicas que dificultam a alavancagem) e de
concorrência, ou melhor, de falta de concorrência. "O sistema passou por uma
consolidação, que aumentou o poder de barganha dos bancos e deixou os clientes
sem muita opção. Logo, podem cobrar mais, porque há poucas alternativas", diz.
Dificilmente um cliente pessoa física, no Brasil, encontrará meios de cotar
os juros com diversos bancos e negociar taxas atraentes para empréstimo pessoal.
As instituições exigem um relacionamento com o cliente e o crédito raramente
será liberado para os não-correntistas. Diante disso, terá duas opções: ou
fechar o empréstimo com o seu gerente ou procurar uma financeira que cobrará
taxas semelhantes.
Já nos Estados Unidos, onde a competição é ampla, o crédito tem se tornado
cada vez mais pulverizado. Lá o mercado de crédito equivale a 80% do PIB. No
Brasil, a participação é de 25% do PIB, no Chile está em 75%, no Japão em 120% e
a média dos países desenvolvidos situa-se em 100% do PIB, conforme dados do
sócio da Austin Asis, Erivelton Rodrigues.A modesta participação do crédito na
economia brasileira está ligada a uma série de fatores. Além dos juros elevados,
a necessidade de financiamento do governo, com a venda de títulos públicos aos
bancos, acaba absorvendo boa parcela da receita das instituições financeiras que
poderia se voltar para o crédito.
Apetite do governo
Um levantamento feito pela Austin Asis, a pedido da Gazeta Mercantil, sobre o
desempenho da carteira de crédito dos bancos, com base nos balanços já
publicados, mostra que a receita com crédito em proporção à receita total saiu
de 43,9% no primeiro trimestre de 2002 para 38,6% no mesmo período deste ano. Em
contrapartida, os ganhos dos bancos com tesouraria (compra de títulos públicos)
subiu de 34,1% no primeiro trimestre de 2002 para 37,5% em 2003.
"Os bancos preferem aproveitar as altas taxas de juros e ganhar com isso,
porque o risco de não receber o empréstimo é alto. E eles não precisam usar sua
base de capital para comprar títulos do governo", afirma Erivelton Rodrigues, da
Austin Asis.
A inadimplência nas operações de crédito pessoal tem se mantido estável, em
2003, para períodos acima de 90 dias. O ano começou com uma inadimplência de
7,7% e em abril estava em 7,8%, conforme dados da Andima. Já para os
financiamentos de até 90 dias, a inadimplência subiu de 7% para 8,1% no mesmo
período.
Troster, da Febraban, observa que um dos fatores decisivos para a redução dos
"spreads" bancários reside nas mudanças na lei de falências, a fim de garantir
ao credor o retorno do dinheiro. Os juros cobrados na concessão de financiamento
de automóveis, por exemplo, são inferiores aos do empréstimo pessoal e do cheque
especial, porque o comprador dá o carro como garantia. Mesmo assim, segundo
Troster, em caso de inadimplência, entre a sentença de execução expedida pelo
juiz e a reto-mada do veículo pelo financiador, há um prazo de nove meses. "Isso
precisa mudar", disse.
Enquanto não muda, os executivos acreditam que dificilmente haverá alteração
na estrutura dos "spreads" bancários. O que significa que, mesmo se o Copom
decidir por uma redução da taxa Selic, hoje, a taxa de intermediação bancária
tenderá a permanecer no patamar atual.