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Imóveis - Usucapião no Novo Código Civil Brasileiro 

Data: 30/05/2007

 
 

O NOVO CÓDIGO CIVIL E A USUCAPIÃO

Por: Renato Afonso Gonçalves

Fonte: Folha de São Paulo


A Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003, introduziu importantes modificações no sistema jurídico brasileiro, entre elas as relativas ao instituto da usucapião.

No entanto, antes de ingressarmos na análise dessas alterações, faz-se necessária a abordagem, mesmo que perfunctória, sobre a essência do instituto em exame.

A expressão usucapião deriva do latim usucapio, de usucapere, ou seja, tomar (capere) ou adquirir algo pelo uso. Pode ser usada no gênero masculino, como o faz o Código Civil de 1916, ou no gênero feminino (fiel a origem latina do termo) como no Código Civil de 2002, sendo autorizadas as duas formas no vernáculo.

A usucapião é um instituto antiquíssimo, anterior a Lei das 12 Tábuas (450 a.C.), que já apontava a posse durante determinado tempo como requisito indispensável. O direito romano aprimorou a usucapião (nas fases pré-clássica, clássica e pós-clássica), fundando seus elementos caracterizadores que vigoram até os dias atuais (essa é a lição do ministro José Carlos Moreira Alves em seu "Direito Romano", 11ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 1999, vol. 1, págs. 311 a 316).

Assim, usucapião é direito autônomo consistente em uma das formas de aquisição da propriedade de bem móvel ou imóvel, desde que preenchidas as exigências previstas na ordem jurídica. Como define o civilista português Menezes Cordeiro, da Universidade de Lisboa, a usucapião é "a constituição, facultada ao possuidor, do direito real correspondente à sua posse, desde que esta, dotada de certas características, se tenha mantido pelo lapso de tempo determinado na lei" (Menezes Cordeiro, "Direitos Reais", Lisboa: Lex, 1979, pág. 467). Também por usucapião se adquirem outros direitos reais como o domínio útil da enfiteuse, o usufruto, o uso, a habitação e servidões, que não serão aqui tratadas.

Como nos ensina a grande jurista Maria Helena Diniz, professora titular de direito civil da PUC-SP, pelo usucapião "o legislador permite que uma determinada situação de fato, que, sem ser molestada, se alongou por um certo intervalo de tempo previsto em lei, se transforme em uma situação jurídica, atribuindo-se assim juridicidade a situações fáticas que amadurecem com o tempo. A posse é o fato objetivo, e o tempo, a força que opera a transformação do fato em direito... O fundamento desse instituto é garantir a estabilidade e segurança da propriedade, fixando um prazo, além do qual não se podem mais levantar dúvidas ou contestações a respeito e sanar a ausência de título do possuidor, bem como os vícios intrínsecos do título que esse mesmo possuidor, porventura, tiver" (Maria Helena Diniz, "Curso de Direito Civil Brasileiro", 17ª edição, São Paulo: Saraiva, 2002, vol. 4, pág. 144).

Com a usucapião, a lei procura fazer justiça, na medida em que beneficia aquele que faz boa utilização do bem, não protegendo o que "dormiu" no tempo, que com sua inércia não utilizou o bem ou não se opôs a sua utilização por outra pessoa.

Mas o direito brasileiro não prevê apenas a posse (poder de fato) e o tempo como requisitos necessários à usucapião. Capacidade do possuidor, qualidades da coisa a ser usucapida, boa-fé (ignorância dos obstáculos que impedem a regular transmissão da propriedade) e justo título (título que contenha algum vício ou irregularidade que o impede de ser instrumento apto para promover a transmissão da propriedade; sua noção está intimamente ligada a de boa-fé) são outros requisitos que tanto o Código Civil de 1916 quanto o de 2002 estabelecem para esta forma de aquisição da propriedade.

Desta feita, o possuidor da coisa deve ser capaz (exercer pessoalmente os atos da vida civil) e reunir as qualidades para usucapir, ou seja, as mesmas para ser proprietário. Prescreve o art. 1.244 do novo Código Civil que aplicam-se ao usucapião as mesmas causas impeditivas, suspensivas e interruptivas da prescrição aplicáveis ao devedor na relação jurídica obrigacional, e previstas nos artigos 197 a 202 do novo Código Civil. Tal mandamento se deve ao fato de que a usucapião é caracterizada pela prescrição aquisitiva, que para alguns doutrinadores é sinônimo do instituto em exame. Assim, à guisa de exemplificação, o marido não pode querer usucapir bem da esposa enquanto perdurar a sociedade conjugal, ou o filho querer usucapir o bem do pai enquanto vigorar o poder familiar, ou ainda alguém querer usucapir bem de quem está servindo às Forças Armadas em tempo de guerra. Também não poderá ser usucapido bem de propriedade de pessoa com idade inferior a 16 anos.

Como visto, é preciso também que a coisa possa ser usucapida, já que as coisas fora do comércio, como o ar e o mar, e os bens públicos não podem ser objeto de usucapião.

A posse deve ser exercida com o ânimo de proprietário, de forma contínua e incontestada, não podendo também ser clandestina, violenta ou precária, podendo ser objeto de sucessão por ato inter vivos ou causa mortis.

A propriedade adquirida por usucapião deverá ser sempre declarada por sentença judicial que servirá de instrumento hábil para a transferência da propriedade no Cartório de Registro de Imóveis competente.

Feitas estas considerações iniciais, note-se que o sistema brasileiro define, de acordo com o tempo transcorrido e particularidades da posse, diversas espécies de usucapião para bens imóveis. São elas:

Usucapião extraordinária (art. 1238 do novo Código Civil): Existente no Código Civil de 1916 teve seu prazo reduzido de 20 para 15 anos. Assim, aquele que exerce posse mansa e pacífica, ininterrupta como se dono fosse, sem oposição do proprietário, pelo prazo de 15 anos, independente de justo título e boa-fé, pode por sentença judicial adquirir a titularidade da propriedade. A inovação trazida para esta espécie está na redução do prazo para 10 anos se o posseiro realizou no imóvel obras ou serviços de caráter produtivo ou o utilizou como moradia habitual.

Usucapião ordinária (art. 1242 do novo Código Civil): Existente no Código Civil de 1916 teve seu prazo de 10 anos mantido. Assim, aquele que exerce posse mansa e pacífica, ininterrupta como se dono fosse, sem oposição do proprietário, com justo título e boa-fé, pelo prazo de 10 anos, pode adquirir a titularidade da propriedade por sentença judicial. A novidade introduzida é que o mesmo será reduzido para 5 anos se o imóvel foi adquirido onerosamente com registro cancelado, e desde que o possuidor tenha realizado investimentos de interesse econômico e social, ou tenha utilizado o imóvel como sua moradia. Outra modificação é abolição do critério utilizado pelo Código de 1916 quanto a pessoas presentes e ausentes. Por aquele diploma o prazo da usucapião ordinária seria de 15 anos entre pessoas ausentes (possuidor e proprietário residem em municípios distintos) e de 10 anos entre pessoas presentes (possuidor e proprietário residem no mesmo município).

Usucapião especial urbana (art. 183, §§1º a 3º da Constituição Federal e art. 1.240 do novo Código Civil): Como exigência dos novos tempos e do surgimento dos grandes centros urbanos, a Constituição Federal de 1988 criou esta espécie. O novo Código Civil apenas reafirmou esta modalidade, conferindo a propriedade por usucapião a quem utilizar imóvel de até 250 metros quadrados em área urbana, como se dono fosse, se tiver exercido sua posse ininterruptamente por 5 anos, sem oposição do proprietário, destinando-o para sua moradia ou de sua família. Não há exigência de justo título e presume-se a boa-fé. Por último, a Constituição e o novo código exigem que o possuidor não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. As pessoas jurídicas não podem valer-se da usucapião urbana e a propriedade deve ser declarada por sentença judicial.

Importante salientar que a Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) determina que as áreas urbanas com mais de 250 metros quadrados ocupadas ininterruptamente por mais de 5 anos por população de baixa renda, sem que se possa identificar as respectivas áreas de cada possuidor, podem ser objeto de usucapião coletivo, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural. Assim como as demais espécies de usucapião, a modalidade coletiva deverá ser declarada por sentença judicial a ser registrada no competente Cartório de Registro de Imóveis para a transmissão da propriedade.

Nesse mesmo sentido prevê o novo Código Civil em seu art. 1.228, §4º, dispensando o critério de baixa renda e adotando a exigência da boa-fé e de existência no imóvel de obras e serviços considerados pelo juiz de interesse econômico e social. Esta hipótese regulada pela lei civil vale para imóveis urbanos ou rurais e não é propriamente forma de usucapião, se aproximando da desapropriação, já que o juiz fixará justa indenização devida ao proprietário quando da proposição de ação reivindicatória, e, em sendo pago o preço, a sentença valerá como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.

Usucapião especial rural (art. 191, parágrafo único da Constituição Federal e art. 1.239 do novo Código Civil): Na esteira do usucapião especial urbano, a nova ordem constitucional criou o usucapião especial rural. O novo Código Civil também apenas reafirmou esta modalidade, conferindo a propriedade por usucapião a quem, não sendo proprietário de outro imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição do proprietário, área de terra em zona rural não superior a 50 hectares, desde que nela produza por seu trabalho ou de sua família e nela tenha sua moradia. Não há exigência de justo título e presume-se a boa-fé. Como as demais espécies de usucapião, a modalidade especial rural deverá ser declarada por sentença judicial a ser registrada no competente Cartório de Registro de Imóveis para a transmissão da propriedade.

Superadas as espécies de usucapião, tratemos da questão não menos importante relativa ao direito intertemporal.

Segundo o artigo 2.028 do novo código, serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos pelo novo código, se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido no código de 1916. Assim, mesmo com os prazos reduzidos da usucapião extraordinária e ordinária, valerão ao prazos do Código Civil de 1916 (20 anos para a extraordinária, e 15 anos entre ausentes ou 10 anos entre presentes para a ordinária) se no dia 11 de janeiro de 2003 tiverem fluído metade desses prazos, ou seja, 10 anos para a extraordinária, e 7,5 anos entre ausentes ou 5 anos entre presentes para a ordinária.

Em relação as hipóteses dos parágrafo único do artigo 1.238 e parágrafo único do artigo 1.242, até 11 de janeiro de 2005, os referidos prazos serão acrescidos de 2 anos, independentemente do tempo transcorrido durante a vigência do código de 1916. Assim, até 11 de janeiro de 2005 na usucapião extraordinária o prazo será reduzido para 12 anos se o posseiro realizou no imóvel obras ou serviços de caráter produtivo ou o utilizou como moradia habitual. Na usucapião ordinária o prazo será reduzido para 7 anos se o imóvel foi adquirido onerosamente com registro cancelado, e desde que o possuidor tenha realizado investimentos de interesse econômico e social, ou tenha utilizado o imóvel como sua moradia.

Em relação bens móveis, se aplicam as mesmas noções adotadas para os bens imóveis. Atente-se que os prazos não foram modificados pelo novo Código Civil.

Assim, aquele que possuir coisa móvel como sua, ininterruptamente e sem oposição do proprietário pelo prazo de 3 anos, com justo título e boa-fé, poderá adquirir a propriedade por usucapião. Esta é a modalidade de usucapião ordinário para bens móveis.

A propriedade de bens móveis também poderá ser adquirida por usucapião extraordinário, desde que o sujeito esteja na posse da coisa por cinco anos ininterruptos e sem oposição do proprietário, independente de justo título e boa-fé.

Por fim, em matéria de usucapião o novo Código Civil avançou consideravelmente. Diante dos novos tempos e do desenvolvimento tecnológico e das comunicações se justifica a redução dos prazos. O novel diploma definitivamente trata a propriedade por sua função social ao trazer para o seu corpo a usucapião especial urbana e rural e ao permitir a redução dos prazos da usucapião extraordinária e ordinária quando da realização de obras ou serviços de caráter produtivo, ou de investimentos de interesse econômico e social, ressaltando também o caráter de moradia diante da carência habitacional da sociedade brasileira do século 21.


** RENATO AFONSO GONÇALVES é advogado, mestre e doutorando em direito pela PUC-SP, professor universitário.



 
Referência: Folha de São Paulo
Autor: Renato Afonso Gonçalves
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